Expulsar
a Grécia do euro e de Schengen
DIRECÇÃO EDITORIAL
25/01/2016 - PÚBLICO
A Europa está completamente à
deriva e não sabe (ou não quer) lidar com a crise dos refugiados.
Há um ano, o Syriza chegava
ao poder na Grécia e desafiava a política de austeridade da troika.
Depois de um longo braço-de-ferro com a Alemanha, que durou mais de
seis meses, o ministro das Finanças alemão achou que a melhor forma
de resolver o problema seria convidar a Grécia a sair
temporariamente da zona euro. Em troca, prometia encetar o processo
de reestruturação da dívida do país. O “convite” acabou por
ser travado por Angela Merkel, que já na altura teve visão
suficiente para perceber que a importância dos gregos para a
integridade do projecto europeu não se esgotava na folha de Excel de
Schäuble. Já então a Europa estava a braços com um gravíssimo
problema de refugiados e a chanceler percebeu que a Grécia, como
maior porta de entrada, teria um papel incontornável na forma como a
Europa iria ter de lidar com a maior vaga de refugiados desde a II
Guerra Mundial.
Com a entrada de mais de um
milhão de refugiados no continente em 2015, o tema acabou por se
sobrepor ao da crise do euro e os sucessivos naufrágios e mortes no
Mediterrâneo transformaram-no numa emergência humanitária. No
entanto, e depois de várias cimeiras para tentar encontrar uma
política comum sobre o tema, os 28 continuam sem se entender e
entraram num perigoso jogo do passa-culpas. E nem os 3 mil milhões
prometidos à Turquia tiveram o efeito desejado, nem a chegada do
Inverno inibiu milhares de continuarem a arriscar a travessia.
Segundo a Reuters, 35 mil refugiados já fizeram a travessia por mar
entre a Turquia e a Grécia em Janeiro, 20 vezes mais do que em
Janeiro de 2015.
A situação dos refugiados já
levou países como a Áustria, Alemanha e Suécia a introduzirem
restrições nas fronteiras e limitações ao acordo de Schengen,
que, a par do euro, é o grande pilar do projecto europeu. Não foi
ao acaso o alerta de Juncker: “Hoje Schengen está em risco.
Amanhã, pode ser a existência do euro. A União Europeia está
ameaçada nas suas bases.” Perante o vazio de ideias para uma nova
cimeira de Fevereiro sobre o tema, alguns países, como a Áustria,
começam à procura de soluções onde elas não existem. A ministra
do Interior austríaca, com o apoio da Suécia e aparentemente da
Alemanha, já veio ameaçar a Grécia, dizendo que as fronteiras de
Schengen podem ser deslocadas em direcção à Europa central se os
gregos se mostrarem incapazes de controlar as suas fronteiras. É a
mesma lógica disparatada adoptada aquando da crise do euro; se a
Grécia está em dificuldades com o euro, que saia do euro; se está
em dificuldades com Schengen, que saia de Schengen. Os gregos
contrapõem, dizendo que a Europa está a falhar na ajuda prometida,
desde berços para os centros de acolhimento, passando por máquinas
para recolha de impressões digitais, até à escassez de
funcionários da Frontex no país. É neste clima que se prepara mais
uma grande cimeira para debater o tema dos refugiados.
Ameaça
de expulsão da Grécia do espaço Schengen revela "pânico"
da UE
RITA SIZA 25/01/2016
- PÚBLICO
Alemanha,
Áustria e Suécia exigem medidas imediatas a Atenas para travar
acesso de refugiados ao território europeu.
O Governo de Atenas
reagiu esta segunda-feira às críticas de alguns dos parceiros
europeus relativamente à sua gestão de fronteiras e lamentou o
estado de “pânico” que está por detrás das ameaças de
expulsão da Grécia do espaço Schengen, ou ainda das propostas para
uma intervenção armada na fronteira da Macedónia, um país que não
faz parte da União.
Num almoço de
trabalho dos ministros do Interior da União Europeia – marcado
para discutir a extensão, por um período que pode chegar a dois
anos, das medidas temporárias de controlo de fronteiras impostas por
vários Estados-membros durante o Verão –, a Alemanha, Áustria,
Suécia e Bélgica formaram uma frente unida contra a Grécia,
exigindo medidas suplementares para travar o fluxo de imigrantes, a
maioria vindo do Médio Oriente e Norte de África, que tentam aceder
ao espaço europeu a partir da costa helénica.
Como argumentaram,
cabe ao Governo de Atenas impedir que os milhares de migrantes que
diariamente embarcam na Turquia possam alcançar o território
europeu. “Se a Grécia, que dispõe de uma das maiores marinhas da
Europa, não tem capacidade para proteger a fronteira com a Turquia,
então é claro que os limites de Schengen vão ter de ser revistos e
limitados à Europa central”, defendeu a ministra austríaca,
Johanna Mikl-Leitner. “Tem de haver consequências em termos de
livre movimento para quem não cumpre com as suas obrigações”,
concordou o ministro da Suécia, Anders Ygeman. “A Grécia precisa
de fazer o seu trabalho de casa. Precisamos de ver resultados nas
próximas semanas”, acrescentou o ministro alemão, Thomas de
Maizière.
Segundo as últimas
estimativas das Nações Unidas, desde o início do ano uma média de
1910 pessoas está a chegar às praias gregas, vindas da Turquia,
todos os dias. Os migrantes devem ser registados na Grécia, mas a
maior parte deles pretende seguir viagem para o centro e o Norte da
Europa – antecipando esses movimentos, a Áustria já fixou um
limite para os refugiados que serão admitidos no país nos próximos
quatro anos, uma medida que pode ser replicada por vários países
balcânicos.
“A Grécia não
tem capacidade de acolher todos os refugiados. Somos um pequeno país
de nove milhões de habitantes que dificilmente tem condições para
integrar três milhões de refugiados”, lembrou o ministro grego
para a Imigração, Ioannis Mouzalas, que denunciou a hipocrisia dos
países que não respeitam, eles próprios, os compromissos assumidos
em termos de auxílio. De acordo com a Bloomberg, só 94 dos 66.400
migrantes abrangidos pelo programa europeu de relocalização
viajaram da Grécia para outros países. “E são os mesmos Estados
que se recusam a ajudar a Grécia que estão dispostos a intervir na
fronteira de um Estado não-membro”, censurou o ministro grego, que
não tem dúvidas de que o envio de tropas para a fronteira da
Macedónia é totalmente ilegal.
“Estamos fartos
das mentiras e da contra-informação”, contra-atacou Ioannis
Mouzalas, que perguntou se a solução preconizada pelos outros
Estados-membros passa por deixar as pessoas morrer no mar. “A lei
internacional, o direito do mar, a Convenção de Genebra, a
legislação europeia e também a da Grécia obrigam-nos a levar a
cabo operações de salvamento. Não podemos afundar os barcos, ou
afastar as pessoas aos tiros”, afirmou.
Além de na cimeira
dos ministros do Interior em Amesterdão, a questão dos fluxos
migratórios com destino à Europa foi discutida esta segunda-feira
pela representante da UE para a política externa, Federica
Mogherini, numa visita oficial a Ancara. Em Novembro, Bruxelas
assinou um acordo com o Governo turco, no valor de três mil milhões
de euros, para apertar a segurança nas fronteiras e garantir a
instalação dos refugiados no país. Ao mesmo tempo que prometeu
maior apoio à Turquia, “que está a fazer um trabalho
extraordinário no acolhimento de um enorme número de refugiados”,
a representante europeia não deixou de criticar as falhas no sistema
gestão dos fluxos migratórios.
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