domingo, 2 de fevereiro de 2014

Livre. Futuro partido depende agora do Tribunal Constitucional.Divergências entre Tavares e Bloco impedem convergência com o Livre.


Livre. Futuro partido depende agora do Tribunal Constitucional
Por Catarina Falcão
publicado em 3 Fev 2014 in (jornal) i online

Com ou sem filiação partidária anterior, membros e simpatizantes do Livre justificam a escolha com descontentamento face ao actual panorama político
Liberdade, esquerda, Europa e ecologia - os valores reclamados pelo novo partido lançado pelo eurodeputado Rui Tavares em Novembro - foram mesmo as palavras mais repetidas no congresso fundador do Livre. O debate sobre o futuro do país e da democracia foi intenso, com muitos dos membros a declararem que nunca tinham pertencido a nenhuma força política porque não se revêem em nenhum partido existente. Para Rui Tavares "tudo no partido chama à acção política".

O Livre conta para já com 500 membros e 250 apoiantes - que não podem votar documentos nem eleger membros dos órgãos do partido. No congresso fundador no Porto estiveram presentes um quinto dos membros e alguns apoiantes - para se ser apoiante do Livre é necessário assinar um compromisso de ética comprometendo-se a defender os interesses do partido.

Para além de acertar agulhas para a estratégia às eleições europeias, este congresso serviu para eleger os órgãos sociais do partido: conselho de jurisdição, assembleia e grupo de contacto - órgão executivo que gere o partido, onde se integra Rui Tavares.

Muitos dos que subiram ao púlpito para explicar as razões da sua candidatura à assembleia apresentaram o descontentamento com os restantes partidos como a razão para procurarem uma nova forma de intervenção. A idade entre os membros varia, mas a maior parte tem formação superior e estudou, em algum ponto da sua formação, no estrangeiro. Têm ligação à sociedade civil, interesses paralelos às suas actividades profissionais e estão insatisfeitos com a política portuguesa. "Nunca fui membro de nenhum partido, mas desde a primeira vez que pude votar sempre votei PS ou Bloco de Esquerda, até me desiludir com ambos e passar a votar em branco. Candidato- -me à assembleia do Livre, acima de tudo, pela mesma razão pela qual apoiei inicialmente a formação deste partido: não quero continuar a votar em branco", disse Miguel Ângelo Andrade, um jovem de 25 anos, estudante de mestrado. Foi também esta esperança que levou Fernando Gilberto, de 43 anos a aderir ao Livre, sem ter qualquer experiência prévia em partidos. "O Livre já venceu, só pelas pessoas que conseguiu juntar e pelas ideias que temos partilhado", apontou.

Diogo Ribeiro de Campos - neto de António Campos, fundador do PS -, também é jovem, mas ao contrário de Miguel, já pertenceu a uma força política: foi dirigente da Juventude Socialista. Afirma que nos partidos instituídos "não se discutem ideias" e considera o Livre "uma oportunidade" para a vida democrática do país. Já Carlos Gouveia, ex-preso político do antigo regime e dramaturgo, foi mais explícito e afirmou querer pertencer aos órgãos do partido por estar farto dos "proxenetas do Estado".

Para Rui Tavares o interesse que o partido tem despertado nas pessoas, especialmente nas que nunca estiveram ligadas à política, não é surpresa. "Tudo neste partido chama o cidadão comum para a acção política, mas quer qualificá-la através de debates exigentes e primárias em que os candidatos vão ter de responder a perguntas", apontou o eurodeputado que considera que o Livre já mudou o panorama político em Portugal - a partir de agora "os partidos vão tentar abrir-se e estar mais em contacto com os cidadãos".

Nas mãos do TC Um programa eleitoral para as europeias até ao fim de Fevereiro e a realização de primárias, em Março, para escolher candidatos a essas eleições são as metas que o Livre estabeleceu para os próximos meses. As assinaturas necessárias à constituição como partido serão entregues no princípio desta semana no Tribunal Constitucional e caberá aos juízes do Ratton decidir se esta nova força à esquerda vai ou não a tempo das eleições, já em Maio, para o Parlamento Europeu.

Os prazos são apertados, dado que o Tribunal Constitucional tem demorado entre dois a três meses para validar novas forças políticas, o que significa que a ratificação legal do Livre pode cair mesmo em cima do prazo legal para a apresentação de listas candidatas às europeias. Outro problema podem ser as eventuais dúvidas que o TC venha a levantar sobre os documentos que fundam o partido ou a validade das assinaturas apresentadas, o que atrasaria todo o processo e levaria a um eventual chumbo.

Foi com estes percalços em mente que o Livre apresentou este fim-de-semana a sua moção estratégica às europeias. O partido admite que, mesmo não podendo concorrer legalmente, quer participar no debate sobre o futuro da Europa de forma a travar "a catástrofe anunciada" de ter novamente o PPE - família europeia integrada pelo PSD e CDS - a ser a força maioritária no Parlamento Europeu.

O Livre pretende que até 2019 a Europa seja liderada por forças de esquerda que têm protagonizado "a oposição a uma União Europeia austeritária": Partido da Esquerda Europeia, Partido dos Socialistas Europeus e Partido Verde Europeu. Quanto à possível filiação do partido a nível europeu, Rui Tavares - que saiu da bancada do Partido da Esquerda Europeia após a ruptura com o Bloco para passar a integrar o Partido Verde Europeu - diz que essa decisão terá de ser debatida por todo o partido, adiantando que nas primárias para escolher os candidatos, quem for a votos para integrar as listas do Livre deverá especificar em que bancada se pretende sentar no Parlamento Europeu.

Divergências entre Tavares e Bloco impedem convergência com o Livre
Por Catarina Falcão
publicado em 3 Fev 2014 in (jornal) i online

José Soeiro considera que essas diferenças "ainda se mantêm"
Mesmo recusando qualquer convergência com o Livre, o Bloco de Esquerda esteve presente no encerramento do congresso do partido. José Soeiro, ex- -deputado e candidato do BE à câmara do Porto em 2013, justifica esta recusa com as divergências que em 2011 afastaram Rui Tavares do Bloco e que considera que se mantêm. Outras forças à esquerda procuram agora o Livre para encontrar novos entendimentos.

Bloco de Esquerda, movimento 3D, MAS e Partido Humanista marcaram presença na sessão de encerramento do congresso fundador do Livre. José Soeiro, em representação do Bloco, considera "paradoxal" acrescentar novos partidos ao panorama político que vêm com "a missão de unir". Sobre a recusa do Bloco de Esquerda em se juntar ao Livre nas próximas europeias, o ex-deputado culpa as divergências entre Rui Tavares e BE. "Houve no passado divergências suficientes para que o principal promotor deste partido [Livre]tenha entendido que as suas diferenças face ao Bloco justificavam que ele saísse do Bloco. Se existiu essa atitude no passado, penso que essas diferenças agora se mantêm", sublinhou.

De qualquer forma, o Livre continua a afirmar que está disponível para fazer convergências com outras forças à esquerda até Abril, e outros partidos parecem estar a responder à chamada. O MAS - Movimento Alternativa Socialista (partido criado após uma cisão no Bloco de Esquerda) pediu já para se reunir com os recém-eleitos dirigentes do partido.


Para já, o Partido Humanista saúda o aparecimento deste novo partido, mas quanto a coligações, dizem não "equacionar a possibilidade". "Quando falamos em convergência não estamos a falar forçosamente de coligações eleitorais", aponta Luís Guerra, antigo secretário- -geral, que marcou presença no Porto. Na sua opinião há "afinidades" entre o Partido Humanista e aquilo que o Livre proclama e por isso quis "dar alento" ao projecto político. "Parece-nos uma manifestação de revitalização da vida política portuguesa. Nós somos a favor do pluralismo democrático e o Livre é um bom sinal", concluiu.

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