03 dezembro
2024 às 20h35
Assembleia
Municipal de Lisboa aprova referendo sobre o fim do Alojamento Local
A ser
validado pelo Tribunal Constitucional, será a primeira vez que este instrumento
é utilizado no país por iniciativa popular.
Proposta do grupo de cidadãos visa responder à atual crise da habitação
com travão ao alojamento de curta-duração em prédios com uso habitacional na
capital.
Rute Simão
Assembleia
Municipal de Lisboa aprova referendo sobre o fim do Alojamento Local
Foto:
Orlando Almeida
A Assembleia
Municipal de Lisboa (AML) deu luz verde, esta terça-feira, 3, à realização de
um referendo popular sobre o fim do alojamento local (AL) em imóveis destinados
à habitação na cidade. A proposta foi
aprovada com os votos a favor do BE, PAN, PEV, PS, Livre e dos deputados independentes do Cidadãos Por
Lisboa Miguel Graça e Daniela Serralha. Já o Chega, IL, CDS-PP, PSD, o PPM e a
deputada independente Margarida Penedo votaram contra. O PCP e o MPT
abstiveram-se.
Em causa
está a iniciativa do Movimento Referendo pela Habitação (MRH) que, para
responder à atual crise da habitação na cidade, pretende avançar com a
realização de uma consulta popular para travar a atividade do AL em prédios com
uso habitacional. O grupo de cidadãos entregou na AML, a 8 de novembro, cerca
de 11 mil assinaturas, recolhidas durante o último ano e meio. Destas, são
válidas 6600, que respeitam a eleitores recenseados na capital e que superam o
número legalmente exigido (5 mil). As restantes correspondem a assinaturas de
solidariedade com a ação.
"A
nossa vontade é que ganhe o sim para que as casas da cidade sejam libertadas do
peso do turismo e seja possível sonhar com um futuro em que os bairros sejam
espaços habitados, onde, em vizinhança, se construam laços de solidariedade e
de vivência em comunidade. Sabemos que a lei do AL mudou recentemente por
decreto, mas essa mudança não tira poderes de regulação ao município, ao
contrário do que o lobby do AL tem dito. A proposta está viva, válida e deve
seguir em frente", referiu esta tarde a porta-voz do MRH, Rosa Maria dos
Santos, durante a reunião pública do executivo municipal.
Também a
mandatária do movimento de cidadãos, Teresa Mamede, destacou que "não
importa se se considera o AL bom ou mau, o que importa é a democracia",
disse, destacando a possibilidade de serem os cidadãos da cidade a decidir
sobre a matéria.
Já em defesa
do AL, o munícipe Ricardo Serrão
sublinhou que esta categoria de alojamento de curta-duração tem sido "um
bode expiatório, há mais de 10 anos, para todos os problemas relacionados com a
habitação". O responsável, que falou no início da sessão municipal,
criticou o facto de serem criadas zonas de contenção à atividade do AL mas, no
entanto, ser permitida a construção de hotéis nestas áreas. "Há milhares
de imóveis do Estado que estão ao abandono e não são utilizados e ninguém
parece fazer nada para agilizar. Queremos resolver a habitação ou atacar o
AL?", questionou diante dos deputados municipais.
O MRH propõe
que sejam referendadas duas questões: “Concorda em alterar o Regulamento
Municipal do Alojamento Local no sentido de a Câmara Municipal de Lisboa, no
prazo de 180 dias, ordenar o cancelamento dos alojamentos locais registados em
imóveis destinados a habitação?” e “Concorda em alterar o Regulamento Municipal
do Alojamento Local para que deixem de ser permitidos alojamentos locais em
imóveis destinados a habitação?”.
Após a
entrega das assinaturas, a AML avançou com a criação de uma comissão liderada
pelo deputado municipal do PS, Ricardo Marques, com o intuito de apreciar a
iniciativa e endereçar aos serviços competentes da administração pública o
pedido de verificação administrativa, por amostragem, da autenticidade das
assinaturas e da identificação dos subscritores.
As duas
questões serão agora enviadas ao Tribunal Constitucional (TC) que irá avaliar a
conformidade constitucional e legal. Caso seja validado, o referendo terá de
ser realizado num prazo de entre 40 a 60 dias. A avançar, será a primeira vez
que este instrumento constitucional é utilizado no país por iniciativa popular.
Já o
advogado especialista em direito imobiliário,
Miguel Ramos Ascensão, defendeu que as perguntas propostas para este
referendo podem colidir com a lei.
Dúvidas
jurídicas justificam votos contra e abstenções
As dúvidas
sobre a constitucionalidade das perguntas a integrar o referendo, a ser votado
pelos lisboetas, foram também o principal motivo apresentado pelos deputados
municipais para justificar os votos contra e as abstenções. "As perguntas
levadas ao TC são matérias excluídas do referendo local”, garantiu a deputada
municipal do PSD, Ana Mateus, adiantando que “só uma alteração à lei poderá
acolher a vontade dos mandatários mas não o referendo”.
As mesmas
indagações foram partilhadas pelo CDS-PP que informou ter solicitado apoio
jurídico na matéria, tendo recebido a indicação de que as perguntas não serão
validadas pelo TC. Martim Borges de Freitas destacou ainda o "conflito
entre o direito à habitação e à liberdade económica" como um dos fatores
para o chumbo da proposta.
Também o
Chega levantou o cartão vermelho à consulta popular. "É duvidoso que os
municípios possam reduzir ou fazer cessar o AL fora das áreas de contenção.
Acreditamos que o TC impedirá a realização deste referendo", defendeu Nuno
Pardal. O deputado municipal culpou ainda a "imigração descontrolada"
de "ocupar e contribuir para o aumento do preços das rendas".
Natacha
Amaro, do PCP, acusou o AL de ser “uma das causas da falta de habitação a
preços acessíveis”, mas referiu que a proposta de referendo “não apresenta
segurança jurídica relativamente à competência regulamentar do municipio”
motivo pelo qual o partido se absteve.
Do lado dos
partidos que viabilizaram a proposta, a deputada municipal do Bloco de
Esquerda, Isabel Pires, destacou o “momento inédito na democracia” e apontou o
dedo às “consequências desastrosas da atividade económica do AL” que “expulsou
moradores” das suas casas nos últimos anos incitando a “especulação dos preços
da habitação”. A deputada frisou que a decisão sobre o AL é uma “competência
municipal” e lamentou que o “Governo de direita” esteja a retirar “as poucas
limitações que existem à atividade”.
O socialista
Ricardo Marques evidenciou os “ 6500 lisboetas que assinaram o manifesto e que
têm direito à sua voz" sendo fundamental aprovar, disse, "este sinal tão positivo ao final de 50
anos de democracia”.
António
Morgado Valente, do PAN, esclareceu que o partido “não é contra o AL”, mas
admitiu, no entanto, que “há graves problemas em cidades como Lisboa e Porto”.
"A
participação cidadã faz parte do ADN do Livre, que votou naturalmente a favor
desta proposta. O Livre esteve na Comissão Eventual e teve oportunidade de
avaliar esta iniciativa, uma iniciativa cidadã, que nunca foi experimentada em
50 anos de democracia e que tem por objecto um direito constitucionalmente
protegido, o direito à habitação. Face à grave crise habitacional em Lisboa, o
Livre só poderia votar a favor”, rematou a deputada do Livre, Ofélia Janeiro.
*Atualizada
às 21h00
03 December
2024 at 20h35
Lisbon
Municipal Assembly approves referendum on the end of Local Lodging
If validated
by the Constitutional Court, it will be the first time that this instrument is
used in the country by popular initiative.
The citizens' group's proposal aims to respond to the current housing
crisis by curbing short-term accommodation in buildings with residential use in
the capital.
Rute Simão
Lisbon
Municipal Assembly approves referendum on the end of Local Lodging
Photo:
Orlando Almeida
The Lisbon
Municipal Assembly (AML) gave the green light, this Tuesday, 3, to the holding
of a popular referendum on the end of local accommodation (AL) in properties
intended for housing in the city. The
proposal was approved with the votes in favor of the BE, PAN, PEV, PS, Livre
and the independent deputies of Citizens for Lisbon Miguel Graça and Daniela
Serralha. Chega, IL, CDS-PP, PSD, PPM and independent deputy Margarida Penedo
voted against. The PCP and the MPT abstained.
At stake is
the initiative of the Referendum Movement for Housing (MRH) which, to respond
to the current housing crisis in the city, intends to move forward with a
popular consultation to stop the activity of AL in buildings with residential
use. The group of citizens delivered to the AML, on November 8, about 11
thousand signatures, collected during the last year and a half. Of these, 6600
are valid, which concern registered voters in the capital and exceed the
legally required number (5 thousand). The rest correspond to signatures of
solidarity with the action.
"Our
desire is for the yes to win so that the city's houses are freed from the
weight of tourism and it is possible to dream of a future in which
neighborhoods are inhabited spaces, where, in neighborhoods, bonds of
solidarity and community living are built. We know that the AL law has recently
changed by decree, but this change does not take away regulatory powers from
the municipality, contrary to what the AL lobby has said. The proposal is
alive, valid and must move forward," said MRH spokesperson Rosa Maria dos
Santos this afternoon during the public meeting of the municipal executive.
The
representative of the citizens' movement, Teresa Mamede, also pointed out that
"it doesn't matter if you consider AL good or bad, what matters is
democracy," she said, highlighting the possibility of the city's citizens
deciding on the matter.
In defense
of AL, the citizen Ricardo Serrão underlined that this category of short-term
accommodation has been "a scapegoat, for more than 10 years, for all
problems related to housing". The official, who spoke at the beginning of
the municipal session, criticized the fact that containment zones are created
for the activity of AL but, however, the construction of hotels in these areas
is allowed. "There are thousands of state properties that are abandoned
and are not used and no one seems to do anything to speed it up. Do we want to
solve housing or attack AL?", he questioned in front of the municipal
deputies.
The MRH
proposes that two questions be endorsed: "Do you agree to amend the
Municipal Regulation of Local Accommodation in the sense that the Lisbon City
Council, within 180 days, orders the cancellation of local accommodation
registered in properties intended for housing?" and "Do you agree to
change the Municipal Regulation of Local Accommodation so that local
accommodation in residential properties is no longer allowed?".
After the
delivery of the signatures, the AML moved forward with the creation of a
commission led by the municipal deputy of the PS, Ricardo Marques, in order to
assess the initiative and address to the competent services of the public
administration the request for administrative verification, by sampling, of the
authenticity of the signatures and the identification of the signatories.
The two
questions will now be sent to the Constitutional Court (TC) which will assess
constitutional and legal compliance. If validated, the referendum will have to
be held within 40 to 60 days. If it goes ahead, it will be the first time that
this constitutional instrument is used in the country by popular initiative.
It should be
recalled that the Association of Local Lodging in Portugal (ALEP), recently
criticized, in statements to DN, the MRH proposal, calling it a
"farce" and a "political circus". "It is a petition
that, by coincidence, everyone believes was delayed by two years to come out
just close to the local elections. It was a mere strategic maneuver,"
Eduardo Miranda pointed out. The president of ALEP accused the political
parties of hiding behind the action to "persecute" AL and "gain
some electoral advantage". "There are parties without solutions for
housing and attack AL", he lamented.
The lawyer
specializing in real estate law, Miguel Ramos Ascensão, argued that the
questions proposed for this referendum may collide with the law.
Legal doubts
justify votes against and abstentions
Doubts about
the constitutionality of the questions to be part of the referendum, to be
voted on by the people of Lisbon, were also the main reason given by the
municipal deputies to justify the votes against and abstentions. "The
questions taken to the TC are matters excluded from the local referendum",
guaranteed the municipal deputy of the PSD, Ana Mateus, adding that "only
a change to the law can accommodate the will of the representatives but not the
referendum".
The same
questions were shared by the CDS-PP, which informed that it had requested legal
support in the matter, having received the indication that the questions will
not be validated by the TC. Martim Borges de Freitas also highlighted the
"conflict between the right to housing and economic freedom" as one
of the factors for the lead of the proposal.
Chega also
raised the red card to the popular consultation. "It is doubtful that
municipalities can reduce or cease AL outside the containment areas. We believe
that the TC will prevent this referendum from taking place", defended Nuno
Pardal. The municipal deputy also blamed "uncontrolled immigration"
for "occupying and contributing to the increase in rent prices".
Natacha
Amaro, from the PCP, accused AL of being "one of the causes of the lack of
affordable housing", but said that the referendum proposal "does not
present legal certainty regarding the regulatory competence of the
municipality", which is why the party abstained.
On the side
of the parties that made the proposal possible, the municipal deputy of the
Left Bloc, Isabel Pires, highlighted the "unprecedented moment in
democracy" and pointed the finger at the "disastrous consequences of
the economic activity of AL" that "expelled residents" from
their homes in recent years inciting "speculation in housing prices".
The deputy stressed that the decision on AL is a "municipal
competence" and regretted that the "right-wing government" is
removing "the few limitations that exist on the activity".
The
socialist Ricardo Marques highlighted the "6500 Lisboners who signed the
manifesto and who have the right to their voice" and it is essential to
approve, he said, "this very positive sign at the end of 50 years of
democracy".
António
Morgado Valente, from the PAN, clarified that the party "is not against
AL", but admitted, however, that "there are serious problems in
cities like Lisbon and Porto".
"Citizen
participation is part of the DNA of Livre, which naturally voted in favor of
this proposal. Livre was in the Eventual Commission and had the opportunity to
evaluate this initiative, a citizens' initiative, which has never been tried in
50 years of democracy and which has as its object a constitutionally protected
right, the right to housing. In view of the serious housing crisis in Lisbon,
Livre could only vote in favor", concluded the deputy of Livre, Ofélia
Janeiro.
*Updated at
9:00 p.m.
Sem comentários:
Enviar um comentário