sexta-feira, 3 de fevereiro de 2023

José Sá Fernandes é o entrevistado do Interesse Público / José Sá Fernandes: “Igreja disse que jornadas teriam de ser financiadas pelas câmaras e Estado”


ENTREVISTA

José Sá Fernandes: “Igreja disse que jornadas teriam de ser financiadas pelas câmaras e Estado”

 

José Sá Fernandes diz que em 2019 a Igreja falou com os representantes do Estado antes de se candidatar à Jornada Mundial da Juventude com condição de assumirem a despesa. “Todos concordaram.”

 

Ana Sá Lopes

2 de Fevereiro de 2023, 20:59

https://www.publico.pt/2023/02/02/politica/entrevista/jose-sa-fernandes-igreja-jornadas-financiadas-camaras-estado-2037449

 

José Sá Fernandes recusa ser "o coordenador disto tudo" e diz que as suas tarefas, enquanto representante do Estado na organização da Jornada Mundial da Juventude (JMJ), estão muito bem definidas. Em entrevista ao Interesse Público, recusa ainda comentar as palavras de Carlos Moedas, que diz que agora é ele que coordena, e do vice-presidente da autarquia lisboeta, que afirma que não aceita "pretensos coordenadores que não fazem nada". Não se reúne com Carlos Moedas, mas reúne-se todas as semanas com D. Américo Aguiar, presidente da Fundação JMJ. E diz que "os elogios que D. Américo fez foi às áreas" que estão sob a sua "tutela".

 

 

Houve esta quinta-feira uma reunião sobre a JMJ que incluiu todos os responsáveis, menos o senhor. Não foi convidado?

Eu não tinha que estar na reunião. Esta era uma tarefa específica da Câmara Municipal de Lisboa em conjunto com a Igreja. Eu apareci nesta polémica do palco porque o senhor Presidente da República veio a público dizer que achava o valor do palco de 5 milhões e 400 mil euros um exagero. E porque disseram que não houve outra hipótese porque o anterior executivo [camarário] nada tinha feito e agora tinham que fazer um ajuste directo.

 

Muito embora a distribuição de tarefas esteja completamente resolvida, escrita, expressa, não só nas funções que me foram atribuídas como no memorando de entendimento entre as várias instituições, era claramente dito que o palco era uma tarefa que só cabia à Câmara Municipal de Lisboa (CML) que, obviamente, como todas as tarefas, deve articular com o organizador do evento, que é a Igreja. Eu intervim para dizer que não é verdade, que a Câmara anterior já tinha trabalhado bastante nesta matéria, nomeadamente lançando concurso para a empreitada principal de toda a jornada.

 

As mais importantes tarefas, fazer a obra do aterro e da consolidação do terreno para suportar o futuro palco e a futura ponte pedonal... A câmara anterior fez um trabalho muito importante e sem ele era hoje impossível estarmos a discutir o que quer que fosse. E fiquei surpreendido com o valor do palco, exactamente na linha do que tinha dito o sr. Presidente da República. O anterior executivo já estava a desenvolver soluções para um palco que eram mais baratas.

 

A minha intervenção foi apenas para esclarecer isto: não é uma tarefa minha. Eu sou coordenador da Jornada Mundial da Juventude para as tarefas que estão atribuídas ao Estado. Era também para desfazer a ideia que se estava a criar de que eu era o coordenador disto tudo. Não sou coordenador disto tudo! Isto é uma co-produção onde há vários coordenadores para cada uma das suas tarefas. E há um organizador do evento, que é a Igreja. Eu tenho algumas tarefas transversais... Segurança, Protecção Civil...

 

Carlos Moedas veio dizer "eu agora é que coordeno" e o vice-presidente da CML Anacoreta Correia afirmou: "Não aceitamos pretensos coordenadores que não fazem nada" e que "não ajudam a resolver". Como viu estas palavras?

Não comento essas palavras. As tarefas estão muito bem definidas. Tenho que coordenar tudo o que tem a ver com a segurança, a protecção civil, a emergência médica, com a mobilidade. E também com todos os equipamentos que estão ligados aos sanitários, uma coisa absolutamente essencial para um evento desta natureza. E ainda dos ecrãs, luz e som. Depois de uma discussão que houve entre as entidades também recebi a missão de organizar a chamada 'Feira da Alegria' juntamente com a Igreja.

 

O que é a "Feira da Alegria"?

Há vários eventos. Há o evento principal, o do Tejo-Trancão, a missa final e a vigília. Depois, há três eventos que em princípio são no Parque Eduardo VII: a missa inaugural, o acolhimento ao Papa, a via-sacra. Depois há o encontro final daqueles que trabalham de borla nesta organização, que são cerca de 30 mil voluntários da Igreja que se encontram com o Papa em Oeiras. Depois há a "cidade da alegria", da Igreja, que tem um sítio que se chama "o parque do perdão" e outro que é "o parque das vocações", que vai ser em Belém.

 

Também recebi essa nova função, que é arranjar o material necessário para que a parte da feira das vocações aconteça. Estas são as minhas missões. É evidente que tenho que articular com todos quando for a questão da saúde, da segurança. Sinto necessidade de dar este esclarecimento: havia coisas feitas pelo anterior executivo e que foram muito gabadas. A empreitada do aterro que era muito complexa – tinha que ser feita por cima de um aterro sanitário – foi muito bem lançada. Este novo executivo já recebeu um concurso público a decorrer e a única coisa que depois tinha que fazer era analisar as propostas dos concorrentes. Não consigo perceber como é que alguém pode dizer que não havia trabalho bem feito. São factos. A obra da ponte pedonal começou ainda no anterior executivo. Já tínhamos começado a preparar a ponte antes de saber que havia jornadas.

 

E para uma pessoa que anda há 40 anos ligada às questões do ambiente, conseguir transformar um aterro sanitário, que é uma lixeira, em Lisboa, e um complexo logístico que é um sítio cheio de contentores, num parque, é das coisas mais bonitas que se pode fazer. Quando me disseram "Zé, vais conseguir aquele teu sonho, que é fazer do aterro sanitário um parque, podes concretizar que vamos precisar mesmo disso para a jornada", para mim foi uma alegria. A empreitada foi lançada e elogiada. Quando dizem "não deixaram nada preparado"...

 

Som e imagem para palco no Parque Eduardo VII pode chegar aos 1,8 milhões de euros

 

Era vereador e depois ficou coordenador da JMJ.

Porque é que sou eu? Porque desde Julho de 2021 tinha-me sido delegado na câmara a Jornada Mundial da Juventude. Fazia todo o sentido que, independentemente de quem ganhasse as eleições, houvesse uma transição. O grupo de trabalho formou-se em Julho, muito antes das eleições. Quando me convidaram para esta missão – "Ó Zé, queres trabalhar numa estrutura de missão do Estado, para as tarefas do Estado para a Jornada Mundial da Juventude", eu disse: "É isso mesmo que me apetece agora, isso é uma coisa que tem a ver comigo."

 

Vai ser um parque verde... e quem tutelava a maior parte dos grandes eventos em Lisboa também era eu. Os Rock in Rio, os piquenicões... Eu não sou o coordenador-geral, eu não tenho nada a ver com o palco. Se pegarem no memorando de entendimento, a SRU [Sociedade de Reabilitação Urbana] já estava a tratar do palco-altar no anterior executivo...

 

Mas a solução não era esta?

Podia ser melhor, pior. Já havia um arquitecto a tratar disso. Desde sempre que a câmara foi responsável por fazer o altar. Eu não quis atirar culpas para ninguém, só quis dizer que havia um passado e a responsabilidade do altar é da Câmara Municipal de Lisboa.

 

Quantas vezes reuniu com Carlos Moedas para discutir estes problemas?

Isto é uma co-produção. Cada instituição nomeou o seu representante. Em relação à Câmara Municipal de Lisboa a competência foi delegada na vereadora Laurinda Alves. A Câmara de Loures delegou na vice-presidente Sónia Paixão, o Governo designou-me a mim. A Igreja tinha o secretário-geral.

 

Eram estas quatro pessoas que reuniam para ver como é que se entreajudavam. Cada um de nós sabia as tarefas que tinha. Eu dizia: "Estas são as minhas tarefas, mas ajudo no que for preciso." Vou dar o exemplo de uma ajuda operacional. A IC 2 vai ter que fechar. É uma tarefa que o Estado tem de tratar. Há um memorando de entendimento com as tarefas divididas, tarefa a tarefa.

 

Está a dizer que nunca reuniu com o presidente da Câmara de Lisboa? Moedas veio agora dizer que é ele que coordena. Como é possível chegar a esta relação entre Governo e Câmara de Lisboa?

Eu não vou comentar isso. As reuniões mais importantes que existem são as reuniões técnicas. Tenho um pequeno grupo de trabalho, somos oito pessoas e temos reuniões técnicas todos os dias para afinar coisas. Não me posso meter nos procedimentos das outras instituições. É a mesma coisa que ir a sua casa e ver o que está a fazer na cozinha. Não tenho direito. E muito mais institucionalmente. Não posso ver que procedimentos vão fazer, como vão contratar. Mas estávamos todos imbuídos num espírito, que era o espírito da parcimónia, desde o princípio. O organizador do evento é o bispo, eu reúno todas as semanas com o bispo.

 

O responsável da Jornada Mundial da Juventude realizada em Madrid em 2011 ficou chocado com o que se vai gastar em Lisboa.

 

Em 2019 a Igreja perguntou a todos os protagonistas da altura – Governo, Câmara Municipal de Lisboa, Presidente da República – se achavam boa ideia a Igreja candidatar-se à Jornada Mundial da Juventude e disse claramente que isto teria que ser financiado ou pelas câmaras ou pelas câmaras e pelo Estado.

 

Disse a Igreja.

E as pessoas concordaram. Todas as pessoas acharam uma boa ideia a Jornada Mundial da Juventude. Posso explicar as minhas tarefas uma a uma, as pessoas dizem "ele não faz nada"... O plano de segurança está a correr muito bem. Os elogios que D. Américo fez foi às tarefas que tenho sob a minha tutela. O Serviço de Segurança Interna funciona muito bem.

 

O que já podemos saber sobre segurança?

Ainda não sabemos esse plano, mas estamos a mais do que a tempo de saber. O plano está a ser feito por pessoas das mais competentes que existem no país, que é o Serviço de Segurança Interna. Se há coisa que me deu esperança de que há matéria que vai correr bem é essa.

 


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