sexta-feira, 6 de dezembro de 2019

EDP acusada de cortar ilegalmente mais de 100 sobreiros na serra do Caldeirão



Carlos Lopes, disse ao PÚBLICO que “não se trata de um abate de sobreiros, mas sim de cortes de ramos”. Carlos Lopes admitiu, no entanto, que houve árvores “que sofreram um corte um pouco mais agressivo”. ( !!!! ???? !!!! )

ALGARVE
EDP acusada de cortar ilegalmente mais de 100 sobreiros na serra do Caldeirão

O Instituto da Conservação da Natureza e Florestas embargou a obra. Árvores protegidas, algumas delas centenárias, foram abatidas ou cortadas. EDP diz que só houve corte de ramos

Idálio Revez 6 de Dezembro de 2019, 6:39

Mais de 100 sobreiros foram abatidos ou cortados na serra Caldeirão sem autorização do Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF). A operação, ordenada pela EDP, está a ser desenvolvida de forma “indiscriminada e sem fiscalização”, acusa o presidente da Associação de Produtores Florestais da Serra do Caldeirão, Gilberto Pereira, adiantando que, na última semana, a associação recebeu a queixa de 13 proprietários lesados. Os trabalhos foram embargados ontem pelo ICNF, mas os danos ambientais não são reparáveis. Árvores centenárias, protegidas por lei, ficaram reduzidas a troncos, sem hipótese de sobrevivência.

A obra foi entregue à empresa Ecorede - Engenharia e Serviços. O objectivo era que se procedesse à limpeza da Rede Secundária de Gestão de Combustível nas linhas de Média Tensão da EDP na zona do Barranco do Velho. O engenheiro florestal Pedro Jesus, da associação representante dos proprietários, diz que “foram derrubados mais de uma centena de sobreiros e há 13 proprietários lesados”. Nesta quarta-feira, em Loulé, durante a reunião da Comissão Municipal da Defesa da Floresta Contra Incêndios — destinada a fazer o balanço do ano ao nível da prevenção contra incêndios — a questão dos cortes abusivos foi levantada. “Não havia, aparentemente, conhecimento do que se estava a passar”, disse Pedro Jesus, adiantando que a comissão integra elementos do ICNF, GNR, EDP, entre outros organismos com responsabilidade na gestão do território.

O responsável regional da EDP por esta área, Carlos Lopes, disse ao PÚBLICO que “não se trata de um abate de sobreiros, mas sim de cortes de ramos”. Carlos Lopes admitiu, no entanto, que houve árvores “que sofreram um corte um pouco mais agressivo”. Este responsável esteve presente na reunião de quarta-feira em Loulé e nesse encontro, diz Carlos Lopes, o que foi referido foi que houve abates de sobreiros, mas noutro local — a EN 2, da responsabilidade da Estradas de Portugal. Sobre o embargo do ICNF, Carlos Lopes diz que os trabalhos estão suspensos.

A primeira queixa sobre os abates destas árvores surgiu no dia 28 através da linha SOS Ambiente. “Passei pela Quintã, estavam a serrar os sobreiros na minha propriedade sem que tivesse havido qualquer aviso ou pedido de autorização”, disse ao PÚBLICO Sérgio Pereira, indignado. “Para cortarmos um sobreiro ou azinheira, secos, esperamos duas ou três semanas pela autorização e estamos sujeitos a multas se não cumprimos todas as formalidades. Neste caso, cortaram a torto e a direito e nada acontece.”

O director regional do ICNF, Castelão Rodrigues, informou que a operação, em área de Rede Natura, não está autorizada. “Não foi pedida licença para os trabalhos e está a decorrer um processo de contra-ordenação à EDP”, adiantou. O valor da coima pode oscilar entre os 50 e os 150 mil euros. “Tirei fotografias e posso mostrar”, prontifica-se Sérgio Pereira, para garantir que as responsabilidades são apuradas.

Durante a manhã de ontem, o PÚBLICO encontrou no local uma equipa da empresa All Fix, da Lousada, com uma viatura da Ecorede. “Houve cortes em demasia, viemos rectificar”, disse um dos elementos da equipa constituída por dois electricistas e dois ajudantes, quando interpelado por Pedro Jesus. “Como é possível corrigir o corte de um sobreiro, serrado ao meio, como se fosse uma oliveira?”, questionou este engenheiro florestal.

 Pouco depois entraram em acção as brigadas da GNR de Salir e do ICNF. Cumpriram a formalidade das identificações  e lavraram os autos de notícia. A vigilante da natureza, depois de um telefonema para as chefias, deu ordem de embargo dos trabalhos. “Cometem um crime de desobediência se continuarem”, avisa o guarda da GNR, perguntando: “Estão sozinhos?” A resposta sacudiu responsabilidades: “A outra equipa [a que teria feito os maiores estragos] já partiu”. Os trabalhos cessaram, ficaram na serra o que restava dos sobreiros.

“É chocante o que se vê”
Descendo a montanha, na direcção da Quintã, verifica-se que não foi só cortado o mato e os ramos das árvores que ameaçavam os cabos eléctricos. “Esperemos que as instituições públicas cumpram o seu papel de punir os responsáveis”, sublinha o presidente da associação de produtores Gilberto Pereira. “É chocante aquilo que se vê.”

A Associação de Produtores Florestais da Serra do Caldeirão gere quatro Zonas de Intervenção Florestal (ZIF), correspondendo a 12 mil hectares. Em formação tem mais seis ZIF, que cobrem 21.500 hectares. “Não se percebe porque é que as instituições que estão no terreno não são ouvidas, quando se pretende fazer este tipo de intervenções. Nós somos os primeiros interessados em que não haja incêndios”, rematou.

Mas os cortes não se ficam por aqui. Ainda na serra do Caldeirão, a Estrada Nacional (EN) 2, classificada de “estrada património” também está a ser alvo de limpeza das zonas laterais para criar faixas de interrupção de combustível. Porém, as árvores de maior porte, com valor comercial, são as primeiras a ser derrubadas ficando os sobrantes à beira da estrada.

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