PJ
encontrou oito milhões de euros em dinheiro em casa ligada a José
Veiga
MARIANA OLIVEIRA
03/02/2016 - PÚBLICO
Ex-agente
de futebolistas e Paulo Santana Lopes, irmão do
ex-primeiro-ministro, estão entre os detidos no âmbito de uma
investigação internacional a alegados crimes de corrupção e
outros ilícitos económicos.
Oito milhões de
euros em dinheiro vivo. Foi este o montante que a Polícia Judiciária
encontrou nesta quarta-feira num cofre de uma casa que seria usada
pelo empresário José Veiga. A habitação está em nome de uma
off-shore que terá ligações ao empresário, que não possui bens
de valor em seu nome em Portugal. Além do dinheiro, a operação
Rota do Atlântico, apreendeu avultadas quantias, ainda não
contabilizadas, em contas bancárias, imóveis e carros de luxo,
quase todos em nome de off-shores.
A investigação,
iniciada em 2014 na sequência de informações de polícias
estrangeiras sobre vários crimes económicos, foca-se nos milhões
de euros que os empresários José Veiga e Paulo Santana Lopes, irmão
do ex-primeiro-ministro, terão angariado em luvas pagas por empresas
que queriam investir no Congo, uma antiga colónia francesa, onde
vivem ambos. O dinheiro seria depois dividido com governantes locais.
Recorde-se que Pedro
Mosqueira do Amaral, antigo administrador do Banco Espírito Santo e
de empresas do grupo detido por aquela família, afirmou numa reunião
do Conselho Superior do grupo, cujas gravações foram divulgadas
pelo semanário Sol, que Veiga geria os investimentos do Presidente
da República do Congo, Denis Sassou Nguesso.
Numa discussão em
Janeiro 2014 sobre potenciais investidores no GES, entretanto falido,
Mosqueira do Amaral informava os outros conselheiros de que José
Veiga se queria reunir consigo porque tinha 300 milhões do Congo
disponíveis para investir em Portugal. Antes o presidente do
BES/GES, Ricardo Salgado, descreve Veiga: “Esteve muito na berra,
por más razões. Ganhou muito dinheiro, é muito esperto, mas foi
perseguido judicialmente por causa de off-shores da bola e do João
Pinto, ficou com o nome manchado. Trabalha muito com os seus amigos
da Guiné”.
A proximidade entre
membros do Governo congolês e José Veiga e Paulo Santana Lopes foi
testemunhada pelos investigadores da Unidade Nacional de Combate à
Corrupção da PJ, numa recente visita que o filho do Presidente do
Congo fez a Portugal acompanhado por vários elementos do Governo. O
actual chefe de Estado liderou o país entre 1979 e 1992, tendo
regressado ao poder em 1997, igualmente como Presidente da República,
cargo em que se mantém hoje. A investigação, que conta com a
cooperação das autoridades de países europeus e africanos (que não
o Congo) já obrigou responsáveis da PJ a viajar várias vezes para
o estrangeiro.
Segundo duas notas
emitidas esta quarta-feira pela PJ e pela Procuradoria-Geral da
República (PGR), nesta investigação estão em causa suspeitas de
corrupção no comércio internacional, branqueamento de capitais,
tráfico de influências, participação económica em negócio e
fraude fiscal. Ao todo, PJ realizou 35 buscas nas zonas de Lisboa,
Braga e Fátima, que envolveram cerca de 120 elementos daquela
polícia e dez magistrados do Ministério Público (MP). No âmbito
destas diligências foram detidos os dois empresários portugueses e
uma advogada, tendo sido constituídos arguidos mais de uma dezena de
pessoas e empresas.
Venda do Banco
Internacional de Cabo Verde
Um dos alegados
crimes de tráfico de influência está relacionado com a venda do
Banco Internacional de Cabo Verde, um activo do Novo Banco avaliado
em 14 milhões de euros, que está em processo de venda. No
comunicado, a PGR refere “suspeitas da prática dos crimes de
tráfico de influência e de participação económica em negócio na
compra e venda de acções de uma instituição financeira
estrangeira, acções essas detidas por instituição de crédito
nacional”, sem relevar o nome das entidades envolvidas.
“Investiga-se igualmente a origem de fundos movimentados noutros
negócios em que são intervenientes os suspeitos, nomeadamente, a
celebração de contratos de fornecimento de bens e serviços, obras
públicas e venda de produtos petrolíferos”, acrescenta a PGR,
salientando que a investigação tem “ligações com os continentes
europeu, africano e americano”.
Os proventos destas
actividades eram, diz a PJ, utilizados na aquisição de imóveis,
veículos de gama alta e sociedades, “utilizando para o efeito
pessoas com conhecimentos especiais e colocadas em lugares
privilegiados, ocultando a origem do dinheiro e integrando-o na
actividade económica lícita.”
Sem revelar
identidades, a nota da PJ indica apenas que o inquérito-crime
dirigido pelo Departamento Central de Investigação e Acção Penal
(DCIAP) resultou na detenção de três pessoas, com idades entre os
53 e os 57 anos. Os dois empresários e a advogada estão detidos no
estabelecimento prisional anexo à PJ e deverão ser ouvidos hoje ou
amanhã por um juiz do Tribunal Central de Instrução Criminal. A
demora dos interrogatórios está associada ao facto de ter sido
apreendida uma enorme quantidade de documentos, tanto em papel como
em suporte digital, que terão de ser analisados.
José Veiga, de 53
anos, é sobretudo conhecido pelas suas ligações ao futebol. Pintor
de automóveis no Luxemburgo, fundou a Casa do FC Porto naquele país,
o que acabou por lhe abrir portas no mundo do futebol. Trabalhou com
Joaquim Oliveira, fundou a sua própria empresa de representação de
jogadores (Superfute) e intermediou as transferências de jogadores
como Paulo Sousa, Sérgio Conceição e Luís Figo. A empresa faliu
em 2008. Na última lista revelada pela Autoridade Tributária, a 2
de Fevereiro, Veiga consta como um dos principais devedores ao fisco,
com uma dívida entre 250 mil e um milhão de euros.
O empresário foi
acusado no processo da transferência de João Pinto do Benfica para
o Sporting em 2000, que lhe valeu uma condenação por fraude fiscal
e branqueamento de capitais, anulada pela Relação.
Já Paulo Santana
Lopes, também empresário, foi gestor de uma sociedade imobiliária
ligada ao BPN e tem participações em várias empresas dos sectores
da mediação imobiliária, organização de eventos, muitas sem
actividade. com Tiago Luz Pedro e Hugo Daniel Sousa
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