sábado, 18 de junho de 2022

Costa recusa ambiguidade mas põe condições para adesão da Ucrânia à UE

 


GUERRA NA UCRÂNIA

Costa recusa ambiguidade mas põe condições para adesão da Ucrânia à UE

 

Primeiro-ministro afirma que Portugal vai acompanhar recomendação da Comissão Europeia, mas alerta para necessidade de revisão da arquitectura institucional e financeira da UE. E sublinha que estatuto de candidato “não resolve nenhum problema dos ucranianos”.

 

Leonete Botelho

17 de Junho de 2022, 22:22

https://www.publico.pt/2022/06/17/politica/noticia/costa-recusa-ambiguidade-poe-condicoes-adesao-ucrania-ue-2010470

 

Sem qualquer ambiguidade, o primeiro-ministro afirmou esta sexta-feira que Portugal acompanhará o parecer da Comissão Europeia para aceitar a candidatura da Ucrânia e da Moldova à União Europeia. Mas também irá deixar claro, no Conselho Europeu da próxima semana, que qualquer processo de alargamento tem de ser acompanhado de “uma reflexão sobre a arquitectura institucional e financeira da UE”, para que não haja no futuro “ricochetes sobre a credibilidade” europeia.

 

Ao fim da tarde desta sexta-feira, depois de ter ouvido “um consenso quase unânime” dos partidos com assento parlamentar sobre o tema, António Costa afirmou que “Portugal irá acompanhar o parecer da Comissão Europeia quanto à adesão da Ucrânia e da Moldova”, mas avisou que “vai ser um processo longo, exigente e incerto”. E sublinhou que o estatuto de candidato não pode fazer “descurar o que a Ucrânia mais necessita no imediato e que é apoio financeiro, militar e humanitário”.

 

Só depois disso explicitou as suas reservas, ou pré-condições, sobre qualquer processo de alargamento da União Europeia ao nível da estrutura institucional e financeira da União Europeia, de forma a garantir que haja “boas condições para termos uma UE forte, unida, capaz de cumprir os seus objectivos e de acolher bem os seus candidatos”. “É fundamental que todos os países que acompanhem esta recomendação da Comissão Europeia o façam de forma consciente para não haver no futuro um ricochete muito inconveniente na credibilidade da UE, como já aconteceu no passado”, disse.

 

Em resposta aos jornalistas, o primeiro-ministro recusou qualquer ambiguidade na sua posição, rejeitando a acusação do eurodeputado Paulo Rangel no PÚBLICO: “Portugal nunca teve uma posição ambígua desde a madrugada de 24 de Fevereiro. Não fomos ambíguos na forma como temos apoiado a Ucrânia a nível político, financeiro, militar e humanitário, e também não fomos ambíguos quando dissemos que era preciso aguardar o parecer da Comissão Europeia”. Em concreto, lembrou os 250 milhões de euros de apoio financeiro, a aquisição de equipamento militar para ceder à Ucrânia e o mecanismo de acolhimento humanitário cedo criado em Portugal.

 

Mas também não escamoteou as suas dúvidas sobre o alargamento da UE. Embora tenha sublinhado a “confiança” na avaliação que o executivo europeu liderado por Ursula von der Leyen faz das condições que os dois países têm para serem candidatos, António Costa insistiu que o processo será “longo, exigente e incerto” e que não resolve nenhum problema dos ucranianos “do ponto de vista prático e urgente”. E repetiu a necessidade de reflectir sobre “o caminho” que a Europa vai seguir.

 

Questionado sobre se Portugal estava preocupado, em particular, com a competição dos novos candidatos em relação aos fundos europeus, António Costa não negou. “Há factos que não devemos escamotear: a boa integração destes países pressupõe uma reflexão para saber qual é o caminho que vamos percorrer”, disse, dando como exemplos das suas preocupações a representatividade de todos os Estados-Membros da UE na Comissão Europeia e no Parlamento Europeu, mas também saber “se os actuais [países] contribuintes líquidos estão abertos a aumentar a sua participação financeira ou se vamos ter o mesmo bolo para dividir por mais parceiros”.

 

Costa não se preocupa se Portugal “fica mais ou menos sozinho” com estas suas posições, mas recorda que “ainda há pouco tempo o Presidente [francês Emmanuel] Macron dizia que há muitas formas de ser europeu”, e recordou como a Suíça e até o Reino Unido são países europeus não integrados na UE. “Os cidadãos europeus têm que conhecer todas as consequências das suas decisões”, disse, insistindo na reflexão sobre o alargamento da EU.

 

E concluiu com uma frase que soou a recado a Macron: “A minha convicção é que os meus colegas hoje tão emocionados [com as imagens da Ucrânia] estão cientes que essas alterações são essenciais”.

 

PCP e IL criticam posição “menos clara”

Ao longo de todo o dia, o primeiro-ministro ouviu dos partidos com assento parlamentar posições quase todas favoráveis à concessão à Ucrânia do estatuto oficial de país candidato à União Europeia. A excepção foi o PCP, com Jerónimo de Sousa a defender que a prioridade face ao conflito na Ucrânia deve ser “o diálogo, o esforço procurando a paz como solução para o conflito” e “evitar que o nosso povo e outros povos sofram as consequências económicas” da guerra.

 

O líder comunista, aliás, aproveitou para sinalizar a “relativização” do primeiro-ministro em relação à candidatura da Ucrânia à UE: “Hão-de reparar que existe uma intenção, mas mesmo aqueles que defendem esse estatuto, relativizam-no, como tem acontecido, incluindo por parte do senhor primeiro-ministro na sua consideração de que ‘sim, estatuto associativo, mas em relação à questão da adesão logo se verá'”, afirmou.

 

Também o presidente da IL lamentou a posição “menos clara” assumida pelo Governo, considerando que não existe, neste momento, “espaço para ambiguidade estratégica na União Europeia”. Questionado se, neste momento, o primeiro-ministro lhe parece menos ambíguo, João Cotrim de Figueiredo não respondeu directamente: “O senhor primeiro-ministro está a misturar os vários planos, a UE é um espaço de comunhão de valores e princípios. Estes valores vêm, para nós, antes de quaisquer outros”.

 

O PSD considerou “fundamental” a Ucrânia obter o estatuto de candidato mas frisa que este caso deve ser visto como “excepcional”, enquanto o Livre considerou que o processo de adesão “terá de ser julgado pelos seus méritos e deméritos” e cumprir as regras, exigência também referida pelo Bloco de Esquerda. Já o PAN não quer adiamentos por motivos económicos.

 

Para esta sexta-feira estava prevista a votação de um projecto de resolução em que o Livre recomendava ao Governo o “exprimir [do] seu apoio à atribuição do estatuto de candidato a Estado-membro da UE à Ucrânia”, sem “interferência das relações com a Rússia nas relações entre a Ucrânia e a UE”.

 

A votação do projecto acabou por ser adiada para dia 22 a pedido do Livre. Ao PÚBLICO, o deputado único do Livre, Rui Tavares, explicou o adiamento com o objectivo de “permitir acabar a ronda de consulta aos partidos e o debate sobre as prioridades da presidência checa, com o primeiro-ministro, na próxima quarta-feira, após o qual a nossa resolução será votada”. com David Santiago e Lusa

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