Racismo, o campeonato onde todos perdem
Infelizmente, o futebol, este campeonato e o desporto em
geral acabam nestes momentos, revelando o pior de uma nação ainda a braços com
um passado colonial onde a supremacia britânica é ainda um motivo de orgulho.
João André Costa
Professor e
escritor, reside em Londres desde 2007. Criou o Blogue Dar Aulas em Inglaterra
e escreveu os livros “1000 Poemas Suecos” e “Crónicas de um átomo”
12 de Julho de
2021, 12:26
https://www.publico.pt/2021/07/12/p3/cronica/racismo-campeonato-onde-perdem-1970057
Entre o destino e
a sorte, ou falta dela, Marcus Rashford, Jadon Sancha e Bukayo Saka acabaram a
noite a falhar os penáltis que deram a vitória à Itália na final do
Europeu.
A razão do seu
insucesso, no entanto, e de acordo com os adeptos ingleses, não está de modo
algum na sua juventude, possível inexperiência ou nas escolhas do treinador.
Não, a razão do seu insucesso está na cor da pele, ou não tivessem sido os três
jogadores vítimas de racismo nas redes sociais imediatamente a seguir ao
término do jogo.
Os insultos,
intraduzíveis e rasurados por razões óbvias, foram desde “Go back to Nigeria”,
“Get out of my country”, até aos “Take banana n...r” ou “It’s coming Rome!!!
F...g n...r!”.
Infelizmente, o
futebol, este campeonato e o desporto em geral acabam nestes momentos,
revelando o pior de uma nação ainda a braços com um passado colonial onde a
supremacia britânica é ainda um motivo de orgulho.
A mesma
supremacia usada como argumento para a saída do Reino Unido da União Europeia e
onde o emigrante, o mestiço, o negro, o europeu, o asiático, o diferente porque
a cor da pele diferente, a língua e a cultura diferentes, o não caucasiano com
olhos que não azuis e com cabelo que não louro ou uma estatura nem por isso
satisfatoriamente alta, fazendo lembrar tempos nem por isso distantes, é o bode
expiatório e o único responsável pelos pecados, insucessos e derrotas de um
país.
A mesma
supremacia ignorante cuja presença dá razão aos adversários do Reino Unido no
palco mundial num mundo que se quer mais justo e igual, mas onde a ignorância é
ainda rainha quando o insucesso bate à porta.
A ignorância de
quem procura por todos os meios expulsar todos os que se levantam às 3horas
desde sempre para fazer tudo o que os britânicos se recusam a fazer, limpar o
chão e as ruas, cuidar dos doentes e idosos, construir estradas, edifícios,
infra-estruturas, o país, mas também investigar, ensinar, curar, em suma,
ajudar, através do sacrifício imenso de quem está a milhares de quilómetros dos
seus, a desenvolver uma nação a troco não de uma vida mas de insultos, medo,
ameaças e agressões.
E o que dizer do
exemplo de Marcus Rashford ao promover o acesso a refeições gratuitas para
famílias carenciadas em plena pandemia?
Porque a culpa do
insucesso, a existir, é da mesma sociedade que insulta das bancadas quando a
equipa da qual se deviam orgulhar insiste em ajoelhar-se, jogo após jogo,
contra a injustiça e o sofrimento, a equipa cujas aspirações, desejos e anseios,
pelo futuro que é o futuro de todos nós vai muito além das quatro linhas de um
simples relvado.
Perder ou ganhar,
no fim é tudo desporto e o importante é competir. Com respeito, maturidade,
solidariedade e amizade, revelando o verdadeiro poder de união que só o
desporto tem ao trazer-nos todos juntos mais uma vez e depois de tanto tempo.
Dizer mil vezes
obrigados a estes jogadores que tantas emoções e alegrias nos trazem pecará
sempre por defeito. E sublinhar a nossa presença ao seu lado quando o pior
monstro de todos se revela mais uma vez, um monstro que a todos diz respeito e
cujo nome, racismo, não é senão o campeonato onde todos verdadeiramente perdem
e contra o qual combatemos. Até à vitória final.
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