O glorioso aumento das pensões em 2023
Não se censure António Costa por hesitar perante o que
desconhece. Mas não se embandeire em arco com as suas promessas gloriosas.
Manuel Carvalho
20 de Junho de
2022, 21:30
https://www.publico.pt/2022/06/20/economia/editorial/glorioso-aumento-pensoes-2023-2010719
Saber jogar com
as palavras é um talento indispensável para quem anda pela alta política, e
nesta segunda-feira o primeiro-ministro, António Costa, fez prova desse recurso
ao dizer, numa sessão da CNN, que no próximo ano haverá um “aumento histórico”
das pensões. António Costa não se furtou depois a explicar a razão dessa
magnífica notícia para os pensionistas que nas últimas eleições foram decisivos
para a sua maioria absoluta. Não: haveria logo depois de dizer que a lei exige
uma actualização das pensões com base na inflação e no crescimento e que ele é
servo da lei. O dia, porém, estava ganho: o que ficou no ouvido é que o Governo
prepara um aumento glorioso das pensões em 2023.
Tudo o que vá
para lá da decorrência da lei como a que impõe a actualização automática das
pensões continua envolto na certeza de que a conjuntura se vai agravar. O
Governo e o país vão a caminho de uma tempestade que não se consegue antecipar.
Como disse Mário Centeno na mesma sessão, os tempos vão ser difíceis. A
inflação deixou de ser um fenómeno passageiro e está aí para corroer os
rendimentos e as poupanças. Os juros da dívida disparam. A guerra na Ucrânia
está para durar. Os sindicatos, e em especial os da CGTP, prometem um Outono de
contestação. O anúncio de um aumento extraordinário é o oásis possível do
discurso do Governo.
Hão-de chegar
entretanto apoios conjunturais às famílias mais carenciadas para fazer esquecer
o apoio alimentar retirado a 30 mil pessoas e, como disse António Costa, o
turismo impulsionado pela geografia que leva os europeus ricos a viajar para
longe do Leste “está fantástico”. As contas públicas continuam a ser geridas
com critério. A turbulência nas urgências ou o caos no aeroporto serão tratados
com comissões de acompanhamento ou planos de contingência para reparar a falta
de decisões estruturais dos últimos anos. Durante o Verão, e até que o momento
do tudo ou nada se exponha com o Orçamento de 2023, Portugal vai viver num
limbo.
Experiente e
arguto como é, António Costa já percebeu que, depois da pandemia, vai governar
na tormenta. O seu Governo é novo, mas parece cansado. Não sabe, como ninguém
sabe, o que está para acontecer. A cada dia que passa, os cidadãos vão dando
conta de que não vem aí nada de bom, e é para contradizer esse espírito soturno
do tempo que Costa fala de aumentos extraordinários, das maravilhas do turismo
ou da certeza das contas certas. Como quem ganha fôlego, navega à bolina. Não
se censure por hesitar perante o que desconhece. Mas não se embandeire em arco
com as suas promessas gloriosas.
tp.ocilbup@ohlavrac.leunam


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