segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

O voto útil à francesa / French mainstream parties split over response to Le Pen

O voto útil à francesa
Em 2002, o socialista Jospin desistiu e apelou ao voto em Chirac. Resultou

EDITORIAL / PÚBLICO / 8-12-2015

Numa repetição da história, a França discute o voto útil. Devem todas as forças políticas, à esquerda e à direita, unir-se para garantir que a Frente Nacional do clã Le Pen é derrotada na segunda volta das eleições regionais?
A Frente Nacional ganhou mais de 28% dos votos na primeira volta e, dentro de cinco dias, os franceses terão duas hipóteses: desfazem o resultado histórico ou, pelo contrário, tornam os xenófobos, populistas, anti-Europa e anti-imigrantes seguidores dos Le Pen o maior partido da França.
Os primeiros sinais não foram animadores. Esperava-se uma subida, mas não esta subida brutal. A FN teve mais 16 pontos percentuais do que nas regionais de 2010. Os partidos já tiveram reuniões de emergência, mas não é claro o que vai acontecer.
Os socialistas do Presidente, François Hollande, que ficou em terceiro, propõem a criação de um “bloco republicano” contra a Frente Nacional, mas o ex-Presidente Nicolas Sarkozy, líder do partido Os Republicanos, que ficou em segundo, não quer acordos. “Não há fusões nem desistências”, disse. Os líderes socialistas estão a pôr os “interesses nacionais” acima dos “interesses partidários” — ou pelo menos dos seus próprios interesses. Preferem perder a dar o poder aos Le Pen. Pediram aos que ficaram em terceiro lugar que desistam e não se candidatem na segunda volta e apelaram a um “voto táctico” nos Republicanos de Sarkozy. Antecipamse no entanto dificuldades, à esquerda e à direita. Um peso-pesado socialista, JeanPierre Masseret (terceiro, com menos 22 pontos percentuais do que o candidato da FN), recusa-se a desistir. Por outro lado, a estratégia do “nem-nem” de Sarkozy (“nem fusões, nem desistências”) é polémica dentro do partido. O ex-primeiro-ministro Raffarin foi um dos que protestaram: “Se ficámos em terceiro, saímos. E criamos uma frente contra esta força destrutiva, porque chegou o momento de reconstruir.”
O ataque terrorista em Paris a 13 de Novembro, que matou 130 pessoas, teve um impacto brutal nas eleições. Uma sondagem à boca das urnas mostra que 16% dos eleitores da FN mudaram a intenção de voto depois dos atentados. A esperança poderá estar num outro número: 68% dos que votaram no clã Le Pen fizeram-no “para castigar Hollande”, que vêem como um Presidente fraco. Estes eleitores, com histórias e ideologias distintas, vão votar de novo na Frente Nacional agora que esta já não é um pária nem um partido de protesto, e tem real possibilidade de chegar ao poder?
E há uma segunda esperança de que Marine Le Pen não ganhe à segunda volta. A França já passou por este susto e os socialistas usaram a mesma estratégia: Le Pen, pai, foi afastado da corrida presidencial de 2002 quando Lionel Jospin se retirou e o PS apelou ao voto em Chirac, da direita, dizendo que o fazia para impedir que Le Pen fosse eleito Presidente. Chirac ganhou com 80%. Marine Le Pen conhece bem esta história. Tão bem que, ontem, mal acordou, disse que a ideia dos socialistas é “antidemocrática” e “injusta”, que a esquerda está a “torcer o braço dos franceses” e que desistir é “insultar” os franceses.

French mainstream parties split over response to Le Pen

On the left and right of center, there’s no agreement on which way to turn.

By PIERRE BRIANÇON 12/7/15, 4:21 PM CET Updated 12/7/15, 4:34 PM CET

PARIS — On Sunday night, France’s two mainstream political parties seemed to have different but clear tactical visions for how to counter a National Front surge in the coming days before a second round of voting in regional elections.

By Monday morning, they were already bickering — with each other, as expected, but also within their own ranks, which isn’t as usual. They were mostly trying to blame each other for paving the way for National Front presidents in two, three or maybe more of the French mainland’s 12 regions.

The Socialists at first said they would pull their candidate lists wherever they came in third, to prevent the far-right party from taking over the presidency of some regional councils. The next day some candidates said they would not abide by the decisions of their party, and would stay in contention in the second round.

The conservative Les Républicains party led by former president Nicolas Sarkozy, on the other hand, initially said it would neither pull its lists, nor try to engage in negotiations to merge them with the Socialists’ (as would be possible under the electoral law).

But on Monday some of the party’s bigwigs criticized Sarkozy’s position and called for conservative candidates to reciprocate and pull out where needed to beat the National Front.

“The Socialists want to appear as the clean party next week once we can actually assess the disaster,” a Les Républicains adviser said Monday. “That could be a trap if we can’t quickly switch the discussion back to their own responsibility for the situation.”

In the Nord-Pas-de-Calais region, National Front leader Marine Le Pen came in first with 40.6 percent of the vote, to Les Républicains’ 25 percent. There, as soon as the results came in Sunday night, and without waiting for instructions from his party’s higher-ups, Socialist candidate Pierre de Saintignon said that he would pull his list, after attracting just 18.1 percent of the vote.

Even that, however, may not prove enough to break Le Pen’s momentum. The mere addition of the conservatives’ and Socialists’ tally, while arithmetically above Le Pen’s, doesn’t take into account the way voters who didn’t turn out for the first round will behave in the second.

In the Provence region, where Le Pen’s niece Marion Maréchal-Le Pen also captured 40.6 percent of the vote, the disappointing performance of mainstream right candidate Christian Estrosi (26.4 percent) may not be helped much by the withdrawal of Socialist local leader Christophe Castaner, considering the latter’s weak performance (16.6 percent) in the first round.

But in the Alsace region in the northeast of the country, the Socialist candidate Jean-Pierre Masseret said he would maintain his list in spite of his party’s decision. It would be “absurd” to pull out, he said as quoted by radio Europe 1, because “the National Front becomes stronger when we pull out.”

The ‘republican barrier’

Socialist party first secretary Jean-Christophe Cambadélis, who had announced Sunday night the surprise decision of his party, immediately tried to quell the dissent by insisting that Masseret should and would stand down.

The need to erect a “republican barrier” to beat the National Front in the regions where it “threatens” to take over was cited by Cambadélis as the reason for the unusual decision to withdraw Socialist candidates.

The move would mean that in regions in the north, south and east of the country, regional councils will operate without any representative from the left in the five years to come, Cambadélis said.

On the other end of the political spectrum, Sarkozy said he would ask his Les Républicains party to maintain conservative candidates in all regions, whatever the first round results.

“We must respect French voters in all regions, without exception, so they are offered a clear choice,” he said.

But as soon as Monday morning, Sarkozy’s clear line hit resistance from some of the party’s elders.

“When you’re third, you pull out,” said former prime minister Jean-Pierre Raffarin, talking about the situation in southern region Languedoc-Roussillon.

National Front candidate Louis Alliot, who polled 32 percent in the first round in the region, stands a reasonable chance to win there next Sunday if conservative candidate Dominique Reynié stays in the race, as he says he will, in spite of his lower-than-expected 18.8 percent showing.

Should Reynié withdraw, Socialist candidate Carole Delga, on the strength of her first-round 24.4 percent, would have a strong chance of winning the region’s presidency.

The backing-and-forthing by the mainstream parties has produced some interesting reactions from the National Front.

Florian Philippot, the FN vice president and close Le Pen associate who stands a chance of becoming president of the Alsace region, openly wished the Socialists would stay in the race against him and criticized their withdrawals in the North and Provence. He said it was important to have “diversity of opinion” in local and regional councils.

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Pierre Briançon

Manuel Valls apela à união contra a extrema-direita
CLARA BARATA 07/12/2015 - PÚBLICO

Para tentar evitar vitórias do partido de Marine Le Pen, o PS francês dá ordem aos seus candidatos para desistirem e recomendarem o voto noutro partido. Mas essa estratégia está a ser muito criticada.

Desistir a favor de um candidato de direita para impedir a vitória da Frente Nacional na segunda volta das eleições regionais no próximo domingo? Essa é a ordem da direcção do Partido Socialista francês, face aos resultados da formação de Marine Le Pen na primeira volta. Mas crescem as resistências a este sacrifício dentro do PS.

A Frente Nacional foi a vencedora no domingo, com 28,42% a nível nacional – teve mais de seis milhões de votos e ficou à frente em seis das 13 regiões metropolitanas francesas. Os Republicanos, de Nicolas Sarkozy, que esperavam uma vitória, ficaram-se por 26,85%, e não têm uma vida fácil para a segunda volta. Os socialistas tiveram 23,47%.

Marine Le Pen teve 40,64% na região Norte-Pas de Calais-Picardia, enquanto o segundo classificado, Xavier Bertrand, ex-ministro de Sarkozy, teve apenas 24,96% - e não tem muito onde ir buscar novos votos na segunda volta. Por isso, será precioso que pelo menos alguns dos eleitores que deram 18,12% ao socialista Pierre de Saintignon votem nele.

Esse é o raciocínio da “desistência republicana”, a que o primeiro-ministro Manuel Valls apela sem cessar: para impedir a eleição de um candidato de extrema-direita, quem fica em terceiro lugar desiste e dá indicação de voto no rival. “Há duas concepções da República: a que exige a união, e da extrema-direita, que divide os franceses, que quer atirar uns contra os outros. No domingo será necessário escolher entre estas duas visões”, afirmou Valls, na noite desta terça-feira, na televisão.

Esta estratégia funcionou em 2002, quando Jean-Marie Le Pen eliminou o socialista Lionel Jospin na primeira volta das presidenciais. Houve um voto em massa no candidato do centro-direita, Jacques Chirac, na segunda volta.

Mas, em vez de ser uma barragem estanque, esta estratégia tornou-se uma construção cheia de furos, agora que um partido de extrema-direita está à beira de dirigir duas grandes regiões num país como França: Marion Maréchal Le Pen, a sobrinha de Marine, teve 40,5% na região Provença-Alpes-Côte d'Azur (PACA), e Florian Philippot, o braço direito de Marine Le Pen, ficou em primeiro em Alsácia-Champagne-Ardenas-Lorena, com uma vantagem de dez pontos, e tem boas hipóteses de ganhar na segunda volta.

Suicídio político
A decisão da direcção do PS de retirar os seus candidatos para fazer uma frente republicana está a gerar polémica. Afinal, retirar as suas listas significa não ficar representado nos órgãos regionais. É fazer suicídio político. E a indicação é para que aconteça nas três regiões em que a FN está mais bem colocada: PACA, Norte-Pas-de-Calais-Picardia e Asácia-Champagne-Ardenas-Lorena.

Mas o candidato socialista de Alsácia-Champagne-Ardenas-Lorena, Jean-Pierre Masseret, recusa retirar-se. “Esta estratégia de evitamento não é uma ideia conseguida. Existe há muitos anos, mas a FN continua sempre a subir. Em vez de nos retirarmos, o que é preciso é confrontarmo-nos”, afirmou, em conferência de imprensa, disposto a lutar contra Florian Philippot.

“O confronto é que fará recuar esse partido. Serei acusado de todos os males da terra mas sou fiel aos meus compromissos. Estaremos lá, determinados a combater”, afirmou este político de 71 anos, admirador, diz o Le Monde, de Vercingetorix – o guerreiro que uniu as tribos da Gália numa revolta contra Júlio César.

Masseret, no entanto, não é o único socialista a não gostar de desistir. “As pessoas de esquerda não vão votar, vão ficar em casa”, comentou, na France Info, Fadela Aoummeur, presidente da câmara adjunta em Miramas, na região de PACA, justificando a tomada de posição do PS de Nice, que se opôs à decisão do PS nacional no Twitter. “Para eles, Marion Maréchal Le Pen ou Christian Estrosi [o candidato d’Os Republicanos, que tem assumido posições muito de direita] é a mesma coisa”.

No Norte-Pas-de-Calais-Picardia, há quem diga não consiga aceitar a escolha entre Marine Le Pen e Xavier Bertrand. “Não vejo como escolher na segunda volta entre a peste e a cólera. Não é possível”, dizia um eleitor de esquerda na rádio Europe 1. “Não é nada certo que os eleitores sigam na segunda volta os conselhos de voto dos estados-maiores, muito afastados do terreno local e largamente descredibilizados. Os resultados podem por isso ser menos automáticos do que as previsões, apesar do apelo a ‘fazer barragem’ contra a FN”, escreveu no Le Monde Laurent Bouvet, politólogo da Universidade de Versailles-Saint-Quentin-Yvelines.

Para o partido de Sarkozy continua a vigorar o “nem-nem”, ou seja, não desiste para apoiar um candidato socialista mais bem colocado nem autoriza que se apoie um candidato da Frente Nacional. “Não somos donos das vozes dos nossos eleitores”, afirmou Alain Juppé, noutras alturas muito crítico de Sarkozy.

A liderança de Sarkozy, no entanto, fica fragilizada. Não conseguiu travar o avanço da FN, com o seu discurso marcadamente à direita, e em vez disso permitiu que Marine Le Pen se posicione cada vez melhor para as eleições presidenciais de 2017 – o objectivo primordial de ambos.


A verdade é que a FN se tornou cada vez mais um partido normal. “A FN já não assusta tanto as pessoas como em 2002, os eleitores socialistas sentem-se mais relutantes a votar no partido de Sarkozy e as pessoas estão mais dispostas a aceitar a ideia de regiões governadas pela FN. Já não é algo tão repelente como Jean-Marie Le Pen tornar-se Presidente”, afirmou à Reuters François Miquet-Marty, da empresa Viavoice.

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