AMBIENTE
Lei do Restauro por um fio. Decisão final nas mãos do
plenário do Parlamento Europeu
Comissão de Ambiente do Parlamento Europeu rejeita
proposta negociada nos últimos meses sobre a Lei do Restauro da Natureza.
Votação em plenário será última oportunidade de salvar lei de conservação.
Aline Flor
27 de Junho de
2023, 16:00
A Lei do Restauro
da Natureza prevê a reversão do declínio de insectos polinizadores, aumento de
espaços verdes ou o restauro de habitats em más condições
“Tirem os vossos
casacos, isto vai aquecer.” O tom leve de Pascal Canfin, presidente da comissão
de Ambiente do Parlamento Europeu (PE), não foi suficiente para desanuviar a
tensão na manhã desta terça-feira, na continuação da longa votação do relatório
sobre a Lei do Restauro da Natureza, que tinha sido interrompida há duas
semanas. O resultado: “44-44, rejeitado”, concluiu por fim o eurodeputado
francês, usando a expressão tantas vezes ouvida ao longo da votação de centenas
de emendas.
A Lei do Restauro
fica, assim, encurralada nos labirintos políticos do Parlamento Europeu, entre
a rejeição do Partido Popular Europeu (PPE, onde se insere o PSD e o CDS),
aliado aos grupos de extrema-direita e a parte dos liberais do Renew Europe, e
as famílias dos Socialistas e Democratas (S&D, que inclui o PS), Verdes,
Esquerda (que integra PCP e BE) e a outra parte do Renew, que votaram a favor
da lei, com o apoio de associações ambientalistas e cientistas de todo o mundo.
Não havendo
maioria na votação desta terça-feira, ao invés de propor melhorias, a comissão
do Ambiente vai propor, na sessão plenária, a rejeição da proposta de lei da
Comissão Europeia para conservação da natureza, que tem entre os seus
objectivos restaurar 20% das áreas de terra e de mar da União Europeia até
2030. Haverá uma última oportunidade de submeter novamente as emendas na
votação final, de forma a não desperdiçar o trabalho de negociação dos últimos
meses. Contudo, se o Parlamento Europeu como um todo confirmar a rejeição da
proposta em plenário — a votação deve ser agendada já para o plenário de 10 a
13 de Julho —, a União Europeia ficará sem uma peça-chave na protecção da
biodiversidade.
Entre os
objectivos da proposta está o restauro de 80% dos habitats europeus em más
condições, a reversão do declínio dos insectos polinizadores até 2030, o
aumento em 5% dos espaços verdes urbanos até 2050 e a redução em 50% do uso de
pesticidas químicos até 2030
Em conferência de
imprensa após as votações, o relator da proposta do Parlamento Europeu, o
socialista César Luena, recordou a importância desta “primeira lei de natureza
e biodiversidade em 70 anos de construção europeia” e prometeu não baixar os
braços até à plenária de Julho, onde se espera que seja agendada a votação
final.
“Vamos
acrescentar emendas e vamos negociar tudo com todos”, garantiu o eurodeputado
espanhol, relembrando que no plenário ainda será possível apresentar emendas,
incluindo os compromissos firmados nos últimos meses com os partidos mais à
esquerda.
“Parto” Ecológico Europeu
A Lei do Restauro
da Natureza foi apresentada pela Comissão Europeia em Junho de 2022 como um dos
pilares do Pacto Ecológico Europeu, a cargo do vice-presidente executivo da
CE, Frans Timmermans, traduzindo-se num conjunto de estratégias e leis que têm
tido um longo “parto” desde 2019, quando foi anunciado. A legislação sobre
restauração vem preencher uma lacuna nas provisões sobre a recuperação a
longo-prazo de recursos naturais na UE, permitindo atingir os objectivos
climáticos e da biodiversidade, não apenas da UE, mas os que foram assumidos na
COP15 da Biodiversidade, em Novembro do ano passado.
Entre os
objectivos da proposta está o restauro de 80% dos habitats europeus em más
condições, a reversão do declínio dos insectos polinizadores até 2030, o aumento
em 5% dos espaços verdes urbanos até 2050, a redução em 50% do uso de
pesticidas químicos até 2030, banindo o seu uso em “áreas sensíveis” tais como
as protegidas e as áreas verdes urbanas.
A proposta da
Comissão tem estado em análise tanto pelo Conselho da União Europeia — que
aprovou a sua proposta na semana passada — como pelo Parlamento Europeu. No PE,
foi a comissão de Ambiente, Saúde Pública e Segurança Alimentar que ficou a
cargo de formular as propostas de melhoria da lei (para serem mais tarde
negociadas com o Conselho), com o relatório a cargo do eurodeputado socialista
César Luena.
As más notícias
começaram a chegar nas comissões que emitiram pareceres, nomeadamente a da
Agricultura e a das Pescas, que rejeitaram a proposta de lei perante uma
aliança entre o PPE e os partidos mais à direita do Parlamento Europeu. O PPE,
aliás, retirou-se das negociações nos últimos meses, alegando que a proposta da
Comissão irá pôr em risco a segurança alimentar europeia e prejudicar a
economia agrícola em geral.
Por trás do
boicote à Lei do Restauro estará o eurodeputado alemão Manfred Weber,
presidente do PPE. Esta posição, contudo, tem sido vista como um dos primeiros
indícios dos confrontos partidários que se prevêem até às eleições europeias de
Junho de 2024.
A pergunta que muitos se fazem, em particular jovens, é:
“Foram capazes de fazer tanto nos últimos anos, como é possível não conseguirem
passar uma lei sobre biodiversidade?”
César Luena, eurodeputado
O presidente da
comissão de Ambiente, Pascal Canfin (do grupo liberal centrista Renew), afirma
ter havido “uma clara manipulação de votos” na votação da comissão de Ambiente,
denunciando que “um número significativo de membros da comissão” — nomeadamente
“um terço dos deputados do PPE” — foram substituídos por outros colegas, em
particular “eurodeputados alemães da comissão de Agricultura”.
Do outro lado da
barricada, a eurodeputada alemã Christine Schneider, relatora-sombra do
projecto de Lei do Restauro pelo PPE, relembrou as objecções do grupo parlamentar
democrata-cristão, como a ameaça à segurança alimentar ou o prejuízo para o
sector agrícola, alegando que não houve uma “avaliação de impacto clara e em
condições”. “Se a Comissão Europeia tivesse levado a sério as nossas
preocupações, não estaríamos aqui hoje”, rematou.
Já Peter Liese,
porta-voz do PPE na comissão de Ambiente, deixou claro o alvo do ataque do seu
grupo parlamentar: “Timmermans está a avançar demasiado e a avançar mal”,
afirmou, atacando várias vezes o vice-presidente da CE responsável pela pasta
do Pacto Ecológico Europeu.
O relator
socialista César Luena relembrou que, fora das movimentações em curso no
Parlamento Europeu, a Lei do Restauro da Natureza continua o seu caminho,
nomeadamente com a aprovação no Conselho da UE. “Dentro de poucos dias começa a
presidência espanhola do Conselho da UE”, lembrou ainda, garantindo que a
negociação bem-sucedida desta lei na fase de trílogo — que só acontecerá caso
seja aprovada pelo Parlamento — será uma das bandeiras do governo espanhol.
Face ao resultado
desta terça-feira, César Luena deixou, por fim, uma palavra de condenação à
atitude apresentada pela direita ao tentar travar esta lei. “A pergunta que
muitos se fazem, em particular jovens, é: ‘Foram capazes de fazer tanto nos
últimos anos, como é possível não conseguirem passar uma lei sobre
biodiversidade?’”
ENVIRONMENT
Law of Restoration by a thread. Final decision in
the hands of the plenary of the European Parliament
The European Parliament's Environment Committee
rejects a proposal negotiated in recent months on the Nature Restoration Act. A
vote in plenary will be the last chance to save conservation law.
Aline
Flower
27 June
2023, 16:00
The Nature
Restoration Act provides for reversing the decline of pollinating insects,
increasing green spaces or restoring habitats in poor condition
"Take
off your coats, this will heat up." The light tone of Pascal Canfin,
chairman of the European Parliament's Environment Committee, was not enough to
defuse tension on Tuesday morning, as the continuation of the long vote on the
report on the Nature Restoration Act, which had been halted two weeks ago. The
result: "44-44, rejected," the French MEP finally concluded, using
the expression so often heard throughout the vote on hundreds of amendments.
The
Restoration Law is thus trapped in the political labyrinths of the European
Parliament, between the rejection of the European People's Party (EPP, which
includes the PSD and the CDS), allied with the far-right groups and the part of
the liberals of Renew Europe, and the families of the Socialists and Democrats
(S&D, which includes the PS),
Greens, Left (which integrates PCP and BE) and the other part of Renew,
who voted in favor of the law, with the support of environmental associations
and scientists from around the world.
With no majority
in Tuesday's vote, instead of proposing improvements, the Environment Committee
will propose, in plenary, the rejection of the European Commission's draft law
for nature conservation, which has among its objectives to restore 20% of the
European Union's land and sea areas by 2030. There will be one last opportunity
to resubmit the amendments in the final vote, so as not to waste the
negotiating work of recent months. However, if the European Parliament as a
whole confirms the rejection of the proposal in plenary — the vote should be
scheduled for plenary from 10 to 13 July — the European Union will be without a
key player in protecting biodiversity.
Among the
objectives of the proposal are the restoration of 80% of European habitats in
poor condition, the reversal of the decline of pollinating insects by 2030, the
5% increase of urban green spaces by 2050 and the 50% reduction in the use of
chemical pesticides by 2030
In a press
conference after the votes, the rapporteur for the European Parliament's proposal,
the Socialist César Luena, recalled the importance of this "first law on
nature and biodiversity in 70 years of European construction" and promised
not to lower his arms until the July plenary, where the final vote is expected
to be scheduled.
"We
will add amendments and we will negotiate everything with everyone," said
the Spanish MEP, recalling that in plenary it will still be possible to present
amendments, including the commitments made in recent months with the most
left-wing parties.
European ecological "childbirth"
The Nature
Restoration Act was presented by the European Commission in June 2022 as one of
the pillars of the European Green Deal, in charge of EC Executive
Vice-President Frans Timmermans, translating into a set of strategies and laws
that have had a long "birth" since 2019, when it was announced. The
restoration legislation fills a gap in the provisions on the long-term recovery
of natural resources in the EU, making it possible to achieve the climate and
biodiversity objectives, not only of the EU, but those that were taken up at
COP15 on Biodiversity in November last year.
Among the
objectives of the proposal are the restoration of 80% of European habitats in
poor condition, the reversal of the decline of pollinating insects by 2030, the
5% increase of urban green spaces by 2050, the 50% reduction of the use of
chemical pesticides by 2030, banning their use in "sensitive areas"
such as protected and urban green areas.
The
Commission's proposal has been under consideration by both the Council of the
European Union — which approved its proposal last week — and the European
Parliament. In the EP, it was the Committee on the Environment, Public Health
and Food Safety that was in charge of formulating the proposals for improving the
law (to be negotiated later with the Council), with the report being carried
out by the Socialist MEP César Luena.
The bad
news began to arrive in the committees that issued opinions, namely Agriculture
and Fisheries, which rejected the draft law in the face of an alliance between
the EPP and the parties further to the right of the European Parliament. The
Group of the European People's Party (Christian Democrats) and European
Democrats, moreover, has withdrawn from the negotiations in recent months, claiming
that the Commission's proposal will jeopardise European food security and harm
the agricultural economy in general.
Behind the
boycott of the Restoration Law will be German MEP Manfred Weber, president of
the EPP. This position, however, has been seen as one of the first indications
of the partisan clashes that are expected until the European elections in June
2024.
The question that many ask themselves, particularly
young people, is: "They have been able to do so much in recent years, how
is it possible not to be able to pass a law on biodiversity?"
César Luena, MEP
The
chairman of the Environment Committee, Pascal Canfin (of the centrist liberal
group Renew), claims that there has been "a clear manipulation of
votes" in the Environment Committee's vote, denouncing that "a
significant number of committee members" – namely "a third of the EPP
MEPs" – have been replaced by other colleagues, in particular "German
MEPs from the Agriculture Committee".
On the
other side of the barricade, German MEP Christine Schneider, shadow rapporteur
of the EPP's Restoration Bill, recalled the objections of the Christian
Democratic parliamentary group, such as the threat to food security or the
damage to the agricultural sector, claiming that there had been no "clear
and conditional impact assessment". "If the European Commission had
taken our concerns seriously, we would not be here today," he said.
Peter
Liese, the EPP's spokesman on the Environment Committee, made clear the target
of his parliamentary group's attack: "Timmermans is going too far and
going badly," he said, repeatedly attacking the EC vice-president
responsible for the European Green Deal.
The
Socialist rapporteur César Luena recalled that, outside the ongoing movements
in the European Parliament, the Law on the Restoration of Nature continues its
path, namely with the approval in the Council of the EU. "In a few days
the Spanish presidency of the Council of the EU begins," he said, assuring
that the successful negotiation of this law in the trialogue phase – which will
only happen if it is approved by Parliament – will be one of the flags of the
Spanish government.
Faced with
Tuesday's result, César Luena finally left a word of condemnation to the
attitude presented by the right in trying to stop this law. "The question
that many ask themselves, particularly young people, is: 'They have been able
to do so much in recent years, how is it possible not to be able to pass a law
on biodiversity?'"
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