Rui Riu-se. A
opinião de Pedro Santos Guerreiro
14.01.2018 às
0h34
Rui Rio vai abrir
o PSD, sim, abrir as portas para correr de lá com o “clube de amigos” que o
desfez. Mas não mostrou ainda definição ideológica nem espessura intelectual
para que percebamos o que fará depois.
PEDRO SANTOS
GUERREIRO
“Rui Rio,
conhece? É um homem perigoso para quem o critica, se ganhar fará uma razia
total de cabeças no PSD, recolocará o partido no centro ideológico, decidirá
com máquina de calcular no bolso mas terá de mostrar se tem visão tamanha ou
tacanha. É o senhor que se segue num partido que segue em autodestruição há
década e meia. Sim, o PSD tem mostrado o que vale, vale pouco mais do que os
jogos de poder daqueles que, subindo na hierarquia, fazem descer o partido. Que
a próxima vida não seja menos uma no saco de gatos. E que a ovação eufórica que
ouviremos não seja do nervosismo dos cínicos e da vitória do medo.”
Escrevi estas
linhas a 7 de outubro no Expresso, para frisar que pouca gente em Portugal
conhece bem Rui Rio, até porque ele se dá pouco a conhecer. Incluindo os que o
conhecem melhor, os cidadãos do Porto. Basta ler o que aqui escreve o
jornalista Valdemar Cruz, do Porto: “Há em Rio uma espécie de neblina, por
momentos impeditiva de um conhecimento rigoroso de algum do seu pensamento”.
É da ação política
como presidente da Câmara do Porto que melhor podemos percebê-lo: um homem de
estilo autoritário e fechado, hostil à comunicação social e intolerante à
crítica, sério, com grandes conhecimentos de economia e desprezo pela cultura,
sem abertura à intelectualidade, cismado no controlo de custos e,
aparentemente, sem mundo nem mundividência.
É fácil é
perceber por onde vai começar: pela vassourada no PSD, limpando o partido da
rede de interesses, políticos e não só, em que se transformou nos últimos anos.
É o “clube de amigos” que levou Pedro Passos Coelho à liderança do partido, não
porque Passos fizesse parte dele, mas porque o deixava à solta. Não controlava
“os amigos”, não sabia como. Rio sabe como. Vai controlar tudo. E se essa
limpeza libertar o PSD dos “interesses” que o tomaram, então o partido ganha.
Mas ganha o quê? Desconhecemos. Porque Rui Rio ainda não revelou posicionamento
ideológico concreto para o partido nem estratégia intelectual política. O PSD
não fez qualquer rejuvenescimento e se carece de uma regeneração, que ela não
seja apenas o corte de cabeças do passado, antes a afirmação de uma proposta
política que agregue e congregue uma alternativa para quem precisa dela. O
esboroar do PSD, que levou à derrota pesada nas autárquicas e a níveis de
popularidade medíocres, não resulta apenas de Passos não ter sabido fazer
oposição, mas da falta de pensamento político estruturado, que devastou o
partido ao longo de mais de uma década e meia. Daí a orfandade de tantos à
direita, espaço político onde existe um vazio por preencher. Incluindo como
expressão de oposição.
Rui Rio esteve
anos à espera do PSD antes de o PSD ficar à espera dele. Preparou-se, ganhou e
agora é líder do principal partido da oposição, declarando guerra à maioria de
esquerda ainda que isso signifique fazer acordos com o PS depois das eleições
de 2019. Rio acredita no diabo de Passos, ainda que não o nomeie: que as contas
públicas do país continuam débeis, que a economia está a crescer sem qualquer
transformação perene, que qualquer crise externa fará ruir a nossa recuperação
e que o atual governo esbanja no Estado, centrando-se em quem vota
(pensionistas, funcionários públicos, trabalhadores privados) em detrimento de
quem investe (as empresas).
Rio não quer
mudar apenas o PSD, quer mudar o país, e provavelmente sente-se o homem
providencial que o pode fazer. Tem dois anos para mostrar o que vale. E, para
fazê-lo, vai ter de mostrar quem é, como é e como pensa. Não vai tardar muito
até começarmos a conhecê-lo. Começando por ver não apenas aqueles que ele
afastará do partido, mas também aqueles de quem se vai rodear. Porque a
campanha pobre mas afirmativa que fez mostra que ele precisa de gente a seu
lado e não é de gente que concorde com ele, mas de quem lhe dê o que ele, mesmo
não o admitindo, não tem. De outra forma, daqui a dois anos Rio esfarela-se. E
o "clube de amigos" esfrega as mãos de contente.
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Quando um líder
de transição não o é
Como se faz um
líder que conduza o PSD de novo ao Governo? Eleito na oposição, o presidente do
PSD tem batalhas pela frente, a maior delas, as legislativas de 2019. O P2
analisa as condições em que, mesmo que não ganhe a Costa, poderá sobreviver até
chegar a primeiro-ministro.
SÃO JOSÉ
ALMEIDA 14 de Janeiro de 2018
No dia seguinte à
eleição do novo presidente do PSD, o desafio que coloca ao ungido nas eleições
directas pelos militantes é o de ser capaz de fazer o partido atravessar o “Mar
Vermelho” de uma eventual derrota nas legislativas de 2019 e, por tempo indeterminado,
conduzi-lo pelo deserto da oposição até à terra prometida do regresso ao
exercício de Governo.
Não existe uma
resposta prévia e fechada que permita garantir, neste momento, se o escolhido
pelos militantes do PSD tem as características e reunirá as condições para
cumprir o papel messiânico que é dele esperado pelo partido. Certeza apenas
existe uma: todos os líderes políticos são de transição, ninguém é eterno. Mas
as variáveis que influenciarão a transitoriedade ou longevidade do mandato são
múltiplas e diversas e não dependem apenas do próprio. Até porque falamos de
política, um mundo em que basta dois meses para as circunstâncias mudarem
radicalmente.
Há assim que
contar com o factor de imprevisibilidade da política para analisar prospectivamente
o futuro do PSD. E aqui contam, à partida, as condições endógenas ao presidente
do PSD. “Vai depender do tipo de liderança e da personalidade do líder”,
considera o antigo chefe do partido Luís Marques Mendes. Ou seja, da sua
resiliência pessoal e política.
O contraponto
histórico é evidente, quando se fala em resiliência política no PSD. Há na
história deste partido um líder que perdeu as legislativas em 1999, resistiu,
esperou e acabou por ser primeiro-ministro em 2002: José Manuel Durão Barroso.
Para não falar de Cavaco Silva, que, embora nunca tenha perdido legislativas,
quando ganhou o Congresso da Figueira da Foz, em 1985, foi olhado como um líder
fraco e o seu governo minoritário sem futuro. “Mesmo quando Cavaco ganhou pela
primeira vez, diziam que era por oito meses e foi dez anos”, recorda José
Arantes, que trabalhou na comunicação política destes dois líderes.
Arantes sublinha
o factor da imprevisibilidade do futuro no momento da eleição de um líder por
um partido. “A situação de um governo pode parecer sólida e ser frágil, assim
como o líder do PSD pode parecer frágil e ser sólido”, sublinha o antigo
assessor de Cavaco e de Barroso, para concluir: “O desafio pode ser muito
simples, o de fazer acreditar que o PSD pode chegar ao Governo e ser o seu
pivot. Isso se a situação do actual Governo se fragilizar.”
O poder dá
carisma
Ainda no plano
estritamente respeitante ao PSD e ao desafio que se coloca ao seu novo
presidente, José Arantes avisa que os líderes são como os melões, só em funções
se revelam. “Os líderes crescem quando chegam lá, o carisma de um líder surge
de facto quando ele é primeiro-ministro”, garante. “Os lugares fazem o carisma.
As características têm de estar lá, o político tem de ter estofo, mas é o
exercício do poder que dá condições para revelar o carisma.” Há exemplos disso
em Portugal e no estrangeiro. António Guterres foi alcunhado por Vasco Pulido
Valente de “picareta falante” antes de ganhar as eleições de 1995. Em Espanha,
o líder do PP José Maria Aznar era visto como alguém que nunca ganharia nada
porque era baixote e tinha um bigode ridículo.
Uma das
condicionantes com que o novo líder do PSD terá de lidar é a nova forma de
fazer política hoje, defende Feliciano Barreiras Duarte, antigo membro do
núcleo duro de Durão Barroso e primeiro chefe de gabinete de Passos Coelho,
tendo integrado os governos de ambos. “Hoje, os ciclos políticos são cada vez
mais pequenos, quer no governo quer na oposição”, garante, sublinhando que para
isso contribui o facto de “na comunicação social e nas redes sociais imperar o
generalismo”. E quanto à reacção do eleitorado? “As pessoas exigem respostas
mais rápidas, a política tem menos poder e os políticos são malvistos, factores
que introduzem concorrência” nos partidos, sustenta Barreiras Duarte,
concluindo que a tendência é para “o balanço de curto prazo” e para a
generalização da ideia de que “o líder tem de ganhar eleições, caso contrário,
vai para a rua”.
Mas a política em
democracia é um jogo com vários players que se disputa no tabuleiro da
realidade da sociedade portuguesa e do seu complexo quotidiano. Isto significa
que muito do que será o futuro do PSD depende e construir-se-á em conjunto e em
espelho com o futuro do seu principal oponente, o PS liderado pelo
primeiro-ministro, António Costa.
Há uma situação
em que claramente o líder agora eleito se verá obrigado a abandonar o poder
partidário pelo seu próprio pé: se em 2019 houver uma maioria absoluta do PS. O
mesmo caminho de abandono de liderança é apontado por diversas personalidades
do PSD ouvidas pelo P2 se o PS tiver um resultado muito bom, de quase maioria
absoluta.
Nesta análise,
Marques Mendes introduz, porém, uma mescla de variantes eleitorais em que,
mesmo sem ganhar eleições, o presidente do PSD se manterá em funções e não será
um líder de transição. A primeira é a de um cenário em que “o PSD perde, mas
evita a maioria absoluta e tem resultado confortável em torno dos 30%”, isto
acompanhado por uma prestação do líder que consiga “afirmar-se com boas
iniciativas”.
O antigo líder do
PSD admite mesmo que, “se a prestação for boa, mesmo com mau resultado, gera
ambiente favorável” à sua continuação. Um factor que funcionará em situação
inversa. “Mesmo que tenha um resultado bom, mas se até às eleições não tiver
uma prestação brilhante, não resiste.” Tudo depende assim em grande parte,
segundo Marques Mendes, do desempenho do novo presidente do PSD: “Se tiver
capacidade de se afirmar na componente afectiva e política, pode manter-se.
Mas, se não for muito eficaz, não se manterá.”
Agarrar a
oportunidade
A tese de Marques
Mendes sobre a importância do desempenho pessoal do presidente do PSD é
coincidente com o modo como José Arantes considera determinante o desempenho do
lugar de líder da oposição. Regressando ao exemplo de Cavaco, José Arantes
insiste: “Tenho presente o caso de Cavaco, que as pessoas pensavam que era por
oito meses, a volatilidade é sempre grande.” E sublinha que “a tarefa é agarrar
essa oportunidade, construir um discurso político que, sem rejeitar a visão
optimista sobre o país, pois a situação está melhor, olhe para o futuro em vez
de olhar para o passado”. O que significa que caberá ao presidente do PSD
mostrar aos eleitores que é ele que tem melhores condições para construir um
projecto para o país a partir da situação existente e que é ele quem pode
dar-lhe melhor seguimento, consolidar e optimizar o presente.
Uma missão que
para Marques Mendes tem de ser cumprida já em 2018. “O factor tempo é muito
importante. Para o líder se afirmar a sério, vai ter de ser em 2018 e não em
2019”, garante, explicando: “Se chegar a Janeiro de 2019 e as sondagens estiverem
como hoje, então o PSD já não vai contar para disputar as eleições, e António
Costa até poderá ter maioria absoluta.” E Mendes deixa o alerta para o seu
próprio partido. “Não é impossível António Costa ter maioria absoluta, se o PSD
não melhorar em um ano nas sondagens; se o eleitorado vir que o partido não tem
hipóteses de ganhar, os eleitores moderados escolherão o voto útil no PS,
porque preferirão os socialistas sozinhos, ou seja, preferirão maioria absoluta
do PS à aliança deste com o PCP e o BE.” E conclui a sua ideia reforçando que,
se o novo presidente do PSD “não recuperar o partido em 2018, está perdido em
2019; é uma questão de timing apertado”.
A necessidade de
o novo líder ser capaz de, logo de início, afirmar um projecto alternativo ao
Governo de António Costa é salientada por todas as personalidades do PSD
ouvidas pelo P2. Um projecto que terá de olhar para o futuro e mostrar dinâmica
de vitória. É dos livros que os eleitores fazem escolhas a olhar para a frente
e que apenas desistem de um líder quando percebem que ele não tem hipóteses de
vencer. “Os militantes não mandam um líder fora por perder eleições, é por
acharem que é inepto para as ganhar”, salientou um responsável do PSD ao P2.
O dia de Costa
O resto está
também nos manuais e passa pela ideia de que a perspectiva do poder dá coesão
aos partidos e capacidade de esperar pelo momento da sua conquista. Ora, a
possibilidade de, mesmo perdendo eleições em 2019, o PSD poder ganhá-las a
seguir é consensual entre os interlocutores do P2. “Mais tarde ou mais cedo,
vai correr mal a António Costa, esse dia vai aparecer”, afirmou um dirigente do
PSD, enquanto outro responsável histórico do partido sublinhou que “não é
nítido que esta solução de esquerda possa dar ao eleitorado uma perspectiva de
futuro”, já que “esta solução tem os genes do seu fim; a actual linha de acção
e de convergência de esquerda não pode ser explorada eternamente”.
Uma outra
personalidade do partido frisou mesmo que “a solução de Governo é inédita, o
que dificulta prever como vai acabar”, e esse fim pode dar-se “com a explosão
da esquerda, mas pode também acabar com o seu fortalecimento”. Chamando a
atenção para factores internos da aliança de esquerda, salientou o exemplo de
“o PCP poder estar em erosão”, apontando a vitória do PS em Almada como “um
sinal”, já que “não é um problema conjuntural, é uma alteração sociológica dos
eleitores de Almada”, pois “hoje são cada vez mais os jovens quadros que vão
para ali viver, porque é caro viver em Lisboa”.
Se chegar a Janeiro
de 2019 e as sondagens estiverem como hoje, então o PSD já não vai contar para
disputar as eleições, e António Costa até poderá ter maioria absoluta.
Marques Mendes
Ora, essa erosão
eleitoral “preocupa o PCP e pode levar este partido a uma estratégia de
afastamento do Governo”, o que se vê já no “reactivar da sua frente sindical”.
Em suma, o futuro da aliança de esquerda é imprevisível, segundo esta
personalidade do PSD: “Como acaba o Governo? Mais coeso? Zangado? O BE vai
integrar a ala esquerda do PS? Haverá um esfarelamento do PCP? Ou um
fortalecimento dos comunistas?”
Há ainda uma
variável político-institucional (não partidária) que é avançada por um
responsável do PSD e que passa pelo que fará Marcelo Rebelo de Sousa quando
tiver de dar posse a um novo Governo: “Como é que o Presidente da República
entenderá a situação e o que decidirá quando se puser a questão de escolher
novamente? O que fará se houver um desentendimento à esquerda?”
Sucessores à
espera
Agora eleito, o
novo presidente do PSD parte para o seu mandato com a espada do sucessor
anunciada. Esta semana mesmo, o antigo dirigente do PSD, Miguel Relvas,
defendia em entrevista ao PÚBLICO e à Rádio Renascença: “Vamos ter um líder
para dois anos; se ganhar as eleições continua, se não ganhar, será posto em
causa.”
Relvas fez
questão de apontar nomes de putativos candidatos a líder num congresso
pós-legislativas. Entre eles, está o nome de Luís Montenegro, que agora
rejeitou ser candidato. Uma recusa que, segundo um dirigente do consulado de
Passos Coelho, não se deveu a qualquer tacticismo mas apenas ao facto de que
“Montenegro era líder parlamentar, era a segunda cara oficial do PSD de Passos;
se fosse ele o líder seguinte, seria a continuidade do passismo sem Passos”.
Em todas as
personalidades ouvidas pelo P2, é unânime a ideia de que a seguir a uma derrota
nas legislativas vão surgir outras vozes para provocar erosão e pedir contas.
Se bem que haja quem lembre que “é sempre o líder que domina o aparelho, elege
distritais, elegerá a bancada em 2019”. Assim, há dirigentes que estão à
espera, mas que podem ver os planos estragados.
Voltando à
história, José Arantes insiste: “Cavaco estragou os planos a muita gente, há
dinâmicas próprias, esse é o fascínio da política, ela surpreende sempre.”
A excepção
Barroso
É a história do
PSD que prova que o facto de haver quem desafie em congresso um líder que perde
eleições não significa que este caia. O exemplo é Durão Barroso. Em Outubro de
1999, o primeiro-ministro e líder do PS, António Guterres, ganhou e até subiu
de 112 para 115 o número de deputados, mas viu a maioria absoluta morrer na
praia por um mandato à Assembleia da República. Em Fevereiro de 2000, o PSD
reuniu-se em congresso em Viseu e Barroso obteve mais de 50% dos votos dos
delegados, contra as candidaturas de Santana Lopes e de Marques Mendes. Um
congresso difícil e duro em que o líder do PSD chegou a chamar a Santana “um
misto de Zandinga e Gabriel Alves”.
É certo que as
circunstâncias foram diferentes das de hoje, como sublinha Marques Mendes. “O
PSD vivia uma situação traumática, Barroso tomou conta do partido muito em cima
de eleições e por um estado de necessidade”. Recorde-se que Barroso agarra o
partido em 1999, após o abandono do então líder Marcelo Rebelo de Sousa, eleito
em 1996, em substituição de Fernando Nogueira, que, um ano antes, recebera o
partido de Cavaco e saíra derrotado das legislativas. Foi, aliás, na sucessão
de Cavaco e ao perder o Congresso do Coliseu de Lisboa, em 1995, que Barroso
ganhou o estatuto de putativo líder do PSD, herdando, desde logo, a liderança
do grupo que se formara em torno de Dias Loureiro dentro do cavaquismo. O
terceiro candidato de então, Pedro Santana Lopes, desistiu da corrida já no
Coliseu.
Marcelo decidira
demitir-se quando foi sabido que o líder do CDS, Paulo Portas, podia estar
envolvido na investigação judicial à Universidade Moderna. Isto num momento em
que Marcelo tinha imposto uma nova AD à direcção do PSD e a figuras como a sua
vice-presidente Leonor Beleza, que estava de relações cortadas e nem sequer
falava a Portas, quando por ele passava no Parlamento, devido às notícias sobre
si no jornal O Independente, quando ela era ministra da Saúde de Cavaco e ele
director daquele semanário.
Barroso eleito em
Abril, no congresso de Coimbra, tem de fazer aprovar à pressa as listas de
candidatos do PSD ao Parlamento Europeu, cujas eleições foram em Maio, e de
seguida aguentar a campanha para as legislativas de Outubro. Surge assim como
“a salvação na crise e não como agora, quando falta mais de ano e meio até às
legislativas de 2019”, sublinha um dirigente do PSD. “Com Durão Barroso, as
pessoas perceberam que ele não tinha condições de ganhar em 1999”, frisa o seu
antigo assessor José Arantes.
Está na memória
de quem viveu esses anos a forma como a comunicação social espelhava a opinião
pública sobre o então presidente do PSD. O director do PÚBLICO naquela época,
José Manuel Fernandes, escreveu que ele nunca seria primeiro-ministro. Luís
Delgado afirmou: venha o próximo. Isto apesar de, à época, “a comunicação
social dar mais espaço à política pura” e, “tal como as elites, não se
alimentar do generalismo e da voragem”, o que fazia com que “o desgaste e a
pressão não fosse tão grande”, defende Barreiras Duarte, que integrou o núcleo
duro da direcção Barroso desde o início, ao lado José Luís Arnaut, José Matos
Correia, Miguel Relvas e de Nuno Morais Sarmento, conhecidos então como “os
cinco mosqueteiros”.
Marcar terreno
O sucesso de
Barroso assentou em vários factores, explica Barreiras Duarte. Para isso,
contou a sua personalidade, garante. “É teimoso, determinado, resistente, mas
não é uma cabeça fechada e sempre gostou de estar rodeado de pessoas diferentes
e diversas, do partido e de fora, criou uma rede de contactos e apoios na
sociedade, nas universidades, calcorreou o país”, explica Barreiras Duarte,
acrescentando que Barroso “beneficiou dentro do PSD de uma renovação de
estruturas distritais”, que trouxe para a primeira fila do partido “uma nova
geração”.
Além disso,
Barroso “foi um moderado”, tal como “Guterres também o era”, teve uma “atitude
serena” e “humilde”, assim como “não foi nunca radical nas propostas”, garante
Barreiras Duarte. Teve “capacidade de ir tapando os espaços de diálogo com a
sociedade” e de marcar o seu território. Exemplo disso é, num momento em que “o
poder era todo dos socialistas”, a sua aposta na candidatura a Presidente da
República de Joaquim Ferreira do Amaral, que “foi muito útil ao PSD embora
enterrasse a sua carreira política”, lembra este antigo “mosqueteiro” de
Barroso. As presidenciais serviram para “marcar a posição do PSD, fazer um
aggiornamento interno e obrigar as pessoas a estarem junto do líder”, conclui.
Paralelo ao
momento actual é o facto de que então António Guterres “tinha uma situação
económica fantástica”, lembra um antigo dirigente do partido. Com o
apadrinhamento de Bruxelas, vivia-se a preparação do país para aderir ao euro,
um factor de comunhão de objectivos europeus entre Guterres e Barroso. O
momento era de sucesso económico da governação, o Governo minoritário
socialista tinha feito crescer o PIB de 89.037 milhões de euros em 1995 para
119.639 milhões em 1999. O défice baixara nesses anos de -4.2% para -1,7%. A
percentagem da dívida em relação ao PIB desceu de 58,3% para 51%. E o
crescimento económico aumentou de 2,31% em 1995 para 3,89% em 1999. É já quase
no fim do segundo Governo de Guterres que se ouviu falar em crise, quando, no
Verão de 2001 e a propósito da preparação do Orçamento do Estado para 2002, o
então ministro das Finanças e da Economia, Joaquim Pina Moura, apresentou um
documento com 50 medidas para reduzir a despesa pública.
A “verdade” de
Manuela
Todavia, por
vezes, os dados da economia não influenciam de forma determinante as escolhas
dos eleitores. Que o diga a ex-líder do PSD entre 2008 e 2010, Manuela Ferreira
Leite. Nas legislativas de 2009, que disputou com o então primeiro-ministro,
José Sócrates, sob o lema “Falar Verdade”, a líder do PSD bem alertou para as
consequências da crise internacional para Portugal que se desenhavam já no
horizonte, numa dura campanha em que José Sócrates prometia a construção do
TGV, depois de ter descongelado as carreiras e aumentado os salários da função
pública, bem como baixado em 1% o IRS.
Os dados
económicos do fim de 2009 acabaram por provar o descalabro financeiro do
Estado. O PIB baixou de 178.872 milhões de euros em 2008 para 175.448 milhões
em 2009, o défice subiu de -2,9% para -8%, a percentagem do peso da dívida
externa de 71,7% para 83,6% e o crescimento económico que em 2008 fora já
anémico, com apenas 0,20% do PIB, em 2009 foi negativo com -2,98%.
A realidade é que
o eleitorado não acreditou na “verdade” de Manuela Ferreira Leite. Ou melhor, a
presidente do PSD não teve capacidade para fazer passar a sua mensagem e o seu
projecto. O que mostra que nos comportamentos e escolhas eleitorais e no
estabelecer de relações de liderança e de empatia com o país há factores
diversos e complexos que podem influenciar uma vitória eleitoral e a
transitoriedade de um líder partidário.
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