SERVIÇO DE
ESTRANGEIROS E FRONTEIRAS
GNR, PSP e PJ querem receber pessoal do SEF mas ninguém
sabe ainda quem nem quantos
Apenas 19 polícias aceitaram a comissão de serviço para
ficarem sob as ordens do SEF no aeroporto de Lisboa. Forças de segurança
queixam-se de não terem acesso às 23 bases de dados do SEF, o que dificulta o
trabalho de investigação.
Maria Lopes
21 de Junho de
2022, 21:00
A avaliar pelas
audições dos responsáveis da GNR, PSP, PJ e INR – Instituto dos Registos e
Notariado, os elementos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF) têm os
braços abertos para se mudarem para aquelas duas forças e serviço de segurança
e para a entidade administrativa. Mas ninguém sabe especificar quantos
inspectores ou administrativos irá receber ou que formação têm, e, em alguns
casos, nem ainda se sabe bem quais as competências que essa entidade terá
porque a entrada em vigor da lei de reestruturação do SEF foi prorrogada sine
die depois de um primeiro adiamento de quatro meses e ainda há regulamentação
por publicar.
Nessas condições
estão a PSP e a GNR que não se entendem sobre a competência nas fronteiras dos
terminais de cruzeiros; assim como o INR que também desconhece quais as funções
administrativas que passará a ter – se irá apenas renovar autorizações de
residência ou também emitir novas. E até o próprio SEF não consegue desenhar
cenários: o director admitiu que continua à espera de “algumas peças
legislativas sobre a definição de como todo este modelo se vai encaixar” –
incluindo quantos inspectores terão que ficar na nova Agência Portuguesa para
as Migrações e Asilo (APMA). Fernando Pinheiro da Silva defendeu, no entanto, a
tutela: “A pressa não é boa conselheira. O processo levará o tempo que for
necessário para que todas as peças encaixem.”
Depois, há uma
característica comum aos órgãos de polícia criminal, ainda que apenas o
director da Polícia Judiciária se tenha queixado das desvantagens que isso traz
à sua “casa": o SEF tem actualmente um total de 23 bases de dados mas
nenhuma delas está acessível às restantes forças e serviços de segurança, o que
prejudica as investigações, e também não há partilha de informação sobre
processos (embora Luís Neves saiba que o SEF tem hoje 735 inquéritos abertos).
São, entre outras
temáticas, bases de dados sobre vistos, residência, registos criminais,
nacionalidade, pessoas expostas politicamente (PEP), boletins de alojamento
(SIBA), sistema de informação de Schengen. A PSP defende que devem estar sob a
gestão do Sistema de Segurança Interna.
Outra
característica em comum? Todos afirmam não terem “problemas de maior” em
receber novas atribuições e responsabilidades, assim como funcionários com
estatuto e remuneração diferentes, e prometem dizer “sim, senhor” ao que a
tutela decidir. A PSP e a GNR já iniciaram a formação dos seus elementos – mas
apenas a concluíram meia centena de elementos.
Estas foram
algumas das vicissitudes do processo salientadas nesta terça-feira à tarde no
Parlamento pelos dirigentes da GNR, PSP, PJ, INR e SEF que foram ouvidos na
Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias na
sequência de um pedido do PSD que tem vários meses – tinha já sido pensado
ainda antes da aprovação da lei, na anterior legislatura, e foi sendo
sucessivamente adiado.
O
comandante-geral da GNR, Rui Clero, admitiu que soube dos “contornos” da
reestruturação na reunião do Conselho Superior de Segurança Interna de Janeiro
de 2021 e que foi dando contributos “de forma silenciosa à tutela”, incluindo
sobre a interpretação da letra da lei “que não é absolutamente clara”. “Diz que
o controlo das fronteiras marítimas e terrestres é da GNR", mas depois
atribui os terminais de cruzeiro à PSP, o que levou a GNR, que já tem um grupo
de trabalho a preparar o “assunto SEF”, a questionar a tutela sobre a
incoerência – que ainda não respondeu.
Filas
“inultrapassáveis"
Mas o director
nacional da PSP, Manuel Magina da Silva, tem uma proposta para resolver o
impasse sem admitir perder atribuições: “Podemos celebrar um protocolo entre a
PSP e a GNR para ultrapassar alguma conflitualidade de competências e permitir
um relacionamento institucional e o complemento operacional.”
Magina contou que
desde 20 de Maio o SEF pediu ajuda por duas vezes para o reforço da capacidade
operacional nos aeroportos – o plano pressupõe a disponibilização de 168
elementos da PSP durante o Verão – e que dos cerca de 80 agentes que já foram
transferidos, apenas 19 aceitaram passar para uma “comissão especial de serviço
no SEF”. Mas admitiu que filas como as dos últimos fins-de-semana são
“inultrapassáveis”.
Com as novas
atribuições, a PSP terá que criar uma unidade de segurança aeroportuária e
controlo fronteiriço onde irá integrar o pessoal do SEF que vai receber. O
director da PSP lamentou a “assimetria remuneratória muito exagerada” entre as
várias forças e serviços de segurança e defendeu que se deve “tentar caminhar
para o equilíbrio”, já que terá que integrar elementos do SEF que ganham o
dobro de polícias com o mesmo tempo de carreira.
Filomena Rosa,
presidente do INR, admite que não consegue avaliar o impacto que as futuras e
“exactas” atribuições terão nos seus serviços enquanto o quadro legal não for
definido e demarca-se dos problemas das bases de dados afirmando que hoje é o
SEF que acede à informação dos Registos, como os dados sobre passaportes.
O actual director
do SEF, Fernando Pinheiro da Silva, negou a perda de know how dos elementos da
instituição com a extinção do serviço – “os inspectores não vão desaparecer;
vão estar noutras entidades a prestar funções com o seu conhecimento acumulado”
–; recusou que a extinção seja a "responsabilização colectiva” pela morte
de Ihor Homeniuk; e defendeu o novo modelo dizendo ser o maioritário na Europa
e o menos dispendioso.
“O modelo [de
competências distribuídas] tem que garantir a harmonização de procedimentos,
boa comunicação entre as várias forças, e a coordenação forte por uma entidade
acima delas.” E recorreu a T.S. Elliot para desdramatizar: “Todo o fim é um
começo em si.”
Mas se nessa
altura deu como exemplos as realidades espanhola, francesa e italiana, nesta
terça-feira voltou a insistir na ideia, indo buscar um estudo de 2006 para a
reforma do modelo de organização do sistema de segurança interna coordenado por
Nuno Severiano Teixeira em que havia um cenário X – o tal da Polícia Nacional
que resultaria da agregação da PSP e SEF.

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