sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

Governo culpa Bruxelas por mais impostos e menos crescimento


Governo culpa Bruxelas por mais impostos e menos crescimento
00:07 Margarida Peixoto / Diário Económico
5-2-2016

Para justificar mais austeridade e menos PIB do que previa no esboço, o Executivo ensaia dois argumentos: medidas adicionais são “culpa” da Comissão e não caem sobre os mesmos.

A proposta de Orçamento do Estado para 2016, entregue hoje no Parlamento, traz um agravamento fiscal face à versão inicial que constava no esboço apresentado há duas semanas pelo Governo. As medidas adicionais foram desenhadas para evitar um pedido formal de revisão das contas pela Comissão Europeia. No Executivo de António Costa , que terá revisto em baixa a previsão de crescimento para este ano face aos 2,1% do esboço, admite-se o impacto negativo dos agravamentos fiscais e ensaia-se uma linha de defesa do Orçamento: colocar a responsabilidade na Comissão Europeia.

“Sabemos que o aumento de impostos vai dificultar mais a atracção do investimento estrangeiro e que vai impedir um crescimento mais rápido. Mas essas culpas só podem ser atiradas a Bruxelas”, defende uma fonte do Governo de António Costa, ao Económico.

Perante a insistência da Comissão Europeia para que o Executivo português apresente mais medidas para cortar, de forma estrutural, no défice orçamental, a equipa de António Costa optou por aumentar mais os impostos, em vez de recorrer a medidas adicionais significativas do lado da despesa.

No primeiro esboço de Orçamento do Estado que foi enviado para Bruxelas, o ministro das Finanças, Mário Centeno, previa já a subida dos impostos sobre os combustíveis, um agravamento ao imposto de selo sobre o crédito ao consumo e a subida dos impostos sobre o tabaco. Com estas medidas previa arrecadar o equivalente a 0,21% do PIB, quase 400 milhões de euros.

Mas a versão que chega hoje ao Parlamento terá uma subida maior da carga fiscal. Uma versão preliminar, a que o Económico teve acesso, dava conta, por exemplo, de um aumento na contribuição extraordinária pedida aos bancos e alterações da taxa de IVA a que alguns produtos estão sujeitos.

O# Governo defende que os rendimentos dos trabalhadores por conta de outrem e dos pensionistas foram protegidos, ao contrário do que queria Bruxelas. Para o Executivo, trata-se de traduzir no Orçamento “opções políticas que foram sufragadas pelos portugueses”. O Governo reforça que quer cumprir as regras orçamentais ditadas pela Comissão e admite que a Comissão desconfia do caminho que está a seguir.

“O #movimento espanhol”

O Executivo relaciona a necessidade que os comissários europeus tiveram de se pronunciar publicamente sobre o esboço de Orçamento português com “o movimento espanhol”. Esta é a tese segundo a qual Portugal precisa de ser transformado num exemplo do que acontece aos países que desafiam as normas orçamentais europeias – não vá o próximo Governo espanhol (que recebeu ontem um aviso adiantado da Comissão - ver página 12) arriscar o mesmo caminho.

Mas perante as exigências de Bruxelas, fonte do Governo argumenta com a necessidade de negociar internamente com os parceiros à esquerda, BE e PCP. “Temos plena consciência de que isto tem de funcionar”, diz fonte governamental, referindo-se ao arranjo político que foi conseguido para sustentar o Governo.

Daí que este Orçamento se trate sobretudo de cumprir com o que já foi dito para dentro e para fora do país. “As medidas são previsíveis”, reconhece a mesma fonte do Governo ao Económico. “Decorrem do Programa de Governo, não vamos romper com o que foi feito no ano anterior”, assegura, “o país não está em posição de fazer rupturas”.

Então e o que muda? “Muda que em vez de se pedir mais aos mesmos, vamos pedir a outros sítios”, responde a mesma fonte, o que será uma das linhas centrais de defesa política do Orçamento do Estado. A mesma fonte aproveita para assegurar que está “muito satisfeito com a dinâmica” que resulta do facto de o PS ter de atender às exigências do Bloco de Esquerda e do PCP. “Isso promove uma discussão muito mais profunda de cada uma das medidas. Cada medida tem de ser bem fundamentada, tem de ter racionalidade económica”, conta, explicando que é dessa forma que se lida com as “divergências”.

Medidas para conter a despesa chegam depois

Ontem à tarde, e mesmo depois da aprovação da proposta de Orçamento pelo Conselho de Ministros, o articulado ainda estava a ser trabalhado. Ainda assim, não será de esperar muitas novidades no que toca a regras de despesa.

O esboço do Orçamento já prometeu cortes nos consumos intermédios, redução de gastos através da simplificação administrativa ou outras poupanças sectoriais. Na primeira versão do Orçamento, o Governo previa poupar cerca de 600 milhões de euros com estas iniciativas.

Mas a concretização destas ideias não se vai traduzir em novidades na lei do Orçamento: “as medidas para conter a despesa serão complementadas pelo decreto-lei de Execução Orçamental porque o problema é sempre a implementação dessas medidas”, defende a fonte do Executivo. Ainda assim, adianta que “estão vários mecanismos novos para controlar as despesas em planeamento, para execução”.


Por agora, uma das mudanças que a lei do Orçamento vai trazer é dar mais autonomia às autarquias, regiões e universidades (ver página 8). Num ano em que já se está a devolver rendimentos – através da retirada progressiva dos cortes aos salários dos funcionários públicos e da redução da sobretaxa de IRS – aumentar a autonomia de gestão destas instituições pode ser um risco. Mas o Governo acredita que esta será uma forma de responsabilizá-las mais pelos seus resultados.

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