Supremo recusa segundo pedido de
libertação de Sócrates escrito na cópia de uma folha de jornal
PEDRO SALES DIAS
04/12/2014 - 17:32
Juízes não aceitaram sequer
analisar o pedido de habeas corpus face à desconsideração.
O Supremo
Tribunal de Justiça (STJ) decidiu esta quinta-feira não admitir sequer para
análise o segundo pedido de habeas corpus (libertação imediata) do
ex-primeiro-ministro, José Sócrates, preso preventivamente e indiciado por
fraude fiscal qualificada, corrupção activa e passiva e recebimento indevido de
vantagem.
No despacho ao
qual o PÚBLICO teve acesso, o juiz conselheiro Manuel Braz aponta aquilo que
surge como uma desconsideração para com o STJ. O pedido foi feito “numa folha
que é uma fotocópia de parte de uma página do Jornal de Notícias do dia
27/11/2014”, aponta o magistrado, considerando que “esta não é uma maneira
séria de apresentar uma petição de habeas corpus”. Por este motivo, o tribunal
considera que o pedido enviado “não pode ser tomado com uma verdadeira petição
de habeas corpus”.
O juiz lembra que
“o mínimo que deve exigir-se para a introdução em juízo desse pedido ou de
qualquer outro é o uso de folhas de papel em branco”.
O segundo pedido
foi enviado por Jorge Domingos Dias Andrade. Entrou nos serviços do tribunal
esta quarta-feira, no mesmo dia em que os juízes decidiram rejeitar o primeiro
habeas corpus requerido por Miguel Mota Cardoso, por “manifesta falta de
fundamento legal”.
Jorge Domingos
Dias Andrade usou então, acusa o tribunal, a uma forma peculiar para se dirigir
à Justiça. Recorreu a uma “fotocópia de parte de uma folha de jornal,
escrevendo em parte nos espaços deixados em branco pelos textos jornalísticos”,
o que para os juiz do Supremo “revela o propósito de desconsiderar a
instituição Supremo Tribunal de Justiça".
De acordo com o
despacho do Supremo, “a primeira parte do seu requerimento, manuscrito,
encontra-se escrita nos espaços em branco que ficam entre os textos jornalísticos
ou entre estes e as margens, apresentando-se um dos seguimentos na posição
vertical e outro na posição horizontal; a segunda parte do requerimento, de
difícil leitura e com rasuras, encontra-se no verso dessa fotocópia”.
Para o Supremo
está em causa a violação do dever de correcção previsto no Código de Processo
Civil, “mais do que uma vontade séria de obter a libertação do arguido”, até
porque Sócrates tem um advogado que, se achasse viável e conveniente para a sua
defesa”, não deixaria “de lançar mão do pedido de habeas corpus”.
“Todos os
intervenientes no processo devem agir em conformidade com um dever de recíproca
correcção, pautando-se as relações entre advogados e magistrados por um
especial dever de urbanidade”, determina o Código de Processo Civil aplicado
neste caso de forma subsidiária ao Código Penal, já que está em causa um
processo-crime.
O tribunal
rejeita também a hipótese de convidar o requerente deste segundo habeas corpus
a apresentar um novo pedido corrigido, uma vez que conclui que Jorge Domingos
Andrade “não visa, ou não visa em primeira linha, a libertação do preso”. O
juiz justifica ainda que o convite é “desnecessário” e não é “compaginável” com
o prazo de oito dias a que está sujeita a apreciação do pedido.
O habeas corpus é
um pedido urgente de libertação imediata de alguém que flagrantemente estará
detido ou preso de forma ilegal e é a derradeira forma de garantia
constitucional para que a liberdade seja resposta. É um tipo de acção judicial
raramente usado e é diferenciado das demais nomeadamente porque sobe de
imediato para o Supremo Tribunal de Justiça, o único que se pronuncia nestes
casos peculiares. Este tipo de recurso tem carácter de urgência (o Supremo tem
de se pronunciar em oito dias) e visa a libertação imediata de um preso, face
ao aparente abuso de poder que é mantê-lo detido. Pode
ser solicitado por qualquer cidadão.
Se Jorge Domingos
Andrade insistir no pedido, poderá fazê-lo enquanto Sócrates estiver em prisão
preventiva. Terá de apresentar um novo pedido, mas desde que cumpra “as regras
mínimas que nesta matéria não podem deixar de ser respeitadas”.
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