Vitória de Hidalgo em Paris foi
consolação para noite negra para o PS
CLARA BARATA
30/03/2014 - 23:11
Eleições municipais deram vitória à direita francesa, com uma mensagem de
castigo para François Hollande e recompensas para Marine Le Pen. Saberá o
Presidente responder à altura?
Uma “vaga azul”
cobriu os municípios franceses, congratulou-se Jean-François Copé: “O primeiro
partido de França é a UMP”, afirmou o líder do grande partido do
centro-direita, comentando os resultados da segunda volta das eleições
municipais em França, que castigaram a governação socialista e entregaram mais
155 cidades com mais de 9000 habitantes ao maior partido do centro-direita. Prémio
de consolação para o PS: a vitória de Anne Hidalgo em Paris.
Quanto a Marine
Le Pen, a líder Frente Nacional, essa tem outras conquistas que a tornaram a
outra estrela da noite: nunca o seu partido de extrema-direita teve um
resultado tão bom em eleições locais. Conquistou dez câmaras, no Sul, Leste e
no Norte do país, e a presidência do 7º sector em Marselha, uma subdivisão
administrativa com 150 mil habitantes. Nas contas finais, a FN ficou até com
mais um vereador que o PS.
Marselha era até
uma cidade que os socialistas esperavam conquistar, antes de os franceses terem
começado a votar. Mas o candidato da Frente Nacional (FN), Séphane Ravier, terá
ajudado à derrota do candidato do PS, Patrick Menucci. O resultado foi que o
presidente da câmara da UMP, Jean-Claude Gaudin, não só foi reeleito como tem
uma enorme maioria absoluta.
O factor FN quase
foi a história principal destas eleições. A aposta de Marine Le Pen em construir,
tijolo a tijolo, a presença do partido de extrema-direita a nível municipal foi
bem-sucedida, com a conquista de pelo menos nove câmaras em cidades de pequenas
ou médias dimensões, sobretudo no sul e no leste do país. As apostas em cidades
maiores, como Avignon e Perpignan, incomodaram mas acabaram por não vingar.
Curiosamente, das
principais figuras do partido, apenas o seu secretário-geral, Steeve Briois,
foi bem-sucedido, e logo à primeira volta, em Hénin-Beaumont. Os vencedores da
noite foram figuras secundárias, que beneficiaram de dinâmicas próprias dos
locais onde se candidataram – como anteriores gestões autárquicas corruptas ou
ineficazes. Os dois vice-presidentes Florian Philippot e Louis Aliot não
conseguiram a eleição em Forbach e Perpignan, respectivamente. Gilbert Collard,
deputado pela FN que era vencedor em Saint-Gilles, viu escapar-lhe a vitória
Morte ao pacto
Jean François
Copé tem motivos para se regozijar. Várias grandes cidades com mais de 30 mil
habitantes passarem da esquerda para a direita. Entre elas, Toulouse (a quarta
maior) ou Limoges, que desde 1912 era gerida pelos socialistas.
O prémio de
consolação para o PS foi Paris, onde a socialista Anne Hidalgo ganhou. Pela
primeira vez, a capital terá uma mulher como presidente da câmara.
Mas a principal
mensagem destas eleições é que são um castigo para o PS por causa da desilusão
provocada por François Hollande. Sintomaticamente, em Quimper, o candidato do
PS, Bernard Poignant, um conselheiro do Presidente, foi derrotado.
Mas a abstenção
atingiu 38%, um nível recorde para umas eleições municipais. Em termos
nacionais, a direita obteve 45,91%, a esquerda 40,57% e a extrema-direita
6,87%.
O
primeiro-ministro, Jean-Marc Ayrault – que se diz com uma insistência cada vez
maior que deverá ser substituído numa remodelação governamental que não tardará
–, reconheceu a “responsabilidade colectiva” do Governo e “toda a sua
quota-parte de culpa”, assumindo que não terão sido capazes de explicar com
toda a “clareza necessária” porque é que a recuperação da economia do país
exigiria tantos sacrifícios.
Ségolène Royal,
que sonha ser ministra, reclama uma baixa dos impostos. Algo de semelhante pede
a ala esquerda do PS, que exige o abandono do “Pacto de Responsabilidade”, que Hollande anunciou com toda a pomba no
início do ano, e prevê um alívio nos impostos cobrados às empresas e aos trabalhadores
independentes no valor de 30 mil milhões de euros, e economias de 50 mil
milhões de euros na despesa pública até 2017.
CLARA BARATA
30/03/2014 - PÚBLICO
Eleições municipais deram vitória à direita francesa, com uma mensagem de
castigo para François Hollande e recompensas para Marine Le Pen. Saberá o
Presidente responder à altura?
Uma “vaga azul”
cobriu os municípios franceses, congratulou-se Jean-François Copé: “O primeiro
partido de França é a UMP”, afirmou o líder do grande partido do
centro-direita, comentando os resultados da segunda volta das eleições
municipais em França, que castigaram a governação socialista e entregaram mais
155 cidades com mais de 9000 habitantes ao maior partido do centro-direita. Prémio
de consolação para o PS: a vitória de Anne Hidalgo em Paris.
Quanto a Marine
Le Pen, a líder Frente Nacional, essa tem outras conquistas que a tornaram a
outra estrela da noite: nunca o seu partido de extrema-direita teve um
resultado tão bom em eleições locais. Conquistou dez câmaras, no Sul, Leste e
no Norte do país, e a presidência do 7º sector em Marselha, uma subdivisão
administrativa com 150 mil habitantes. Nas contas finais, a FN ficou até com
mais um vereador que o PS.
Marselha era até
uma cidade que os socialistas esperavam conquistar, antes de os franceses terem
começado a votar. Mas o candidato da Frente Nacional (FN), Séphane Ravier, terá
ajudado à derrota do candidato do PS, Patrick Menucci. O resultado foi que o
presidente da câmara da UMP, Jean-Claude Gaudin, não só foi reeleito como tem
uma enorme maioria absoluta.
O factor FN quase
foi a história principal destas eleições. A aposta de Marine Le Pen em construir,
tijolo a tijolo, a presença do partido de extrema-direita a nível municipal foi
bem-sucedida, com a conquista de pelo menos nove câmaras em cidades de pequenas
ou médias dimensões, sobretudo no sul e no leste do país. As apostas em cidades
maiores, como Avignon e Perpignan, incomodaram mas acabaram por não vingar.
Curiosamente, das
principais figuras do partido, apenas o seu secretário-geral, Steeve Briois,
foi bem-sucedido, e logo à primeira volta, em Hénin-Beaumont. Os vencedores da
noite foram figuras secundárias, que beneficiaram de dinâmicas próprias dos
locais onde se candidataram – como anteriores gestões autárquicas corruptas ou
ineficazes. Os dois vice-presidentes Florian Philippot e Louis Aliot não
conseguiram a eleição em Forbach e Perpignan, respectivamente. Gilbert Collard,
deputado pela FN que era vencedor em Saint-Gilles, viu escapar-lhe a vitória
Morte ao pacto
Jean François
Copé tem motivos para se regozijar. Várias grandes cidades com mais de 30 mil
habitantes passarem da esquerda para a direita. Entre elas, Toulouse (a quarta
maior) ou Limoges, que desde 1912 era gerida pelos socialistas.
O prémio de
consolação para o PS foi Paris, onde a socialista Anne Hidalgo ganhou. Pela
primeira vez, a capital terá uma mulher como presidente da câmara.
Mas a principal
mensagem destas eleições é que são um castigo para o PS por causa da desilusão
provocada por François Hollande. Sintomaticamente, em Quimper, o candidato do
PS, Bernard Poignant, um conselheiro do Presidente, foi derrotado.
Mas a abstenção
atingiu 38%, um nível recorde para umas eleições municipais. Em termos
nacionais, a direita obteve 45,91%, a esquerda 40,57% e a extrema-direita
6,87%.
O
primeiro-ministro, Jean-Marc Ayrault – que se diz com uma insistência cada vez
maior que deverá ser substituído numa remodelação governamental que não tardará
–, reconheceu a “responsabilidade colectiva” do Governo e “toda a sua
quota-parte de culpa”, assumindo que não terão sido capazes de explicar com
toda a “clareza necessária” porque é que a recuperação da economia do país
exigiria tantos sacrifícios.
Ségolène Royal,
que sonha ser ministra, reclama uma baixa dos impostos. Algo de semelhante pede
a ala esquerda do PS, que exige o abandono do “Pacto de Responsabilidade”, que Hollande anunciou com toda a pomba no
início do ano, e prevê um alívio nos impostos cobrados às empresas e aos trabalhadores
independentes no valor de 30 mil milhões de euros, e economias de 50 mil
milhões de euros na despesa pública até 2017.
Hollande tenta acordar após
bofetada eleitoral de Marine Le Pen
CLARA BARATA
30/03/2014 – PÚBLICO
Na segunda volta
das eleições municipais, a esquerda deve perder uma centena de municípios. O
Governo socialista aguarda a remodelação decidida pelo Presidente, sem mudança
de estratégia.
Khalid, filho de
mineiros, vive em Hombourg-Haut, uma velha cidade medieval no Leste de França,
junto à fronteira com a Alemanha, no departamento de Moselle. É uma das zonas
onde a direita – e a extrema-direita – ganhou terreno nas eleições municipais,
que hoje terão a segunda volta. “Quando François Hollande foi eleito, fiquei
feliz. Votei nele por convicção. Estou decepcionado, o PS e a UMP [o maior
partido do centro-direita] são parecidos. Não aderi, mas compreendo que se vote
na Frente Nacional”, diz.
No seu município,
que fica na antiga bacia mineira do carvão – o último poço que era explorado
encerrou em 2004, relata o jornal Le Monde – a vida parece ter parado. Ali
vivem 7400 pessoas, mas em dez anos desapareceram para outras paragens entre
4000 e 5000 habitantes. Resta um café aberto, e um único supermercado. No
centro desta antiga cidade medieval fortificada, edificada no século XIII pelos
bispos de Metz, que fica a apenas 50
km, só se vêem pessoas idosas, relata o diário francês. A
taxa de desemprego entre os jovens com menos de 26 anos ronda os 50%.
“Os idosos vêem
os jovens por aí a rondar, e sentem-se inseguros. Marine Le Pen [a líder da
Frente Nacional] cavalga a onda da incompetência dos outros e da crise
económica”, afirma Khalid.
O que ele diz é
certificado pelos analistas e politólogos que descascaram o sucesso eleitoral
na primeira volta do partido de Marine Le Pen: os candidatos apoiados pela
Frente Nacional (FN) ficaram à frente em 17 municípios e passaram à segunda
volta em 229 comunas com mais de 10.000 habitantes, com hipóteses de conseguir
obter uma mão-cheia de presidências de câmara, para além de Hénin-Beaumont, que
ganharam logo à primeira volta.
“A maior parte
dos municípios onde os candidatos da FN se implantaram eram mal muito mal
geridos. Isso atenuou o receio da FN”, disse em entrevista ao Le Monde Sylvain
Crépon, investigador da Universidade de Nanterre e membro do Observatório das
Radicalidades Políticas da Fundação Jean-Jaurès, especialista em Frente
Nacional.
Se o Partido
Socialista tinha montado desde o Verão uma campanha para combater a FN no plano
dos valores, com o primeiro-secretário Harlem Désir a lançar um “combate
cultural e político” contra as ideias frentistas – como a recusa da imigração e
do Islão, ou da União Europeia – a estratégia da FN para as eleições municipais
foi a de manter a ideologia em perfil baixo. “Fizeram campanha sobre as vias
públicas, o comércio, o emprego local, para não atemorizar. O que foi pedido
aos candidatos foi que dessem a aparência de serem gestores, com um programa
local”, explicou Sylvain Crépon.
Volte e
explique-se
O Presidente,
François Hollande, em 2012 passou por Hombourg-Haut e fez um discurso
mobilizador em cima de um camião de caixa aberta, destinado a conquistar os
corações do eleitorado de uma zona que já então se virava para o canto da
sereia Le Pen. “Não teremos necessidade de rejeitar os que não fizeram a mesma
escolha que nós. Vamos precisar dessa reconciliação,
dessa mudança, dessa união”, afirmou.
Rachid estava lá.
“Era uma sexta-feira, e francamente, acreditei. Era preciso mandar o Sarkozy
embora, que nos via como se fôssemos lixo. Mas Hollande enganou-nos com um
discurso de veludo. Tenho 36 anos, já não tenho direito às ajudas reservadas
aos mais novos e agora tenho menos trabalho por causa da fiscalização das horas
extraordinárias. Talvez a crise se tenha agravado, mas parece-me que Sarkozy a
geria melhor”, afirmou ao Le Monde.
Khalid também
ouvi o discurso de Hollande nesse dia, e enviou um email para o Palácio
presidencial, em Paris, em representação de vários outros habitantes do
município em 2013, convidando o Presidente a voltar a Hombourg-Haut para se explicar – porque é que a política
que seguia era tão diferente do discurso mobilizador que tinha feito ali? “O
que nos tinha dito, era só para ganhar o tacho?”, interroga-se, mostrando ao
repórter do diário francês a resposta, recusando o convite.
François Hollande
fez saber que o Governo deve “ouvir os
franceses e tirar as lições” devidas aos resultados destas eleições. Após a”
bofetada” dada pelos eleitores, o Governo “deve trabalhar com mais força, mais
coerência e justiça social para a recuperação do país”, disse o Presidente,
através da porta-voz do Executivo, a ministra Najat Vallaud-Belkacem.
Mas o que tem o
Presidente para oferecer de novo? Na verdade, pelo que se viu até agora, nada.
A maior mudança será a remodelação governamental – que já estava a ser planeada
antes das eleições, quando ninguém no PS francês antecipava um resultado tão
penalizador nas eleições. É provável que saia o próprio primeiro-ministro,
Jean-Marc Ayrault, e muito se especula que seja substituído pelo actual
ministro da Administração Interna, Manuel Valls – o governante mais popular.
Valls tem muitos
apoiantes – embora não entre os verdes e a Europa Ecologia, parceiros de
coligação no Governo. Como “primeiro polícia de França”, com uma polícia
agressiva de deportações de ciganos da Europa de Leste, gera algumas
resistências nos sectores mais à esquerda. Mas é também um potencial rival para
Hollande – é um socialista com perfil de candidato à Presidência da República.
Quem substituir
Ayrault terá de pilotar o que é o plano-mestre do Governo para os próximos
anos: o “pacto de responsabilidade”, a estabelecer entre o Estado e as empresas
francesas, que prevê um alívio nos impostos cobrados às empresas e aos
trabalhadores independentes no valor de 30 mil milhões de euros, e economias de
50 mil milhões de euros na despesa pública até 2017.
Este pacto
avançará sempre, embora estejam a ser preparados alguns cortes nos impostos
para as famílias de menores rendimentos, a apresentar no fim de Abril, que
podem representar 2000 a
3000 milhões de euros.