sexta-feira, 29 de junho de 2018

Uma profunda e determinante crise na UE 5 / Dossier 5




Angela Merkel: a grande desestabilizadora da União Europeia


O pior de preservar, a todo o custo, uma construção europeia deficiente, foi ter alimentado uma engrenagem desestabilizadora da própria União Europeia.

JOSÉ PEDRO TEIXEIRA FERNANDES
28 de Junho de 2018, 16:44

1. Ao longo dos últimos anos Angela Merkel transformou-se numa líder quase mítica para o europeísmo de centro-direita, e, de forma mais surpreendente, tendo em conta a sua área política, também para o europeísmo de centro-esquerda. Defendeu o Euro e a estabilidade monetária na União Europeia no seu período mais crítico, após a crise desencadeada em 2008 nos EUA que alastrou rapidamente para a Zona Euro. Emergiu como uma autoridade e reserva moral na questão dos migrantes/refugiados, após a sua decisão de abertura das fronteiras alemãs em 2015. É vista como o maior bastião da construção europeia contra as derivas populista e eurocéptica, quer no interior da União, quer no outro pilar do Ocidente, os EUA, sob o efeito isolacionista e anti-liberal de Donald Trump. Para os seus defensores, os múltiplos ataques de que Angela Merkel tem sido alvo só alicerçam a convicção de que é preciso cerrar fileiras em torno desta e apoiar as suas ideias para a Europa e o mundo. Mas o legado político de Angela Merkel pode ter uma leitura bem mais crítica, pelos múltiplos impactos das suas políticas, quer internamente, quer em vários Estados-membros da União Europeia, sobretudo a Sul e a Leste.

2. Paradoxalmente, a obsessão de Angela Merkel pela estabilidade europeia tornou-se desestabilizadora. À custa de tanto querer preservar a construção europeia na lógica actualmente instituída — e o papel central da Alemanha nesta —, acabou por provocar e libertar forças poderosas que a desestabilizaram, e continuam a desestabilizar, em sucessivas crises. As actuais fracturas europeias, em torno da política de asilo e migrações, evidenciam o problema. Num primeiro olhar, estamos perante uma crise totalmente artificial, provocada por políticos populistas e outros radicais. Nesta altura, os fluxos migratórios para a União Europeia são bem mais baixos do que em 2015, ou até em 2017. É verdade. Mas essa é apenas a superficialidade do problema, como explicarei melhor. Nas profundezas da questão estão os avanços, pouco consistentes, da União Europeia, para uma união económica e monetária e para o Espaço Schengen, a partir do final dos anos 1980 e anos 1990. Não são, importa deixar isso claro, responsabilidade directa de Angela Merkel, mas dos políticos da época. Em qualquer caso, ambos se tornaram, ao longo do tempo, aspectos centrais de uma União Europeia mais integrada e a caminho de uma união política. O problema é que a arquitectura de ambos — a da Zona Euro e a do Espaço Schengen — foi mal concebida em aspectos cruciais do seu funcionamento. Não previu soluções adequadas, a nível europeu, para crises graves. Na prática, ambas favorecem uns Estados em detrimento de outros, como mostra a experiência da última década. E aí começam as sementes da contestação e da instabilidade.

3. Ao preservar uma construção europeia desequilibrada que herdou, na realidade Angela Merkel fez muito mais do que isso: manteve intocado um sistema que, na prática, favorece uns Estados a favor de outros e a centralidade da Alemanha. Isso é bastante evidente na Zona Euro. Com esta actuação, Angela Merkel criou, assim, uma poderosa engrenagem externa de ressentimento contra si em vários Estados-membros, no Sul e Centro e Leste europeu. Ironicamente, há também uma dimensão interna desse ressentimento que não é irrelevante: no pior cenário, até poderá derrubar o seu governo, se perder o apoio da CSU, os democratas-cristãos da Baviera. O contraste é flagrante com o passado. Quando chegou ao poder, em finais de 2005, a Alemanha tinha um sistema partidário muito estável, herdado da fundação da República Federal da Alemanha em 1949, após o colapso da Alemanha nazi na II Guerra Mundial. A rotatividade entre o centro-direita (CDU-CSU) e centro-esquerda (SPD) era uma realidade consistente da política alemã. Agora, em 2018, a Alemanha tem um governo frágil da CDU/CSU / SPD, assente num centro político cada vez mais a estreitar-se (com o SPD a arriscar-se a uma crescente irrelevância política) e com os extremos em alta, especialmente à direita a Alternativa para a Alemanha (AfD). Pela primeira vez na história do pós-guerra, a aliança política que estabilizava o centro-direita CDU/CSU está em risco de colapso. Há uma observação inegável: a grande coligação liderada por Angela Merkel, entre a CDU/CSU e o SPD, ao desguarnecer os extremos, está a destruir as bases da estabilidade política alemã tal como a conhecíamos.

4. No plano externo, a engrenagem do ressentimento contra Angela Merkel e a Alemanha surgiu, primeiro, ligada à crise Zona Euro. Esta atingiu o seu ponto crítico nos primeiros meses do ano de 2015, com o problema da imensa dívida grega. O que se verificou, especialmente entre 2010 e 2015, foi um contínuo acumular de desequilíbrios na Zona Euro. Independentemente de outras causas — e das responsabilidades nacionais que obviamente também existiram, como é muito evidente na Grécia —, o sistema potenciou um aumento contínuo da dívida pública no Estados do Sul da União, um acumular de superavits comerciais e um afluxo de capitais à Alemanha, que intensificou a sua primazia económica na União. Ao defender intransigentemente a arquitectura do Euro — uma réplica europeia do modelo monetário alemão —, Angela Merkel conseguiu, de facto, preservar o sistema. Mas esse sucesso teve um preço muito político elevado: libertou uma poderosa engrenagem de ressentimento. Basta lembrarmo-nos das imagens do nazismo e das guerras da Alemanha na Europa que ressurgiram em força, na Grécia e nos Estados mais afectados pela crise e pelas políticas de austeridade. Ao contrário do que muitos pensam, esse ressentimento não desapareceu, apenas se tornou latente. Ficou à espera de uma nova conjugação de circunstâncias negativas para explodir. Aqui entram os populismos que encontraram o terreno perfeito para crescer e funcionam agora como detonadores.

5. A engrenagem do ressentimento tem um outro lado crítico na crise dos refugiados/migrantes do Verão de 2015. Um elemento eminentemente político da construção europeia está no cerne do problema: o Espaço Schengen. Tal como a Zona Euro, não foi pensado para crises de alguma gravidade, ligadas a pressões migratórias de massa de refugiados / migrantes económicos nas suas fronteiras externas. O quadro legislativo europeu — “os regulamentos de Dublin” — colocou uma sobrecarga desproporcionada nos Estados com fronteiras externas a Sul, dado os fluxos migratórios virem do Mediterrâneo. São estes que têm de lidar, em primeira linha, com as chegadas em massa no seu território e tratar a generalidade dos pedidos de asilo. (Ver Comissão Europeia, “Country responsible for asylum application (Dublin)”). Mas sendo este um sistema europeu, pressupõe uma actuação comum europeia. Todavia, em 2015, quando Angela Merkel, decidiu abrir as suas fronteiras, fê-lo unilateralmente. (Ver “Merkel's Refugee Policy Divides Europe” in Der Spiegel, 21/09/2015). Podemos debater, interminavelmente, se o fez por genuíno sentimento humanitário e liderança moral da União Europeia — como sustentam os seus defensores; ou se o fez por frio calculismo político, para melhorar a imagem negativa ligada à insensibilidade ao sofrimento dos povos do Sul da Europa duramente afectados pelas políticas de austeridade — como sustentam os seus detractores. Seja qual for a interpretação mais próxima da realidade, abriu uma segunda área de ressentimento. Foi no Centro e Leste europeu onde esta ganhou mais terreno.

6. A Itália, originalmente muito europeísta, é hoje o Estado onde as sequelas da actuação de Angela Merkel em defesa da Zona Euro e do Espaço Schengen — ambos, como vimos, com falhas de concepção que geram, na prática, acentuados desequilíbrios entre os Estados-membros — maior desestabilização acabaram por criar no sistema político. É uma ironia da construção europeia. Certamente que não há apenas causas externas para o problema de Itália. Há grandes responsabilidades dos políticos que governaram o país nas últimas décadas e o amplificaram. A realidade é que em muitos italianos se instalou o sentimento de que o Euro lhe fez perder bem-estar, levando, ao mesmo tempo, a ganhos injustos da Alemanha à sua custa. E que a Itália ficou (quase) sozinha, com um grave problema migratório europeu — devido ao Espaço Schengen e à lógica desproporcional da legislação europeia sobre o asilo —, mais uma vez favorecendo a Alemanha e os Estados do Norte que estão longe do Mediterrâneo. Foi esse terreno político onde cresceram o Movimento Cinco Estrelas (M5S) e a Liga, actualmente no poder. É tentador ver o M5S e a Liga como causas do actual problema italiano. Tudo estaria bem se não fossem estes populistas e extremistas. Mas é uma visão superficial e errada. Na realidade, estes são mais sintomas e consequências de um mal-estar acumulado ao longo dos últimos anos, que tem causas internas e externas.

7. Angela Merkel não é certamente culpada de todos males da União Europeia, nem da Alemanha. (Ver “Deutschland unter alles They can’t blame this one on ‘Mutti.’” in Politico, 27/06/2018). Para os seus adeptos é uma heroína. É, tudo indica, uma europeísta convicta. Herdou, como já notado, uma construção europeia desequilibrada por decisões dos anos 1990. Mas as suas políticas de preservação, a qualquer custo, dessa construção europeia mal concebida, sobretudo na Zona Euro e no Espaço Schengen, geraram um sentimento de ressentimento. Acabaram por tornar grande parte do Sul e do Leste europeu anti-europeístas e anti-germânicos, de forma aberta ou latente. Instalou-se o sentimento de que a Alemanha retira os maiores ganhos da construção europeia. E de que a União Europeia é um instrumento de dominação germânica. Ao mesmo tempo, internamente, Angela Merkel afastou eleitorado tradicional e abriu, sem querer, o caminho aos extremos, sobretudo à direita. Mas o pior de preservar, a todo o custo, esta construção europeia deficiente, ignorando ou não resolvendo os seus problemas mais profundos, foi ter alimentado uma engrenagem desestabilizadora da própria União Europeia. A actual crise migratória “ao retardador” — explorada politicamente pela (extrema)direita populista e outros contestatários —, mostra como as consequências podem surgir anos mais tarde. No Conselho Europeu de 28 e 29 de Junho, Angela Merkel tem um teste crítico à sua longa carreira política. Resta saber se, com tantos ressentimentos e fracturas, é ainda possível reconfigurar políticas que, para além das intenções europeístas, desestabilizaram a União Europeia nos seus delicados equilíbrios entre o Norte e o Sul, o Ocidente e o Leste.

Descontrolo migratório: ter dúvidas não é racismo

Não é preciso ser racista ou xenófobo para ter dúvidas sobre as causas e as consequências do afluxo descontrolado de pessoas à Europa nos últimos anos.

Rui Ramos
29/6/2018

Não é preciso ser racista ou xenófobo para ter dúvidas sobre as causas e as consequências do afluxo descontrolado de pessoas à Europa nos últimos anos.

Os governantes europeus estão reunidos. Têm muito para discutir, mas só uma coisa, segundoAngela Merkel, verdadeiramente importa: a imigração. Primeiro no norte da Europa, mas agora também no sul, a imigração está a provocar as maiores convulsões partidárias desde a Segunda Guerra Mundial. Foi aliás a imigração, e não a austeridade do Euro, ao contrário do que se esperava, que provocou a primeira cisão europeia, com um referendo inglês realizado sob a impressão da “crise dos refugiados” do ano anterior. Posto isto, a imigração é um tema ingrato. Por vezes, parece que levantar a mínima dúvida ao direito de toda a humanidade desembarcar na Europa é necessariamente um sinal de racismo ou xenofobia. No entanto, não é preciso ser racista ou xenófobo para ter dúvidas sobre as causas e as consequências do afluxo descontrolado de pessoas à Europa nos últimos anos.

A causa estrutural dessa circulação descontrolada de pessoas é obviamente o desnível de bem estar e de segurança entre regiões muito próximas, como acontece entre a Europa ocidental e a África e o Médio Oriente, ou entre os EUA, o México e outros países latino-americanos. Mas a causa imediata, como se viu em 2015, depois de Angela Merkel ter declarado a Alemanha aberta à migração do Médio Oriente, é outra: a percepção de que as fronteiras dos países ocidentais não estão defendidas e de que quem as conseguir atravessar ilegalmente terá acesso garantido a riquezas e confortos míticos. É isto, e não apenas a guerra, que explica que tanta gente corra tantos riscos através de desertos, rios, e mares. É isto, e não apenas a pobreza, que explica porque há um tão grande negócio à volta do tráfico de pessoas entre a Europa e a África. Enquanto as fronteiras não inspirarem respeito, não valerá a pena discutir políticas de migração, porque a ausência de fronteiras anula quaisquer políticas de migração.

Vamos entender-nos: o problema não é a circulação de pessoas ou a diversidade das populações. A Europa só tem a ganhar com a passagem ou a fixação de pessoas do resto do mundo. Uma sociedade não tem de ser composta de gente toda idêntica entre si, com as mesmas ideias e os mesmos gostos – a maior parte das sociedades europeias, aliás, foram, ao longo de grande parte da sua história, religiosa e culturalmente diversas. Não é isso que está em causa, mas a capacidade actual da Europa para assimilar ou integrar devidamente, sem alarmes ou conflitos sociais graves, o afluxo ilegal e descontrolado de massas de jovens pouco qualificados. É legítimo duvidar dessa capacidade. As economias europeias não têm o dinamismo suficiente, os seus Estados sociais não dispõem dos recursos necessários, e às suas culturas faltam a convicção necessária para proporcionar referências estáveis às novas comunidades. Por isso, a probabilidade de as massas de imigrantes ilegais transformarem a Europa é muito mais elevada do que a probabilidade de serem transformadas pela Europa.

A primeira consequência do descontrole fronteiriço pode ser assim, não uma diversidade saudável, porque enquadrada por princípios comuns, mas divisões e hostilidades susceptíveis de inspirar lapsos generalizados de humanitarismo. Há na Europa demasiadas organizações interessadas em usar os migrantes ilegais para contestar e repudiar tradições ocidentais, tal como há muitos movimentos tentados a explorar o caos migratório para provocar revoltas “nativistas” contra os sistemas políticos. É a esses, como se tem visto, que a crise das migrações melhor serve. Se não queremos ver nascer monstros, não devemos cultivar as suas sementes.


4 takeaways from ‘Mother of All EU Summits’


The migration crisis hogged leaders’ attention at an exhausting — and sometimes frustrating — gathering.

By           DAVID M. HERSZENHORN, JACOPO BARIGAZZI, LILI BAYER AND PIERRE BRIANÇON          6/29/18, 7:17 PM CET Updated 6/29/18, 8:29 PM CET

The summit was ugly at times, but saw leaders find enough common ground to live to fight another day

They’re called crises for a reason — they hurt when they hit, the pain lingers and they are difficult to resolve.

June’s European Council, with an all-night negotiation on migration, was in many ways one big exercise in crisis management.



On migration, they failed to reach an overall agreement to rewrite the Dublin regulation on asylum policies, though a Herculean effort produced series of proposals that one senior official termed “pre-Dublin solutions.”

On eurozone reforms, leaders inched forward with initiatives to improve their ability to respond to asymmetrical financial shocks. Dubbed “The Mother of All Summits” because of the huge agenda, it also touched on Brexit, sanctions on Russia and the trade war ignited by U.S. President Donald Trump.

Here are four main takeaways from a summit which was ugly at times, but saw leaders find enough common ground to live to fight another day.

1. Theresa May lends a hand
As a former U.K. home secretary, May was in her element in the marathon negotiation on migration policy. You could almost have forgotten that Brexit was on the agenda too.

We will miss the U.K. for so many reasons. This is just another one of them” — Senior EU official

While the core of the eventual compromise was a proposal championed by France’s Emmanuel Macron to create “controlled centers” for asylum seekers on EU territory, May intervened helpfully to describe the U.K.’s efforts at strategic communications to discourage migrants from turning to smugglers.

She made clear Britain’s own interest in helping Europe manage migration and asylum and helped to negotiate important changes in the (English) language of the leaders’ conclusions. When the nine-hour debate ended just before dawn, May emerged looking as exhausted — and as happy — as her EU27 colleagues.

Of course, the U.K. remains a full member of the EU until formal withdrawal on March 29, 2019, and London has a clear interest in cultivating good will.

“You have to give it to her,” said a senior EU official. “She did in fact contribute constructively and positively to the migration debate. We will miss the U.K. for so many reasons. This is just another one of them.”

2. Battle of the newbies: Giuseppe vs Pedro

“My first EU summit has been an intense experience,” said Spanish Prime Minister Pedro Sánchez | Ludovic Marin/AFP via Getty Images

Pedro Sánchez, the Socialist successor to Mariano Rajoy, spent his first EU summit as Spanish leader playing the conciliator and showing off his pro-EU credentials. Together with Macron, he helped forge the migration compromise.


Giuseppe Conte, the former lawyer who leads Italy’s new populist government, played a very prominent role as the disruptor. Arriving in Brussels Thursday, he immediately blocked the Council conclusions — even uncontroversial ones — insisting Italy would agree nothing before the divisive discussion on migration.

The most striking difference between the freshmen, however, emerged during the eurozone discussion: Conte, once again, blocked the conclusions. Sánchez, as well as Luxembourg Prime Minister Xavier Bettel, didn’t hide his frustration and urged his Italian colleague “to be generous,” according to an EU official.

However, some leaders believe it is easier to deal with Conte than Matteo Salvini, the real power center in the Italian government (and current interior minister). Council President Donald Tusk attempted to coach Conte in summitry, and in his final press conference Macron said: “I see a prime minister who is responsible.”

3. Kicking a €1 trillion can down the road
The biggest victim of the June summit: the EU’s next long-term budget.

While leaders like Germany’s Angela Merkel had expressed a wish to get a budget deal before May, the migration row has sapped all available political bandwidth.

In early May, the Commission proposed a budget for 2021-2027, covering everything from farm subsidies and regional funds to money for border control and integration of migrants. It needs unanimous endorsement from member states, and the European Parliament also has to sign off.

But, unusually, budget negotiations coincide with the European Parliament election in May 2019, raising the question of whether the current MEPs and commission officials will be the ones negotiating with the member countries.

The current Commission, keen to cement its legacy and avoid Euroskeptics derailing its proposals, is pushing for a quick budget deal. But while leaders like Germany’s Angela Merkel had expressed a wish to get a deal before May, the migration row has sapped all available political bandwidth.

Leaders agreed the next EU budget should include flexible instruments for fast disbursement of funds to combat illegal migration, and that migration-related funds within the budget should focus on external migration management.

But key questions — the size of the budget, how much governments will contribute now that the U.K. is leaving, and what will happen to traditional large spending programs like cohesion and agriculture — went unaddressed. Leaders made a vague pledge to consider budget proposals “as soon as possible.”


“I think we know all the constraints so I don’t want to have over-expectations,” said French President Emmanuel Macron | Aris Oikonomou/AFP via Getty Images

After the summit, Macron was asked by POLITICO about the prospects of an agreement on the Multiannual Financial Framework before the EU election. He replied: “We didn’t discuss about that, but when I look at all the challenges that we have — eurozone, migration, Brexit — we will do our best, but I think we know all the constraints so I don’t want to have over-expectations.”

4. Eurozone minimalism
Leaders managed — just — to make enough progress on eurozone reforms to avoid the summit looking like a slap in the face for Merkel and Macron.

The German and French leaders, who had proposed a list of modest reforms to strengthen the monetary union against future crises, only achieved one long-overdue decision: giving the fund that finances the wind-down of failed banks the backing of the European Stability Mechanism, the eurozone bailout fund.

For the rest, the two leaders found out what happens in the eurozone when the fiscally-retentive north meets the spendthrift south.

The French president’s signature proposal of a eurozone budget didn’t even get a symbolic nod in the summit communiqué. It was the main bone of contention between the Franco-German duo, who struck a deal at Meseberg Castle near Berlin, and 12 governments who wrote a letter of protest two days later.

In the coming months, with a new date for talks in December, Macron will have time to reflect on his strategy of engaging exclusively with Merkel, when she now has trouble keeping her own coalition together, let alone the eurozone.


Crise dos refugiados. Depois de um longo jantar, líderes europeus só conseguiram um acordo que é uma “manta de retalhos” 


29 Junho 2018
João de Almeida Dias

Após um longo jantar, os líderes europeus chegaram a um acordo para a política de refugiados. Só pararam às 4h35. Apesar do esforço, especialistas criticam: é "vago" e uma "manta de retalhos".

A ideia de um jantar que só termina de madrugada costuma ser agradável. Se é certo que no final alguém terá sempre de lavar a loiça, também é verdade que à inevitável tarefa doméstica se antecedem, se tudo tiver corrido bem, conversas e gargalhadas movidas pela cumplicidade que junta amigos repasto após repasto.

Esta quarta-feira à noite, também os líderes dos 28 países da União Europeia se sentaram à mesma mesa para jantar — e também só se levantaram já de madrugada, com os ponteiros do relógio a bater nas 4h35. Só que há muito que a mesa de jantar do Conselho da Europa deixou como a mesa imaginada no parágrafo anterior. Ali, as conversas já pouco ou nada se fazem de cumplicidade, são raras as gargalhadas que se ouvem e cada vez mais são as dúvidas de que haja amigos à mesa.


A cimeira do Conselho Europeu desta quarta e quinta-feira não era para ser sobre a crise migratória. Na agenda, estavam temas como a reforma da moeda única e uma maior integração. Mas a agenda de dois países sobrepôs-se à da Europa. Primeiro, porque em Itália passou a governar Giuseppe Conte (do Movimento 5 Estrelas) e Matteo Salvini (da Liga). Deste último, resultou a decisão de impedir que dois navios com centenas de migrantes atracassem em portos italianos. Depois, porque na Alemanha o governo de Angela Merkel foi palco de uma revolta interna, por parte dos parceiros de coligação da CSU, com os conservadores a quererem apertar as regras para a presença de requerentes de asilo em solo germânico.


A cimeira começou à hora de almoço de quinta-feira e só terminou às 4h35 de sexta-feira

Assim, sob pena de irritar aquela que é a quarta maior economia da UE ou de involuntariamente derrubar o governo da maior potência alemã, os líderes europeus sentaram-se à mesma mesa e deixaram o mais complicado — o tema da crise migratória — para o fim.

O resultado da noitada dos líderes europeus é, entre os outros temas abordados ao longo do dia, um acordo dividido por 12 pontos. Neles, destacam-se as seguintes ideias:

O acolhimento de refugiados e requerentes de asilo passa a ser feito em “centros controlados criados nos Estados-Membros” e “numa base voluntária”, ao contrário do anterior sistema de quotas;
Será explorada a possibilidade de construir “plataformas de desembarque regionais” em “países terceiros pertinentes”, que poderão servir para selecionar quais migrantes serão elegíveis para o estatuto de refugiado;
A agência de proteção das fronteiras da União Europeia, a Frontex, vai ter um “aumento dos recursos” e o seu mandato vai ser reforçado.

Contactadas pelo Observador, três especialistas no tema das políticas migratórias olham para o acordo atingido esta madrugada com ceticismo e tecem-lhe várias críticas, nomeadamente à forma vaga como aborda questões muito concretas.

“Este Conselho Europeu não está preocupado com a operacionalização dos acordos a que a chegou, mas antes em entregar algo. Está na consciência de todos que estes mecanismos não são para funcionar de forma sustentada e pensada”, diz Patrícia Lisa, investigadora do think-tank espanhol Real Instituto Elcano. “É uma manta de retalhos.”

Com este acordo, fica consumado o fim anunciado do sistema de quotas, anunciado em setembro de 2015 para distribuir de forma obrigatória pelos 28 países da UE, e ao longo de dois anos, um total de 160 mil refugiados localizados em três países: 54 mil na Hungria, 50 400 na Grécia e 15 600 em Itália. Porém, este sistema acabou por não ser respeitado a nível europeu, tendo sido distribuídos apenas 34 690 pessoas ao fim de quase três anos.

Em setembro de 2015, a União Europeia acordou distribuir 160 mil refugiados (localizados na Hungria, Grécia e Itália) ao longo de dois anos. Mas, no final de contas, só 34 690 foram dali para os restantes países da comunidade europeia.
Esta é uma alteração de base na política europeia para os refugiados, que surge numa altura em que o número de entradas atinge os valores mais baixos dos últimos anos. Depois do pico de pedidos de asilo de 2015 (1,3 milhões), os números desceram consistentemente: 1,2 milhões em 2016; 704 mil em 2017; e 131 mil no primeiro trimestre de 2018, o que representa um decréscimo de 25% no período homólogo do ano anterior.

Alguns dos países, como a Grécia e Itália, quiseram levar para a mesa a discussão do Tratado de Dublin, que refere que cada requerente de asilo deve permanecer no país em que é registado à entrada na Europa. Uma vez que a maior parte das chegadas de migrantes nos últimos anos tem sido naqueles dois países, a par de Espanha, é para eles uma prioridade a alteração destes termos. Porém, os países que não têm uma fronteira externa demonstram pouca abertura para esta ideia. Ainda antes da cimeira, o chanceler austríaco, Sebastian Kurz, dizia que a obrigação era a de haver um registo no país de chegada e nunca noutros, como o seu, sem fronteira com o Mediterrâneo. “Qualquer um sabe que, tendo em conta a situação geográfica da Áustria, eles só poderiam chegar de paraquedas”, ironizou, em declarações ao Politico.

Como sublinha Patrícia Lisa, a discussão de Dublin acabou por não ser um tema desenvolvido nesta cimeira. “A discussão das regras comuns para o sistema de Dublin não aconteceu e foi completamente ultrapassada por uma situação que não se justifica, no sentido em que a UE até estava a conseguir diminuir as taxas de entrada irregulares”, diz. “Só que era preciso haver um acordo, desse por onde desse. E a ideia da base voluntária é, no fundo, a solução encontrada para evitar dizer que se falhou redondamente nas negociações de Dublin”.

O acordo inclui as propostas do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, quase na íntegra. O político polaco rejeitou as críticas que diziam que eram medidas "duras" (Jack Taylor/Getty Images)

Ainda assim, sobram dúvidas quanto à eficácia do sistema desenhado esta madrugada pelos 28 líderes da União Europeia. “Estou cética quanto à capacidade de este acordo lidar com este problema, porque a política de refugiados na Europa está dividida entre visões nacionais e está a afastar-se dos princípios da solidariedade e da responsabilidade partilhada”, diz ao Observador Petra Bendel, do Expert Council of German Foundations for Integration and Migration.

A investigadora alemã refere que, neste momento, existem quatro blocos dentro da UE para lidar com a política de refugiados. O primeiro diz respeito aos países que estão nas fronteiras externas, mais expostos ao fenómeno das migrações, como é o caso de Grécia e Itália; o segundo, que está “a ficar cada vez mais pequeno”, inclui países que “ainda defendem uma solução europeia para esta questão”, elencando entre estes o caso de Portugal; o terceiro, onde inclui países como a Áustria, estão a “cada vez mais restringir as políticas de integração de refugiados e a abdicar da solidariedade”; e, por fim, o quarto grupo, onde se encontram os países do Grupo de Visegrado, com a Hungria à cabeça, que são contra a entrada de refugiados de forma geral. A Alemanha e a França, acrescenta a investigadora, “estão a entrar e a sair continuamente do segundo e do terceiro grupo”.

Para Susi Dennison, especialista em políticas para a migração e refugiados do think-tank European Centre for Foreign Relations (ECFR), a inclusão do voluntarismo como conceito-chave para o acolhimento de requerentes de asilo neste acordo é “o mais longe que os defensores do federalismo europeu e de um modelo integracionista podiam estar de um triunfo”.

“Estou cética quanto à capacidade deste acordo lidar com este problema, porque a política de refugiados na Europa está dividida entre visões nacionais e está a afastar-se dos princípios da solidariedade e da responsabilidade partilhada.”
Petra Bendel, do Expert Council of German Foundations for Integration and Migration

Ao Observador, a investigadora do ECFR coloca um prazo de validade a este acordo: “Uma vez que ele é muito pouco claro em vários pontos, a Europa ficará com ele provavelmente até chegar uma nova crise de refugiados. E isso é impossível prever”.

Ainda antes da cimeira, Donald Tusk reagiu às críticas que alguns fizeram às suas propostas para esta cimeira — e que acabaram, em matéria de imigração, por ser aprovadas quase na sua plenitude — acenando com o fantasma do populismo. “Há quem possa pensar que eu sou demasiado duro nas minhas propostas para as migrações. Mas, acreditem, se não chegarmos a acordo em torno destas propostas, então vamos ver outras verdadeiramente duras a serem propostas por tipos verdadeiramente duros”, advertiu o presidente do Conselho Europeu.

Patrícia Lisa descreve o momento sendo de um “clima de pânico” instaurado entre os líderes do mainstream político europeu, o que os levou a tomar medidas que em 2015 tomavam como impensáveis. Porém, Susi Dennison acredita que, ao aprovar um acordo que agrada acima de tudo ao bloco mais conservador da Europa, não se encontrou um antídoto para o problema. “Antes pelo contrário, na verdade só vai ajudar ainda mais os populistas. O que a AfD, Marine Le Pen, Salvini e tantos outros vão retirar desta cimeira é que eles sempre estiveram certos e que os partidos do mainstream finalmente aceitaram as suas ideias”, diz a investigador do ECFR.

Plataformas de desembarque em África: mais perguntas do que respostas
Uma das medidas mais importantes, mas não por isso mais detalhada, deste acordo é a intenção – a ser explorada “rapidamente” – de abertura de “plataformas de desembarque regionais” em países-terceiros da União Europeia, com a cooperação do Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR) e da Organização Internacional para as Migrações (OIM). A ideia não é nova — só que, até agora, nunca tinha reunido consenso na Europa.

O primeiro a propô-la foi Tony Blair, em 2003, altura em que ainda era primeiro-ministro do Reino Unido. Dois anos depois, em 2005, foi a vez do então ministro da Administração Interna da Alemanha, Otto Schily. Com a crise de refugiados de 2015, a ideia voltou a ser proposta, então pelo primeiro-ministro de Itália, Matteo Renzi, e pelo seu homólogo húngaro, Viktor Órban. A estes, entretanto, juntou-se a Áustria, França, Espanha e Dinamarca.


Em 2015, Viktor Órban já tinha proposta a criação de centros de seleção de migrantes fora da União Europeia
No acordo assinado esta madrugada, esta proposta vê enfim a luz verde, com os 28 países da União Europeia a assinarem por baixo. Mas a questão não se adivinha tão simples como aquele documento parece querer torná-la. Até porque, na antecipação da aprovação desta medida, já três países fora da UE vieram dizer que não estão disponíveis para fazerem parte deste programa. São eles a Tunísia, Marrocos e a Albânia. Assim, olhando estritamente para o Norte de África, sobra a Argélia, a Líbia e o Egito.

“O conceito destas plataformas regionais de desembarque continua a ser completamente confuso e podemos até estar perante um eufemismo”, refere Petra Bendel, que acaba por admitir que tem mais perguntas do que respostas sobre esta medida, que desta vez foi colocada em cima da mesa após proposta do presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk.

Ao Observador, a investigadora alemã faz a longa lista de perguntas que importa fazer e às quais o acordo não oferece resposta: “Onde é que os barcos vão desembarcar? Em que países é que elas vão estar e, entre estes, quais é são países-terceiros seguros? Vão ser recebidos antes, durante ou depois da viagem? E estas plataformas vão servir para redistribuir ou para processar pedidos de asilo? Se for esse o caso, quem é que trata do processamento? E no caso de conseguirem asilo, para onde vão as pessoas? Suécia ou Hungria? E no caso de serem rejeitados, vão voltar mesmo para os seus países de origem? E se não voltarem, o que é que lhes acontece e o que é que isso quer dizer para o país anfitrião?”.

Sobre este tema, Petra Bendel conclui que sobram “demasiadas questões quanto à legalidade e exequibilidade” do que ficou acordado.

No acordo, lê-se ainda que estas plataformas  “deverão funcionar mediante a diferenciação das situações individuais, no pleno respeito pelo direito internacional e sem criar um fator de atração”.

Patrícia Lisa coloca algumas dúvidas em relação à capacidade de países-terceiros gerirem estas plataformas, comparando-os com a Turquia, com quem a UE assinou um protocolo em 2016, onde ficou estabelecido que em troca de 3 mil milhões, o país de Recep Tayyip Erdoğan se comprometia a receber todos os migrantes irregulares que chegassem à Grécia e a impedir que mais chegassem dessa forma à Europa.

“A externalização é sempre complicada e funciona de forma trémula. Estamos a falar de estados que não estão ao nível da Turquia e que não têm a mesma capacidade de implementação de medidas desta dimensão que a Turquia tem, apesar de as coisas terem estado longe de correr bem naquele caso”, disse a investigadora portuguesa sediada em Madrid.



Insistindo na sua crítica de que o acordo é pouco específico em questões onde importa sê-lo, Susi Dennison refere: “O acordo usa uma linguagem vaga, provavelmente de forma intencional, porque desta forma estão escondidas diferentes interpretações que podem ser feitas consoante o seu autor. Por isso, Giuseppe Conte pode chegar a Roma e dizer que conseguiu a solidariedade da Europa e, ao mesmo tempo, Angela Merkel pode chegar a Berlim e dizer que há um entendimento europeu que lhe permite ter o assunto controlado”.

Em casa onde não há pão, cada um puxa a brasa à sua sardinha
Na conferência de imprensa que deu depois da cimeira, Angela Merkel falou abertamente da crise interna no seu governo, aberta com a tomada de posição do parceiro de coligação CSU, que pediu à chanceler a aprovação de uma série de medidas restritivas à entrada de refugiados e requerentes de asilo na Alemanha.

Para já, a chanceler alemã pode respirar de alívio — ou pelo menos acredita que assim deve ser. Admitindo que a “tensão na Alemanha” funcionou como um “impulso” para chegar a “soluções que talvez não teríamos alcançado de outro modo”, Angela Merkel disse acreditar que estas medidas são suficientes para convencer a CSU a ficar do seu lado. “Se implementarmos tudo o que o acordámos a 28 e bilateralmente, então é mais do que equivalente [ao que a CSU exigiu], é até melhor”, disse. “Mas eu só vos posso dar a minha opinião.”

Também Giuseppe Conte procurou dourar a sua pílula, recusando ter acedido à pressão da chanceler alemã. “Eu não assinei nenhum acordo específico com Merkel”, disse na conferência de imprensa. E, quanto ao acordo que assinou com restantes 27 países da UE, e cujas negociações chegaram a estar bloqueadas perante a sua própria ação, Giuseppe Conte disse que Itália conseguiu “70% daquilo que queria”.

Já Emmanuel Macron, que falhou o seu objetivo de tornar esta cimeira num palco para o seu impulso federalista, atribuiu a França um papel essencial a uma mesa de negociações: “Fomos facilitadores de posições que eram de conciliação difícil, entre a crise política italiana, a crise política alemã e as tensões com Visegrado”.

"Portugal não se candidata, nem havia razões para isso."
António Costa, primeiro-ministro, sobre a possibilidade de haver centros de refugiados em Portugal

Apesar de ser novato nestas andanças, também Pedro Sánchez procurou projetar este acordo. Apesar de dizer que “não foi o melhor dos acordos possíveis”, disse que “a partir de agora, quando alguém chega a Malta, Espanha, Itália ou Grécia, essa pessoa está a chegar à União Europeia”. Faltou, porém, acrescentar, que essa mesma pessoa chega à UE que tiver propensão para o voluntarismo.

E em nome dos quatro países do Grupo de Visegrado — Hungria, Polónia, Eslováquia e República Checa — falou o primeiro-ministro polaco, Mateusz Morawiecki. Contente com o resultado da cimeira, que deitou por terra a obrigatoriedade de receber refugiados que estes países tanto criticaram, o líder conservador disse: “Falámos a uma só voz e convencemos os outros da razão da nossa argumentação”.

Quem também falou foi o primeiro-ministro, António Costa. “Esta foi uma cimeira seguramente muito difícil e onde num aparente consenso expresso no documento não disfarça as divisões profundas que hoje ameaçam a União Europeia em matéria de valores e migrações”, começou por dizer chefe do governo português. No entanto, referiu que Portugal não vai fazer parte dos voluntários a receber os centros de refugiados. “Portugal não se candidata, nem havia razões para isso”, disse, acrescentando que o “país tem tido uma política coerente e constante em matéria de migrações” que se pauta pela “solidariedade interna, participação ativa no controlo das fronteiras externas e ação de cooperação em África”.

O primeiro-ministro não o fez, mas talvez a maneira mais adequada para comentar o desfecho da cimeira (e o jantar) seria a junção de dois ditados portugueses: em casa onde não há pão, todos puxam a brasa à sua sardinha. O problema é que, neste caso, ninguém sabe ao certo quem, como e quando vai lavar a loiça depois do repasto.


EU leaders clinch migration deal in marathon summit

Agreement looked in doubt after Italian blocking maneuver.

By           DAVID M. HERSZENHORN, JACOPO BARIGAZZI AND MAÏA DE LA BAUME               6/29/18, 4:49 AM CET Updated 6/29/18, 8:11 PM CET

Germany's Chancellor Angela Merkel (C) reacts as she speaks with European Council President Donald Tusk (L) and Spain's Prime Minister Pedro Sanchez during an European Union leaders' summit focused on migration, Brexit and eurozone reforms on June 28, 2018 | Ludovic Marin/AFP via Getty Images

Talking through the night, EU leaders surmounted an Italian blockade and clinched a tentative deal early Friday morning to create new “centers” on European soil for housing and processing asylum seekers, and to take an array of other cooperative steps on migration policy.

The deal, reached at 4:35 a.m., still falls short of an overall agreement to revise the EU’s asylum rules, which has bedevilled and eluded leaders since the height of the migration crisis in 2015. But the accord represented a crucial — if not complete — consensus on the bloc’s most divisive issue and stands to ease some political pressure, particularly on German Chancellor Angela Merkel.

The deal strikes a balance between concerns of frontier, coastline countries hit hardest by arrivals of migrants and asylum seekers, and the political demands of interior nations who want to stop migrants traveling on to their countries  — and the leaders’ conclusions sought to emphasize a sense of unity and resolve.

“This is a challenge not only for a single member state but for Europe as a whole,” the leaders’ declared. Citing success in reducing the numbers of arrivals in recent years, the leaders added, “The European Council is determined to continue and reinforce this policy to prevent a return to the uncontrolled flows of 2015 and to further stem illegal migration on all existing and emerging routes.”

Exhausted leaders, exiting as the sun rose, expressed a sense of triumph, and relief. “After intensive discussion on perhaps the most challenging topic for the European Union, it’s a good message that we agreed on a common text,” Merkel told reporters.

President of the European Commission Jean-Claude Juncker attends a meeting during the European Union leaders’ summit focused on migration, Brexit and eurozone reforms on June 28, 2018 | Ludovic Marin/AFP via Getty Images

The migration issue rocketed to the top of the Council summit agenda in recent weeks as Merkel faced an acute political challenge from her coalition partner, Bavaria’s Christian Social Union and its leader, Interior Minister Horst Seehofer, who threatened to impose tough new border rules to stop migrants from entering Germany.

Merkel won crucial language in the declarations addressing those concerns that will help bolster her position against Seehofer and other critics complaining about so-called “secondary movements” of migrants, who register in one EU country and then cross into another.

 “Secondary movements of asylum seekers between member states risk jeopardising the integrity of the Common European Asylum system and the Schengen” common travel area, the leaders declared. “Member states should take all necessary internal legislative and administrative measures to counter such movements.”

Long dinner
The discussion about migration and asylum began over a leaders’ dinner shortly after 8 p.m., following a brief update on Brexit by U.K. Prime Minister Theresa May, and it stretched past 4 a.m., with the leaders personally hashing out the details around the table. They did not roll up their sleeves but did pull out pens, and scratch out ideas by hand, according to photos from inside the room.

Austrian Chancellor Sebastian Kurz acknowledged Friday’s agreement was by no means the end of the debate within the EU on asylum and migration, and leaders said they would continue working to revise the overall asylum rules.“It was a long and hard discussion, there are still many very different approaches in the European Union,” Kurz said.

EU leaders had fully expected a protracted discussion on the issue, and Council President Donald Tusk weeks ago had given up hope on reaching consensus on the so-called Dublin regulation on asylum policies. Instead, Tusk had proposed focusing on universally acceptable proposals to toughen border controls and enforcement, including the establishment of processing centers for asylum seekers outside EU territory, to be operated in partnership with the United Nations refugee agency and the International Organization for Migration.

But Tusk’s cautious, consensus-based approach fell victim to an inflammatory political debate triggered by Merkel’s problems in Bavaria and the installation of a populist government in Italy.


Italy reacted furiously to Merkel’s call for a mini-summit last weekend focused on secondary movements that seemed to steal attention from Rome’s longstanding complaint that frontier nations are unfairly burdened by asylum-seekers’ arrivals, and do not get sufficient help from other EU nations.

Controversial Conte
Italian Prime Minister Giuseppe Conte, attending his first European Council summit, astonished other leaders on Thursday afternoon by blocking all of their planned joint conclusions, including on noncontroversial topics. Conte, to the dismay of his colleagues, said he would not agree to anything before the conclusion of the difficult migration debate.

It was a stunning debut for the novice Italian politician, a lawyer and law professor, who never previously served in public office, but emerged as the compromise premier in the governing coalition of the anti-establishment 5Stars and the Euroskeptic, hard-right League. And it clearly won him no friends.

At one point, after Conte claimed to be taking a lawyerly approach to the development of Council conclusions — which in fact are political statements and do not have force of law — other leaders openly mocked him with their own professional credentials. Swedish Prime Minister Stefan Löfven cited his experience as a welder and Bulgarian Prime Minister Boyko Borisov chipped in, “I am a firefighter.”


Italian Prime Minister Giuseppe Conte threatened to upend the summit | Ludovic Marin/AFP via Getty Images

Conte’s blocking move also prompted lengthy explanations of Council procedure, including from Tusk, and it led one senior EU official to note, with some exasperation: “There is no fix.”

French President Emannuel Macron intervened, with support from new Spanish Prime Minister Pedro Sánchez, by pushing for a proposal to create the so-called “controlled centers” — essentially, secured refugee camps — on EU soil, mainly in frontline countries willing to host them, to be financed and managed collectively by the EU.

The Italians initially opposed the concept, fearing it would add yet more to the burden on frontier countries, but ultimately relented as compromise provisions and reassurances were tacked on to the plan — including a proviso that the EU would still push to establish the processing centers, also called disembarkation platforms, in North Africa.

The Council conclusions stressed that the new controlled centers inside the EU would be set up “only on a voluntary basis … without prejudice to the Dublin reform” leaving an opening for Italy to renew its push for mandatory relocations of refugees under a quota system — an approach that has little support across the bloc. The conclusions call for “a speedy solution to the whole package,” with a progress report due at the October Council summit.

‘Not alone’
The plan also included a declaration that asylum seekers landing in Italy will be regarded as arriving “in Europe” — essentially a rhetorical message that responsibility for them will be shared, though exactly how was not fully spelled out.

“Italy is not alone anymore,” Conte said once the deal was reached.

Sánchez, who like Conte leads the government of a frontline country and was also attending his very first Council summit, set himself apart from the Italian by playing a conciliatory role throughout.


Chancellor of Austria Sebastian Kurz | Jack Taylor/Getty Images

Meanwhile, the Visegrad Four group of Central European countries — Czech Republic, Hungary, Poland, Slovakia — that have been most resistant to accepting refugees and fiercely opposed to any mandatory quotas, said they could accept the text.

One diplomat said the Visegrad Four were still adamant that frontier countries should be responsible for enforcing border controls, and had pushed to limit the use of the word “solidarity” in the text of the compromise deal.

Rare block
Diplomats noted that there previous examples of countries blocking the formal Council conclusions — the last instance being in March 2017, when Poland did so in opposition to the reelection of Tusk as Council president. Tusk, a former Polish prime minister, is a nemesis of Jarosław Kaczyński, the leader of the governing Law and Justice Party.

And in December 2016, Austria blocked conclusions in a dispute over whether Turkey should remain a candidate country for EU membership.

But officials said that the Italians badly miscalculated in this case, in part because they were on track to win many of their demands without engaging in obstruction — simply because their goals were aligned with the political imperatives of Merkel, who is still the EU’s most influential leader.

Conte also put himself, and the League leader, Matteo Salvini, at risk of stalling cooperative ventures with broad support, including strengthening EU defense cooperation, pushing legislative initiatives that promote digital innovation, and speeding work on the bloc’s next long-term budget.

A very short discussion then followed on Russia, and the continuing lack of progress in implementing the Minsk 2 peace agreement in eastern Ukraine.

In the end, the agreement reached before dawn included approval of the full set of Council conclusions, along with the migration package.

Even after reaching agreement on the migration package, leaders still weren’t done. A very short discussion then followed on Russia, and the continuing lack of progress in implementing the Minsk 2 peace agreement in eastern Ukraine. Officials said the result was consensus on a six-month rollover of sanctions against Russia.

In addition, the leaders agreed to support a plan to reshape the European Parliament after Brexit.

Leaders seemed happy, and exhausted, as they left the Council. Sánchez called the agreement “good news” for Spain and for Europe. Danish Prime Minister Lars Løkke Rasmussen looked at the television cameras on his way out and yawned.

Andrew Gray contributed reporting.

quinta-feira, 28 de junho de 2018

O Museu Judaico de Lisboa: um testemunho da pluralidade de culturas da cidade de Lisboa



(…) “Compreendemos e somos solidários dos moradores de todos os bairros históricos e nomeadamente de Alfama onde está previsto o nosso museu. Sabemos que estão sujeitos às duras leis do mercado que têm permitido muitos despejos injustos e dolorosos. Mas não posso deixar de dizer que neste caso concreto o museu é simplesmente o “bode expiatório” desse descontentamento. Contrariamente ao que tem sido dito, nem a volumetria do projecto da arquitecta Graça Bachmann nem a sua fachada central “descaracterizam” o Largo de São Miguel. Ou então teríamos de concluir que Lisboa e, nomeadamente, os seus bairros populares estão em processo de descaracterização contínua, não apenas por novas construções “dissonantes” que se erguem por todo o lado, mas pela descaracterização do seu elemento humano, esse sim essencial. No caso concreto do Museu Judaico, cujo projecto foi aprovado pela Direcção-Geral do Património Cultural e tem merecido numerosos elogios por conciliar tradição e contemporaneidade, o único elemento “dissonante” é a Estrela de David estilizada numa parte da fachada. Mas num bairro onde a convivência de culturas é tão antiga e ainda hoje marcada por vestígios romanos, cristãos e islâmicos, a presença judaica com a sua simbologia será mais um testemunho da pluralidade de culturas do bairro e da cidade de Lisboa.”
ESTHER MUCZNIK

O Museu Judaico de Lisboa: um testemunho da pluralidade de culturas da cidade de Lisboa

O Museu que estamos a criar não é o “Museu dos judeus”, é um Museu dos lisboetas, de Portugal e dos portugueses.

ESTHER MUCZNIK
29 de Junho de 2018, 6:15

O processo de criação do Museu Judaico de Lisboa tem provocado dois tipos de reacções diferentes, senão mesmo opostas: de um lado as tentativas de carácter legal para impedir a sua construção “ali” e “assim”, e do outro, um apoio entusiástico de milhares de pessoas que têm manifestado a sua satisfação por finalmente ver narrada de forma acessível ao público a história da presença judaica em Portugal. Este apoio não vem apenas das instituições envolvidas ou de pessoas individuais: vem de museus nacionais, regionais e de outras instituições oficiais que nos cedem em depósito peças de interesse judaico; vem de doadores privados que nos entregam o seu espólio ou simplesmente as suas memórias em forma de objectos, fotos e escritos; vem de instituições similares internacionais que nos têm manifestado o seu apoio de forma inequívoca e com quem o futuro museu estabelecerá parcerias e intercâmbios no âmbito de exposições temporárias. Este entusiasmo já deu origem à criação em Dezembro 2017 da Associação de Amigos do Museu Judaico de Lisboa, com uma importante componente internacional.

Tudo isto para dizer que o Museu Judaico de Lisboa é já um processo irreversível: o guião museológico e o projecto museográfico estão praticamente terminados com a colaboração de alguns dos melhores investigadores da história judaica em Portugal, muitas peças doadas ou em depósito já estão restauradas ou em vias de o ser, o programa multimédia também se encontra em avançado estado de andamento, para não citar muitos outros aspectos fundamentais já concretizados.

Tal como qualquer outro museu, o Museu Judaico de Lisboa contará uma história: a história de perto de um milénio de presença judaica em Portugal. A cultura religiosa judaica estará patente seguindo um percurso que se desenrola em torno de três aspectos centrais: espiritualidade e sabedoria; o ciclo da vida e o ciclo do tempo. Por sua vez, o percurso histórico evoca os primeiros vestígios antes da Nacionalidade, mas o foco é o período da “Convivência” e os contributos da população judaica entre os séculos XII-XV, seguindo-se a era da “Intolerância”, a Diáspora judaico-portuguesa e o regresso contemporâneo do Judaísmo.

Confesso que, à partida, o desafio era grande: as conversões forçadas em 1497, a instauração da Inquisição em 1536 e respectivas perseguições apagaram grande parte dos vestígios da presença judaica em Portugal, não apenas na memória pública mas também no património material nacional. Felizmente, quis o bom senso e a coragem de muitos homens e mulheres que, na sua fuga da sanha inquisitorial, conseguiram salvar algum desse património hoje presente em museus e bibliotecas estrangeiras. Se assim não fosse, essa herança estaria hoje irremediavelmente perdida. E neste campo o desafio está a ser ganho: o futuro Museu Judaico de Lisboa honrará, estamos certos, a memória dos nossos antepassados, os que deixaram para sempre o seu “paraíso perdido” e os que ficaram arriscando a sua vida e segurança...

Compreendemos e somos solidários dos moradores de todos os bairros históricos e nomeadamente de Alfama onde está previsto o nosso museu. Sabemos que estão sujeitos às duras leis do mercado que têm permitido muitos despejos injustos e dolorosos. Mas não posso deixar de dizer que neste caso concreto o museu é simplesmente o “bode expiatório” desse descontentamento. Contrariamente ao que tem sido dito, nem a volumetria do projecto da arquitecta Graça Bachmann nem a sua fachada central “descaracterizam” o Largo de São Miguel. Ou então teríamos de concluir que Lisboa e, nomeadamente, os seus bairros populares estão em processo de descaracterização contínua, não apenas por novas construções “dissonantes” que se erguem por todo o lado, mas pela descaracterização do seu elemento humano, esse sim essencial. No caso concreto do Museu Judaico, cujo projecto foi aprovado pela Direcção-Geral do Património Cultural e tem merecido numerosos elogios por conciliar tradição e contemporaneidade, o único elemento “dissonante” é a Estrela de David estilizada numa parte da fachada. Mas num bairro onde a convivência de culturas é tão antiga e ainda hoje marcada por vestígios romanos, cristãos e islâmicos, a presença judaica com a sua simbologia será mais um testemunho da pluralidade de culturas do bairro e da cidade de Lisboa.

O Museu Judaico de Lisboa não pretende ser um “ajuste de contas” com o passado: na história de luz e sombra que caracteriza a presença judaica em Portugal, a tónica será posta na “luz”. A visão que fundamenta todo o guião museológico tem como primeiro objectivo destacar fundamentalmente os contributos dos judeus portugueses, especialmente em Lisboa, assim como nos países da diáspora onde procuraram refúgio.

Mas temos um outro objectivo: que o visitante, ao sair do Museu, entenda que a história que acabou de ver é também a sua história, parte indissolúvel da história de Portugal. O Museu que estamos a criar não é o “Museu dos judeus”, é um Museu dos lisboetas, de Portugal e dos portugueses... Fundadora do Museu Judaico de Lisboa e coordenadora da sua instalação

Angela Merkel: a grande desestabilizadora da União Europeia




Angela Merkel: a grande desestabilizadora da União Europeia

O pior de preservar, a todo o custo, uma construção europeia deficiente, foi ter alimentado uma engrenagem desestabilizadora da própria União Europeia.

JOSÉ PEDRO TEIXEIRA FERNANDES
28 de Junho de 2018, 16:44

1. Ao longo dos últimos anos Angela Merkel transformou-se numa líder quase mítica para o europeísmo de centro-direita, e, de forma mais surpreendente, tendo em conta a sua área política, também para o europeísmo de centro-esquerda. Defendeu o Euro e a estabilidade monetária na União Europeia no seu período mais crítico, após a crise desencadeada em 2008 nos EUA que alastrou rapidamente para a Zona Euro. Emergiu como uma autoridade e reserva moral na questão dos migrantes/refugiados, após a sua decisão de abertura das fronteiras alemãs em 2015. É vista como o maior bastião da construção europeia contra as derivas populista e eurocéptica, quer no interior da União, quer no outro pilar do Ocidente, os EUA, sob o efeito isolacionista e anti-liberal de Donald Trump. Para os seus defensores, os múltiplos ataques de que Angela Merkel tem sido alvo só alicerçam a convicção de que é preciso cerrar fileiras em torno desta e apoiar as suas ideias para a Europa e o mundo. Mas o legado político de Angela Merkel pode ter uma leitura bem mais crítica, pelos múltiplos impactos das suas políticas, quer internamente, quer em vários Estados-membros da União Europeia, sobretudo a Sul e a Leste.

2. Paradoxalmente, a obsessão de Angela Merkel pela estabilidade europeia tornou-se desestabilizadora. À custa de tanto querer preservar a construção europeia na lógica actualmente instituída — e o papel central da Alemanha nesta —, acabou por provocar e libertar forças poderosas que a desestabilizaram, e continuam a desestabilizar, em sucessivas crises. As actuais fracturas europeias, em torno da política de asilo e migrações, evidenciam o problema. Num primeiro olhar, estamos perante uma crise totalmente artificial, provocada por políticos populistas e outros radicais. Nesta altura, os fluxos migratórios para a União Europeia são bem mais baixos do que em 2015, ou até em 2017. É verdade. Mas essa é apenas a superficialidade do problema, como explicarei melhor. Nas profundezas da questão estão os avanços, pouco consistentes, da União Europeia, para uma união económica e monetária e para o Espaço Schengen, a partir do final dos anos 1980 e anos 1990. Não são, importa deixar isso claro, responsabilidade directa de Angela Merkel, mas dos políticos da época. Em qualquer caso, ambos se tornaram, ao longo do tempo, aspectos centrais de uma União Europeia mais integrada e a caminho de uma união política. O problema é que a arquitectura de ambos — a da Zona Euro e a do Espaço Schengen — foi mal concebida em aspectos cruciais do seu funcionamento. Não previu soluções adequadas, a nível europeu, para crises graves. Na prática, ambas favorecem uns Estados em detrimento de outros, como mostra a experiência da última década. E aí começam as sementes da contestação e da instabilidade.

3. Ao preservar uma construção europeia desequilibrada que herdou, na realidade Angela Merkel fez muito mais do que isso: manteve intocado um sistema que, na prática, favorece uns Estados a favor de outros e a centralidade da Alemanha. Isso é bastante evidente na Zona Euro. Com esta actuação, Angela Merkel criou, assim, uma poderosa engrenagem externa de ressentimento contra si em vários Estados-membros, no Sul e Centro e Leste europeu. Ironicamente, há também uma dimensão interna desse ressentimento que não é irrelevante: no pior cenário, até poderá derrubar o seu governo, se perder o apoio da CSU, os democratas-cristãos da Baviera. O contraste é flagrante com o passado. Quando chegou ao poder, em finais de 2005, a Alemanha tinha um sistema partidário muito estável, herdado da fundação da República Federal da Alemanha em 1949, após o colapso da Alemanha nazi na II Guerra Mundial. A rotatividade entre o centro-direita (CDU-CSU) e centro-esquerda (SPD) era uma realidade consistente da política alemã. Agora, em 2018, a Alemanha tem um governo frágil da CDU/CSU / SPD, assente num centro político cada vez mais a estreitar-se (com o SPD a arriscar-se a uma crescente irrelevância política) e com os extremos em alta, especialmente à direita a Alternativa para a Alemanha (AfD). Pela primeira vez na história do pós-guerra, a aliança política que estabilizava o centro-direita CDU/CSU está em risco de colapso. Há uma observação inegável: a grande coligação liderada por Angela Merkel, entre a CDU/CSU e o SPD, ao desguarnecer os extremos, está a destruir as bases da estabilidade política alemã tal como a conhecíamos.

4. No plano externo, a engrenagem do ressentimento contra Angela Merkel e a Alemanha surgiu, primeiro, ligada à crise Zona Euro. Esta atingiu o seu ponto crítico nos primeiros meses do ano de 2015, com o problema da imensa dívida grega. O que se verificou, especialmente entre 2010 e 2015, foi um contínuo acumular de desequilíbrios na Zona Euro. Independentemente de outras causas — e das responsabilidades nacionais que obviamente também existiram, como é muito evidente na Grécia —, o sistema potenciou um aumento contínuo da dívida pública no Estados do Sul da União, um acumular de superavits comerciais e um afluxo de capitais à Alemanha, que intensificou a sua primazia económica na União. Ao defender intransigentemente a arquitectura do Euro — uma réplica europeia do modelo monetário alemão —, Angela Merkel conseguiu, de facto, preservar o sistema. Mas esse sucesso teve um preço muito político elevado: libertou uma poderosa engrenagem de ressentimento. Basta lembrarmo-nos das imagens do nazismo e das guerras da Alemanha na Europa que ressurgiram em força, na Grécia e nos Estados mais afectados pela crise e pelas políticas de austeridade. Ao contrário do que muitos pensam, esse ressentimento não desapareceu, apenas se tornou latente. Ficou à espera de uma nova conjugação de circunstâncias negativas para explodir. Aqui entram os populismos que encontraram o terreno perfeito para crescer e funcionam agora como detonadores.

5. A engrenagem do ressentimento tem um outro lado crítico na crise dos refugiados/migrantes do Verão de 2015. Um elemento eminentemente político da construção europeia está no cerne do problema: o Espaço Schengen. Tal como a Zona Euro, não foi pensado para crises de alguma gravidade, ligadas a pressões migratórias de massa de refugiados / migrantes económicos nas suas fronteiras externas. O quadro legislativo europeu — “os regulamentos de Dublin” — colocou uma sobrecarga desproporcionada nos Estados com fronteiras externas a Sul, dado os fluxos migratórios virem do Mediterrâneo. São estes que têm de lidar, em primeira linha, com as chegadas em massa no seu território e tratar a generalidade dos pedidos de asilo. (Ver Comissão Europeia, “Country responsible for asylum application (Dublin)”). Mas sendo este um sistema europeu, pressupõe uma actuação comum europeia. Todavia, em 2015, quando Angela Merkel, decidiu abrir as suas fronteiras, fê-lo unilateralmente. (Ver “Merkel's Refugee Policy Divides Europe” in Der Spiegel, 21/09/2015). Podemos debater, interminavelmente, se o fez por genuíno sentimento humanitário e liderança moral da União Europeia — como sustentam os seus defensores; ou se o fez por frio calculismo político, para melhorar a imagem negativa ligada à insensibilidade ao sofrimento dos povos do Sul da Europa duramente afectados pelas políticas de austeridade — como sustentam os seus detractores. Seja qual for a interpretação mais próxima da realidade, abriu uma segunda área de ressentimento. Foi no Centro e Leste europeu onde esta ganhou mais terreno.

6. A Itália, originalmente muito europeísta, é hoje o Estado onde as sequelas da actuação de Angela Merkel em defesa da Zona Euro e do Espaço Schengen — ambos, como vimos, com falhas de concepção que geram, na prática, acentuados desequilíbrios entre os Estados-membros — maior desestabilização acabaram por criar no sistema político. É uma ironia da construção europeia. Certamente que não há apenas causas externas para o problema de Itália. Há grandes responsabilidades dos políticos que governaram o país nas últimas décadas e o amplificaram. A realidade é que em muitos italianos se instalou o sentimento de que o Euro lhe fez perder bem-estar, levando, ao mesmo tempo, a ganhos injustos da Alemanha à sua custa. E que a Itália ficou (quase) sozinha, com um grave problema migratório europeu — devido ao Espaço Schengen e à lógica desproporcional da legislação europeia sobre o asilo —, mais uma vez favorecendo a Alemanha e os Estados do Norte que estão longe do Mediterrâneo. Foi esse terreno político onde cresceram o Movimento Cinco Estrelas (M5S) e a Liga, actualmente no poder. É tentador ver o M5S e a Liga como causas do actual problema italiano. Tudo estaria bem se não fossem estes populistas e extremistas. Mas é uma visão superficial e errada. Na realidade, estes são mais sintomas e consequências de um mal-estar acumulado ao longo dos últimos anos, que tem causas internas e externas.

7. Angela Merkel não é certamente culpada de todos males da União Europeia, nem da Alemanha. (Ver “Deutschland unter alles They can’t blame this one on ‘Mutti.’” in Politico, 27/06/2018). Para os seus adeptos é uma heroína. É, tudo indica, uma europeísta convicta. Herdou, como já notado, uma construção europeia desequilibrada por decisões dos anos 1990. Mas as suas políticas de preservação, a qualquer custo, dessa construção europeia mal concebida, sobretudo na Zona Euro e no Espaço Schengen, geraram um sentimento de ressentimento. Acabaram por tornar grande parte do Sul e do Leste europeu anti-europeístas e anti-germânicos, de forma aberta ou latente. Instalou-se o sentimento de que a Alemanha retira os maiores ganhos da construção europeia. E de que a União Europeia é um instrumento de dominação germânica. Ao mesmo tempo, internamente, Angela Merkel afastou eleitorado tradicional e abriu, sem querer, o caminho aos extremos, sobretudo à direita. Mas o pior de preservar, a todo o custo, esta construção europeia deficiente, ignorando ou não resolvendo os seus problemas mais profundos, foi ter alimentado uma engrenagem desestabilizadora da própria União Europeia. A actual crise migratória “ao retardador” — explorada politicamente pela (extrema)direita populista e outros contestatários —, mostra como as consequências podem surgir anos mais tarde. No Conselho Europeu de 28 e 29 de Junho, Angela Merkel tem um teste crítico à sua longa carreira política. Resta saber se, com tantos ressentimentos e fracturas, é ainda possível reconfigurar políticas que, para além das intenções europeístas, desestabilizaram a União Europeia nos seus delicados equilíbrios entre o Norte e o Sul, o Ocidente e o Leste.

Italy stalls EU summit with block on joint conclusions / Itália sobe a parada no tema das migrações e deixa Merkel em posição ainda mais difícil



Italy stalls EU summit with block on joint conclusions

‘Nothing is agreed until everything is agreed,’ says Italian official.

By           DAVID M. HERSZENHORN AND JACOPO BARIGAZZI         6/28/18, 8:35 PM CET Updated 6/28/18, 9:46 PM CET

Italy’s new populist government sabotaged its first EU summit on Thursday, as Prime Minister Giuseppe Conte blocked all joint decisions ahead of a controversial dinner discussion on migration, several officials said.

Conte’s refusal to accept the joint Council conclusions — written statements agreed by all leaders — even on noncontroversial topics prompted EU officials to scrap a planned evening news conference.

Italy had expressed its dismay over the trajectory of the migration discussion, but Conte’s move to stall the entire summit caught other leaders off-guard.

According to one official observing the discussions, other leaders urged him not to block the other issues on which there appeared to be consensus — including strengthening defense cooperation, pursuing legislation that promotes digital innovation, and speeding work on the EU’s next long-term budget — by linking them to the divisive migration debate.

The Italians are deeply angry that the discussion of migration policy has shifted in recent days away from its own concerns over the burden on frontline countries and focused instead on so-called “secondary movements,” which had created a domestic political crisis for German Chancellor Angela Merkel.

The migration discussion was scheduled to be held over dinner — the time leaders traditionally reserve for their most difficult summit debates.

Council President Donald Tusk and Commission President Jean-Claude Juncker had scheduled a pre-dinner news conference where they planned to announce the agreement on other issues. But with Conte blocking everything, the news conference was cancelled.

“As one member reserved their position on the entire conclusions, no conclusions have been agreed at this stage,” said a Council spokesperson, “For this reason, the press conference by the EU institutional representatives has been canceled and will instead take place tomorrow after the end of the Euro Summit.”

The official observing the discussions said Tusk had conceded that according to Council procedures any one nation could block the conclusions, but that he also “encouraged everyone not to see this as the anticipation of a negative outcome, noting that there is a good possibility of a constructive outcome.”

Conte’s move appeared to confirm Brussels’ worst fears that Italy’s unusual coalition government — a partnership between the anti-establishment 5Stars and the Euroskeptic, hard-right League — could lead to paralysis.

An Italian official confirmed that the Conte was blocking agreement on the summit conclusions. “Nothing is agreed until everything is agreed,” the official said.

Itália sobe a parada no tema das migrações e deixa Merkel em posição ainda mais difícil

Alegando que o momento é para "acções concretas", Giuseppe Conte bloqueou a aprovação do documento com as conclusões da cimeira até haver consenso para a repartição dos refugiados pelo território europeu.

 Rita Siza
RITA SIZA Bruxelas 28 de Junho de 2018, 21:55

A parada não podia estar mais alta. Com a sobrevivência política da chanceler alemã, Angela Merkel, em jogo, e a depender de um acordo para (mais uma vez) tentar conter o fluxo de migrantes e candidatos a asilo que agora arriscam a vida no Mediterrâneo para entrar na União Europeia, os chefes de Estado e de governo sabiam que não podiam dar os trabalhos por terminados se não tivessem alguma coisa que pudessem apresentar como um “resultado”.

“Vai ser seguramente um Conselho Europeu decisivo”, afirmava o primeiro-ministro, António Costa, antecipando “uma noite longa” a partir pedra sobre o tema das migrações. “Vai ser muito exigente, mas se todos tivermos a vontade política de tomar decisões, de procurar convergências sobre aquilo que temos de acordar, sob pena de a Europa se continuar a dividir, creio que poderemos chegar a bom porto”, acrescentou.

Mas depois de muitas horas de debate, não havia resultado nenhum — e nem a perspectiva de que pudesse haver. Numa posição de força, que mesmo sem ser inesperada parece ter apanhado os líderes europeus de surpresa, o primeiro-ministro de Itália, Giuseppe Conte, sacou do seu trunfo e anunciou, minutos antes de todos se sentarem para o jantar de trabalho, que não ia aprovar o documento com as conclusões do Conselho em todos os temas, antes de se avançar com a discussão das ideias e propostas em cima da mesa sobre o tema das migrações.

Conte, que no domingo apresentou aos seus parceiros uma nova “estratégia europeia em seis pontos e vários níveis” para garantir a protecção das fronteiras externas da UE, mas também a repartição dos refugiados por todo o território europeu, repetia que “este é um momento crucial”. “Recebi muitas manifestações de solidariedade, mas o que a Itália precisa não é de garantias verbais, é de acções concretas”, vincou, acrescentando que estava disposto a “assumir todas as consequências” em função do desenvolvimento do debate.

“Durante a tarde, o Conselho Europeu discutiu matérias de defesa e segurança, emprego, crescimento e competitividade, inovação e digital e ainda questões como o alargamento e o próximo quadro financeiro plurianual. Como um Estado-membro reservou a sua posição para depois da discussão de todos os temas, nada foi aprovado nesta altura. Por esta razão, a conferência de imprensa dos dois representantes institucionais da União Europeia foi cancelada e só ocorrerá [amanhã] depois da cimeira do euro”, informaram os serviços do Conselho, num comunicado divulgado uma hora depois do previsto.

O italiano insiste que o seu país, e os outros que estão na mira das redes de tráfico humano através do Mediterrâneo, não podem ficar sozinhos a gerir as operações de resgate no mar, o processamento dos migrantes e a redistribuição dos refugiados pelos outros países do bloco. Na sessão de trabalho nocturna, os líderes preparavam-se para analisar a proposta de instalação de plataformas de desembarque regionais, isto é, “canais legais e sítios seguros, do lado de cá ou do lado de lá do Mediterrâneo, que sejam portas de entrada para todos aqueles que carecem de protecção internacional”, segundo explicou o primeiro-ministro português, que apoia a ideia.

“Nós temos de ter canais organizados para que os refugiados possam ser acolhidos na Europa. Não é admissível que continuem a morrer no Sara ou no Mediterrâneo os milhares de seres humanos que todos os anos morrem, por não haver capacidade de a Europa se organizar”, criticou António Costa. “Manter legislação antiquada, que obriga os refugiados a arriscar a vida, colocando-se nas mãos de redes mafiosas e correndo o risco de morrerem no Mediterrâneo, porque só chegando às costas europeias podem pedir o direito de asilo, é uma situação desajustada da realidade e absolutamente desumana”, considerou.

Mas mesmo que os líderes acabem por chegar a acordo para dar luz verde ao estabelecimento destas plataformas — que ainda ninguém sabe ao certo como vão funcionar, nem onde —, serão precisas outras acções, mais imediatas e concretas, para mitigar a crise aberta pelo ministro alemão do Interior, Horst Seehofer, que ameaça desfazer o Governo de coligação em Berlim por causa dos chamados “movimentos secundários”. Merkel agendou uma série de reuniões bilaterais, noite fora, para fechar acordos com a Grécia, a França ou a Hungria e assim travar as pretensões do seu ministro, que quer fechar as fronteiras do país à entrada de refugiados com registos feitos noutros Estados-membros.

Enquanto isso, a França, juntamente com Malta, Holanda e Espanha, tentavam negociar com a delegação italiana um novo rascunho de conclusões com nova linguagem sobre as migrações — fontes diplomáticas diziam que teria referências explícitas aos tais “centros de controlo” que reuniam cada vez mais defensores. As alianças, que ao início do dia se anunciavam como uma frente (mais ou menos unida) de apoio a Angela Merkel, tentavam alargar os seus esforços para convencer Giuseppe Conte, aparentemente sem grande sucesso.

O líder italiano mostrava-se inflexível, e deixava todos em suspenso ao garantir que sem um (improvável) compromisso para a reforma do regulamento de Dublin que consagre as obrigações e responsabilidades de cada Estado-membro no acolhimento de refugiados, e sem um aumento das contribuições financeiras para que os países africanos de onde partem os migrantes possam ajudar a travar o fluxo, não haverá acordo nenhum.