ENTREVISTA
José Sá Fernandes: “Igreja disse que jornadas teriam de
ser financiadas pelas câmaras e Estado”
José Sá Fernandes diz que em 2019 a Igreja falou com os
representantes do Estado antes de se candidatar à Jornada Mundial da Juventude
com condição de assumirem a despesa. “Todos concordaram.”
Ana Sá Lopes
2 de Fevereiro de
2023, 20:59
José Sá Fernandes recusa ser "o coordenador disto
tudo" e diz que as suas tarefas, enquanto representante do Estado na
organização da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), estão muito bem definidas.
Em entrevista ao Interesse Público, recusa ainda comentar as palavras de Carlos
Moedas, que diz que agora é ele que coordena, e do vice-presidente da autarquia
lisboeta, que afirma que não aceita "pretensos coordenadores que não fazem
nada". Não se reúne com Carlos Moedas, mas reúne-se todas as semanas com
D. Américo Aguiar, presidente da Fundação JMJ. E diz que "os elogios que
D. Américo fez foi às áreas" que estão sob a sua "tutela".
Houve esta
quinta-feira uma reunião sobre a JMJ que incluiu todos os responsáveis, menos o
senhor. Não foi convidado?
Eu não tinha que
estar na reunião. Esta era uma tarefa específica da Câmara Municipal de Lisboa
em conjunto com a Igreja. Eu apareci nesta polémica do palco porque o senhor
Presidente da República veio a público dizer que achava o valor do palco de 5
milhões e 400 mil euros um exagero. E porque disseram que não houve outra
hipótese porque o anterior executivo [camarário] nada tinha feito e agora
tinham que fazer um ajuste directo.
Muito embora a
distribuição de tarefas esteja completamente resolvida, escrita, expressa, não
só nas funções que me foram atribuídas como no memorando de entendimento entre
as várias instituições, era claramente dito que o palco era uma tarefa que só
cabia à Câmara Municipal de Lisboa (CML) que, obviamente, como todas as
tarefas, deve articular com o organizador do evento, que é a Igreja. Eu
intervim para dizer que não é verdade, que a Câmara anterior já tinha
trabalhado bastante nesta matéria, nomeadamente lançando concurso para a empreitada
principal de toda a jornada.
As mais
importantes tarefas, fazer a obra do aterro e da consolidação do terreno para
suportar o futuro palco e a futura ponte pedonal... A câmara anterior fez um
trabalho muito importante e sem ele era hoje impossível estarmos a discutir o
que quer que fosse. E fiquei surpreendido com o valor do palco, exactamente na
linha do que tinha dito o sr. Presidente da República. O anterior executivo já
estava a desenvolver soluções para um palco que eram mais baratas.
A minha
intervenção foi apenas para esclarecer isto: não é uma tarefa minha. Eu sou
coordenador da Jornada Mundial da Juventude para as tarefas que estão
atribuídas ao Estado. Era também para desfazer a ideia que se estava a criar de
que eu era o coordenador disto tudo. Não sou coordenador disto tudo! Isto é uma
co-produção onde há vários coordenadores para cada uma das suas tarefas. E há
um organizador do evento, que é a Igreja. Eu tenho algumas tarefas
transversais... Segurança, Protecção Civil...
Carlos Moedas
veio dizer "eu agora é que coordeno" e o vice-presidente da CML
Anacoreta Correia afirmou: "Não aceitamos pretensos coordenadores que não
fazem nada" e que "não ajudam a resolver". Como viu estas
palavras?
Não comento essas
palavras. As tarefas estão muito bem definidas. Tenho que coordenar tudo o que
tem a ver com a segurança, a protecção civil, a emergência médica, com a
mobilidade. E também com todos os equipamentos que estão ligados aos
sanitários, uma coisa absolutamente essencial para um evento desta natureza. E
ainda dos ecrãs, luz e som. Depois de uma discussão que houve entre as
entidades também recebi a missão de organizar a chamada 'Feira da Alegria'
juntamente com a Igreja.
O que é a
"Feira da Alegria"?
Há vários
eventos. Há o evento principal, o do Tejo-Trancão, a missa final e a vigília.
Depois, há três eventos que em princípio são no Parque Eduardo VII: a missa
inaugural, o acolhimento ao Papa, a via-sacra. Depois há o encontro final
daqueles que trabalham de borla nesta organização, que são cerca de 30 mil
voluntários da Igreja que se encontram com o Papa em Oeiras. Depois há a
"cidade da alegria", da Igreja, que tem um sítio que se chama "o
parque do perdão" e outro que é "o parque das vocações", que vai
ser em Belém.
Também recebi
essa nova função, que é arranjar o material necessário para que a parte da
feira das vocações aconteça. Estas são as minhas missões. É evidente que tenho
que articular com todos quando for a questão da saúde, da segurança. Sinto
necessidade de dar este esclarecimento: havia coisas feitas pelo anterior
executivo e que foram muito gabadas. A empreitada do aterro que era muito
complexa – tinha que ser feita por cima de um aterro sanitário – foi muito bem
lançada. Este novo executivo já recebeu um concurso público a decorrer e a
única coisa que depois tinha que fazer era analisar as propostas dos
concorrentes. Não consigo perceber como é que alguém pode dizer que não havia
trabalho bem feito. São factos. A obra da ponte pedonal começou ainda no
anterior executivo. Já tínhamos começado a preparar a ponte antes de saber que
havia jornadas.
E para uma pessoa
que anda há 40 anos ligada às questões do ambiente, conseguir transformar um
aterro sanitário, que é uma lixeira, em Lisboa, e um complexo logístico que é
um sítio cheio de contentores, num parque, é das coisas mais bonitas que se
pode fazer. Quando me disseram "Zé, vais conseguir aquele teu sonho, que é
fazer do aterro sanitário um parque, podes concretizar que vamos precisar mesmo
disso para a jornada", para mim foi uma alegria. A empreitada foi lançada
e elogiada. Quando dizem "não deixaram nada preparado"...
Som e imagem para palco no Parque Eduardo VII pode chegar
aos 1,8 milhões de euros
Era vereador e
depois ficou coordenador da JMJ.
Porque é que sou
eu? Porque desde Julho de 2021 tinha-me sido delegado na câmara a Jornada
Mundial da Juventude. Fazia todo o sentido que, independentemente de quem
ganhasse as eleições, houvesse uma transição. O grupo de trabalho formou-se em
Julho, muito antes das eleições. Quando me convidaram para esta missão –
"Ó Zé, queres trabalhar numa estrutura de missão do Estado, para as
tarefas do Estado para a Jornada Mundial da Juventude", eu disse: "É
isso mesmo que me apetece agora, isso é uma coisa que tem a ver comigo."
Vai ser um parque
verde... e quem tutelava a maior parte dos grandes eventos em Lisboa também era
eu. Os Rock in Rio, os piquenicões... Eu não sou o coordenador-geral, eu não
tenho nada a ver com o palco. Se pegarem no memorando de entendimento, a SRU
[Sociedade de Reabilitação Urbana] já estava a tratar do palco-altar no
anterior executivo...
Mas a solução não
era esta?
Podia ser melhor,
pior. Já havia um arquitecto a tratar disso. Desde sempre que a câmara foi
responsável por fazer o altar. Eu não quis atirar culpas para ninguém, só quis
dizer que havia um passado e a responsabilidade do altar é da Câmara Municipal
de Lisboa.
Quantas vezes
reuniu com Carlos Moedas para discutir estes problemas?
Isto é uma
co-produção. Cada instituição nomeou o seu representante. Em relação à Câmara
Municipal de Lisboa a competência foi delegada na vereadora Laurinda Alves. A
Câmara de Loures delegou na vice-presidente Sónia Paixão, o Governo designou-me
a mim. A Igreja tinha o secretário-geral.
Eram estas quatro
pessoas que reuniam para ver como é que se entreajudavam. Cada um de nós sabia
as tarefas que tinha. Eu dizia: "Estas são as minhas tarefas, mas ajudo no
que for preciso." Vou dar o exemplo de uma ajuda operacional. A IC 2 vai
ter que fechar. É uma tarefa que o Estado tem de tratar. Há um memorando de
entendimento com as tarefas divididas, tarefa a tarefa.
Está a dizer que
nunca reuniu com o presidente da Câmara de Lisboa? Moedas veio agora dizer que
é ele que coordena. Como é possível chegar a esta relação entre Governo e
Câmara de Lisboa?
Eu não vou
comentar isso. As reuniões mais importantes que existem são as reuniões
técnicas. Tenho um pequeno grupo de trabalho, somos oito pessoas e temos
reuniões técnicas todos os dias para afinar coisas. Não me posso meter nos
procedimentos das outras instituições. É a mesma coisa que ir a sua casa e ver
o que está a fazer na cozinha. Não tenho direito. E muito mais
institucionalmente. Não posso ver que procedimentos vão fazer, como vão
contratar. Mas estávamos todos imbuídos num espírito, que era o espírito da
parcimónia, desde o princípio. O organizador do evento é o bispo, eu reúno
todas as semanas com o bispo.
O responsável da Jornada Mundial da Juventude realizada
em Madrid em 2011 ficou chocado com o que se vai gastar em Lisboa.
Em 2019 a Igreja
perguntou a todos os protagonistas da altura – Governo, Câmara Municipal de
Lisboa, Presidente da República – se achavam boa ideia a Igreja candidatar-se à
Jornada Mundial da Juventude e disse claramente que isto teria que ser
financiado ou pelas câmaras ou pelas câmaras e pelo Estado.
Disse a Igreja.
E as pessoas
concordaram. Todas as pessoas acharam uma boa ideia a Jornada Mundial da
Juventude. Posso explicar as minhas tarefas uma a uma, as pessoas dizem
"ele não faz nada"... O plano de segurança está a correr muito bem.
Os elogios que D. Américo fez foi às tarefas que tenho sob a minha tutela. O
Serviço de Segurança Interna funciona muito bem.
O que já podemos
saber sobre segurança?
Ainda não sabemos
esse plano, mas estamos a mais do que a tempo de saber. O plano está a ser
feito por pessoas das mais competentes que existem no país, que é o Serviço de
Segurança Interna. Se há coisa que me deu esperança de que há matéria que vai
correr bem é essa.
Sem comentários:
Enviar um comentário