terça-feira, 9 de julho de 2024

Lucília Gago: "A avaliação do primeiro-ministro é pessoal e política. Não cabe ao MP fazer"

 



08 julho 2024 às 21h33

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Lucília Gago: "A avaliação do primeiro-ministro é pessoal e política. Não cabe ao MP fazer"

 

Procuradora-Geral da República reconhece que antevia uma “reação forte” quando elaborou o último parágrafo do comunicado emitido a 7 de novembro.

 

David Pereira

Lucília Gago: "A avaliação do primeiro-ministro é pessoal e política. Não cabe ao MP fazer"

 

Lucília Gago afirmou esta segunda-feira em entrevista à RTP que não se sente responsável pela demissão de António Costa do cargo de primeiro-ministro, mas reconhece que antevia uma “reação forte” quando elaborou o último parágrafo do comunicado da Procuradoria Geral da República emitido a 7 de novembro.

 

“Quando o parágrafo foi construído é evidente que se antevê que possa haver uma reação forte. A avaliação do primeiro-ministro é pessoal e política. Não cabe ao Ministério Público fazer. O Ministério Público fez o seu trabalho e não tem que se preocupar com as consequências que daí advêm. Pela Europa fora há governantes que em situações idênticas não se demitem”, afirmou, dando os exemplos de Ursula Von der Leyen e Pedro Sanchez.

 

“Nada dizia que o primeiro-ministro estava indiciado. O magistrado que ouviu o primeiro-ministro entendeu que não havia indícios e não o constituiu como arguido, mas o inquérito ainda decorre”, prosseguiu a Procuradora-Geral da República, que assumiu a responsabilidade pela elaboração do parágrafo.

 

“Foi concebido por mim e pelo gabinete de imprensa. É da minha inteira responsabilidade a sua inclusão e divulgação. Considerei na altura que não era compreensível uma omissão. Houve buscas na residência oficial do primeiro-ministro. Considerar-se-ia que estaria a protege-lo”, acrescentou, numa entrevista agendada antes de requerimento parlamentar para a sua audição.

 

Lucília Gago explicou que “a mera alusão à prática de um crime obriga o Ministério Público à instauração de inquérito” e que algumas afirmações deram a entender que “poderia haver prática de ilícitos”, tendo rejeitado a ideia de que deveria ter um “cuidado acrescido neste caso em particular”. “Não se pode dizer que todos os cidadãos são iguais e depois dispensarmos um tratamento diferenciado para o primeiro-ministro”, argumentou.

 

A procuradora confirmou que o encontro que teve com o Presidente da República na manhã de 7 de novembro foi a pedido de Marcelo Rebelo de Sousa, mas rejeitou que o chefe de Estado tenha tido influência na redação do comunicado: Não foi divulgado antes dessa audiência porque havia uma detenção a consumar.”

 

A magistrada rejeitou a ideia de “golpe de Estado” e considera “completamente descontextualizada” a referência, não sentido necessidade de pedir desculpa ou de assumir o erro caso não se prove o envolvimento do primeiro-ministro no caso conhecido por Operação Influencer. “Há uma investigação como tantas outras, e haverá um arquivamento se for o caso”, vincou.

 

Lucília Gago justificou a ausência de entrevistas por considerar que a “discrição é sempre melhor que o espalhafato”. “Nunca tive o culto da imagem e não preciso de popularidade nem estrelato. Tudo o que procurei fazer foi numa lógica de isenção e retidão para dar um contributo útil para o Ministério Público”, explicou, realçando que durante o seu mandato foi “duplicado o número de elementos de assessoria de imprensa” da PGR.

 

Acerca do caso de corrupção da Madeira, confessou não achar “normal” três detidos terem ficado detidos durante três semanas sem definição das medidas de coação e lamentou que isso tenha acontecido. “Não foi obra fácil apresentar despacho para que magistrado apresentasse a sua decisão”, explicou.

 

Lucília Gago reconheceu que a imagem da Justiça “sai muito fragilizada”, mas afirmou que a greve dos oficiais de Justiça não ajudou ao andamento do processo. “Há cidadãos que são detidos em flagrante detido e não podem ser ouvidos devido à greve”, acrescentou.

 

Sobre a recente entrevista da ministra da Justiça, que falou na necessidade de “arrumar a casa” no Ministério Público, Lucília Gago considerou as “declarações indecifráveis e graves”, porque “disse que o diagnóstico está feito, mas não disse qual”. A procuradora disse que essas “declarações imputam ao ministério da Justiça tudo o que de mau acontece na Justiça”, o que refuta.

 

A magistrada revelou ainda que “nunca” ponderou demitir-se, pois encara o seu mandato “como sendo um mandato que leva um cunho de rigor, objetividade e isenção” e alega existir contra si “uma campanha orquestrada por pessoas que têm ou tiveram responsabilidades de relevo na nação”.

 

Lucília Gago negou que não vá de bom grado à Assembleia da República e que tenha pedido qualquer adiamento da audição que foi requerida.

 

No final da entrevista à RTP, reconheceu também que “não é comum” que João Galamba tenha estado quatro anos sob escuta.

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