Sarkozy denuncia “a
instrumentalização política da justiça”
MARIA JOÃO
GUIMARÃES e JOANA AMADO 02/07/2014 - PÚBLICO
Ex-Presidente foi constituído arguido por suspeita de corrupção e de
tráfico de influências.
Depois de ter sido detido na terça-feira e interrogado durante cerca de 15
horas, o ex-Presidente francês Nicolas Sarkozy foi constituído arguido por
suspeita de corrupção e de tráfico de influências. Ao fim do dia de
quarta-feira, Sarkozy quebrou o silêncio para clamar inocência e denunciar “a
instrumentalização política da justiça”.
A acusação é
diferente das de outros seis casos em que o antigo chefe de Estado está a ser
investigado, de financiamento ilegal de campanhas ou do partido. E a pergunta
que está na cabeça de todos é se este caso será o travão às cada vez mais
evidentes ambições presidenciais do antigo Presidente. Nas palavras do próprio
Sarkozy, o objectivo dos seus inimigos políticos do governo socialista terá
sido esse mesmo: travar o seu regresso à liderança da UMP (direita) e ao palco
principal da política francesa.
“Tudo isto foi
feito para dar uma imagem de mim que não corresponde à realidade”, disse o
ex-Presidente em entrevista à TF1 e à Europe 1. “Nunca cometi um acto contrário
aos princípios republicanos ou ao Estado de direito”, garantiu.
O caso provoca
grande comoção em França, onde a instituição do Presidente tem especial
prestígio e onde há uma forte protecção da sua imunidade. Jacques Chirac, outro
antigo Presidente condenado, foi-o por acções cometidas enquanto presidente da
câmara de Paris, e acabou por ser condenado a uma pena, suspensa, de prisão,
não chegando a ser detido. Sarzoky foi ouvido na segunda-feira e, após chegar
ao gabinete anticorrupção da Polícia Judiciária em Nanterre, ficou detido para
interrogatório. “A noite passada que me
foi reservada convenceu-me a falar aqui e agora para dizer que estou
profundamente chocado e que não exijo nenhum privilégio. Há uma vontade de me humilhar”,
disse Sarkozy, comentando a sua detenção. “Se cometi falhas, assumirei todas as
consequências, não sou um homem que fuja às suas responsabilidades.”
Na noite de
terça-feira, depois de questionado, o ex-Presidente foi conduzido ao Tribunal
de Grande Instância de Paris, onde chegou por volta das 23h30 (hora de Paris,
menos uma hora em Lisboa), e foi constituído arguido por violação do segredo
profissional, corrupção e tráfico de influência activos, segundo um comunicado
citado pela agência francesa AFP. Estes crimes têm penas que podem ir até dez
anos de prisão.
Sarkozy deixou o
local pelas 2h da manhã, precisa o diário Le Monde, 18 horas depois do início
do período de detenção (que poderia ser de 24 horas, extensível por mais 24),
sem estar submetido a quaisquer medidas de controlo judiciário, indicava ainda
o comunicado.
O processo segue
agora para a fase de instrução, e depois um juiz decidirá se formaliza uma
acusação ou não. Sarkozy já esteve neste papel, no caso de alegado
aproveitamento de fragilidade da herdeira da L’Oréal Liliane Bettencourt, mas o
caso acabou por não seguir para julgamento.
Agora, está em
causa uma alegada tentativa de Sarkozy de obter informações sobre processos em
que era investigado – do caso das suspeitas de financiamento ilegal do antigo
ditador líbio Muammar Khadafi à sua campanha para as presidenciais de 2007 às
verbas dadas por Liliane Bettencourt, herdeira da L’Oréal. Escutas ao seu
telefone feitas no início do ano passado pareciam mostrar que o Presidente
tinha informação sobre os processos e referiu-se mesmo a alguém que lhe daria
essas informações.
O juiz Azibert
Mais: há
suspeitas ainda de que prometeu um cargo a um alto magistrado – Gilbert
Azibert, também constituído arguido – para não só lhe dar informação como para
influenciar o processo. Azibert pediu recentemente que as agendas de Sarkozy,
usadas no âmbito do caso Bettencourt, que terminou com Sarkozy ilibado, não
pudessem ser usadas noutros processos que decorrem ainda, como o do
financiamento líbio – algo que beneficiaria o antigo Presidente. A decisão
acabou por ser a contrária e as agendas poderão ser usadas.
As escutas a
outros responsáveis revelaram ainda várias tentativas de pessoas próximas de
Sarkozy de se informarem sobre o processo líbio, interpelando directamente os
investigadores.
Uma das
principais razões para a constituição de Sarkozy como arguido terá sido a
utilização de um segundo telefone registado num nome falso, com o qual tinha
conversas com o seu advogado, que tinha também outro telefone com outro nome. Numa
delas, ainda segundo as escutas, teriam combinado conversas para ter nos
telefones normais, mostrando saber que estavam sob escuta.
Pelo timing da
investigação, no momento em que parecia evidente que Sarkozy se preparava para
concorrer à liderança do seu partido como primeiro passo para uma nova
candidatura presidencial, os seus apoiantes criticam-na como tendo um objectivo
político. O Partido Socialista, no poder, nega qualquer interferência – mas
quando surgiram notícias das escutas a ministra da Justiça negou saber da sua
existência, o que acabou por prejudicar o já desacreditado Governo socialista,
já que se sabe agora que Christiane Taubira tinha sido informada. Para o diário
Financial Times, tudo isto contribui para o descrédito da classe política,
muito invocado para o crescimento da Frente Nacional, e sublinha que as
hipóteses de Marine Le Pen poder ser uma séria candidata à presidência em 2017
não devem ser menorizadas.
EDITORIAL / FINANCIAL TIMES / http://www.ft.com/intl/cms/s/0/7412621c-0128-11e4-a938-00144feab7de.html?siteedition=intl#axzz36O0p81iJ
July 1, 2014 6:30 pm
The waning appeal of Nicolas Sarkozy
Whatever happens
in court, he is not a leader for France
Nicolas
Sarkozy, France ’s
former president, always provokes wildly contrasting reactions among his
nation’s citizens, whether they be feelings of admiration or contempt. One
aspect of the man on which most people would agree is that his burning
political ambition never seems to wane.
When he
lost the presidential election to François Hollande in 2012, Mr Sarkozy
immediately declared he would quit politics. Two years later the French media
is speculating about a comeback. With the French centre-right in total
disarray, Mr Sarkozy’s supporters say he may try to win the leadership of his
UMP party later this year as a first step to regaining the presidency in 2017.
The problem
for Mr Sarkozy is that while his ambition may not have deserted him, neither
has his past. In recent years he has faced numerous allegations about illegal
money-raising for his party’s campaigns. None of those allegations has ever led
to a conviction. But on Tuesday the former head of state faced acute
embarrassment when he was detained in police custody by an anti-corruption court
investigating claims of “influence peddling”. It is thought to be the first
time any former French president has been held in this way.
Mr Sarkozy
has denied wrongdoing and says the allegations are made up by his political
enemies. But even before this week’s events, the drip-drip of corruption claims
had put his chances of a political return in jeopardy.
The
regularity with which allegations of sleaze are being levelled against top
politicians stokes the contempt that French voters feel for their political
class. Mr Hollande, who is still struggling to implement a modest set of
economic reforms, is plagued by the worst poll ratings of any president in the
history of the Fifth
Republic . The opposition
UMP has been racked by internecine warfare for the past two years.
Alarmingly,
this political disarray has created an opening for Marine Le Pen’s far-right
Front National. Last month the FN topped the poll in France ’s European elections. Ms Le
Pen’s chances of mounting a serious challenge for the French presidency in 2017
cannot be dismissed.
Mr
Sarkozy’s supporters insist he can overcome his legal difficulties and provide
the centre-right with a credible challenger for the presidency. But even
assuming he can clear his name, Mr Sarkozy is not the man for the job. As head
of state he was bold on foreign policy and struck a tough note on law and
order. He is also a brilliant retail politician. But his presidency was damaged
by hyperactivity and by a vainglorious image that led to him being dubbed
“President Bling-Bling”. Despite his pledge to implement a significant reform
programme – a proclaimed “rupture” with the past – he fell short, failing to
match words with deeds. The centre-right should look to other, less flawed,
figures as a future presidential candidate.
Among France ’s
neighbours there is a tendency to indulge in a certain schadenfreude over the
country’s problems. The talk about a French malaise sometimes goes too far. The
country’s gross domestic product is above the level it was in 2008 at the start
of the financial crisis. France
did not suffer an upheaval in the banking sector on anything like the scale
that affected Britain .
It remains a country whose culture is cherished and envied in a way that could
be said of few others.
This is
not, however, to play down legitimate concerns about the political health of France . There
is no country in Europe that today suffers so
sorely from the absence of mainstream political leadership. Nor is there one
where the political prospects for the far right are quite as alarming. France urgently
needs new political leaders who, unlike Mr Sarkozy, offer a vision for the
nation that is fresh, bold and untainted by the past.
Nicolas Sarkozy
contre-attaque. Au lendemain de l'annonce de sa mise en examen pour corruption
active, trafic d'influence actif et recel de violation du secret
professionnel, il est sorti de son
silence médiatique pour dénoncer, dans un entretien donné à TF1 et Europe 1, «
l'instrumentalisation politique d'une partie de la justice aujourd'hui ».
« Tout est fait
pour donner une image de moi qui n'est pas conforme à la réalité, déplore-t-il.
Dans notre pays, pays des droits de l'homme [...], les Français doivent [...]
juger de ce qu'il en est. [...] Je n'ai jamais commis un acte contraire aux
principes républicains ou à l'Etat de droit. Il était venu le temps pour moi de m'expliquer.
In LE MONDE
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