19 de junho 2021
E o comentador do regime É... Pedro Cardoso Pereira
Pedro Adão e Silva usa o apelido materno em vez do
paterno. O seu avô foi um reconhecido maçon republicano que deixou bem
carimbado o apelido ‘Adão e Silva’. Pedro surfa a onda.
Henrique Pinto de
Mesquita
henrique.mesquita@newsplex.pt
Cardoso Pereira
são os apelidos do comentador político e desportivo, na televisão, na rádio e
nos jornais, indicado por António Costa para comissário executivo das
comemorações do 50º aniversário da revolução do 25 de Abril. Mas ninguém o conhece pelos apelidos herdados
do pai, porque Pedro optou por se fazer conhecer publicamente pelos de sua mãe,
Adão e Silva, cujo pai foi um influente republicano e maçon, grão-mestre do
Grande Oriente Lusitano.
O casamento entre
a família Adão e Silva e o poder não é coisa deste século. O avô materno de Pedro
– Armando Adão e Silva – foi figura proeminente no combate ao salazarismo e um
destacado membros das elites burguesas de esquerda da segunda metade do século
XX.
Já Pedro Adão e
Silva, pertencente à mesma elite, é um conhecido comentador da nossa praça.
Associado à defesa intransigente do PS, tem plataforma pública nacional há
vários anos em sítios como o RTP, TSF, Expresso, Sport TV e Record.
É possível que o
seu apelido lhe tenha facilitado a vida.
A verdade é que, devido à importância que o seu avô teve nos meios
revolucionários, carregar o apelido Adão e Silva em círculos de esquerda é
bastante diferente do que, por exemplo, carregar o apelido Cardoso Pereira, do
pai. Para a esquerda portuguesa, ‘Adão e Silva’ significa status, como
reconhece ao Nascer do SOL_um histórico militante socialista e maçon.
Grão-mestre, do PS à AD
Armando Adão e
Silva não foi apenas um destacado antissalazarista. Foi, sobretudo, um
proeminente maçon. Nasce em Lisboa em 1909 e em 1931 forma-se em Direito pela
Universidade de Lisboa. Passados quatro anos é iniciado na maçonaria pela Loja
da Liberdade nº 197, com o nome Mestre de Avis, mantendo-se na clandestinidade
até 1974. Em 1968, juntamente com Luís Dias Amado, forma os Pentágonos –
células paramaçónicas cujo objetivo era o de difundir o espírito da maçonaria
junto da juventude. Após o 25 de Abril teve um papel importante na
reorganização do Grande Oriente Lusitano, tendo sido também importante no
processo de devolução do Palácio Maçónico (conquistando-o ao PPD, que quase
logrou ter ali a sua sede). Em 1981 viria a suceder a Dias Amado como
grão-mestre do Grande Oriente Lusitano, cargo em que se manterá até 1984.
Também comemorou um centenário: o da República
Em 1943, Armando
Adão e Silva e um conjunto de intelectuais de esquerda fundam a União
Democrato-Socialista, núcleo antifascista que mais tarde viria a fundir-se com
o Núcleo de Doutrinação e Acção Socialista e formar a União Socialista. Ainda
nesse século, foi uma das principais vozes a favor da entrada de Portugal na
NATO.
Em 1959 é preso –
uma situação que, dois anos mais tarde e devido a ter sido um dos 62
signatários do ‘Programa para a Democratização da República’, voltaria a
repetir-se. A sua calcorreada republicana acabaria por juntá-lo a um grupo de
influentes opositores do regime, composto por advogados, médicos, maçons e
republicanos, onde constavam figuras como Mário Soares, Nuno Rodrigues dos Santos,
Mayer Garção, Mário de Azevedo Gomes, Joaquim Bastos, Carlos Pereira, Piteira
Santos, Armando Castanheira ou Acácio Gouveia. E é com este grupo que, em 1960,
viria a assinalar o cinquentenário da República, através de um almoço
comemorativo que decorreu no restaurante Colombo, como exposto numa das
fotografias que acompanha este texto (Adão e Silva é o segundo em pé da
esquerda para a direita). O mesmo «grupo de republicanos» deslocar-se-ia ainda
aos Jerónimos para depositar «ramos de flores nos túmulos de Teófilo Braga,
Herculano, Garrett e Junqueiro», tal como o Diário de Lisboa noticia a 4 de
Outubro de 1960.
Dá-se, portanto,
a coincidência de, em 1960, Armando Adão e Silva ter integrou as comemorações
do cinquentenário da República e Pedro Adão e Silva, em 2024, ser o comissário
oficial das comemorações do
cinquentenário do 25 de Abril.
Armando Adão e
Silva, em 1976, integrou, com Adelino Palma Carlos, o extinto Partido
Social-Democrata Português (a razão para a confusão entre os nomes PPD/PSD), de
onde sairia diretamente para o Partido Socialista. Contudo, a sua passagem pelo
PS foi sol de pouca dura: em 1978 sai e, juntamente com António Barreto,
Medeiros Ferreira, Francisco Sousa Tavares e outros, integra o ‘Grupo dos
Reformadores’ – grupo que juntar-se-ia à Aliança Democrática nas eleições
intercalares de 1979, acabando por eleger Armando Adão e Silva como deputado
por Aveiro.
De notar ainda
que Armando Adão e Silva foi Presidente da Associação de Futebol de Lisboa e
membro do Conselho Jurisdicional do Sport Lisboa e Benfica. Um ‘benfiquismo’
que Pedro Adão e Silva perfilha, tendo sido candidato a vice-presidente do
clube pela lista de Noronha Lopes em 2020.
Após receber a
Comenda da Ordem da Liberdade em 1980 e ser agraciado como Grande-Oficial da
Ordem de Mérito em 1989, viria a morrer, em Lisboa, em 1993.
O menino de ouro
de Ferro
E Pedro Adão e
Silva? Quem é e como se tornou alguém tão acarinhado dentro do PS? Um histórico
socialista explicou-nos qual foi o seu percurso no partido, garantindo-nos que
«todos têm pena» de que ele se tenha ido embora tão novo. Explicou-nos, por
exemplo, que a ala que o apadrinhara politicamente foi a ala divergente da de
Mário Soares, camarada do avô Adão e Silva. Trata-se da ala do «sótão do
Guterres»: composta pelo próprio, Ferro Rodrigues, Jorge Sampaio e Vitor
Constâncio, que «em nada tem a ver com a ala maçónica republicana do Armando» e
que conspirou contra Soares até 1985,
tomando conta do partido após a sua saída.
Explica a mesma
fonte que Pedro Adão e Silva «tem umas ascensão meteórica mais por causa de
Ferro Rodrigues» do que pelo nome de família: «Quando Ferro chega a
secretário-geral do PS vai buscar dois jovens que vêm do ‘grupo do ISCTE’: Adão
e Silva e Paulo Pedroso». Adão e Silva era apontado como o mais «equilibrado e
ponderado», começando, por isso, a «brilhar» no partido. Contudo, quando
Sampaio decide não antecipar eleições e Ferro se demite, Adão e Silva
«desilude-se, sai do PS e desiste da política».
Mas a mesma fonte
acredita que esta sua nomeação, por escolha direta de António Costa, vai de
encontro à ideia de Adão e Silva estar próximo do poder e, contudo, nunca o
representar. E considera a defesa «acérrima» e «com erros» de Marcelo
«estranha», ironizando que isso talvez seja um sinal de uma aproximação ao PSD
– fazendo, então, assim o mesmo percurso político de seu avô.

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