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CÂMARA DE LISBOA
Serviços rejeitaram projecto para a Tapada das
Necessidades, mas inverteram posição a pedido do vereador
Sá Fernandes pediu a um director municipal, que dele
depende, para rever um parecer que inviabilizava a aprovação das polémicas
obras previstas para a Tapada das Necessidades por elas contrariarem o contrato
de concessão. O director aceitou o pedido e escreveu no novo parecer que o
fazia por solicitação do vereador. Depois o projecto foi aprovado. Sá Fernandes
nega pressão sobre o director.
José António
Cerejo
2 de Junho de
2021, 20:16
Técnicas, chefia
intermédia e director municipal da Estrutura Verde rejeitaram, em 2017, o
projecto de construção de vários edifícios na Tapada das Necessidades, em
Lisboa, por entenderem que ele violava o contrato de concessão daqueles
espaços, bem como o caderno de encargos do concurso realizado para escolher o
concessionário dos mesmos. A aprovação do projecto pelo executivo de Fernando
Medina só foi possível graças ao facto de o vereador José Sá Fernandes ter
pedido àquele director municipal, Ângelo Mesquita, que alterasse o seu anterior
parecer negativo, coisa que ele aceitou fazer, emitindo um novo parecer, desta
vez favorável.
O projecto de
arquitectura das obras que a empresa concessionária pretende ali fazer foi
objecto de uma primeira rejeição por parte dos serviços da Estrutura Verde,
confirmada pelo director municipal no final de 2016. As alterações entretanto
efectuadas pelo concessionário ditaram uma nova apreciação daqueles serviços,
no que concerne ao cumprimento das condições estabelecidas no contrato de
concessão assinado em 2016 com a empresa Banana Café Emporium e ao impacte da
intervenção na Tapada das Necessidades.
Cave com 226 m2 viola contrato
Na informação
técnica produzida em Junho de 2017 pelo Gabinete de Projectos de Estrutura
Verde, o novo projecto voltou a ser chumbado, precisamente por não cumprir o
preceituado no contrato de concessão e no caderno de encargos. Em concreto, e
entre outras coisas, as autoras da informação apontaram o facto de o projecto
prever a demolição de vários edifícios e a construção de outros novos, quando o
caderno de encargos e o contrato – que a câmara facultou agora ao PÚBLICO, 14
dias depois de ser requerido ao abrigo da Lei de Acesso aos Documentos
Administrativos, mas nunca divulgara antes e nunca publicou no portal
base.gov.pt – impõem a sua reabilitação.
Entre eles avulta
o edifício principal do antigo jardim zoológico, a casa central, ao qual não é
reconhecido qualquer valor histórico ou arquitectónico, mas cuja recuperação é
contratualmente obrigatória. No seu lugar, o concessionário pretende erguer um
novo edifício para instalação de um restaurante, por baixo do qual será
construída uma ampla cave em betão armado, que funcionará como cozinha, com 226
m2 e seis metros de profundidade – situação que não está prevista no caderno de
encargos do concurso, nem no contrato de concessão. Simetricamente à casa
central, serão instalados dois “pavilhões construídos em estrutura metálica e
vidro, com cerca de 359 m2”. Sucede que as condicionantes contratuais permitem
apenas a criação de duas “estruturas amovíveis em lona (tipo tenda)”, as quais
serão “obrigatoriamente de carácter efémero” e “leve”, com um total de 300 m2.
Tal como todas as
outras obras a efectuar pelo concessionário, a intervenção a realizar no antigo
jardim zoológico, lê-se no caderno de encargos, terá de obedecer aos
“princípios da autenticidade, da reversibilidade, da retractibilidade e da
intervenção mínima”, contrariamente ao que acontece com o projecto aprovado.
Na informação do
Gabinete de Projectos de Estrutura Verde apontam-se todos estes incumprimentos
e sublinha-se que o projecto propõe para o restaurante “uma estrutura
construtiva que irá alterar de forma permanente as condições actuais, ao criar
um piso em cave que obrigará necessariamente a uma escavação considerável”.
Outros incumprimentos referidos incidem sobre a volumetria do novo edifício a
construir no topo Norte da tapada – no lugar dos actuais que teriam de ser
recuperados –, a qual é considerada “excessiva”, e sobre “a linguagem
arquitectónica que não se adequa ao contexto romântico deste jardim histórico
nem valoriza a sua identidade”, conforme estabelecido no plano director
municipal. As arquitectas responsáveis pela informação notam ainda que a
esplanada projectada para a zona Sul, junto ao quiosque a instalar, ocupa 150
m2, em vez dos 80 indicados no contrato.
A concluir, a
informação diz que o concessionário terá de apresentar um novo projecto “que vá
ao encontro das condições constantes no contrato de concessão e no concurso”.
Obtida a concordância da chefia intermédia, a informação mereceu a aprovação do
director municipal. “O projecto deverá, em minha opinião, ser reformulado de
forma a que o clausulado do caderno de encargos e as disposições legais e em
vigor sejam cumpridas”, escreveu Ângelo Mesquita a 5 de Junho de 2017, em
despacho dirigido ao vereador Sá Fernandes.
“Na sequência do solicitado por V. Ex.ª”
Três semanas
depois, a 28 de Junho, o mesmo responsável camarário voltou a pronunciar-se
sobre o assunto, dirigindo-se novamente a Sá Fernandes, agora com um preâmbulo
inusitado: “Na sequência do solicitado por V. Ex.ª, venho, pelo presente,
proceder a um esclarecimento e revisão do meu parecer de 9/6/2017.”
A revisão
solicitada pelo vereador e manuscrita logo por baixo do parecer anterior
desemboca numa conclusão oposta à primeira, assim resumida pelo autor: “Se for
considerado por V. Ex.ª que os supramencionados desvios ao clausulado do
caderno de encargos não conduzem à alteração dos pressupostos abrangidos pelo
objecto do contrato, atenta a qualidade do proposto, o processo poderá seguir a
sua tramitação (...)”
E assim
aconteceu. No dia seguinte, um assessor jurídico de Sá Fernandes redigiu uma
informação sobre a apreciação dos serviços da Estrutura Verde e sobre os dois
pareceres do “ilustre director municipal”, considerando “nada obstar à aprovação”
do projecto e propondo a sua aprovação. No mesmo dia, o vereador proferiu o seu
despacho de concordância, respaldado na informação do assessor: “Nada a opor ao
projecto uma vez respeitadas as condicionantes” dos pareceres da Direcção-Geral
do Património Cultural e do Instituto de Conservação da Natureza.
Com a anuência da
Direcção Municipal de Urbanismo já obtida, o projecto foi aprovado seis meses
depois pelo executivo camarário, com os votos contra do PCP e do BE e a
abstenção do CDS.
Entretanto, na sequência
de uma petição lançada em Março e que já reuniu quase 12 mil assinaturas contra
a concretização do projecto assim viabilizado, Sá Fernandes anunciou que seria
apresentado publicamente, no dia 1 de Junho, um plano de salvaguarda da tapada
e que todas as obras a efectuar no seu perímetro, incluindo as que o
concessionário pretende levar a cabo, só poderão ser feitas “se estiverem de
acordo com as respectivas orientações”. A apresentação pública acabou por não
acontecer, sendo nesta quarta-feira substituída pela disponibilização, no site
da câmara, dos documentos do plano que ficará em discussão pública até 1 de
Julho. É possível concluir que, na sua versão actual, o plano desenvolvido sob
a coordenação dos serviços camarários não levanta qualquer obstáculo à
concretização do projecto apresentado pelo concessionário e já aprovado pela
autarquia.
Sá Fernandes invoca “condicionante” desconhecida
Solicitado pelo
PÚBLICO a esclarecer se foram dadas instruções aos responsáveis por esse plano
para que ele contemple o projecto já aprovado, Sá Fernandes respondeu que não,
acrescentando, por email, que “o projecto de arquitectura foi aprovado
condicionalmente, nomeadamente no que se refere à sua compatibilização com o
plano de salvaguarda que vier a ser aprovado”. Por via dessa “condicionante”,
acrescentou o vereador, o concessionário “terá que sujeitar o seu projecto ao
que resultar do plano”.
Acontece que em
nenhum parecer dos serviços que são conhecidos nem nas deliberações camarárias
que aprovaram o projecto consta a “condicionante” referida por Sá Fernandes. O
PÚBLICO solicitou nesta quarta-feira à tarde que lhe fosse facultado um
qualquer documento que comprovasse a existência dessa condição e o gabinete do
vereador enviou vários documentos, mas nenhum deles confirma a existência dessa
condicionante.
Quanto ao pedido
de explicação sobre os motivos que o levaram a pedir ao director municipal
Ângelo Mesquita para rever o seu parecer desfavorável à aprovação do projecto,
o vereador respondeu que “não houve, obviamente, qualquer pedido ou solicitação
para que o director municipal alterasse o despacho por ele proferido”. Na
versão de Sá Fernandes, tanto o seu despacho de concordância com o projecto
como o segundo despacho de Ângelo Mesquita foram proferidas depois de o seu
assessor jurídico, Miguel Rato, ter esclarecido “as dúvidas levantadas pelos
técnicos relativamente à compatibilização do projecto com o caderno de
encargos”, concluindo que não havia qualquer incompatibilidade.
Acontece que o
segundo parecer do director municipal tem data de 28 de Junho e o de Miguel
Rato, tal como a concordância do vereador, tem data de 29 de Junho. Mais: o
parecer jurídico (trata-se apenas de uma “informação” com uma página e meia)
que Sá Fernandes diz ser anterior ao de Ângelo Mesquita consiste precisamente,
entre outras coisas, na apreciação do parecer do “ilustre” director municipal
emitido na véspera. “As questões foram esclarecidas [pelo assessor jurídico] e
cada um emitiu o despacho que entendeu por conveniente”, acrescentou o autarca.
Ângelo Mesquita,
apesar de ter começado por informar que explicaria ao PÚBLICO o que se passou,
nada disse.
Nas respostas
enviadas ao PÚBLICO, a propósito da não publicação do contrato de concessão no
portal Base, Sá Fernandes afirmou que tal publicação não é obrigatória,
alegando, sem explicar porquê, que aquele contrato não está sujeito ao Código
dos Contratos Públicos pelo que não tem, nem pode, ser publicado. De qualquer
modo, acrescentou, o contrato “reproduz o texto da minuta aprovada nas
respectivas deliberações de Câmara, cujos conteúdos e documentos são públicos”.
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Acontece que a
minuta em causa nunca foi aprovada em reunião de Câmara uma vez que a
deliberação através da qual o contrato foi aprovado diz expressamente que “a
competência para aprovar a minuta do contrato” foi delegada no próprio Sá
Fernandes.<_o3a_p>
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