"Social-democracia
sempre?"
“A
génese do PSD fez dele uma espécie de albergue espanhol onde foram
convivendo alegremente salazaristas e anti-salazaristas,
sociais-democratas e liberais, personalistas com republicanos
históricos e correntes cristãs. Daí, não ser de estranhar que o
PSD tenha sido um pouco de tudo e o seu contrário: conformista,
irrequieto, conservador, reformista, liberal, estatizante, enfim, o
partido mais difícil de rotular do espectro político português.”
EDITORIAL / PÚBLICO
O
momento Trump de Passos Coelho
DIRECÇÃO EDITORIAL
01/02/2016 - PÚBLICO
O
líder do PSD já só pensa na reeleição. E mostra que não
tenciona dar o mínimo espaço ao Governo.
No mesmo dia em que
o Governo aprova a proposta de Orçamento do Estado em Conselho de
Ministros, Passos Coelho apresenta a sua recandidatura à liderança
do PSD. Como não há coincidências em política, é óbvio que nada
disto é por acaso.
Numa altura em que
os holofotes estão centrados no instrumento político mais
importante e definidor das opções do executivo, Passos cria um
evento paralelo e rouba uma parcela do protagonismo aos responsáveis
do documento. É o momento Trump do ex-primeiro-ministro. Não sendo
actor de primeira linha nessa ocasião particular, cria um evento
paralelo para chamar a atenção sobre si próprio, como ainda fez a
semana passada o candidato à nomeação republicana, quando resolveu
boicotar o último debate entre os concorrentes do partido antes da
votação no Iowa. Não participou, mas resolveu organizar, à mesma
hora, um encontro com veteranos que logrou ampla cobertura mediática.
Isto só prova que,
passada a fase inicial de paralisia e indignação face à solução
governativa saída das legislativas, Passos recompôs as tropas e já
dispõe hoje de uma equipa de spin atenta e oportuna. Mas nesta sua
quarta caminhada em direcção à presidência do PSD, Passos Coelho
tem pela frente dois problemas essenciais. O primeiro tem que ver com
a mensagem. Não basta apresentar-se sob o lema "Social-democracia
sempre!" para fazer descolar o PSD do buraco negro onde a sua
liderança o colocou nestes anos de troika: completamente encostado à
direita, quase sempre com um discurso mais radical do que o do CDS. O
PSD nunca foi um partido ideológico. A não ser Francisco Sá
Carneiro, o único com visão e projecto, nenhum outro líder se
preocupou com essas minudências.
A génese do PSD fez
dele uma espécie de albergue espanhol onde foram convivendo
alegremente salazaristas e anti-salazaristas, sociais-democratas e
liberais, personalistas com republicanos históricos e correntes
cristãs. Daí, não ser de estranhar que o PSD tenha sido um pouco
de tudo e o seu contrário: conformista, irrequieto, conservador,
reformista, liberal, estatizante, enfim, o partido mais difícil de
rotular do espectro político português. Sá Carneiro tentou a sua
entrada na Internacional Socialista e durante anos o PSD preferiu o
pequeno grupo dos liberais em vez do poderoso PPE, que acolhia
democratas-cristãos e conservadores populistas, apenas porque, na
altura, este grupo era considerado mais à direita. O PSD nunca
gostou de ter o rótulo de direita e grande parte do seu eleitorado
também não. Aparentemente, Passos Coelho também acha agora que sem
o centro e a moderação nunca voltará ao poder. É um desafio. O
outro é ele próprio. Será ele, o rosto das políticas de
austeridade, o líder mais credível para recentrar o partido e,
sobretudo, para o conduzir à vitória? Mais, e o PSD acredita mesmo
nisso? A resposta virá em breve, ou sob a forma de uma candidatura
alternativa, ou sob o manto diáfano da unanimidade.
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