CONSERVAÇÃO DA
NATUREZA
União Europeia: proposta da Lei de Restauro da Natureza
“está viva”
Tentativa do Partido Popular Europeu de pôr na gaveta a
proposta de lei que quer restaurar habitats marinhos e terrestres na Europa foi
rejeitada na Comissão de Ambiente do Parlamento Europeu.
Nicolau Ferreira
15 de Junho de
2023, 14:47
Foi por um triz,
mas a proposta da Comissão Europeia da Lei de Restauro da Natureza ainda está
viva. A votação que ocorreu na manhã desta quinta-feira em Estrasburgo, na
França, na Comissão de Ambiente, Saúde Pública e Segurança Alimentar do
Parlamento Europeu não deu luz verde à proposta do Partido Popular Europeu
(PPE), que quer rejeitar uma lei em que um dos principais objectivos é
restaurar 20% das áreas de terra e de mar da União Europeia até 2030.
No entanto, o
resultado foi renhido: 44 dos 88 eurodeputados da comissão votaram a favor da
proposta do PPE e outros 44 votaram contra. Ou seja, houve um empate técnico
que, de acordo com as normas, significa que a proposta é rejeitada, permitindo
que a Lei de Restauro da Natureza se mantenha de pé. Se 45 eurodeputados
tivessem votado a favor da proposta do PPE, então a Lei de Restauro da Natureza
não avançaria e uma das peças-chave do Pacto Verde europeu cairia por terra.
“A Lei de
Restauro da Natureza está viva e recomenda-se”, afirma ao PÚBLICO Sara Cerdas,
eurodeputada portuguesa do Partido Socialista que faz parte da Comissão de
Ambiente e votou contra a proposta do PPE, liderada por Manfred Weber,
eurodeputado alemão e presidente do grupo parlamentar europeu do PPE, que tem
sido muito criticado pela sua posição. “É uma primeira derrota do PPE. A
rejeição [à Lei de Restauro da Natureza] foi rejeitada. Mas os votos estão
muito renhidos.”
Nas várias horas
seguintes, os eurodeputados votaram uma série de emendas da Lei de Restauro da
Natureza, muitas foram rejeitadas com o mesmo equilíbrio de 44 eurodeputados a
favor e 44 contra. E a sessão foi insuficiente para terminar a votação das
emendas e do relatório da lei como um todo. Por isso, haverá novo encontro da
comissão a 27 de Junho.
“A posição
aprovada em Comissão de Ambiente [a 27 de Junho] irá a plenário em Julho”,
explica ainda a eurodeputada. “Aí Manfred Weber já não pode escolher os
deputados que votam contra, já que todos [os 705] eurodeputados têm de votar”,
alega Sara Cerdas, referindo-se a eurodeputados da bancada do PPE que foram
substituídos na Comissão de Ambiente por discordarem do boicote que Manfred
Weber está a fazer à lei de restauro, como é caso de Stanislav Polčák, da
República Checa.
“Não considero
que a rejeição geral proposta pelo PPE seja uma boa decisão, mas decidi
respeitá-la, e como a minha posição se tornou tão fundamentalmente contra o meu
grupo, pedi para ser substituído na votação da comissão de quinta-feira”, lê-se
no Twitter do eurodeputado.
O resultado final ainda é um enigma
A proposta da lei
ainda terá que ser aprovada no Parlamento Europeu e no Conselho Europeu. Só
depois, juntamente com a Comissão Europeia, é que será iniciado o trílogo entre
as três entidades legisladoras da União Europeia. Se for aprovada, o resultado
final da lei ainda é um enigma.
“Não estamos
completamente felizes, porque as coisas ainda estão em aberto e muitas das
emendas aprovadas diminuem a ambição da lei, mas ainda há uma esperança de que
o resultado da Comissão de Ambiente seja positivo”, diz ao PÚBLICO Bianca
Mattos, técnica de políticas da associação ambientalista ANP/WWF.
Depois de um
tempo em produção na Comissão Europeia, a proposta da Lei de Restauro da
Natureza ficou pronta em Junho de 2022. A lei quer responder aos problemas dos
ecossistemas. Ao todo, 80% dos habitats europeus estão num estado de
conservação mau ou pobre e 70% do solo europeu não é saudável.
Entre os
objectivos da proposta, está o restauro de 80% dos habitats europeus, a
reversão do declínio dos insectos polinizadores até 2030, o aumento em 5% dos
espaços verdes urbanos até 2050 e a redução em 50% do uso de pesticidas
químicos até 2030
A proposta é um
“passo-chave para evitar o colapso dos ecossistemas e prevenir os piores
impactos das alterações climáticas e da perda da biodiversidade”, lê-se no
comunicado de imprensa da Comissão Europeia sobre a proposta.
Entre os
objectivos da proposta, está o restauro de 80% dos habitats europeus em más
condições, a reversão do declínio dos insectos polinizadores até 2030, o
aumento em 5% dos espaços verdes urbanos até 2050, a redução em 50% do uso de
pesticidas químicos até 2030, banindo o seu uso em “áreas sensíveis” tais como
as protegidas e as áreas verdes urbanas.
“Enquanto não
houver uma certeza absoluta de que esta lei fique completamente aprovada e
tenha um consenso de todos, eu continuo preocupada”, diz ao PÚBLICO Maria
Amélia Martins-Loução, bióloga, professora catedrática de Ciências da
Universidade de Lisboa e presidente da Sociedade Portuguesa de Ecologia, que
num artigo de opinião recente alertava para um “aviso laranja: risco acentuado
de degradação dos ecossistemas”.
Um euro a render
No entanto, a
proposta não impede a actividade económica, um receio de parte do sector de
agricultura que tem alimentado a rejeição da lei e resultou, nos Países Baixos,
na vitória do partido BoerBurgerBeweging (BBB, ou Movimento de Cidadãos
Agricultores). Os críticos a Manfred Weber dizem que, com esta posição, o líder
do PPE está a tentar angariar votos que, de outro modo, iriam para a extrema-direita.
Na votação desta quinta-feira, o PPE angariou também os votos da
extrema-direita e dos liberais.
“Não vamos
alcançar os nossos objectivos climáticos indo contra as áreas rurais”, defendeu
nesta quarta-feira Manfred Weber, na sua conta de Twitter, que nas últimas
semanas tem alimentado a narrativa de que a Lei de Restauro iria diminuir a
autonomia alimentar da Europa, um receio que tem mais tracção desde o início da
Guerra na Ucrânia. A sua posição vai frontalmente contra à de Ursula von der Leyen,
presidente da Comissão Europeia, que pertence ao mesmo grupo partidário que
Weber.
Mas a lei de
“restauro é sobre a vida e a produção juntas com a natureza, ao trazer de volta
mais biodiversidade para todos os lugares, incluindo áreas onde a actividade
económica ocorre como nas florestas geridas, nas terras agrícolas e nas
cidades”, lê-se no comunicado da Comissão Europeia.
“Estamos à beira
do precipício com o colapso da biodiversidade e a rejeição da lei seria um
salto para o vazio”, disse, por sua vez, Virginijus Sinkevičius, comissário
europeu para o Ambiente, Oceanos e as Pescas numa entrevista ao jornal
britânico The Guardian dada há algumas semanas.
“Não há a
possibilidade de executar o Pacto Verde sem a natureza”, acrescentou. “Podemos
fazer um trabalho excelente em diminuir as emissões de CO2. Podemos atingir as
zero emissões. Mas se os ecossistemas se degradam, se o solo se degrada, se as
nossas florestas se degradam, se os nossos ecossistemas marinhos se degradam,
eles não poderão absorver o carbono e mitigar o calor.”
NATURE
CONSERVATION
European Union: Proposed Nature Restoration Act
'is alive'
The European
People's Party's attempt to put a draft law that wants to restore marine and
terrestrial habitats in Europe in the drawer has been rejected in the European
Parliament's Environment Committee.
Nicholas Smith
15 June
2023, 14:47
It was by a hair's breadth, but the European
Commission's proposal for the Nature Restoration Act is still alive. The vote
that took place on Thursday morning in Strasbourg, France, in the Committee on
the Environment, Public Health and Food Safety of the European Parliament did
not give the green light to the proposal of the European People's Party (EPP),
which wants to reject a law in which one of the main objectives is to restore
20% of the European Union's land and sea areas by 2030.
However, the result was reckless: 44 of the 88
MEPs in the committee voted in favour of the EPP proposal and another 44 voted
against. That is, there was a technical tie that, according to the rules, means
that the proposal is rejected, allowing the Nature Restoration Act to remain
standing. If 45 MEPs had voted in favour of the EPP's proposal, then the Nature
Restoration Act would not move forward and one of the key pieces of the
European Green Deal would fall apart.
"The Nature Restoration Law is alive and well," Sara Cerdas, a Portuguese MEP from the Socialist Party who sits on the Environment Committee and voted against the EPP's proposal, led by Manfred Weber, a German MEP and chairman of the EPP's European parliamentary group, told PÚBLICO, which has been widely criticised for its position. "It's a first defeat for the EPP. The rejection [of the Law of Restoration of Nature] was rejected. But the votes are very close."
The result shows the state of dissent that
reigns in the European Union regarding this law and also how the 2024 European
elections are already influencing the discussions in Strasbourg.
Over the next several hours, MEPs voted on a
series of amendments to the Nature Restoration Act, many of which were rejected
with the same balance of 44 MEPs in favour and 44 against. And the session was
insufficient to finish the vote on the amendments and the report of the law as
a whole. Therefore, there will be another meeting of the commission on June 27.
"The position approved in the Environment
Committee [on 27 June] will go to plenary in July," explains the MEP.
"Then Manfred Weber can no longer choose the MEPs who vote against, since
all [the 705] MEPs have to vote," says Sara Cerdas, referring to MEPs from
the EPP caucus who have been replaced in the Environment Committee for
disagreeing with Manfred Weber's boycott of the restoration law, such as
Stanislav Polčák. of the Czech Republic.
"I do not consider the general rejection
proposed by the EPP to be a good decision, but I have decided to respect it,
and as my position has become so fundamentally against my group, I asked to be
replaced in Thursday's committee vote," the MEP's Twitter account reads.
The end result is still an enigma
The draft
law has yet to be approved in the European Parliament and the European Council.
Only then, together with the European Commission, will the trialogue between
the three legislative bodies of the European Union begin. If passed, the final
outcome of the law is still an enigma.
"We are not completely happy, because
things are still open and many of the amendments approved diminish the ambition
of the law, but there is still a hope that the result of the Environment
Commission will be positive," Bianca Mattos, a policy technician at the
environmental association ANP/WWF, told PÚBLICO.
After a time in production at the European
Commission, the proposed Nature Restoration Act was ready in June 2022. The law
wants to respond to the problems of ecosystems. In all, 80% of European habitats
are in a poor or poor conservation state and 70% of European soil is unhealthy.
Among the objectives of the proposal is the
restoration of 80% of European habitats, the reversal of the decline of
pollinating insects by 2030, the 5% increase in urban green spaces by 2050 and
the 50% reduction in the use of chemical pesticides by 2030
The proposal is a "key step to prevent
the collapse of ecosystems and prevent the worst impacts of climate change and
biodiversity loss," reads the European Commission's press release on the
proposal.
Among the objectives of the proposal is the
restoration of 80% of European habitats in poor condition, the reversal of the
decline of pollinating insects by 2030, the 5% increase in urban green spaces
by 2050, the 50% reduction in the use of chemical pesticides by 2030, banning
their use in "sensitive areas" such as protected and urban green
areas.
"As long as there is no absolute
certainty that this law will be completely approved and have a consensus of
all, I remain worried," Maria Amélia Martins-Loução, a biologist, full
professor of Sciences at the University of Lisbon and president of the
Portuguese Society of Ecology, tells PÚBLICO, who in a recent opinion article
warned of an "orange warning: accentuated risk of degradation of
ecosystems."
A euro to yield
However,
the proposal does not impede economic activity, a fear on the part of the
agriculture sector that has fuelled the rejection of the law and has resulted,
in the Netherlands, in the victory of the BoerBurgerBeweging (BBB) party.
Critics of Manfred Weber say that with this stance, the EPP leader is trying to
garner votes that would otherwise go to the far right. In Thursday's vote, the
EPP also garnered the votes of the far right and the liberals.
"We will not achieve our climate goals by
going against rural areas," Manfred Weber said on Wednesday on his Twitter
account, which in recent weeks has fueled the narrative that the Restoration
Act would diminish Europe's food autonomy, a fear that has gained more traction
since the start of the war in Ukraine. His position runs squarely against that
of Ursula von der Leyen, president of the European Commission, who belongs to
the same party group as Weber.
But the "restoration law is about living
and production together with nature, by bringing back more biodiversity
everywhere, including areas where economic activity takes place such as in
managed forests, farmland and cities," the European Commission statement
reads.
The proposal estimates that one euro invested
in nature restoration will yield between eight and 38 euros. In addition, the
proposal aims to avoid 25% of carbon dioxide emissions from the soil, helping
to comply with the Paris Agreement, and, by promoting the increase of green
zones in cities, will make urban areas more resistant to rising temperatures
due to global warming.
"We are on the precipice with the
collapse of biodiversity and the rejection of the law would be a leap into the
void," Virginijus Sinkevičius, European Commissioner for the Environment,
Oceans and Fisheries, said in an interview with the Guardian a few weeks ago.
"There is no possibility of executing the
Green Deal without nature," he added. "We can do an excellent job of
reducing CO2 emissions. We can reach zero emissions. But if ecosystems degrade,
if soil degrades, if our forests degrade, if our marine ecosystems degrade,
they won't be able to absorb carbon and mitigate heat."
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