“A historiadora Raquel Varela intitula-se sem falsa
modéstia como “uma das mais importantes divulgadoras de ciência no país”
(https://raquelcardeiravarela.wordpress.com. acesso a 17/9/2021), mas as suas
constantes intervenções públicas relacionadas com a temática da covid-19 não
têm sido mais que a reprodução da desinformação científica repescada das redes
sociais negacionistas.”
Pedro Abreu
OPINIÃO
Sobre a ética académica
Deverão as universidades ignorar o conteúdo da informação
científica veiculada pelos seus assalariados nos casos em que os padrões éticos
na interação com a sociedade e divulgação pública da ciência não são
observados?
Pedro Abreu
23 de Setembro de
2021, 0:30
https://www.publico.pt/2021/09/23/opiniao/opiniao/etica-academica-1978431
A retirada do
apoio do Instituto de História Contemporânea (IHC) da Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas à candidatura da investigadora Raquel Varela ao Concurso de
Estímulo ao Emprego Científico Individual promovido pela Fundação para a
Ciência e a Tecnologia, devido à existência de “erros” no seu currículo que
faziam aumentar a contabilidade da produção científica (PÚBLICO, 20/9/2021;
21/9/2021), deu origem a uma polémica que remete para o plano dos valores e
normas de conduta contemplados no Código de Ética da Universidade Nova de
Lisboa (UNL).
A conflitualidade
no universo dos docentes e investigadores do ensino superior tem quase sempre
origem no que o PÚBLICO classificou eufemisticamente como “erros”. “Erros” de
avaliação curricular dos júris nos concursos para progressão na carreira,
“erros” nos Editais dos concursos que favorecem à partida este ou aquele
candidato, “erros” dos candidatos na apresentação dos respetivos curricula,
“erros” na redação de teses de mestrado e doutoramento que consubstanciam
situações de plágio e auto-plágio, e “erros” na divulgação de resultados de
divulgação científica. Em muitos casos estes “erros” resultam em processos
judiciais que se arrastam ad aeternum nos tribunais administrativos.
As universidades
públicas têm vindo a aprovar desde 2012 Códigos de Conduta Ética, Deontologia,
Boas Práticas e Integridade Académica, que se destinam a toda a comunidade
académica: docentes e investigadores, trabalhadores não docentes e não
investigadores, bolseiros de investigação, estudantes e visitantes. Estes
regulamentos, uns mais detalhados que outros, “estabelecem um conjunto de
valores e normas de conduta que deverão orientar a Instituição no exercício das
suas atividades de ensino e aprendizagem, formação, investigação científica e
interação com a sociedade, alicerçando-se nos princípios éticos da equidade e
justiça, do respeito pela dignidade humana, não discriminação e igualdade de
oportunidades e da responsabilidade pessoal e profissional” (in Código de Ética
da UNL).
De entre as
inúmeras situações passíveis de sanções que violam a integridade do investigador,
inclui-se a utilização de falsas informações curriculares. Às Comissões de
Ética compete analisar e emitir parecer sobre situações de eventuais quebras de
conduta que lhes sejam reportadas. Caso a violação do Código de Conduta tenha
implicações disciplinares, compete aos órgãos de gestão darem seguimento aos
processos.
Em relação aos
docentes e investigadores que exercem atividade de comentadores e articulistas
nos media, essa intervenção é quase sempre feita a título pessoal e não vincula
nem compromete a instituição de que fazem parte. Mas deverão as universidades
ignorar o conteúdo da informação científica veiculada pelos seus assalariados
nos casos em que os padrões éticos na interação com a sociedade e divulgação
pública da ciência não são observados?
Tanto o caso que está na origem da polémica entre Raquel
Varela e o IHC, como a desinformação científica que esta investigadora divulga
nos media, deveriam ser objeto de apreciação pelo Conselho de Ética da UNL
A historiadora
Raquel Varela intitula-se sem falsa modéstia como “uma das mais importantes
divulgadoras de ciência no país” (https://raquelcardeiravarela.wordpress.com.
acesso a 17/9/2021), mas as suas constantes intervenções públicas relacionadas
com a temática da covid-19 não têm sido mais que a reprodução da desinformação
científica repescada das redes sociais negacionistas. A este propósito já aqui
tive oportunidade de referir a tomada de posição do Centre National de la
Recherche Scientifique (CNRS) contra um dos seus diretores de investigação de
sociologia, e seguidor dos movimentos negacionistas e anti-vacinas: “O CNRS
lamenta as posições públicas tomadas por alguns cientistas, muitas vezes mais
preocupados com a glória efémera dos media do que com a verdade científica,
sobre assuntos longe das suas áreas de competência profissional.”
Deste modo, tanto
o caso que está na origem da polémica entre Raquel Varela e o IHC, como a
desinformação científica que esta investigadora divulga nos media, deveriam ser
objeto de apreciação pelo Conselho de Ética da UNL.
O autor escreve
segundo o novo acordo ortográfico



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