quinta-feira, 3 de julho de 2014

Sarkozy : retour offensif

Sarkozy denuncia “a instrumentalização política da justiça”
MARIA JOÃO GUIMARÃES e JOANA AMADO 02/07/2014 - PÚBLICO
Ex-Presidente foi constituído arguido por suspeita de corrupção e de tráfico de influências.
Depois de ter sido detido na terça-feira e interrogado durante cerca de 15 horas, o ex-Presidente francês Nicolas Sarkozy foi constituído arguido por suspeita de corrupção e de tráfico de influências. Ao fim do dia de quarta-feira, Sarkozy quebrou o silêncio para clamar inocência e denunciar “a instrumentalização política da justiça”.

A acusação é diferente das de outros seis casos em que o antigo chefe de Estado está a ser investigado, de financiamento ilegal de campanhas ou do partido. E a pergunta que está na cabeça de todos é se este caso será o travão às cada vez mais evidentes ambições presidenciais do antigo Presidente. Nas palavras do próprio Sarkozy, o objectivo dos seus inimigos políticos do governo socialista terá sido esse mesmo: travar o seu regresso à liderança da UMP (direita) e ao palco principal da política francesa.

“Tudo isto foi feito para dar uma imagem de mim que não corresponde à realidade”, disse o ex-Presidente em entrevista à TF1 e à Europe 1. “Nunca cometi um acto contrário aos princípios republicanos ou ao Estado de direito”, garantiu.

O caso provoca grande comoção em França, onde a instituição do Presidente tem especial prestígio e onde há uma forte protecção da sua imunidade. Jacques Chirac, outro antigo Presidente condenado, foi-o por acções cometidas enquanto presidente da câmara de Paris, e acabou por ser condenado a uma pena, suspensa, de prisão, não chegando a ser detido. Sarzoky foi ouvido na segunda-feira e, após chegar ao gabinete anticorrupção da Polícia Judiciária em Nanterre, ficou detido para interrogatório.  “A noite passada que me foi reservada convenceu-me a falar aqui e agora para dizer que estou profundamente chocado e que não exijo nenhum privilégio. Há uma vontade de me humilhar”, disse Sarkozy, comentando a sua detenção. “Se cometi falhas, assumirei todas as consequências, não sou um homem que fuja às suas responsabilidades.”

Na noite de terça-feira, depois de questionado, o ex-Presidente foi conduzido ao Tribunal de Grande Instância de Paris, onde chegou por volta das 23h30 (hora de Paris, menos uma hora em Lisboa), e foi constituído arguido por violação do segredo profissional, corrupção e tráfico de influência activos, segundo um comunicado citado pela agência francesa AFP. Estes crimes têm penas que podem ir até dez anos de prisão.

Sarkozy deixou o local pelas 2h da manhã, precisa o diário Le Monde, 18 horas depois do início do período de detenção (que poderia ser de 24 horas, extensível por mais 24), sem estar submetido a quaisquer medidas de controlo judiciário, indicava ainda o comunicado.

O processo segue agora para a fase de instrução, e depois um juiz decidirá se formaliza uma acusação ou não. Sarkozy já esteve neste papel, no caso de alegado aproveitamento de fragilidade da herdeira da L’Oréal Liliane Bettencourt, mas o caso acabou por não seguir para julgamento.

Agora, está em causa uma alegada tentativa de Sarkozy de obter informações sobre processos em que era investigado – do caso das suspeitas de financiamento ilegal do antigo ditador líbio Muammar Khadafi à sua campanha para as presidenciais de 2007 às verbas dadas por Liliane Bettencourt, herdeira da L’Oréal. Escutas ao seu telefone feitas no início do ano passado pareciam mostrar que o Presidente tinha informação sobre os processos e referiu-se mesmo a alguém que lhe daria essas informações.

O juiz Azibert
Mais: há suspeitas ainda de que prometeu um cargo a um alto magistrado – Gilbert Azibert, também constituído arguido – para não só lhe dar informação como para influenciar o processo. Azibert pediu recentemente que as agendas de Sarkozy, usadas no âmbito do caso Bettencourt, que terminou com Sarkozy ilibado, não pudessem ser usadas noutros processos que decorrem ainda, como o do financiamento líbio – algo que beneficiaria o antigo Presidente. A decisão acabou por ser a contrária e as agendas poderão ser usadas.

As escutas a outros responsáveis revelaram ainda várias tentativas de pessoas próximas de Sarkozy de se informarem sobre o processo líbio, interpelando directamente os investigadores.

Uma das principais razões para a constituição de Sarkozy como arguido terá sido a utilização de um segundo telefone registado num nome falso, com o qual tinha conversas com o seu advogado, que tinha também outro telefone com outro nome. Numa delas, ainda segundo as escutas, teriam combinado conversas para ter nos telefones normais, mostrando saber que estavam sob escuta.

Pelo timing da investigação, no momento em que parecia evidente que Sarkozy se preparava para concorrer à liderança do seu partido como primeiro passo para uma nova candidatura presidencial, os seus apoiantes criticam-na como tendo um objectivo político. O Partido Socialista, no poder, nega qualquer interferência – mas quando surgiram notícias das escutas a ministra da Justiça negou saber da sua existência, o que acabou por prejudicar o já desacreditado Governo socialista, já que se sabe agora que Christiane Taubira tinha sido informada. Para o diário Financial Times, tudo isto contribui para o descrédito da classe política, muito invocado para o crescimento da Frente Nacional, e sublinha que as hipóteses de Marine Le Pen poder ser uma séria candidata à presidência em 2017 não devem ser menorizadas.

As opiniões sobre o que acontecerá agora são variáveis. Mesmo que o processo não siga, ou não acabe com uma condenação, as alegações são demasiado graves para que o antigo Presidente consiga sair delas incólume, diz uma corrente. Outros comentadores relativizam. Se em dois anos Hollande passou para o menos popular Presidente, em três anos Sarkozy, que é neste momento mais popular do que Hollande, poderia ter já deixado este caso para trás.



July 1, 2014 6:30 pm
The waning appeal of Nicolas Sarkozy
Whatever happens in court, he is not a leader for France

Nicolas Sarkozy, France’s former president, always provokes wildly contrasting reactions among his nation’s citizens, whether they be feelings of admiration or contempt. One aspect of the man on which most people would agree is that his burning political ambition never seems to wane.
When he lost the presidential election to François Hollande in 2012, Mr Sarkozy immediately declared he would quit politics. Two years later the French media is speculating about a comeback. With the French centre-right in total disarray, Mr Sarkozy’s supporters say he may try to win the leadership of his UMP party later this year as a first step to regaining the presidency in 2017.
The problem for Mr Sarkozy is that while his ambition may not have deserted him, neither has his past. In recent years he has faced numerous allegations about illegal money-raising for his party’s campaigns. None of those allegations has ever led to a conviction. But on Tuesday the former head of state faced acute embarrassment when he was detained in police custody by an anti-corruption court investigating claims of “influence peddling”. It is thought to be the first time any former French president has been held in this way.
Mr Sarkozy has denied wrongdoing and says the allegations are made up by his political enemies. But even before this week’s events, the drip-drip of corruption claims had put his chances of a political return in jeopardy.
The regularity with which allegations of sleaze are being levelled against top politicians stokes the contempt that French voters feel for their political class. Mr Hollande, who is still struggling to implement a modest set of economic reforms, is plagued by the worst poll ratings of any president in the history of the Fifth Republic. The opposition UMP has been racked by internecine warfare for the past two years.
Alarmingly, this political disarray has created an opening for Marine Le Pen’s far-right Front National. Last month the FN topped the poll in France’s European elections. Ms Le Pen’s chances of mounting a serious challenge for the French presidency in 2017 cannot be dismissed.
Mr Sarkozy’s supporters insist he can overcome his legal difficulties and provide the centre-right with a credible challenger for the presidency. But even assuming he can clear his name, Mr Sarkozy is not the man for the job. As head of state he was bold on foreign policy and struck a tough note on law and order. He is also a brilliant retail politician. But his presidency was damaged by hyperactivity and by a vainglorious image that led to him being dubbed “President Bling-Bling”. Despite his pledge to implement a significant reform programme – a proclaimed “rupture” with the past – he fell short, failing to match words with deeds. The centre-right should look to other, less flawed, figures as a future presidential candidate.
Among France’s neighbours there is a tendency to indulge in a certain schadenfreude over the country’s problems. The talk about a French malaise sometimes goes too far. The country’s gross domestic product is above the level it was in 2008 at the start of the financial crisis. France did not suffer an upheaval in the banking sector on anything like the scale that affected Britain. It remains a country whose culture is cherished and envied in a way that could be said of few others.

This is not, however, to play down legitimate concerns about the political health of France. There is no country in Europe that today suffers so sorely from the absence of mainstream political leadership. Nor is there one where the political prospects for the far right are quite as alarming. France urgently needs new political leaders who, unlike Mr Sarkozy, offer a vision for the nation that is fresh, bold and untainted by the past.

Nicolas Sarkozy contre-attaque. Au lendemain de l'annonce de sa mise en examen pour corruption active, trafic d'influence actif et recel de violation du secret professionnel,  il est sorti de son silence médiatique pour dénoncer, dans un entretien donné à TF1 et Europe 1, « l'instrumentalisation politique d'une partie de la justice aujourd'hui ».
« Tout est fait pour donner une image de moi qui n'est pas conforme à la réalité, déplore-t-il. Dans notre pays, pays des droits de l'homme [...], les Français doivent [...] juger de ce qu'il en est. [...] Je n'ai jamais commis un acte contraire aux principes républicains ou à l'Etat de droit. Il était venu le temps pour moi de m'expliquer.
 In LE MONDE

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