OPINIÃO
O C.G.P. tem as melhores soluções para os ricos
No mundo ideal da IL, não existe Estado capitalizado. O
mercado resolve tudo.
Carmo Afonso
17 de Junho de
2022, 0:00
https://www.publico.pt/2022/06/17/opiniao/opiniao/cgp-melhores-solucoes-ricos-2010316
Alguns terão
ouvido Carlos Guimarães Pinto (C.G.P.), na Assembleia da República, esta semana
a falar de habitação. Tentarei fazer um pequeno resumo.
C.G.P. falou de
xenofobia, um problema que sabemos ser grave, mas na versão hostilidade relativamente
aos estrangeiros, de classes socioeconómicas altas, que conseguem comprar casas
nos centros urbanos, sobretudo no centro de Lisboa.
Num país marcado pelo crescimento da extrema-direita e da consequente discriminação racial e xenófoba das minorias, lembrou-se este político de fazer soar o alarme da xenofobia apontando como vítimas estrangeiros ricos, que chegam a Portugal e que compram casas que os portugueses já não conseguem comprar. Se é possível ser vítima de estigma pertencendo a uma classe social muito privilegiada? C.G.P. acha que sim e denunciou o flagelo. Veremos como se comportarão as autoridades.
Não ficou por aí.
Falou no direito
à habitação, até enquanto direito constitucional, mas com muita calminha: este
direito não pode incluir a ambição de comprar casa nas zonas caras. As coisas
são como são. C.G.P. lembrou que o interior está a desertificar e que faria
melhor, em ir para lá, quem anda a pensar comprar casa nestes centros urbanos,
que não lhe estão destinados.
Já vou tarde para
deixar alguma espécie de mistério relativamente à minha inclinação política.
Sigo pela esquerda e não sinto na pele a tentação de acreditar nas promessas da
Iniciativa Liberal. Mas, mérito lhes seja reconhecido, houve uma percentagem
significativa dos portugueses que acreditou. Acreditaram que contribuir para o
Estado social significa um prejuízo nos seus rendimentos líquidos, que não
compensa os benefícios que dele poderiam recolher. A estes eleitores pouco
interessou já terem beneficiado desse Estado social, designadamente na educação
e na saúde. Interessou-lhes mais o futuro. Encaram esse futuro com confiança no
seu próprio valor e com os seus seguros de saúde. Na verdade, e sem querer ser
leitora de mentes, o único obstáculo que os eleitores da IL veem – entre a
situação em que atualmente se encontram e o momento em que serão abastados – é
o pagamento de impostos excessivos que a governação socialista, marxista mesmo,
lhes exige.
Nem todos os que
votaram na IL são ricos. É ponto assente. E muitos são jovens. A tendência
política dos jovens já foi o combate às desigualdades. O BE tinha maior poder
de atração, pois a radicalidade que traziam encontrava, nas políticas de
combate à precariedade e na luta por melhores salários, um bom domicílio. Essa
tendência esmoreceu. Agora nota-se outra: a sua radicalidade encontra no
anarcocapitalismo, proposto pela IL, um pouso mais convidativo.
Mas o que tem a
IL para oferecer a esses jovens?
Como é que, a
partir do funcionamento livre do mercado, se propõem encontrar soluções para as
aspirações, e já sabemos que não são curtas, destes jovens ambiciosos? Confesso
a minha curiosidade relativamente às reações perante as palavras de C.G.P..
Trocaram a luta contra as desigualdades pela promessa de que seriam ricos, mas
a primeira é uma luta efetiva e a segunda é um grande zero. Isso terá ficado
mais à vista.
Querem casa? Vão
para o interior que bem precisa de vocês. Preferiam morar no centro de Lisboa?
Lamento, mas não vamos bater-nos por isso. Cada um no seu sítio. Os pobres
poderão sempre vir grelhar sardinhas nos Santos Populares.
A verdade é que o
imobiliário é um bom exemplo do que pode acontecer quando deixamos o mercado a
funcionar. Não são os promotores imobiliários, que estão no mercado e que
procuram o lucro, que devem ser demonizados. É o sistema que não intervém e que
permite que seja sobretudo a lógica do mercado a ditar as regras e os preços.
Vamos entrar em roda livre.
O hábito de falar
das políticas que se fazem lá fora, como bons exemplos a seguir, partiu
precisamente da IL. Recordemos que existem excelentes exemplos de intervenções
do Estado no mercado imobiliário em Berlim, em Amesterdão e, de um modo geral,
na Dinamarca. Apoiaram quem precisava e salvaram os centros urbanos de se
parecerem com pequenos Dubais.
Carlos Guimarães
Pinto sabe muito bem que os estrangeiros milionários que estão a comprar casa
nos bairros caros são vítimas de preconceito e que correm risco. O que sabemos
é que não se trata do risco de terem vizinhos pobres
É mais fácil
resolver problemas em países ricos. É sabido. Mas falamos aqui de Estados
capitalizados e não de privados ricos. No mundo ideal da IL, não existe Estado
capitalizado. O mercado resolve tudo.
Acontece que a IL
só tem soluções para quem já é rico. Mas não fica por aqui. Para esses, até
problemas tem. Tal é a dedicação à classe. A filósofa espanhola Adela Cortina
afirmou: “Não rejeitamos estrangeiros se forem turistas, cantores ou atletas
famosos, rejeitamos se forem pobres.” Não saberá do que fala. C.G.P. sabe
muito bem que os estrangeiros milionários que estão a comprar casa nos bairros
caros são vítimas de preconceito e que correm risco.
O que sabemos é
que não se trata do risco de terem vizinhos pobres.
A autora é colunista do PÚBLICO e escreve segundo o novo acordo ortogr


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