Uma abertura contra José Sócrates
Por Luís Rosa
publicado em 2
Dez 2014 in
(jornal) i online
Se mais provas fossem necessárias,a abertura para
discutir o crime de enriquecimento ilícito reitera que António Costa quer um
cordão sanitário em redor de José Sócrates
É um princípio.
Ainda não é a solução, mas a disponibilidade do PS para discutir a proposta do
PSD sobre o crime de enriquecimento ilícito indicia que algo está a mudar no
partido liderado por António Costa. Não é só na justiça, mas também entre os
socialistas. Em primeiro lugar porque o PS foi o único partido que, liderado
por José Sócrates e António J. Seguro, sempre rejeitou esse novo crime -
votando contra nos três momentos em que foi formalmente proposto desde 2007 no
parlamento. O facto de o debate ressurgir, como se previu aqui neste espaço,
por causa da prisão preventiva de José Sócrates e das respectivas suspeitas de
deter cerca de 20 milhões de euros numa conta suíça em nome do seu amigo Carlos
Santos Silva, dá uma importância ainda maior à abertura manifestada por António
Costa. Não por acaso, tem sido João Cravinho a liderar o debate do lado dos
socialistas. Sampaísta de sempre como Costa, Cravinho é um velho defensor da
ideia agora relançada por Teresa Leal Coelho (PSD). O facto de o ex-ministro
das Obras Públicas ter voltado à carga no momento em que (re)entrou para a
Comissão Política Nacional do PS, pela mão do novo líder, dá uma simbologia
política importante às suas palavras. Se mais provas fossem necessárias depois
de os socráticos terem sido afastados da direcção nacional do PS, fica
reiterado que Costa quer um cordão sanitário em redor de José Sócrates e dos
seus apoiantes.
Não quer isto
dizer que a oposição de sempre dos socialistas à criminalização do
enriquecimento ilícito seja totalmente descabida. Em primeiro lugar, foi também
essa a leitura do Tribunal Constitucional - contra, refira-se, a visão do PSD,
do CDS, do PCP e do BE. A violação dos princípios da presunção de inocência e
da inversão do ónus da prova são uma matéria que deve preocupar todos os
defensores do Estado de direito. O que não pode acontecer são dois pesos e duas
medidas no nosso ordenamento jurídico. Além do direito fiscal (em que uma
autêntica ditadura legal do fisco anulou praticamente a presunção de inocência
que seria devida aos contribuintes), também no direito penal já se verificou a
inversão do ónus da prova. Desde 2002 que um novo regime de declaração de bens
a favor do Estado instituiu a prática de que, em caso de condenação por crimes
como corrupção passiva, peculato ou tráfico de droga, entre outros,
"presume-se constituir vantagem da actividade criminosa a diferença entre
o valor do património do arguido e aquele que seja congruente com o seu
rendimento lícito". Os respectivos bens só não serão declarados a favor do
Estado se o arguido provar que os mesmos foram adquiridos com fundos que tenham
uma proveniência lícita. Isto é, está a instituída a inversão do ónus da prova
no direito penal. A questão é simples: o PS de António Costa não pode concordar
com a ditadura legal do fiscal, agravada regularmente com os votos dos
socialistas, do PSD e do CDS em nome da cada vez maior necessidade de receitas
do Estado, e permitir que o enriquecimento ilícito dos titulares de cargos
políticos fique impune.
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