OPERAÇÃO CARTÃO VERMELHO
Oito milhões emprestados a firma de Vieira terão sido
usados para “benefício pessoal”
Crédito foi concedido pelo BES menos de um mês antes da
sua resolução. Ministério Público diz que Vieira ocultou benefício pessoal.
Empresário deu uma versão diferente no Parlamento.
Mariana Oliveira
10 de Julho de
2021, 6:50
Oito milhões de
euros que o antigo Banco Espírito Santo (BES) emprestou a uma empresa de Luís
Filipe Vieira, a Imosteps, foram transferidos para uma conta pessoal de Vieira
e acabaram por servir para pagar um outro financiamento concedido em finais de
2012 “no seu exclusivo interesse pessoal”, diz o Ministério Público. Nos
mandados de buscas da Operação Cartão Vermelho lê-se que a verba foi
“apropriada” pelo dirigente desportivo que, “para ocultar o benefício pessoal”,
lançou na contabilidade da Imosteps que esta pagara esse montante a uma outra
sociedade de Vieira, a Promovalor II.
Curioso é que o
crédito foi aprovado a 11 de Julho de 2014, menos de um mês antes da resolução
do BES, que era então liderado pelo banqueiro Ricardo Salgado, de quem o
Ministério Público diz que Vieira era próximo. “Indicia-se que Luís Filipe
Vieira manteve um relacionamento privilegiado com Ricardo Salgado, então
principal responsável” do grupo Espírito Santo, escrevem os procuradores.
Foi aliás por
indicação do banqueiro que Vieira veio a comprar, através da Imosteps, 50% do
capital da Oata à construtora Opway. O próprio BES possuía 12,5% da Oata que
tinha, através de outras sociedades, dois negócios: um relativo a terrenos e
projectos para dois cemitérios localizados no Rio de Janeiro - dos quais
detinha a maioria do capital - e uma propriedade com aval para construir uma
área total de 102 mil metros quadrados na Barra da Tijuca, imóveis sobre os
quais, segundo o MP, “havia grandes expectativas de obtenção de grandes
lucros”.
A aquisição da
participação de 50% da Oata pela Imosteps justificou um empréstimo inicial de
34,8 milhões de euros por parte do BES à empresa controlada por Vieira e mais
quatro financiamentos concedidos entre Julho de 2013 e Julho de 2014 à mesma
sociedade, num valor global de 54,3 milhões. O último crédito, aprovado a 11 de
Julho de 2014, chegou à conta da Imosteps a 22 de Julho, menos de duas semanas
antes da resolução do BES, decretada a 3 de Agosto. Logo nesse dia 22 o
dinheiro é transferido para a conta pessoal de Vieira.
No Parlamento,
onde esteve a 10 de Maio, Vieira recusou sempre que esta verba tenha ido parar
à sua conta pessoal. “De certeza que eu nunca levantei dinheiro para mim. Pode
pôr aí que eu nunca levantei um tostão para mim!”, sublinhou o empresário, na
resposta a uma pergunta da deputada bloquista Mariana Mortágua.
No entanto, numa
carta enviada aos deputados, a 24 de Maio, para complementar informação que não
tinha conseguido prestar no depoimento presencial, o presidente da Promovalor
admitiu que os oito milhões passaram pela sua conta - sugerindo que esta terá servido
como uma espécie de conta-veículo -, não sendo, porém, esse o seu fim. "O
destino final desse montante foi a Promovalor”, em resultado de uma livrança
emitida pelo BES e subscrita por Luís Filipe Vieira “para pagamento de uma
dívida da Promovalor à Caixa Geral de Depósitos”, revela a carta a que o
PÚBLICO teve acesso.
“Em Julho de
2014, a Imosteps recebeu o empréstimo de oito milhões de euros para pagar
aquela dívida da Promovalor que à data ascendia a 7,7 milhões de euros, sendo
as transferências bancárias promovidas pelos serviços do Novo Banco entre 22 de
Julho de 2014 - data da transferência de fundos para a conta de Luís Filipe
Vieira - e 15 de Outubro de 2014, data em que a última transferência foi feita
da conta de Luís Filipe Vieira para a conta da Promovalor, no valor de 360 mil
euros”, explica o presidente da Promovalor. No total, foram entregues 8,06
milhões de euros, “mais 60 mil euros do que o recebido do empréstimo feito à
Imposteps”, acrescenta a missiva.
O Ministério
Público tem outra versão. Garante que os oito milhões foram lançados na
contabilidade da Imosteps como pagamento à sociedade Promovalor II, igualmente
controlada por Vieira, mas que na realidade tiveram um destino diferente. “No
entanto, a referida quantia, uma vez transferida para a conta pessoal de Luís
Filipe Vieira foi quase integralmente utilizada para o pagamento de um efeito,
isto é, um financiamento suportado em livrança, que havia sido concedido ao
mesmo, já em Dezembro de 2012, no seu exclusivo interesse pessoal, o qual
atingia na data o montante de 7,7 milhões de euros, que assim foi integralmente
pago”, escrevem os procuradores. Com Marta Moitinho Oliveira
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