O
inominável
Teresa Patrício
Gouveia
1/3/2016, OBSERVADOR
Em
40 anos de democracia nunca presenciei, como agora, um tal
espectáculo de grosseria e despudor e de falta de respeito pelo
serviço público por parte de um político com responsabilidades
públicas.
Tive o privilégio
de ter a colaboração do Professor António Lamas como Presidente do
IPPC e, desde aí, pude, todos puderam, nos últimos 30 anos,
acompanhar a sua brilhante carreira como universitário e gestor
público.
Raríssimas vezes se
veem reunidas numa mesma pessoa visão clara, capacidade de
concretizar e um inabalável entusiasmo, gosto genuíno, pela obra e
pela realização, como no caso de António Lamas.
António Lamas tem
obra feita, nos vários cargos públicos que lhe foram cometidos.
Num dos últimos, o
de presidente do Monte da Lua-Parques de Sintra, com base numa
investigação rigorosa e um saber técnico assinaláveis, recuperou
– também financeiramente – um dos mais valiosos e emblemáticos
conjuntos patrimoniais portugueses.
A ele se deve
também, em larga medida, a existência do Centro Cultural de Belém.
António Lamas acaba
de ser publicamente insultado e despedido pelo membro do governo que
tutela o CCB.
Desconhecemos –
ninguém conhece, julgo – qual o argumento político ou de política
cultural que fundamenta esta destituição. Não é conhecida até à
data, ao governante, uma única ideia. Nada poderia, aliás,
justificar o método e a linguagem destemperada e grosseira ouvida de
um ministro.
Uma campanha contra
o plano para o eixo Ajuda-Belém (que se encontra publicado e
disponível para crítica e discussão) de que o Prof. António Lamas
foi encarregue, através de uma Resolução do Conselho de Ministros,
fora já iniciada sob falsos pretextos, neste caso o de ausência de
contactos com a Câmara Municipal de Lisboa. Sei que os houve.
Podemos supor, supor
apenas, as várias motivações, já que nenhum comentário
substantivo quanto ao plano foi até hoje conhecido ou tornado
público pelos seus opositores, que antes escolheram as armas do
assassinato de carácter, o ataque pessoal, ou até a silenciosa
obstrução burocrática, como a que foi feita, por quem a pôde
fazer, ainda durante o anterior Governo.
O enunciado político
e o processo são componentes essenciais da democracia. Na sua
ausência, resta a gestão – o assalto – aos lugares, ao sabor da
sofreguidão pessoal, da vinculação partidária ou de outras
fidelidades.
Em 40 anos de
democracia nunca presenciei, como agora, um tal espectáculo de
grosseria e despudor e de falta de respeito pelo serviço público
por parte de um político com responsabilidades públicas. Lamento
ainda que seja a propósito de um tão digno servidor do Estado e tão
honrado cidadão.
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