LISBOA
Quarteirão da Confeitaria Nacional deverá ser convertido
em Hotel
Projecto já tem uma aprovação condicionada da
Direcção-Geral do Património Cultural. Piso superior da histórica confeitaria
deverá ser integrada no hotel, como sala de pequenos-almoços e restaurante.
Cristiana Faria
Moreira
2 de Janeiro de
2021, 8:00
A concretizar-se
o plano dos promotores, a baixa de Lisboa terá mais um hotel numa das suas
zonas mais nobres. O quarteirão que é delimitado pela Rua da Prata, Praça da
Figueira e Rua dos Correeiros, deverá ser transformado numa unidade hoteleira
de três estrelas, segundo o projecto que está em apreciação na Direcção-Geral
do Património Cultural (DGPC), que já emitiu uma aprovação condicionada ao
mesmo.
A empresa
Rottshire submeteu à DGPC um Pedido de Informação Prévia (PIP) para a
instalação de um hotel no edifício pombalino que alberga duas lojas históricas,
recentemente classificadas como imóveis de interesse público: a Ourivesaria
Barbosa e Esteves, que está encerrada desde 2018, e a Confeitaria Nacional, que
se mantém em funcionamento há 191 anos. Este último estabelecimento será, de
resto, integrado no projecto do hotel, ficando o primeiro andar da confeitaria
como área para servir pequenos-almoços e restaurante.
A avaliação da
DGPC, no entanto, apenas incide sobre as alterações que poderão afectar os dois
estabelecimentos classificados — e não para a totalidade do imóvel. Segundo
fonte ligada ao projecto, foi já submetido à Câmara de Lisboa o processo de
licenciamento urbanístico.
Manter as lojas
De acordo com o
projecto apresentado, a recepção e o lobby de entrada do hotel ficarão voltados
para a Praça da Figueira e estão previstas alterações no perímetro das lojas,
nas áreas acessíveis a clientes e zonas de serviço. Essas transformações, que
implicavam, numa primeira fase, o rasgo de uma das abóbadas pombalinas e a
demolição de uma parede estrutural, mereceram parecer desfavorável do
Património em Agosto de 2019.
Nesse parecer, a
então directora-geral do Património, Paula Silva, justificava a decisão de não
aprovação por entender que com as “transformações previstas para os espaços das
duas lojas históricas”, concretamente “alterações arquitectónicas dos
interiores e do património integrado”, se assistiria à “descaracterização do
espírito do lugar”.
Ao longo do
processo, os técnicos da DGPC notam que no edifício se conservam elementos
estruturais e artísticos “com valor patrimonial, da fase da construção e da
intervenção realizada em 1899”, como as fachadas em estrutura vertical e
horizontal, a caixa de escada, duas abóbadas de aresta, um arco abatido e o
arranque de outros arcos de suporte de alvenarias, os panos de apanhar das
chaminés das cozinhas, molduras de vãos em peças de cantaria maciça, simples e
trabalhadas, tectos estucados, azulejos, ferragens e guardas metálicas”, que
devem ser preservados.
O promotor, a
empresa Rottshire, efectuou entretanto alterações ao projecto prévio de
arquitectura, que culminou em Setembro num parecer de aprovação ao Hotel da
Betesga, mas condicionado à revisão de um conjunto de soluções arquitectónicas
e à realização de trabalhos arqueológicos. Este parecer, nota a DGPC, incide
apenas sobre os imóveis classificados. Na nova proposta, os autores do projecto
deslocalizaram o elevador de serviço do hotel para a zona de saguão, evitando
assim o rasgo numa das abóbadas pombalinas. O projecto passou também a
conservar a chaminé pombalina que existe na cozinha da confeitaria no piso 1.
“Salienta-se a
necessidade de preservação e valorização integral do património móvel integrado
existente na Confeitaria Nacional, no espaço da antiga Ourivesaria Barbosa e
Esteves e, também, no espaço ocupado pelo restaurante Cervejaria Moderna,
incluindo todos os elementos arte nova, que devem ser integralmente mantidos
(tecto, luminárias, molduras dos vãos exteriores e números de polícia,
procurando torna-los aparentes ao público, se possível, em horários compatíveis
com as funções que forem atribuídas a esses espaços”, notam os técnicos do
Património.
No parecer de
aprovação condicionada, de Setembro, a DGPC refere estar agora salvaguardada a
integridade da parede pombalina existente entre a nova área do hotel e a
Ourivesaria Barbosa e Esteves, no piso 0 e -1. O que será demolido são as
escadas que ligam os pisos o e -1 da Ourivesaria Barbosa e Esteves, que
considera não terem valor patrimonial. Segundo o despacho do chefe da divisão
da salvaguarda do património arquitectónico, Carlos Bessa, as escadas são
“datadas dos anos 70” e, por isso, “não revelam qualquer valor arquitectónico
ou mesmo patrimonial na medida em que correspondem a soluções correntes sem
qualidade reconhecida”.
Ainda assim,
refere o parecer, será preservado o programa decorativo da cave (armários
expositores e tecto). A ligação entre os dois pisos passará a ser feita no
interior da área de arrumos existente, de modo a “salvaguardar todos os outros
elementos de valor patrimonial reconhecido em ambos os espaços classificados
(sejam as abóbadas e paredes estruturais pombalinas, entre outros elementos
singulares)”.
Sala de
pequenos-almoços
Da análise do
projecto, a DGPC conclui ainda que a ourivesaria estará totalmente autonomizada
do hotel. A Confeitaria Nacional conservará a sua autonomia, mas apenas ao
nível do piso 0, para onde estão previstas algumas alterações como uma nova
área com lugares sentados, sendo uma “extensão da sala de chá criada em 1920”.
No primeiro andar serão servidos os pequenos-almoços e funcionará também o
restaurante. Por esclarecer fica se esta área estará aberta ao público em geral
ou apenas a hóspedes.
A esse respeito,
numa reunião entre responsáveis da DGPC e os requerentes, em Outubro de 2019,
estes informaram que era sua intenção passar a posse do imóvel para o
descendente da Confeitaria Nacional.
O prédio em que a
confeitaria está instalada desde 1829 foi um dos imóveis vendidos pela
seguradora Fidelidade a empresas do grupo Apollo em 2018, ficando nas mãos da
Fragrantstrategy. Passou, entretanto, para as mãos da empresa que ali quer
erguer o hotel. O PÚBLICO tentou obter mais esclarecimentos sobre o projecto
junto dos responsáveis da Confeitaria Nacional e da Rottshire, mas tal não foi
possível até ao momento.
A concretizar-se
este projecto, será mais um quarteirão a ser intervencionado na baixa. Também
para o quarteirão da antiga Pastelaria Suíça, no Rossio, se perspectivam
grandes mudanças. Será transformado num grande espaço comercial, que ocupará
quase todos os pisos e deverá estar aberto até meados de 2023.
Sem comentários:
Enviar um comentário