quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

Quem ganha e quem perde com a vitória de Rui Rio

 



OPINIÃO

Quem ganha e quem perde com a vitória de Rui Rio

 

O PSD de Rio e o PS de Costa podem, de facto, entender-se. Rio quer reformas, Costa nem por isso, mas ambos partilham a fé no poder do Estado, para guiar os destinos da pátria, e a fé em si próprios, para guiar os destinos do Estado.

 

João Miguel Tavares

30 de Novembro de 2021, 0:43

https://www.publico.pt/2021/11/30/opiniao/opiniao/ganha-perde-vitoria-rui-rio-1986866

 

Esta análise parte das seguintes premissas: 1) O PSD de Rui Rio está mais ao centro do que o PSD de Paulo Rangel. 2) Rio é mais autoritário e menos liberal do que Rangel. 3) Rio é um candidato mais forte do que Rangel na disputa do espaço do PS. A partir daqui, eis os partidos que ganham e que perdem com a vitória de Rui Rio, avançando dos mais pequenos para os maiores.

 

Iniciativa Liberal – ganha. Rangel era uma ameaça, no sentido em que podia captar o voto útil dos liberais do PSD. Com Rui Rio, essa ameaça desapareceu. O seu espaço político não terá concorrência em Janeiro de 2022. Boas notícias para a afirmação da IL.

 

Chega – perde. André Ventura, com a elegância habitual, chamou várias vezes “frouxo” a Paulo Rangel, mas para chegar aos ambicionados 15%, o “frouxo” ser-lhe-ia muito mais útil. Rui Rio, com os seus tiques autocráticos, a alergia ao “folclore parlamentar”, e o cheirinho frequente a alto quadro da União Nacional, é uma ameaça bem maior para Ventura. Pela ideologia, capta votos ao centro; pelo estilo, é capaz de captar votos à direita autoritária.

 

PAN – perde. Não perde por causa do charme de Rui Rio entre os ambientalistas – que não existe –, mas porque Rio pode colocar o PS mais longe da maioria absoluta. Para o PAN ser realmente decisivo, o PS teria de ficar a dois ou três deputados dos 115, e precisar dos deputados do PAN para chegar lá. Sem Rangel, vai ser mais difícil acertar no Euromilhões.

 

CDS – ganha. Na noite de sábado só vimos Rui Rio abrir garrafas de champanhe, mas Francisco Rodrigues dos Santos também abriu a sua. A única forma de o CDS escapar à irrelevância em 2022 é através de uma coligação com o PSD, aproveitando os seus melhores quadros para compor listas conjuntas. Rangel não queria. Rio quer. Até porque é uma excelente desculpa para dar outra vassourada na ala descontente do partido. A fome junta-se à vontade de comer.

 

PCP e Bloco – perdem. A tese é válida para os dois partidos. Nem o PSD de Rio nem o PSD de Rangel irão alguma vez buscar votos ao Bloco ou ao PCP. Mas o PSD de Rio oferece a António Costa aquilo que Rangel disse que não oferecia: uma alternativa viável de governação. Rio pode polarizar as eleições, o que significa menos lugares no Parlamento para a esquerda e menos influência no país. Quanto mais acesa estiver a luta ao centro, mais o PS precisará de ir buscar votos à sua esquerda para continuar no poder. Más notícias para PCP e para Bloco.

 

PSD – ganha (no presente). Estou com as sondagens: Rio é um nome mais forte do que Rangel para disputar as eleições com António Costa. E é, sobretudo, um nome menos arriscado. Os militantes do PSD preferiram ter um pássaro na mão (um acordo futuro com o PS), do que dois a voar (a hipótese miraculosa de uma maioria absoluta, ou perto disso). O PSD de Rio e o PS de Costa podem, de facto, entender-se. Rio quer reformas, Costa nem por isso, mas ambos partilham a fé no poder do Estado para guiar os destinos da pátria, e a fé em si próprios para guiar os destinos do Estado. Nenhum deles desfaz este nó: onde superabundam os candidatos disponíveis para salvar o país, escasseiam os candidatos dispostos a oferecer ao país os meios para ele se salvar a si próprio.

 

PS – depende. Por um lado, Rio vai roubar votos a Costa. Por outro, oferece-lhe um governo viável ao centro. Em qualquer dos casos, o mais provável é Costa acabar com menos poder em 2022 do que tinha em 2019. Irá conformar-se com isso? Tenho muitas dúvidas.

 

Sem comentários: