Europa. Pode vir aí uma UE a duas
velocidades, com novas dificuldades políticas e jurídicas
Por Isabel
Tavares
publicado em 5
Jul 2014 / in (jornal) i online
O orçamento não
chega para pagar os compromissos assumidos. No final de 2013 faltavam 23 mil
milhões de euros só para a política de coesão, dinheiro gasto pelos
Estados-membros mas que o Conselho Europeu ainda não pagou
A Alemanha ganhou
ontem à França, no estádio do Maracanã, no Rio de Janeiro, mas no Parlamento
Europeu, em Estrasburgo, Merkel tem outros adversários pela frente. Os perigos
estão à vista: a posição do Reino Unido face à UE, o referendo na Escócia e,
eventualmente, na Catalunha, as políticas de emigração, a zona euro e as
dificuldades acrescidas nos países resgatados pela troika, um parlamento
extremado e um orçamento insuficiente são questões que abrem a porta a uma
Europa a várias velocidades, criando novas dificuldades do ponto de vista
político e jurídico.
As pastas ligadas
à chamada economia real ganharam um novo peso e o Parlamento Europeu já disse
que não está disposto a passar cheques em branco e quer um verdadeiro plano de
crescimento, com investimento público e privado em infra-estruturas, redes
energéticas, PME.
Mas este é outro
problema. A Europa precisa de fundos próprios. No final de 2013 faltavam mais
de 23 mil milhões de euros só para a política de coesão (fundos estruturais),
segundo fontes comunitárias, mais do que o QCA - Quadro Comunitário de Apoio
destinado a Portugal entre 2014 e 2020 (21 mil milhões). Dinheiro que já foi
gasto pelos Estados-membros e que o Conselho Europeu se comprometeu pagar, mas
que não há.
É preciso
encontar alternativas - a taxa sobre transacções financeiras poderá ser uma
delas -, mas é preciso que cheguem com rapidez. Também poderá ser criado um
orçamento apenas para a zona euro, mas as divisões são cada vez mais evidentes.
O MEDO DA GUERRA
"A Europa precisa do Reino Unido, mas o Reino Unido também precisa da
Europa". Foi assim que o recém reeleito presidente do Parlamento Europeu,
Martin Schulz, respondeu à posição cada vez mais extremada do primeiro-ministro
inglês, David Cameron, face à União Europeia. "Estou aberto para
conversar, discutir, aprender e melhorar", disse Schulz.
Confrontado com a
sua incapacidade para impedir que Jean-Claude Juncker seja o novo presidente da
Comissão Europeia, depois de ter sido derrotado por 26 votos contra dois no
Conselho Europeu, o primeiro-ministro britânico tentou a reconciliação, numa
tentativa de ganhar "capital de queixa" em negociações futuras. "Vou
trabalhar com o senhor Juncker. Há negócios que podemos fazer", escreveu
Cameron num artigo de opinião publicado no 'Daily Telegraph'.
No seu primeiro
discurso no hemiciclo, Schulz optou pelas questões da emigração e dos direitos
humanos, deixando de lado temas como a austeridade ou o desemprego, uma das
bandeiras da sua candidatura. "Não podemos ter pessoas como medo de guerra
na Europa", afirmou o presidente do PE, lembrando que o Parlamento não
pode "subestimar" a questão da emigração e tem de ter uma política
activa nesta matéria. "Tem de haver na Europa a solidariedade que tanto
apreciamos no Parlamento. As pessoas têm de acreditar que a União Europeia está
lá para as proteger", independentemente da sua cor, religião ou escolhas
pessoais.
UMA ALMA NOVA
A
Europa tem de parar de agir como "uma tia velha e chata", disse esta
semana o primeiro-ministro Matteo Renzi, que agora inicia a presidência
semestral rotativa da UE. Um discurso inspiracional na sessão plenária de
quarta-feira e que foi também um cartão amarelo aos "conservadores",
a Jean-Claude Juncker e à política de austeridade que está a dividir a União
Europeia.
"Se hoje a
Europa fizesse uma selfie, que imagem teria? Mostraria um rosto de tédio",
disse Renzi. "Não podemos subestimar a questão financeira. A Itália
defende que o grande desafio do semestre europeu não é fazer uma lista de
problemas a resolver, o grande desafio é recuperar a alma europeia".
O
primeiro-ministro italiano lembrou que a Itália é um contribuinte líquido da UE
(paga mais do que recebe) e que as regras do pacto de estabilidade não devem
ser postas em causa, mas "o crescimento deve ser o ponto central da
política europeia, sem crescimento a Europa não tem futuro".
Renzi explicou
que pretende aproveitar a presidência para reerguer o espírito europeu e ver os
valores europeus espelhados na política externa. Resta saber se terá tempo para
impor a sua vontade, já que uma presidência no segundo semestre é sempre
ingrata devido ao período de férias (Verão e Natal).
Comissão
Europeia. Portugal entra tarde na guerra por um lugar de comissário
Juncker terá de
convercer a Europa com o seu programa e com a sua equipa
O mandato da
actual comissão, liderada por Durão Barroso, termina no final de Outubro. No
próximo dia 15 de Julho, o luxemburguês Jean-Claude Junker deverá ser
confirmado como presidente e serão então nomeados os novos comissários. O voto
foi antecipado para não coincidir com a cimeira extraordinária de chefes do
Estado e do Governo da UE, marcada para dia 16 de julho.
O eurodeputado do
PSD Paulo Rangel considera que Portugal está muito a tempo para apresentar os
seus candidatos a comissário europeu e acredita que o presidente indigitado da
Comissão Europeia está mais preocupado em fazer um programa do que em pensar em
nomes. “Não estamos atrasados, alguns estão é adiantados e isso até os pode
prejudicar”, disse o cabeça-de-lista às eleições europeias da Aliança Portugal
(PSD/CDS).
Mas esta posição
não é unânime e muitos acreditam que Portugal está a perder terreno e poderá
acabar por ficar com uma pasta menos interessante por ainda não se ter
posicinado oficialmente. Em termos oficiosos, vários nomes têm sido lançados e
houve até quem já tivesse confirmado que ficaria feliz com o lugar, como o
presidente do Conselho Económico e Social, José Silva Peneda.
O
primeiro-ministro Passos Coelho já disse que não tomará nenhuma decisão sem
antes falar com o PS. No entanto, é sabida a pressão para que seja uma mulher,
uma posição partilhada por Durão Barroso, que tem vindo a defender a questão
das quotas em termos de género.
Entre as
potenciais candidatas estão a ex-minista das Finanças, Manuela Ferreira Leite,
ou a ex-ministra da Ciência e do Ensino Superior, que recentemente deixou a
função de conselheira da Comissão Europeia, Maria da Graça Carvalho. Mas os
nomes das eurodeputadas socialistas Maria João Rodrigues (vice-presidente do
grupo S&D) e Elisa Ferreira têm sido ventilados. Ontem, Maria João
Rodrigues disse ao i que acredita que tem o perfil certo para o lugar.
Do lado
masculino, além do nome de Silva Peneda foram também falados os do actual
ministro-adjunto e do Desenvolvimento Regional, Miguel Poiares, ou do
secretário de Estado adjunto do primeiro-ministro, Carlos Moedas.
Rui Rio admite renegociação da
dívida se crescimento do país for fraco
Social-democrata considera que a carga fiscal é “insustentável”. E
ex-ministro Santos Pereira defende baixa de impostos
5 jul 2014 / PÚBLICO
O social-
democrata Rui Rio alertou ontem para a necessidade de, “qualquer dia”, Portugal
ter de “renegociar a dívida” pública no caso de não ter um crescimento económico
sustentável.
Mas também disse
não ver possibilidades de alcançar o consenso político defendido no Conselho de
Estado de anteontem, alertando que “os momentos mais adequados” para
entendimentos partidários são “mais calmos e pós- eleitorais”.
“Naturalmente que
Portugal só poderá não falar de renegociar a dívida se tiver um crescimento
económico sustentável. Se conseguirmos esse crescimento, teremos riqueza
suficiente para fazer face à dívida acumulada”, observou o economista, no fim
da conferência As Empresas e o Imperativo da Competitividade, no Porto.
A renegociação
das condições do pagamento da dívida pública está a ganhar terreno entre os
membros do Conselho de Estado (ver texto ao lado). Já sobre o apelo para o
diálogo construtivo saído do Conselho de Estado, Rio disse não acreditar que
este seja o momento ideal.
“Sou altamente
favorável ao consenso entre partidos, mas, neste momento, não vejo como é
possível, principalmente no enquadramento em que está o PS, nem que os dois
candidatos a líderes quisessem”, observou o economista. Para Rio, os “momentos
mais adequados” para apelar ao diálogo entre forças políticas são alturas “mais
calmas” e “pós- eleitorais”. Rui Rio considerou “indiscutível” que a carga fi
scal em Portugal é actualmente “insustentável, injusta” e “quase ultrapassou
todos os limites”.
Em declarações
aos jornalistas no fim da conferência As Empresas e o Imperativo da
Competitividade, no Porto, Rio defendeu a necessidade de uma reforma do Estado
que “tem de ir da despesa mais baixa à mais alta”, porque “é o somatório de
muitas despesas pequeninas, feito organismo a organismo”, que permite “reduzir
a carga fiscal”.
“Temos de baixar
a despesa, mas é a despesa real, não é só a despesa com salários e pensões. Há
muita outra despesa do Estado que temos de fazer um esforço para reduzir”,
alertou o social-democrata.
Também o
ex-ministro da Economia Álvaro Santos Pereira defendeu ontem que a prioridade
nos próximos anos “vai ser baixar impostos”, com a ambição de ter um IRC dos
mais reduzidos da Europa — porque “uma taxa de 18% ou 19% não chega” —, o que
obrigará a cortar na despesa.
“É preciso
continuar a apostar nesse diálogo social”, nomeadamente para avançar “com a
reforma da Segurança Social e a reforma do Estado” e, dessa forma, “reduzir
despesas” e “apostar em reformas estruturais”, afirmou Santos Pereira no Porto,
na segunda intervenção pública sobre economia desde que deixou o Governo, em
Julho de 2013.
PÚBLICO/Lusa
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