ENTREVISTA
“Uma falha” mais no SEF levará “à substituição imediata
de quem tem essa responsabilidade no aeroporto”
O ministro da Administração Interna, José Luís Carneiro,
afirma que a construção do novo aeroporto “é mesmo uma questão de interesse
nacional” e defende o encontro de um “amplo consenso social”, incluindo com o
PSD.
São José Almeida
18 de Junho de
2022, 6:30
O ministro da Administração Interna assume que tentará
antecipar o reforço de agentes do SEF no aeroporto de Lisboa
O ministro da
Administração Interna, José Luís Carneiro, garante que o reforço de meios
humanos nos aeroportos será completado até ao início de Julho. Entretanto,
foram aumentados e actualizados os meios electrónicos de identificação dos
passageiros que desembarcam em Portugal. Tudo para evitar aglomerações na
Portela, como a que ocorreu na segunda-feira. Que se deveu a uma “falha”,
explica José Luís Carneiro. A saber: “A equipa de contingência” estava
preparada, mas “não foi mobilizada, porque não houve informação da equipa que
estava no aeroporto para a direcção nacional”. E assume que a situação “não
pode voltar a repetir-se”.
O reforço de
agentes do SEF no aeroporto de Lisboa já foi feito?
Este plano tem
três tipos de resposta conjugada. Um é o reforço de meios humanos, que integra
dois tipos de elementos. Os elementos da PSP que terminaram a sua formação
teórica entraram em formação prática e encontram-se, embora sob a supervisão
dos inspectores do SEF, já em reforço dos meios.
Já estão a
estagiar?
Já e a fazer
trabalho de primeira linha. Há também a mobilização de recursos humanos do SEF,
de outras unidades orgânicas. Este reforço, que está previsto no plano de
contingência, ficará todo ele desenvolvido até dia 4 de Julho e acabámos de
tomar a decisão de antecipar entre 8 a 15 dias este período de reforço em
função da disponibilidade. Mas já há reforço de funcionários do SEF e da PSP.
E os meios
tecnológicos?
Temos também um
conjunto de portas electrónicas que permitem a leitura facial e leitura documental,
nomeadamente do passaporte electrónico. E, neste caso, não é necessária nenhuma
outra triagem. Quem recorre às portas electrónicas, a partir daí passa a
fronteira.
Isso entrou em
vigor esta semana para os passageiros vindos do Canadá e dos Estados Unidos?
Tínhamos antes
cinco nacionalidades a usar este meio: Reino Unido, Singapura, Japão, Austrália
e Nova Zelândia. Acabaram de entrar o Canadá e Estados Unidos. Esta dimensão de
reforço das portas electrónicas acompanha o reforço dos meios humanos. Acresce
uma outra solução que o SEF já tinha desenvolvido durante a pandemia, mas que
agora estamos a procurar alargar, sobretudo para quem está em trânsito e não
fica em Portugal. É o SEF Mobile, que permite fazer leitura dos dados do
passaporte a partir de uma base de dados.
Isso já está a
ser utilizado?
O SEF Mobile já
foi utilizado nos primeiros dias. Isto obriga a ter os agentes junto das saídas
dos aviões e, como estávamos a necessitar deles para mantermos as boxes
abertas, fomos forçados a recuar e a garantir as boxes abertas. Há outra
solução que está em estudo para o futuro, que é o prévio screening [triagem]
antes da saída dos países terceiros. Depois, há uma terceira dimensão deste
plano que tem que ver com a monitorização do que está a acontecer no aeroporto.
Como é feita?
Tínhamos dois
directores nacionais adjuntos, na quarta-feira foi designado mais um, que está
concentrado exclusivamente no que se está a desenvolver nos aeroportos
nacionais e muito particularmente no aeroporto de Lisboa, e que tem como
principal missão supervisionar a implementação do plano de contingência. Este
plano tem também mais uma equipa técnica e ao nível tecnológico, informático,
que teve que fazer a actualização de todo o software que tínhamos. Porque,
desde o “Brexit”, ainda não tinha sido actualizado e teve de o ser por forma a
permitir, em todas as máquinas electrónicas, a leitura electrónica do
passaporte. Porque havia falhas, porque estava desactualizado o software dessa
tecnologia. Esta equipa tecnológica está também operacional todos os dias. Para
além disso, há uma equipa de contingência preparada de inspectores do SEF, que
é mobilizada sempre que se justifica.
Não se pode
repetir falhas desta natureza. Uma falha desta natureza tem que levar à
substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto. Esta foi
a orientação que foi transmitida à Direcção Nacional do SEF
Então que se
passou na segunda-feira?
Ela não foi
mobilizada, porque não houve informação da equipa que estava no aeroporto para
a direcção nacional.
Mas essa falha
não pode acontecer.
Não se pode
repetir falhas desta natureza. Uma falha desta natureza tem que levar à
substituição imediata de quem tem essa responsabilidade no aeroporto. Esta foi
a orientação que foi transmitida à Direcção Nacional do SEF. Porque, quando se
detecta que está a haver uma sobre concentração de chegadas, há uma equipa de
contingência que é mobilizada por parte do director nacional do SEF. Não foi
mobilizada na segunda-feira que passou porque não foi comunicada essa falha.
Mas já foi referido que não pode voltar a repetir-se.
Este problema
está a acontecer em aeroportos de vários países e tem a ver com a retoma pós-covid.
Nos outros países, sabe-se que foram despedidos funcionários, mas no SEF não.
Há hoje uma
realidade aeroportuária em toda a Europa que mostra que está a haver um pico de
procura que, em horas determinadas, já ultrapassa os picos de procura de 2019.
São dados muito objectivos. Segundo os dados da Da Vinci em relação ao
aeroporto de Lisboa, entre as 6h e as 12h, o pico da procura já ultrapassa os
picos de 2019. Isto entre o dia 1 e 13 de Junho. O que se verifica é que há
aeroportos na Europa em que a justificação que tem vindo a ser dada tem a ver
com o facto de ter havido dispensa de pessoal no decurso da pandemia e agora
têm de voltar a contratar recursos humanos com competências específicas e é
difícil contratá-los. No caso do aeroporto de Lisboa, aquilo que nós podemos
dizer é que há aqui hoje uma maior procura do SEF. Mas estamos a procurar
garantir que, nas horas de maior afluxo, as 16 boxes estejam sempre a produzir.
Se tivermos as 16
boxes [do SEF] sempre em produção, ou seja, se tivermos um período que não
demore mais de 30 segundos a um minuto por passageiro, temos capacidade de
resposta, sem filas, até aos 1850 passageiros. […] A questão é que, chegando
picos de quatro, cinco mil pessoas, como é evidente, não há capacidade de
resposta
Por causa dessa
hiper concentração entre as 6h e as 12h, dos voos intercontinentais e de fora
do espaço Schengen – que têm de obedecer a esse tipo de controlo mais apurado
–, por que é que não tentam escalar o horário de chegada ao longo do dia e
negociar isso com as companhias aéreas?
Esse é um
trabalho que tem que ser feito pela ANA Aeroportos, nomeadamente com as
companhias e também com as outras entidades que tratam de toda a dimensão
ligada aos fluxos aéreos e turísticos. O que me é transmitido é que a TAP
procurou aproveitar e valorizar as oportunidades de mercado, porque tem que
efectivamente se tornar sustentável. E sobre concentrou a resposta no período
da manhã. É uma matéria que não depende da minha vontade. Mas é evidente que é
desejável que haja um diálogo e uma articulação entre quem, e bem, quer
aproveitar as oportunidades do mercado, mas depois também com as capacidades do
próprio aeroporto para acolher e integrar convenientemente quem nos procura.
Há um dado muito
relevante. Se tivermos as 16 boxes sempre em produção, ou seja, se tivermos um
período que não demore mais de 30 segundos a um minuto por passageiro, temos
capacidade de resposta, sem filas, até aos 1850 passageiros. Com tempos de
espera muito curtos. A questão é que, chegando picos de quatro, cinco mil
pessoas, como é evidente, não há capacidade de resposta. Por muito que os
trabalhadores do SEF e da PSP desenvolvam a sua actividade com muito brio
profissional, não é possível sem tempos de espera.
Mia Couto disse,
em relação ao que se passou na segunda-feira, que as esperas de cinco horas que
se viram na Portela são “um atentado contra a tradição portuguesa de bem
receber os outros”. Teme os impactos negativos destes fenómenos na imagem
externa de Portugal?
Li com atenção e,
naturalmente, com preocupação e também compreensão, as palavras do Mia Couto,
como de muitos outros cidadãos que se pronunciaram perante essas esperas que
tiveram no aeroporto. Mas é um fenómeno ao qual nós podemos responder,
encontrando condições de resposta, nomeadamente do ponto de vista da
verificação documental. É evidente que é necessário efectuar verificações
documentais para garantir a segurança do Estado português e garantir a segurança
do espaço Schengen. Mas, nesse dia, também ocorreu que foram detectados
documentos falsos e declarações que não eram válidas à luz da lei. E os agentes
do SEF tiveram que sair das boxes e acompanhá-los à segunda linha de
fiscalização. É também muito importante que os cidadãos tenham consciência
disto, há medidas cautelares de serviços de cooperação policial internacional
que são comunicadas aos inspectores que estão no aeroporto e, quando estes
detectam esses casos, também têm o dever de levá-los aos locais onde têm que
ser ouvidos.
Qual tem sido a
disponibilidade da ANA para melhorar a situação?
A ANA Aeroportos
está a fazer um esforço articulado connosco. O plano de contingência foi
articulado com o Ministério das Infra-estruturas, com o Ministério da Economia,
com a Secretaria de Estado do Turismo e foi articulado com a ANA Aeroportos.
Tive também uma reunião de trabalho com a TAP e outra com o Turismo de
Portugal. Nessas reuniões, cada parte comprometeu-se com um esforço, tendo em
consideração que a previsão de crescimento é muito significativa. Arranjando a
ANA mais espaço, nós estamos disponíveis para mobilizar mais inspectores para
termos um maior número de boxes, em vez das actuais 16.
Mas há espaço
para isso?
Essa avaliação só
pode ser feita pelo aeroporto. Por outro lado, há um problema de informação e
de encaminhamento de passageiros. Há muitos passageiros que se dirigem aos
inspectores a perguntar para onde se devem encaminhar. Essa informação prévia
pode ser feita dentro do avião ou quando se chega, com sinalética, com
informação visual ou audiovisual.
Tem que haver um
investimento por parte da ANA também para melhorar as condições?
Há um trabalho de
informação, de esclarecimento e de acompanhamento de passageiros, que é o que
está a ser feito no seguimento deste trabalho de coordenação. A ANA está, por
exemplo, a recrutar um conjunto de jovens que estão a ser preparados para,
precisamente, quando as pessoas saem, dar a informação. Por exemplo, há um
baixo uso das portas electrónicas, porque as pessoas não sabem que as podem
utilizar. Esse é um trabalho em que a ANA está efectivamente comprometida e em
permanente diálogo connosco. Agora, é evidente que o aeroporto tem limitações
de espaço.
Eu, mais do que acreditar, entendo que [a construção do
novo aeroporto] é mesmo uma questão de interesse nacional
Que prioridade
vai dar o Governo à construção do novo aeroporto?
Essa é uma
pergunta que não pode ser feita ao ministro da Administração Interna. O que lhe
posso dizer é que essa é uma prioridade do Governo desde a primeira
legislatura. Houve dois compromissos que foram assumidos por parte do
primeiro-ministro. O primeiro era o compromisso de, nos grandes investimentos,
haver um amplo consenso social. Aliás, criou-se mesmo um plano nacional de investimentos
em infra-estruturas públicas de transportes. Em segundo lugar, embora não fosse
a posição anterior do PS, o governo PSD/CDS adoptou a solução do Montijo. Nós,
na busca da estabilidade nas opções, mantivemos essa opção. Mas o dr. Rui Rio
não mostrou disponibilidade de apoio à solução. Detectou-se também o problema
do parecer favorável das autarquias. Por isso, o primeiro-ministro deu conta de
que queria, durante Julho, falar com o novo líder do PSD para com ele discutir
um conjunto de questões, entre as quais esta.
Acredita que se
vai atingir esse consenso?
Eu, mais do que
acreditar, entendo que é mesmo uma questão de interesse nacional.
Quando fala em
interesse nacional, refere-se ao cenário preocupante que o ministro Pedro Nuno
Santos previu, esta semana, de que, para o ano, Portugal pode ter que recusar
voos, ou seja, recusar turistas?
O que o ministro
das Infra-estruturas disse tem que ver com a realidade que já é hoje observável
em vários aeroportos internacionais de cancelamentos de voos. E é evidente que,
se tivéssemos uma infra-estrutura aeroportuária com outro potencial, estaríamos
hoje a aproveitar oportunidades de captação de turistas para o país que, por
impossibilidade do aeroporto, não estão a ser devidamente aproveitadas. O
ministro das Infra-estruturas tem toda a razão quando diz que, efectivamente, é
necessário encontrar um amplo consenso político em torno deste objectivo
nacional.
tp.ocilbup@adiemla.esoj.oas



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