BICENTENÁRIO DA
INDEPENDÊNCIA DO BRASIL
“Deixem o coração de D. Pedro no Porto”, pedem
intelectuais brasileiros
Historiadores, escritores e filósofos brasileiros
criticam a autorização da Câmara do Porto de trasladar para o Brasil o coração
de D. Pedro IV. Rui Moreira é acusado de desrespeitar e ofender a memória do
primeiro imperador daquele país. E dizem que o autarca pode tornar-se “um actor
coadjuvante” de uma “manifestação golpista” de Jair Bolsonaro nas celebrações
do bicentenário da independência do Brasil.
Adriana Negreiros
31 de Julho de
2022, 7:55
Quando leu a
notícia de que o coração de D. Pedro IV seria trasladado de Portugal para o
Brasil, a arqueóloga e historiadora brasileira Valdirene Carmo Ambiel temeu o
pior. A primeira imagem que lhe veio à mente foi a do Monumento à
Independência, em São Paulo, onde estão guardados os restos mortais de D. Pedro
e das suas duas esposas, as imperatrizes Maria Leopoldina e Amélia Leuchtenberg
— o monarca casou-se com a segunda em 1829, três anos após a morte da primeira.
Desde 2013 — ano
em que defendeu dissertação de mestrado em Arqueologia na Universidade de São
Paulo (USP) sobre os restos humanos dos primeiros imperadores do Brasil — que
Ambiel chama a atenção para o estado de conservação do monumento, “construído
numa região de aterro e próximo ao riacho do Ipiranga”. Foi nas margens do
riacho que D. Pedro declarou a independência do Brasil, em 7 de Setembro de
1822. Segundo Ambiel, devido ao relevo natural do terreno, aquela construção
sofre há décadas de infiltrações: a água da chuva acumula-se na parte superior
do monumento e desce para o subsolo, onde está a Cripta Imperial com os corpos
de D. Pedro, D. Leopoldina e D. Amélia. “A humidade pode provocar danos
irreversíveis aos restos mortais”, adianta.
Foi por isso que
Valdirene Ambiel estremeceu ao ler que o coração de Dom Pedro IV estava prestes
a atravessar o oceano Atlântico — um pedido do Governo do Presidente do Brasil,
Jair Bolsonaro, para as celebrações do bicentenário da independência. Decidiu,
então, fazer o que estivesse ao seu alcance para impedir o traslado, autorizado
em Junho pelo presidente da Câmara Municipal do Porto, Rui Moreira, guardião do
órgão. A primeira iniciativa foi protestar através das redes sociais. “Se não
conseguimos fornecer o mínimo de respeito e dignidade ao corpo de D. Pedro,
qual o sentido em trazer seu coração, mesmo que por pouco tempo?”, escreveu, no
final de Junho, num post do Instagram. Também concedeu entrevistas, distribuiu
imagens que comprovam a infiltração no Monumento à Independência e antecipou
informações de uma nova investigação em curso, cujo resultado trará a
reconstituição facial dos três imperadores. O trabalho está a ser feito a
partir de imagens tomográficas dos crânios e terá um alto grau de realismo,
promete Ambiel.
Todas as
iniciativas, afirma, são em nome do “respeito à memória do ser humano”. Para a
arqueóloga, o mesmo cuidado deveria ser dispensado à vontade do próprio D.
Pedro. Antes de morrer, ele pediu que o seu coração fosse doado à cidade do
Porto. O gesto foi um agradecimento à resistência da população, que defendeu o
monarca durante o Cerco do Porto, entre Julho de 1832 e Agosto de 1833. Nessa
altura, o exército liberal de D. Pedro venceu as tropas absolutistas do irmão
D. Miguel. “Quando estive no Porto, em 2015, pude constatar o respeito que há
pela figura do monarca na cidade”, conta Ambiel. “Essa cumplicidade deve ser
respeitada.”
“Projecto
ridículo e risível”
Valdirene Carmo
Ambiel não é a única investigadora brasileira a opor-se à ida do coração de D.
Pedro IV para o Brasil. Há, entre historiadores, escritores, filósofos e outros
intelectuais uma forte reacção adversa à iniciativa. Essa resistência é
expressa de duas maneiras principais. A primeira, na forma de uma dura crítica
à solicitação da presidência de Jair Bolsonaro, acusado de usar o coração do
imperador do Brasil para fazer do Sete de Setembro — o feriado nacional da
independência — um “grande espectáculo da pujança dos militares”, nas palavras
da historiadora Lilia Schwarcz, professora do Departamento de Antropologia da
USP e Global Scholar na Universidade de Princeton, nos Estados Unidos. Ela é
autora de 19 livros, entre os quais O Sequestro da Independência: uma história
da construção do mito de Sete de Setembro, em co-autoria com Carlos Lima Jr. e
Lúcia Stumpf, que será lançado no Brasil no dia 5 de Agosto, pela editora
Companhia das Letras. “O empréstimo do coração é um projecto ridículo e
risível”, afirma Schwarcz. “O Governo brasileiro aposta no aumento das armas e
da morte. Somente um Governo que se guia pela ideia de que a violência é intrínseca
pode fazer tal espectáculo de um órgão.”
A segunda reacção
dos pensadores brasileiros expressa-se num sentimento de decepção com as
autoridades portuguesas por terem atendido ao pedido do Governo de Bolsonaro.
Esse desapontamento é endereçado sobretudo à figura de Rui Moreira, presidente
da Câmara Municipal do Porto. Para o escritor Laurentino Gomes, autor dos
best-sellers 1808, 1822 e 1989 (Porto Editora) e da recém-concluída trilogia
Escravidão (o primeiro volume saiu em Portugal pela Porto Editora, em 2021), a
biografia de Moreira “corre riscos”. “Rui Moreira, que conheço e admiro há
muitos anos, já anunciou que pretende acompanhar pessoalmente a viagem do
coração de D. Pedro ao Brasil. Sinto informá-lo que são grandes as chances de
que se torne um actor coadjuvante em uma manifestação golpista do Presidente
Jair Bolsonaro”, afirma o escritor, para quem a decisão da Câmara do Porto foi
“ingénua e precipitada”.
Gomes afirma que, recentemente, durante a Bienal
Internacional do Livro de São Paulo (na qual Portugal foi o país homenageado),
“Bolsonaro humilhou publicamente” o Presidente da República de Portugal.
“Bolsonaro não compareceu ao evento e ‘desconvidou’ Marcelo Rebelo de Sousa
para um almoço programado em Brasília. Não terá qualquer prurido em fazer o
mesmo com o presidente da Câmara do Porto. Para mim, seria penoso ver, uma vez
mais, um representante da democrática República Portuguesa passar por um
constrangimento dessa natureza”, avalia Gomes.
A historiadora
brasileira Isabel Lustosa, investigadora integrada na Universidade Nova de
Lisboa e autora, entre outros livros, da biografia D. Pedro I: Um Herói sem
Nenhum Caráter (Companhia das Letras, 2006), também não compreende os motivos
pelos quais as autoridades portuguesas concordaram com o pedido do Governo
brasileiro. “É surpreendente que Portugal tenha agido assim”, lamenta a
historiadora, convicta de que o recomendável seria fazer-se a última vontade do
monarca e manter o coração no Porto.
Ao contrário do
que muitos afirmam, D. Pedro não deixou registado por escrito o desejo de que o
órgão permanecesse na cidade. Em nenhum dos seus dois testamentos — um assinado
em Paris em 21 de Janeiro de 1832; o outro finalizado em Lisboa em 14 de
Setembro de 1834, dez dias antes de morrer — há recomendações quanto ao destino
dos seus órgãos. No entanto, os historiadores confiam nos relatos dos que
testemunharam os momentos finais do monarca. No leito de morte, conforme relata
Otávio Tarquínio de Sousa no terceiro tomo de A Vida de D. Pedro I, lançado em
1952 e reeditado em 2009 pelo Senado Federal do Brasil, D. Pedro recomendou à
esposa, D. Amélia, “que fosse o seu coração embalsamado e oferecido ao Porto,
em testemunho da mais pura gratidão”.
“As palavras de
D. Pedro foram testemunhadas por seus contemporâneos, pelos que acompanharam a
sua agonia, e a história reconhece o pedido como seu último desejo”, reforça
Isabel Lustosa, convicta de que não há razões para duvidar da autenticidade dos
laços entre o monarca e o Porto. “Perto de morrer, ele quis viajar para a
cidade. O Porto foi fundamental na história de vida do imperador e do homem. A
experiência dramática da guerra, na qual lutou bravamente, revelou-lhe valores
que, talvez, nem [o próprio] soubesse tê-los”, avalia.
“Desrespeito e
ofensa à memória de D. Pedro”
Para Laurentino
Gomes, ao dizer “sim” ao Governo brasileiro, “a câmara de certa forma
desrespeitou a vontade de D. Pedro e ofendeu a sua memória”. Diante do pedido
de empréstimo, “feito à última hora e de forma atabalhoada”, as autoridades
portuguesas “deveriam ter sido mais corajosas” e dito “não”. O escritor
salienta que o coração é uma relíquia frágil, cuja preservação recomenda que
não seja retirado da Igreja da Lapa, onde está conservado em formol e guardado
a cinco chaves. “Só isso já serviria de justificação para que a Câmara
Municipal do Porto recusasse o pedido do Governo Bolsonaro. Não haveria ofensa
alguma ao povo brasileiro. Todos entenderiam perfeitamente a delicadeza da
situação”, analisa. E alerta que “o preço a ser pago por essa imprevidência se
verá na Esplanada dos Ministérios de Brasília no dia 7 de Setembro”.
Até ao momento,
no entanto, o Governo brasileiro ainda não tem planos definidos para o coração.
Não se sabe o que será feito ao órgão nem em que tipo de cerimónias será usado.
Ao P2, a assessoria de comunicação do Ministério das Relações Exteriores disse
que a programação “específica a ser cumprida durante a permanência do coração
está sendo negociada com a parte portuguesa”. Informou ainda que “a vinda do
coração será oportunidade para que os brasileiros possam homenagear a figura
central no processo de independência do país”.
Entusiasta da
ideia de imaginar desdobramentos possíveis para a história — é autor do
recém-lançado A Neve Quente dos Trópicos: O Brasil sem a Família Real (U. Porto
Press), romance sobre o que teria acontecido ao Brasil se a família real
portuguesa não tivesse embarcado para lá em 1807 — o filósofo Renato Janine
Ribeiro torce para o coração não ser exposto publicamente. “Vi as fotografias e
não é uma coisa bonita”, relata. “Não consigo imaginar crianças e adolescentes
animados para ver um coração que parou de bater há quase dois séculos”,
prossegue o filósofo, que foi ministro da Educação da Presidente Dilma Rousseff
e, actualmente, é professor sénior da USP e presidente da Sociedade Brasileira
para o Progresso da Ciência (SBPC).
Ribeiro associa o
pedido do Governo Bolsonaro ao ocorrido em 1972, quando os restos mortais —
menos o coração — foram enviados para o Brasil a pedido do general Emílio
Garrastazu Médici, então Presidente. O país vivia, à época, um dos momentos da
maior e mais violenta repressão contra os adversários da ditadura militar. O
pedido de Médici, assim como o de Bolsonaro, foi feito no âmbito das
celebrações pelo aniversário da independência, que então completava 150 anos. O
actual Presidente do Brasil é um admirador dos ditadores que comandaram o país
entre 1964 e 1985. Em 2016, pouco antes de ser eleito, disse em entrevista a
uma rádio local que o “erro da ditadura foi torturar e não matar”.
A negociação
entre o Estado Novo português — cujo Presidente, em 1972, era o também militar
Américo Tomás — iniciou-se, na ocasião, com maior antecedência do que agora. Na
noite de 13 de Agosto de 1971, Médici foi à televisão anunciar o acordo com as
autoridades portuguesas. O professor Janine Ribeiro conta que havia, entre os
brasileiros, grande expectativa de que, nessa altura, o Presidente anunciasse
uma amnistia para os perseguidos pela ditadura. Ansiava-se pelo anúncio de medidas
que permitissem o regresso ao Brasil de exilados políticos. “Em vez disso, ele
anunciou a vinda de um cadáver, o corpo do imperador. Foi uma decepção. Ao
invés de vida, morte”, descreve Ribeiro.
Quase um funeral
Em 1972, os
despojos de D. Pedro cruzaram o Atlântico a bordo do navio Funchal, que partiu
do Cais de Alcântara, em Lisboa, num final de dia frio e cinzento, a 10 de
Abril. “A despedida foi protocolar, formal”, narrou o jornalista carioca
Humberto Borges, enviado especial do Jornal do Brasil, do Rio de Janeiro, à
capital portuguesa. “O locutor da Radiotelevisão Portuguesa tentava descrever o
embarque dos restos mortais do imperador como uma cerimónia que houvesse
deslumbrado Lisboa. E as imagens desfilavam, bem filmadas, teimando em desmenti-lo”,
ironizou, num texto publicado na edição de 23 e 24 de Abril daquele ano.
Numa cerimónia
descrita pelo repórter como “curta e simples”, cerca de 50 curiosos
presenciaram o momento em que oficiais da Marinha portuguesa conduziram o
esquife com o corpo de D. Pedro ao interior do navio. Naquele momento, foram
executados os hinos do Brasil e de Portugal e os navios de escolta dos dois
países deram salvas de canhão ao rei daqui e imperador de lá.
A bordo da
embarcação estavam 400 pessoas, entre os quais o Presidente Américo Tomás — e a
sua comitiva de 52 convidados —, jornalistas, auxiliares, militares e
tripulantes. “Quatrocentas pessoas e um esquife”, dizia, com ironia, um texto
publicado no Jornal do Brasil a respeito da viagem. Nos 12 dias a bordo, os
viajantes dividiam-se entre o ímpeto de buscar algum prazer no trajecto e o
respeito à presença do morto. “Para encher o tempo, apesar de ser sempre
lembrado que se trata de quase um funeral e de que a viagem não deveria ter
qualquer cunho de diversão, foi instituído o bingo vespertino, na hora do chá”,
lia-se na reportagem. Além disso, os convivas distraíam-se com cafés, licores e
passeios nos convés, onde ocorriam verdadeiros desfiles de moda, “com Diors,
Valentinos e Balenciagas” a exibir-se para os integrantes menos nobres do
navio, intimidados nos seus “surrados paletós enxadrezados”.
Um caixão
demasiado grande
O Funchal aportou
no Rio de Janeiro às 8h50 do dia 22 de Abril — não à toa, data em que, em 1500,
os portugueses chegaram ao Brasil. Foram 270 horas e 50 minutos de navegação,
com uma parada para abastecimento em Porto Grande, em Cabo Verde, no dia 14 de
Abril — no total, foram gastas 800 toneladas de combustível.
A chegada, ao
contrário da partida, atraiu uma multidão de curiosos ao Monumento aos
Pracinhas, no aterro do Flamengo, no Rio de Janeiro, sítio da cerimónia de
entrega dos restos mortais. A população presente ao evento foi estimada, na
data, em cerca de 12 mil pessoas. O esquife foi recebido por uma guarda de
honra formada por fuzileiros dos dois países. Aviões da Esquadrilha da Fumaça
brasileira cruzaram o céu, fazendo acrobacias e soltando jactos de fumo verde e
amarelo ou verde e vermelho, numa referência às cores das bandeiras de Brasil e
Portugal.
No discurso
durante a cerimónia, o Presidente brasileiro Garrastazu Médici fez menção ao
coração de D. Pedro: “Os seus despojos mortais estarão divididos, doravante,
entre a cidade do Porto e a cidade de São Paulo, como divididos estiveram
sempre o seu espírito e o seu afecto entre as duas pátrias que igualmente
amou”. Lembrou, durante o pronunciamento, que “o Cerco do Porto e o Grito do
Ipiranga — os dois maiores momentos de sua grande vida — marcaram o seu destino
histórico”.
Entre Abril e
Setembro, os restos mortais de D. Pedro fizeram uma excursão pelas principais
cidades brasileiras, sendo sempre recebidos com honras militares. No dia 6 de
Setembro, véspera do feriado nacional, foram conduzidos num carro de combate do
Exército brasileiro até o Monumento à Independência, em São Paulo. Neste
espaço, já estava guardado, desde 1954, o corpo de D. Leopoldina (o de D.
Amélia chegaria em 1982). O então presidente do Conselho de Ministros de
Portugal, Marcello Caetano, acompanhou a cerimónia, que teve um desfecho, no
mínimo, constrangedor: o caixão de D. Pedro era maior do que o espaço destinado
a ele no sarcófago de granito da Cripta Imperial.
“Esse foi um
problema que durou vários anos”, relata a arqueóloga e historiadora Valdirene
Ambiel na sua dissertação sobre os restos mortais dos imperadores. “Em 1975, a
urna funerária ainda não havia sido depositada no sarcófago, o que foi
criticado pelas autoridades portuguesas. Parece não ter havido preocupação com
os remanescentes humanos, mas apenas com o personagem, usado como propaganda
política”, critica.
Para a
historiadora Lilia Schwarcz, “tudo funciona na lógica de que a história se
repete primeiro como farsa, depois como tragédia”. Ela afirma que, como
ocorrido meio século atrás, está-se diante de uma celebração do Sete de
Setembro em uma “versão mórbida”. Mais uma vez, na análise de Schwarcz, o
Governo procura defender a visão segundo a qual o processo de independência do
Brasil ocorreu de maneira “ordeira, pacífica e sem povo”, atribuindo
protagonismo a D. Pedro.
“No Brasil, a
figura de D. Pedro é controversa. E há-de ser. Entre 1822 e 1831, quando foi
forçado a abdicar do trono, a popularidade dele foi por água abaixo. Ele impôs
uma Constituição — de 1824 —, reprimiu qualquer manifestação contra a monarquia
e teve de sair do país devido à pressão dos brasileiros”, diz Schwarcz. Esta
historiadora defende que em vez de homenagear a figura do imperador, como
propõe o Ministério das Relações Exteriores, o Brasil deveria estar preocupado
em “entender a independência de forma crítica e reflexiva”.
Sequestro dos
símbolos nacionais
Até agora, o
traslado do coração de D. Pedro foi a única iniciativa anunciada pelo Governo
brasileiro para o bicentenário da independência — o vértice das comemorações,
em tese, deve ocorrer no feriado de Sete de Setembro. A aproximação da data tem
sido motivo de preocupação em alguns sectores da sociedade brasileira —
especialmente entre os críticos do Presidente Jair Bolsonaro. As eleições
presidenciais estão marcadas para o dia 2 de Outubro, 25 dias após o feriado.
Na convenção que oficializou a sua candidatura à presidência, Bolsonaro
convocou os seus apoiantes a saírem para as ruas “pela última vez” e pediu aos
presentes que repetissem a seguinte frase: “Eu juro dar a minha vida pela
liberdade.”
O discurso teve
ampla repercussão nos media e foi compreendido como mais uma ameaça do
Presidente de inviabilizar o processo eleitoral. A suspeita havia sido
reforçada em outro acontecimento recente, quando Jair Bolsonaro se reuniu com
embaixadores brasileiros e atacou a segurança das urnas electrónicas e o
Supremo Tribunal Federal. Para Laurentino Gomes, é nesse contexto que a
biografia de Rui Moreira corre riscos. “Desde que assumiu o Governo, o
Presidente brasileiro sequestrou os símbolos e as datas cívicas nacionais, que
sistematicamente tem usado para atacar as instituições democráticas. Fará isso
novamente no dia 7 de Setembro”, prevê.
O Governo
brasileiro aposta no aumento das armas e da morte. Somente um Governo que se
guia pela ideia de que a violência é intrínseca pode fazer tal espectáculo de
um órgão
“Ao contrário de
celebrações de carácter ufanista, usadas como palco para manifestações
golpistas e antidemocráticas do actual Governo, Brasil e Portugal poderiam
aproveitar o bicentenário para reflectir em maior profundidade sobre as
injustiças, as dores e sofrimentos do passado”, sugere o escritor. É a mesma
opinião de Renato Janine Ribeiro, para quem o bicentenário seria uma boa
oportunidade para que os dois países revisassem o tratado de dupla nacionalidade.
“Não há festas populares, colóquios, exposições em museus, obras públicas sendo
entregues, livros sendo lançados. Em vez disso, temos uma agenda necrófila com
ameaças à democracia. Democracia é vida e ditadura é morte.”
Se, em 1972, o
corpo de D. Pedro demorou 12 dias para chegar ao Rio de Janeiro, o coração
levará cerca de dez horas para atravessar o Atlântico. Voará num avião da Força
Aérea Brasileira, na companhia de Rui Moreira, caso tudo corra conforme o
combinado. Até lá, a Prefeitura de São Paulo espera ter concluído as reformas
no Monumento à Independência, de modo a reparar os defeitos hidráulicos e
eléctricos que, na avaliação de Valdirene Ambiel, têm colocado a integridade
dos restos mortais dos imperadores em risco.
Sem comentários:
Enviar um comentário