Algarve
teme vir a ser uma “janela” com vista para as plataformas
petrolíferas
As
vozes contra os projectos de exploração de petróleo e gás no
Algarve, em terra e no mar, fazem-se ouvir cada vez mais. Movimentos
de cidadãos, autarcas e empresários receiam pelo Ambiente e pelo
Turismo. Sousa Cintra foi o último a entrar na corrida e já tem
gente no terreno em busca do ouro negro.
Idálio Revez /
13-2-2016 / PÚBLICO
O Algarve corre o
risco de ser atirado para a lista negra dos operadores turísticos,
se as plataformas petrolíferas surgirem no horizonte. Este é um
cenário que está a ser contestado pela Plataforma Algarve Livre de
Petróleo (PALP), que em Novembro entregou na Assembleia da República
uma petição com mais de sete mil assinaturas. A essa causa
juntaram-se, ultimamente, muitos autarcas e as principais associações
empresariais.
“Não estamos
disponíveis para discutir riscos ambientais”, afirma, peremptório,
Vítor Neto, ex-secretário de Estado do Turismo de António Guterres
e ex-deputado do PS. O que é necessário, afirma, é que “sejam
rapidamente suspensos e anulados” os oito contratos de concessão
já assinados para pesquisa, prospecção e exploração de petróleo
e gás na região. No mar e em terra. “Vamos destruir um recurso
como é o turismo, perdendo 5 a 6 mil milhões de euros por ano?”,
questiona o agora presidente da Associação Empresarial do Algarve -
NERA.
“Para quê criar
mau ambiente?”, interroga, com alguma ironia, Sara Kellen,
activista da PALP. Os motivos para contestar o projecto, justifica
esta estudante de Biologia Marinha, são muitos. Vão desde a
destruição da fauna e flora marinha, no caso das concessões
offshore, até à contaminação dos aquíferos em terra ( onshore).
“Alguém vem passar férias para abrir a janela e ver uma
plataforma [petrolífera]?, perguntou na quinta-feira à noite num
debate realizado na biblioteca pública da Fuzeta.
A professora
universitária Rosa Guedes explicou que a PALP nasceu porque houve
“pessoas e organizações, de diferentes origens, que se juntaram
pela vontade de intervir”. O presidente da Comunidade
Intermunicipal do Algarve - AMAL, Jorge Botelho (PS), que é também
presidente da câmara de Tavira, regozijou-se com a iniciativa.
“Ainda bem que surgiu este movimento da cidadania. Os municípios
não sabiam o que se estava a passar”, diz, adiantando que os
autarcas tiveram uma reunião com o secretário de Estado da Energia,
Jorge Sanches, a dia 26 de Janeiro, reclamando que sejam “revogadas
as concessões”.
A resposta que
obteve, admite, não traz nada de novo. “Os contratos vão ser
analisados do ponto de vista jurídico. Poderá haver direito ao
pagamento de indemnizações se forem anulados”, afirmou. As
últimas duas licenças para os blocos de Aljezur e Tavira foram
atribuídas por “negociação directa” à empresa Portfuel
[Petróleos e Gás de Portugal], do empresário Sousa Cintra, no dia
25 de Setembro, no final do mandato do anterior executivo. Estes dois
blocos abrangem 14 dos 16 concelhos algarvios, Só escapam Albufeira
e Alcoutuim.
Governo não se
compromete
Há duas semanas, no
Parlamento, já o primeiro-ministro garantira que apenas estão
autorizadas prospecções com recurso a métodos convencionais, sem
recurso à tecnologia do
fracking
[fracturação hidráulica], e que não há nenhuma autorização
para exploração emitida. Mas não se comprometeu a que isso não
venha a acontecer. Os contratos de concessão, todavia, não excluem
o fracking e incluem a exploração, embora esta dependa de
autorizações específicas. Já há mais de vinte anos, o
Decreto-Lei 109/94 alterou as regras do jogo. A actividade de
prospecção e exploração, diz a lei, “fica subordinada a um
único título, sob a forma de contrato administrativo de concessão,
contemplando todas as fases da actividade”.
A prática que
vigorava até 1994, explica Rosa Guedes, obrigava à abertura de
concurso público, mas desde então é também admitida a negociação
directa. “Não existe transparência”, critica. Situação
idêntica, acrescenta, verifica-se na Avaliação de Impacto
Ambiental que deixou de ser obrigatória nas fases de pesquisa e
prospecção. Sara Kellen pede que se olhe para o futuro — “o
momento em que todo o ecossistema seja posto em causa”. Nessa
altura, diz, haverá uma pergunta a fazer: “Onde estará o bom
peixe do Algarve?” Os activistas da PALP são da opinião que os
efeitos surgirão mesmo na fase das prospecções. Os cetáceos, por
exemplo, adianta o biólogo Manuel Vieira, “poderão ficar surdos,
com as explosões sísmicas, usadas nas pesquisas”.
No meio da
biblioteca, levanta-se um homem. “Sou a favor da exploração do
petróleo, não estejam para aí a agitar o papão da poluição.
Estive em Cabinda, tomei banho, não vi nada do que estão a falar”.
No mesmo sentido, diz outro: “Trabalhei na industria petrolífera.
Se isso fosse verdade, eu já estaria morto.”
As coisas não
pareciam correr bem para o lado de quem defende o Algarve livre de
petróleo. “As informações estão todas disponíveis no site da
PALP, as pessoas podem comparar e ver quem diz a verdade”,
respondeu Rosa Guedes.
Um estrangeiro
residente na região deu uma achega. “Ainda não falaram de um
outro perigo. O Algarve é uma zona de risco sísmico”. Um pouco
por toda a região, a PALP tem vindo a realizar debates nos quais a
comunidade de estrangeiros residentes tem sido um dos grupos mais
activos.
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