sábado, 18 de junho de 2022

“Uma falha” mais no SEF levará “à substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto”

 



ENTREVISTA

“Uma falha” mais no SEF levará “à substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto”

 

O ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, afirma que a construção do novo aeroporto “é mesmo uma questão de interesse nacional” e defende o encontro de um “amplo consenso social”, incluindo com o PSD.

 


São José Almeida

18 de Junho de 2022, 6:30

https://www.publico.pt/2022/06/18/politica/entrevista/falha-sef-levara-substituicao-imediata-responsabilidade-aeroporto-2010347

 

O ministro da Administração Interna assume que tentará antecipar o reforço de agentes do SEF no aeroporto de Lisboa

 

O ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro, garante que o reforço de meios humanos nos aeroportos será completado até ao início de Julho. Entretanto, foram aumentados e actualizados os meios electrónicos de identificação dos passageiros que desembarcam em Portugal. Tudo para evitar aglomerações na Portela, como a que ocorreu na segunda-feira. Que se deveu a uma “falha”, explica José Luís Carneiro. A saber: “A equipa de contingência” estava preparada, mas “não foi mobilizada, porque não houve informação da equipa que estava no aeroporto para a direcção nacional”. E assume que a situação “não pode voltar a repetir-se”.

 

O reforço de agentes do SEF no aeroporto de Lisboa já foi feito?

Este plano tem três tipos de resposta conjugada. Um é o reforço de meios humanos, que integra dois tipos de elementos. Os elementos da PSP que terminaram a sua formação teórica entraram em formação prática e encontram-se, embora sob a supervisão dos inspectores do SEF, já em reforço dos meios.

 

Já estão a estagiar?

Já e a fazer trabalho de primeira linha. Há também a mobilização de recursos humanos do SEF, de outras unidades orgânicas. Este reforço, que está previsto no plano de contingência, ficará todo ele desenvolvido até dia 4 de Julho e acabámos de tomar a decisão de antecipar entre 8 a 15 dias este período de reforço em função da disponibilidade. Mas já há reforço de funcionários do SEF e da PSP.

 

E os meios tecnológicos?

Temos também um conjunto de portas electrónicas que permitem a leitura facial e leitura documental, nomeadamente do passaporte electrónico. E, neste caso, não é necessária nenhuma outra triagem. Quem recorre às portas electrónicas, a partir daí passa a fronteira.

 

Isso entrou em vigor esta semana para os passageiros vindos do Canadá e dos Estados Unidos?

Tínhamos antes cinco nacionalidades a usar este meio: Reino Unido, Singapura, Japão, Austrália e Nova Zelândia. Acabaram de entrar o Canadá e Estados Unidos. Esta dimensão de reforço das portas electrónicas acompanha o reforço dos meios humanos. Acresce uma outra solução que o SEF já tinha desenvolvido durante a pandemia, mas que agora estamos a procurar alargar, sobretudo para quem está em trânsito e não fica em Portugal. É o SEF Mobile, que permite fazer leitura dos dados do passaporte a partir de uma base de dados.

 

Isso já está a ser utilizado?

O SEF Mobile já foi utilizado nos primeiros dias. Isto obriga a ter os agentes junto das saídas dos aviões e, como estávamos a necessitar deles para mantermos as boxes abertas, fomos forçados a recuar e a garantir as boxes abertas. Há outra solução que está em estudo para o futuro, que é o prévio screening [triagem] antes da saída dos países terceiros. Depois, há uma terceira dimensão deste plano que tem que ver com a monitorização do que está a acontecer no aeroporto.

 

Como é feita?

Tínhamos dois directores nacionais adjuntos, na quarta-feira foi designado mais um, que está concentrado exclusivamente no que se está a desenvolver nos aeroportos nacionais e muito particularmente no aeroporto de Lisboa, e que tem como principal missão supervisionar a implementação do plano de contingência. Este plano tem também mais uma equipa técnica e ao nível tecnológico, informático, que teve que fazer a actualização de todo o software que tínhamos. Porque, desde o “Brexit”, ainda não tinha sido actualizado e teve de o ser por forma a permitir, em todas as máquinas electrónicas, a leitura electrónica do passaporte. Porque havia falhas, porque estava desactualizado o software dessa tecnologia. Esta equipa tecnológica está também operacional todos os dias. Para além disso, há uma equipa de contingência preparada de inspectores do SEF, que é mobilizada sempre que se justifica.

 

Não se pode repetir falhas desta natureza. Uma falha desta natureza tem que levar à substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto. Esta foi a orientação que foi transmitida à Direcção Nacional do SEF

 

Então que se passou na segunda-feira?

Ela não foi mobilizada, porque não houve informação da equipa que estava no aeroporto para a direcção nacional.

 

Mas essa falha não pode acontecer.

Não se pode repetir falhas desta natureza. Uma falha desta natureza tem que levar à substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto. Esta foi a orientação que foi transmitida à Direcção Nacional do SEF. Porque, quando se detecta que está a haver uma sobre concentração de chegadas, há uma equipa de contingência que é mobilizada por parte do director nacional do SEF. Não foi mobilizada na segunda-feira que passou porque não foi comunicada essa falha. Mas já foi referido que não pode voltar a repetir-se.

 

Este problema está a acontecer em aeroportos de vários países e tem a ver com a retoma pós-covid. Nos outros países, sabe-se que foram despedidos funcionários, mas no SEF não.

Há hoje uma realidade aeroportuária em toda a Europa que mostra que está a haver um pico de procura que, em horas determinadas, já ultrapassa os picos de procura de 2019. São dados muito objectivos. Segundo os dados da Da Vinci em relação ao aeroporto de Lisboa, entre as 6h e as 12h, o pico da procura já ultrapassa os picos de 2019. Isto entre o dia 1 e 13 de Junho. O que se verifica é que há aeroportos na Europa em que a justificação que tem vindo a ser dada tem a ver com o facto de ter havido dispensa de pessoal no decurso da pandemia e agora têm de voltar a contratar recursos humanos com competências específicas e é difícil contratá-los. No caso do aeroporto de Lisboa, aquilo que nós podemos dizer é que há aqui hoje uma maior procura do SEF. Mas estamos a procurar garantir que, nas horas de maior afluxo, as 16 boxes estejam sempre a produzir.

 

Se tivermos as 16 boxes [do SEF] sempre em produção, ou seja, se tivermos um período que não demore mais de 30 segundos a um minuto por passageiro, temos capacidade de resposta, sem filas, até aos 1850 passageiros. […] A questão é que, chegando picos de quatro, cinco mil pessoas, como é evidente, não há capacidade de resposta

Por causa dessa hiper concentração entre as 6h e as 12h, dos voos intercontinentais e de fora do espaço Schengen –​ que têm de obedecer a esse tipo de controlo mais apurado –​, por que é que não tentam escalar o horário de chegada ao longo do dia e negociar isso com as companhias aéreas?

Esse é um trabalho que tem que ser feito pela ANA Aeroportos, nomeadamente com as companhias e também com as outras entidades que tratam de toda a dimensão ligada aos fluxos aéreos e turísticos. O que me é transmitido é que a TAP procurou aproveitar e valorizar as oportunidades de mercado, porque tem que efectivamente se tornar sustentável. E sobre concentrou a resposta no período da manhã. É uma matéria que não depende da minha vontade. Mas é evidente que é desejável que haja um diálogo e uma articulação entre quem, e bem, quer aproveitar as oportunidades do mercado, mas depois também com as capacidades do próprio aeroporto para acolher e integrar convenientemente quem nos procura.

 

Há um dado muito relevante. Se tivermos as 16 boxes sempre em produção, ou seja, se tivermos um período que não demore mais de 30 segundos a um minuto por passageiro, temos capacidade de resposta, sem filas, até aos 1850 passageiros. Com tempos de espera muito curtos. A questão é que, chegando picos de quatro, cinco mil pessoas, como é evidente, não há capacidade de resposta. Por muito que os trabalhadores do SEF e da PSP desenvolvam a sua actividade com muito brio profissional, não é possível sem tempos de espera.

 

Mia Couto disse, em relação ao que se passou na segunda-feira, que as esperas de cinco horas que se viram na Portela são “um atentado contra a tradição portuguesa de bem receber os outros”. Teme os impactos negativos destes fenómenos na imagem externa de Portugal?

Li com atenção e, naturalmente, com preocupação e também compreensão, as palavras do Mia Couto, como de muitos outros cidadãos que se pronunciaram perante essas esperas que tiveram no aeroporto. Mas é um fenómeno ao qual nós podemos responder, encontrando condições de resposta, nomeadamente do ponto de vista da verificação documental. É evidente que é necessário efectuar verificações documentais para garantir a segurança do Estado português e garantir a segurança do espaço Schengen. Mas, nesse dia, também ocorreu que foram detectados documentos falsos e declarações que não eram válidas à luz da lei. E os agentes do SEF tiveram que sair das boxes e acompanhá-los à segunda linha de fiscalização. É também muito importante que os cidadãos tenham consciência disto, há medidas cautelares de serviços de cooperação policial internacional que são comunicadas aos inspectores que estão no aeroporto e, quando estes detectam esses casos, também têm o dever de levá-los aos locais onde têm que ser ouvidos.

 

Qual tem sido a disponibilidade da ANA para melhorar a situação?

A ANA Aeroportos está a fazer um esforço articulado connosco. O plano de contingência foi articulado com o Ministério das Infra-estruturas, com o Ministério da Economia, com a Secretaria de Estado do Turismo e foi articulado com a ANA Aeroportos. Tive também uma reunião de trabalho com a TAP e outra com o Turismo de Portugal. Nessas reuniões, cada parte comprometeu-se com um esforço, tendo em consideração que a previsão de crescimento é muito significativa. Arranjando a ANA mais espaço, nós estamos disponíveis para mobilizar mais inspectores para termos um maior número de boxes, em vez das actuais 16.

 

Mas há espaço para isso?

Essa avaliação só pode ser feita pelo aeroporto. Por outro lado, há um problema de informação e de encaminhamento de passageiros. Há muitos passageiros que se dirigem aos inspectores a perguntar para onde se devem encaminhar. Essa informação prévia pode ser feita dentro do avião ou quando se chega, com sinalética, com informação visual ou audiovisual.

 

Tem que haver um investimento por parte da ANA também para melhorar as condições?

Há um trabalho de informação, de esclarecimento e de acompanhamento de passageiros, que é o que está a ser feito no seguimento deste trabalho de coordenação. A ANA está, por exemplo, a recrutar um conjunto de jovens que estão a ser preparados para, precisamente, quando as pessoas saem, dar a informação. Por exemplo, há um baixo uso das portas electrónicas, porque as pessoas não sabem que as podem utilizar. Esse é um trabalho em que a ANA está efectivamente comprometida e em permanente diálogo connosco. Agora, é evidente que o aeroporto tem limitações de espaço.

 

Eu, mais do que acreditar, entendo que [a construção do novo aeroporto] é mesmo uma questão de interesse nacional

 

Que prioridade vai dar o Governo à construção do novo aeroporto?

Essa é uma pergunta que não pode ser feita ao ministro da Administração Interna. O que lhe posso dizer é que essa é uma prioridade do Governo desde a primeira legislatura. Houve dois compromissos que foram assumidos por parte do primeiro-ministro. O primeiro era o compromisso de, nos grandes investimentos, haver um amplo consenso social. Aliás, criou-se mesmo um plano nacional de investimentos em infra-estruturas públicas de transportes. Em segundo lugar, embora não fosse a posição anterior do PS, o governo PSD/CDS adoptou a solução do Montijo. Nós, na busca da estabilidade nas opções, mantivemos essa opção. Mas o dr. Rui Rio não mostrou disponibilidade de apoio à solução. Detectou-se também o problema do parecer favorável das autarquias. Por isso, o primeiro-ministro deu conta de que queria, durante Julho, falar com o novo líder do PSD para com ele discutir um conjunto de questões, entre as quais esta.

 

Acredita que se vai atingir esse consenso?

Eu, mais do que acreditar, entendo que é mesmo uma questão de interesse nacional.

 

Quando fala em interesse nacional, refere-se ao cenário preocupante que o ministro Pedro Nuno Santos previu, esta semana, de que, para o ano, Portugal pode ter que recusar voos, ou seja, recusar turistas?

O que o ministro das Infra-estruturas disse tem que ver com a realidade que já é hoje observável em vários aeroportos internacionais de cancelamentos de voos. E é evidente que, se tivéssemos uma infra-estrutura aeroportuária com outro potencial, estaríamos hoje a aproveitar oportunidades de captação de turistas para o país que, por impossibilidade do aeroporto, não estão a ser devidamente aproveitadas. O ministro das Infra-estruturas tem toda a razão quando diz que, efectivamente, é necessário encontrar um amplo consenso político em torno deste objectivo nacional.

 

tp.ocilbup@adiemla.esoj.oas

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