segunda-feira, 29 de junho de 2015

Câmara demarca-se de fecho de loja histórica. Município diz que “não tem conhecimento nem é suposto que tenha” de que o proprietário do espaço vai despejar a casa

Simultâneamente com o anúncio da intenção de implementar o programa “Lojas com História”, este, acompanhado com um levantamento “exaustivo” das mesmas lojas, a CML torna pública a sua “posição” sobre o caso Sant' Anna na Rua do Alecrim …
Ler o artigo que se segue da autoria de António Sérgio Rosa de Carvalho, publicado a 25-6-2015 no Público …
OVOODOCORVO

Câmara demarca-se de fecho de loja histórica

Município diz que “não tem conhecimento nem é suposto que tenha” de que o proprietário do espaço vai despejar a casa

Inês Boaventura / 30-6-2015 / PÚBLICO

A Câmara de Lisboa diz que “não tem conhecimento nem é suposto que tenha” de que o proprietário do prédio na Rua do Alecrim em cujo rés-do-chão funciona a loja da Fábrica de Sant’Anna tenha dado ordem de despejo à empresa, instalada no local há 99 anos, acrescentando que não tem competências nesta matéria.
A notícia do despejo, marcado para Outubro e motivado pela transformação do prédio num hotel, gerou uma onde de indignação e de solidariedade para com aquela que se apresenta como a “última grande fábrica de azulejos e faianças artesanais da Europa”.
Também a Junta de Freguesia da Misericórdia, presidida pelo PS, se pronunciou contra o fecho anunciado da loja, apelando ao promotor, o Grupo Visabeira, para que a integrasse no seu “projecto de requalificação do edificado”. Diferente parece ser a visão da câmara sobre o assunto.
Na sexta-feira, respondendo a perguntas feitas pelo PÚBLICO a 11 de Junho, o município informou que, “como é do conhecimento publico, a nova lei do arrendamento não atribui às câmaras municipais quaisquer competências na regulação dos arrendamentos comerciais entre particulares”. E acrescentou que o edifício em causa “integra o Inventário Municipal do Património”, mas a loja “não integra”.
Questionada sobre se a câmara tem conhecimento de que o proprietário se prepara para despejar a loja da Fábrica de Sant’Anna, a resposta, que não está assinada e foi enviada por correio electrónico pelo Departamento de Marca e Comunicação, foi esta: “Não tem, nem é suposto que tenha”.

“A proprietária do prédio submeteu à apreciação desta câmara um pedido de licenciamento para adaptação do edifício existente para o uso de turismo, aprovado por maioria na reunião de câmara de 17/12/2014, encontrando-se a aguardar a entrega dos projectos das especialidades”, diz o município.

As lojas tradicionais da Baixa: desafios presentes e futuros ANTÓNIO SÉRGIO ROSA DE CARVALHO 25/06/2015 – PÚBLICO


As lojas tradicionais da Baixa: desafios presentes e futuros

Finalmente, os proprietários das Lojas Tradicionais encontraram-se em Lisboa, e estabeleceram contacto através de uma plataforma de “cidadania”.

Este é o exacto título de um artigo da minha autoria, inserido no volume intitulado “Reabilitação Urbana: bases para uma intervenção de salvaguarda” (https://www.academia.edu/3876080/Baixa_Pombalina_bases_para_uma_interven%C3%A7%C3%A3o_de_salvaguarda_Baixa_Pombalina_Bases_for_Intervention_and_Preservation)
, publicado em Junho de 2005 pela CML, com a coordenaçào editorial de João Mascarenhas Mateus, exemplo de um completo estudo de conteúdo, no contexto preparatório da classificação da Baixa a Património Mundial.

Isto é relevante, agora que a CML anunciou a sua intenção de reactivar a ideia da Classificação, estendendo-a aos bairros históricos e simultaneamente voltar a repetir a ideia/intenção, tantas vezes repetida, de promover o programa “Lojas com História”, onde se pretende simultaneamente defender as características culturais/patrimoniais dos estabelecimentos históricos e promover o comércio tradicional.

Ora, precisamente no artigo acima referido e também em artigo publicado no PÚBLICO em 16/07/2006 Made in Portugal, eu descrevo as experiências que tive oportunidade de desenvolver em lojas tradicionais com interiores de valor histórico, em permanente colaboração com a Unidade de Projecto Baixa-Chiado e o então IPPAR.

Assim, na antiga alfaitaria Rosado Pires, na Rua Augusta, conseguiu-se convencer o novo proprietário a manter todo o interior intacto, utilizando a sua autenticidade como uma mais valia. Pena que, com o tempo, uma parte do mobiliário original tenha desaparecido e o interior tenha sido “funcionalizado”. O mesmo foi conseguido na Perfumaria Pompadour, com projecto de interiores de Raúl Lino (agora Swarovski /Rua Garret ) assim como na farmácia Normal na Rua da Prata.

Isto serve apenas para ilustrar que, embora estes processos tenham conhecido avanços e recuos paradoxais e inexplicáveis, existe uma base de conhecimento já considerável e aproveitável.

Um bom exemplo destes paradoxos constitui a recusa de classificação, por parte do IPPAR neste período, da Ourivesaria Aliança, juntamente com outros importantes estabelecimentos que constavam nos dossiers completos desenvolvidos pelo Núcleo dos Estudos do Património da CML.

No entanto, posteriormente, sobre a pressão da Opinião Pública e Comunicação Social, Manuel Salgado exigiu e garantiu a preservação deste notável e insubstituível estabelecimento.

A vigilância e o contacto entre os interessados é portanto fundamental.

Mas, e aqui chego ao objectivo deste artigo, há que manter objectividade e pragmatismo nos objectivos imediatos.

O acontecimento mais importante no que respeita a salvaguarda concreta perante a ameaça progressiva que constitui a Lei das Rendas, tomou lugar no Porto no Hotel Intercontinental, numa conferência intitulada Reabilitar para Revitalizar (PÚBLICO 20/09/2014) onde Rui Moreira exprimiu as suas preocupações de forma confrontadora perante uma assembleia de empreendedores e proprietários, ameaçando chegar ao ponto de expropriar edifícios, caso os insubstituíveis estabelecimentos históricos instalados no mesmos fossem ameaçados e consequentemente extintos, pelo aumentos das rendas.

Ora, finalmente, os proprietários das Lojas Tradicionais encontraram-se em Lisboa, e estabeleceram contacto através de uma plataforma de “cidadania”.

Se isto fizer algum sentido será, não apenas na troca de informações e de postais “culturais”, ficando “entretidos” num circulo inefectivo, enquanto a espada ameaçadora da Lei das Rendas continua a descer sobre as suas cabeças, mas precisamente numa acção coordenada e sistemática de forma a levarem Medina e Salgado a tomarem uma posição explícita e pública de compromisso na defesa das Lojas Tradicionais, perante a ameaça crescente para a sua existência e sobrevivência, que a Lei das Rendas constitui.


Historiador de Arquitectura

Europe's big guns warn Greek voters that a no vote means euro exit / GUARDIAN



Europe's big guns warn Greek voters that a no vote means euro exit


Germany, France and Italy joined the European commission in insisting that Sunday’s poll is about continued eurozone membership

Larry Elliott, Graeme Wearden, Nicholas Watt and Helena Smith in Athens

The eurozone’s three biggest countries have raised the stakes in next Sunday’s Greek referendum with an orchestrated warning to voters that a no vote would mean exit from the single currency and the return of the drachma.

As the Greek economy suffered on its first day of stringent capital controls, politicians from Germany, France and Italy joined the European commission in insisting that the poll was not about whether Athens could secure more favourable bailout terms but was about continued euro membership.

The stark assessment was shared by George Osborne who told MPs that the UK economy would be affected by the chaos that would result from Greece leaving the eurozone.

The chancellor’s comments came as ratings agency Standard & Poor’s issued a grim analysis of the repercussions that could follow an euro exit, the chances of which it has raised from 33% to 50%. S&P said there could be “a serious foreign currency shortage for the private and public sectors, potentially leading to the rationing of key imports such as fuel”.

S&P added that without continuing European Central Bank support for Greek banks, the country’s “payment system would shut down and its banks would not be able to operate”.

Eurozone leaders sought to exploit pictures of cashpoint queues and empty Athens restaurants to stress what was at stake if Greeks supported the decision of their prime minister, Alexis Tsipras, to reject the fresh austerity measures being demanded by the country’s creditors for continued financial support.

At the end of a day that saw sharp falls in share prices around the globe, Tsipras used a TV address to ask a public still stunned by the imposition of a €60 daily limit on bank withdrawals to back his resistance to a new round of tough tax increases and spending cuts demanded by the troika of the commission, the ECB and the International Monetary Fund.

Tsipras urged Greeks to vote no in the forthcoming referendum, saying the plebiscite would be a strong “negotiating tool” in talks with lenders. Denying that Greece had walked away from negotiations, he told state-run TV: “The greater the number of no [votes], the greater the weapon the government will have to relaunch negotiations. Greece never left the negotiating table, it is still at the negotiating table. ”

Appearing by turns combative and nervous, the 40-year-old leader suggested, for the first time, that he and his radical left Syriza party would resign if the yes vote triumphed in the referendum.

“We will respect the result but we will not be there to serve it,” he told the station.

Greece’s international creditors clearly did not want a no vote because they wanted to kill “the hope” of enacting policies against austerity, he claimed. “They want to kill democracy in the place where it was born,” he said, adding that the “negative decision” to close banks was aimed squarely at thwarting Sunday’s vote.

“Greek people have experienced more difficult moments and they will survive,’ he said.

With polls showing Greeks in favour of remaining inside the eurozone, the Greek government made no mention of exit from the single currency in the wording of Sunday’s referendum. This will ask Greece whether they support the “plan of agreement” drawn up by the troika and will put the no option Tsipras wants at the top of the ballot paper.

The publication of the wording coincided with Greece admitting that it would not meet the Tuesday deadline for making a €1.6bn (£1.1bn) payment to the IMF in Washington and new evidence of the parlous state of Greek banks following the referendum announcement. It emerged that the Bank of Greece asked in vain for the ECB to increase its emergency funding by €6bn in order to cover panic withdrawals.

Sigmar Gabriel, Germany’s vice-chancellor, voiced concerns that a so-called Grexit could start to unravel six decades of closer integration. He said the crisis was the most serious faced by Europe since the signing of the Treaty of Rome in 1957. He added that if the Greeks voted no on Sunday, they were voting “against remaining in the euro”.

He was supported by French president François Hollande, who came under strong pressure from US president Barack Obama to find a solution to the deepening crisis before it caused more damage to a still-fragile global economy. Hollande said: “It’s the Greek people’s right to say what they want their future to be. It’s about whether the Greeks want to stay in the eurozone or take the risk of leaving.”

Jeroen Dijsselbloem, the chairman of the Eurogroup of finance ministers from the 19 nations using the single currency, said the door was still open for negotiations to resume despite time running out before Sunday’s referendum.

But the hardening stance among Greece’s partners was evident from a tweet by Matteo Renzi, Italy’s prime minister and hitherto seen as one of the European leaders closest to Tsipras. The referendum, Renzi said, was not a question of the commission versus Tsipras but of “the euro versus the drachma. This is the choice”.

Jean-Claude Juncker, the commission president, said: “It’s the moment of truth ... I’d like to ask the Greek people to vote yes ... No would mean that Greece is saying no to Europe.”

In a sign of how relations have been soured by last week’s rejection of what was seen by Tsipras as a take-it-or-leave-it final offer, Juncker accused the Greek prime minister of telling lies about the proposals and said they did not include plans to cut pensions. A government spokesman in Athens accused Juncker of telling a “preposterous lie”.

Greece’s stock market was closed but a share price fall that began in Asia spread to Europe and later the US. London’s FTSE 100 lost almost 2% of its value, with drops of 3.5% in Frankfurt and 3.7% in Paris. New York’s Dow Jones Industrial Average was down 2%, the biggest one day decline this year, while the Nasdaq tumbled 2.4%. The euro slid to its weakest level against the pound since 2007 and now stands at almost €1.40 to the pound. Twelve months ago it was trading at €1.25.

On global markets, the interest rate on Greek 10-year bonds rose by four percentage points to 15%, a sign that financial markets fear the country’s days in the euro are numbered. About 850 Greek banks could open for business on Thursday in order to pay pensions, the government said.

Osborne said British holidaymakers travelling to Greece should carry enough cash for the whole trip and to cover emergencies. After the chancellor held a contingency meeting with David Cameron and the governor of the Bank of England, Mark Carney, he said he was “hoping for the best but preparing for the worst”.

The chancellor said British taxpayers could be liable for hundreds of millions of pounds if Greece fell out of the eurozone and relied on an emergency loan scheme supported by the EU’s budget which is funded by all 28 member states.

He said that an early decision by the coalition government was to exempt the UK from eurozone bailouts, dramatically reducing the “direct exposure” of the UK. But Osborne added: “Of course we are part of the financial system of Europe and we will be affected if there is a Greek exit.”

The chancellor’s remarks referred to the EU’s balance of payments support system which is open to non-eurozone members of the EU. The scheme has been used in recent years to release billions of euros to Romania, Hungary and Latvia when they were hit by the global financial crash.


If Greek falls out of the euro, it is expected that the IMF would become its main lender of emergency. Under the arrangements for Hungarian and Romanian, the EU balance of payments scheme provided about 40% of their loans.

Tsipras quer que a Grécia pare de tomar veneno / JOSÉ VÍTOR MALHEIROS


Tsipras quer que a Grécia pare de tomar veneno
JOSÉ VÍTOR MALHEIROS 30/06/2015 - PÚBLICO

O tratamento a que a UE quer submeter a Grécia não é um tratamento, mas um envenenamento. Lento e mortal.

Uma das coisas mais surpreendentes nos acontecimentos dos últimos dias em torno da erradamente chamada “crise grega” (que é, sempre foi e continuará a ser a “crise do euro”) foi o choque do FMI e dos eurocratas perante a decisão da Grécia de recusar as propostas das instituições-antes-conhecidas-pelo-nome-de-troika e de convocar um referendo para auscultar o povo grego.

É surpreendente porque se esperaria de pessoas com este nível de responsabilidade que soubessem o que estão a fazer e que antevissem os desenvolvimentos possíveis das jogadas que fazem. Constatamos que, afinal, não sabiam e não anteviram. Ou não quiseram saber, para considerar outra possibilidade ainda mais preocupante. Ou, pior ainda, jogaram conscientemente para chegar a este resultado e todas as palavras que proferem nascem da mais profunda hipocrisia.

Teria sido melhor, para usar a paternalista expressão da chefe do FMI, que Lagarde, Dijsselbloem e Juncker tivessem deixado a discussão para os adultos e se tivessem retirado discretamente da sala para o recreio. Mas não o fizeram e teremos agora de pagar o preço da sua arrogância. Nós, os europeus, nós, os portugueses. Porque não há neste momento nenhuma saída boa da crise.

É possível que as instituições-antes-conhecidas-pelo-nome-de-troika não estivessem à espera de que Tsipras se preocupasse com as promessas eleitorais que o seu partido fez ao povo grego nem se preocupasse com o bem-estar dos seus concidadãos. É natural que assim seja porque todos os outros chefes de governo com quem a troika interagiu (a começar pelo lamentável espécimen que ocupa S. Bento) sempre dobraram a espinha perante as ordens recebidas, sem o mínimo rebuço em quebrar promessas eleitorais e em empobrecer os seus países. Por isso, é bem possível que Bruxelas tenha mesmo ficado em estado de choque quando viu à sua frente um político com uma espinha dorsal.

É tristemente revelador do défice democrático da União Europeia que o anúncio do referendo seja visto (como já tinha acontecido com o referendo que George Papandreou foi obrigado a retirar em Novembro de 2011) como um gesto inaceitável de confronto, um verdadeiro casus belli. A Comissão Europeia e o FMI estão acostumados a pressionar os chefes de governo que têm dúvidas e a ser obedecidos sem grande hesitação. Devolver uma decisão ao povo é algo que é mal visto (uma infantilidade, como diz Lagarde), uma demonstração de que os gregos ainda não perceberam que quem manda é quem tem o dinheiro: a Alemanha e o FMI.

Durante os últimos meses, habituámo-nos a ver descrita nos media a história da negociação entre gregos e a troika como um braço-de-ferro, com propostas e contra-propostas, pressões dos dois lados e o desprezo palaciano dos educados senhores de gravata e da senhora que não paga impostos contra os gregos preguiçosos.

A história desta negociação foi-nos contada tanta vez que a narrativa foi normalizada: de um lado estava a troika que queria mais impostos e menos gastos do estado e do outro o Governo grego que tentava manter os actuais impostos ou subi-los muito pouco e manter os actuais gastos do Estado ou descê-los muito pouco.

A história era (e continua a ser na esmagadora maioria das notícias) assim: há um remédio amargo que a Grécia tem de tomar. A troika quer que a Grécia tome muito e depressa. A Grécia quer tomar pouco e devagar. E andam há meses a discutir a posologia e a duração do tratamento.

O problema é que esta história, que os leitores têm lido e ouvido em todos os media, é uma refinada mentira. Não uma “inverdade”, mas uma daquelas refinadas aldrabices, como as que Passos Coelho diz nos nossos televisores com cara séria.

A verdade - que os factos comprovam para quem queira ver - é que a austeridade não funcionou, nem na Grécia nem em Portugal. Na Grécia, a austeridade aumentou a dívida para 320 mil milhões de euros (177% do PIB), reduziu o PIB em 25%, aumentou o desemprego para 26%, reduziu drasticamente o investimento e a economia, fez fugir os capitais, destruiu a classe média, criou milhões de pobres, uma catástrofe social.

A verdade é que o tratamento não é um tratamento mas um envenenamento. Lento e mortal. E a negociação foi sempre, por parte da Grécia, uma tentativa de reduzir a intoxicação de forma a dar possibilidade ao paciente de ganhar forças. Como escrevia o The Guardian no seu editorial de domingo: “Os credores precisam de ter a humildade de reconhecer que o seu programa de austeridade falhou. Nenhuma das privações a que a Grécia foi sujeita tornou a dívida grega mais sustentável mas, apesar disso, os credores ainda pedem mais”.

A verdade é que a Grécia precisa não de austeridade nem de empréstimos para pagar juros mas de investimento em grande escala para modernizar a sua economia e as suas instituições. A UE deveria servir para fazer precisamente isso. Mas não faz.


E, se a UE não é a Europa da solidariedade, da democracia, dos direitos humanos, do progresso para todos e do Estado Social, não serve para nada. A UE foi um belo sonho e é triste estar a morrer, mas a agonia já começou.

Cinco anos depois, a Europa ainda não sabe o que fazer / TERESA DE SOUSA


Cinco anos depois, a Europa ainda não sabe o que fazer
TERESA DE SOUSA 30/06/2015 - PÚBLICO

1. O que parece ser mais extraordinário, nesta prolongada crise europeia que agora está prestes a atingir o seu clímax, é que a Europa, incluindo Berlim, não estava preparada para enfrentar um cenário altamente provável de iminente catástrofe num dos membros da zona euro. A razão é simples: nos últimos cinco anos, enquanto a Europa viveu ao ritmo da crise do euro cujo primeiro acto foi a crise da dívida grega (2010), Berlim não definiu uma estratégia política de longo prazo (a não ser recriar o euro à sua imagem e semelhança). Foi fazendo apenas o estritamente indispensável. Os outros países não tiveram força ou vontade para lhe impor outra atitude.

Há cinco anos, em Maio de 2010, a Grécia estava na iminência de bancarrota. A crise financeira mundial e a recessão económica que se abateram sobre a Europa levaram os mercados a olhar para a dívida soberana de outra maneira. Até aí, o custo do dinheiro era praticamente o mesmo na poderosa Alemanha e na frágil Grécia. Depois, separaram as águas, deixando de confiar na solidez do euro. A chanceler alemã não tinha uma resposta à altura dos acontecimentos. Até ao último instante, limitou-se a repetir a cláusula do “no bail-out” inscrita no Tratado de Maastricht, segundo a qual cada país tinha a responsabilidade de resolver os seus problemas em caso de um choque assimétrico ou de uma gestão irresponsável da dívida. Merkel resistiu até ao último minuto antes de aceitar que os governos europeus teriam de salvar a Grécia, pagando o primeiro resgate. Como escreveram na altura muitos analistas, a chanceler apenas reagiu quando “viu o abismo à sua frente”. O segundo “estado de negação” de Berlim (e de Bruxelas) foi sobre a avaliação do risco de contágios a mais países da zona euro. Enganou-se. Seguiu-se a Irlanda, depois Portugal e Espanha (embora apenas aos bancos) e, finalmente, Chipre. A Alemanha percebeu que tinha diante de si uma crise que lhe daria a oportunidade de reformar a zona euro à sua imagem e semelhança. A austeridade passou a ser o remédio que os incumpridores teriam de beber até ao fim a troco dos respectivos resgates. A Grécia precisou de dois resgates e de uma reestruturação da dívida (aos privados). Portugal e Irlanda saíram dos respectivos “programas de ajustamento”. O tempo e os resultados mostraram à saciedade que os programas tinham erros calamitosos de avaliação das suas consequências. O principal resultado político desta desadequação foi a eleição do Syriza.

2. Merkel teve o mérito de reconhecer que, se o euro falhasse, seria o fim da União Europeia. Ontem, voltou a repetir essa frase. Guiou a sua política dos “pequenos passos” mantendo na memória que a Alemanha não podia correr o risco de ser olhada como o país que destruiu três vezes a Europa no prazo de 100 anos. Mas não mudou a sua forma de actuar: no último minuto e com o menor custo possível. Quando o Syriza chegou ao poder em Atenas, a chanceler actuou bem do ponto de vista táctico, reservando a sua margem de manobra para decidir em última instância. Quando Alexis lhe tirou o tapete, ficou sem nada. Ainda não se sabe o que tenciona fazer. “O que está em causa não é apenas a estabilidade económica e financeira”, escreve Marcel Fratzscher no Financial Times. “O desgaste político de longo prazo pode ser devastador, em particular para o Governo alemão”. No fundo, ela é a principal responsável pela incapacidade política europeia de agir em conjunto nos últimos cinco anos, em vez de contribuir para dividir a Europa. Sem poupar as palavras, a Spiegel escreve que o que se passa na Grécia é “o preço de cinco anos de cobardia”.

A chanceler ouviu dezenas de vezes o Presidente americano dizer-lhe que a Grécia não era apenas um problema económico, mas um problema de enorme importância geopolítica para o Ocidente. Obama nunca conseguiu perceber porque é que a Alemanha não era capaz de resolver um problema que valia menos de 2 por cento do PIB europeu. Alertou para consequências que poderiam sair muito mais caras. A Europa seguiu em frente. Até chocar no muro. Deixou-se arrastar por Tsipras para uma situação insustentável. Mario Draghi que, perante a ausência política europeia, foi tratando de manter o euro a respirar, deixou cair os braços. Avisou mil vezes os europeus que as decisões políticas eram com eles.

3. Agora, sem uma estratégia alternativa, vêm ao de cima as incongruências europeias que não são apenas da chanceler. François Hollande, que optou por ficar discretamente ao lado de Merkel na condução da crise grega, tenta de novo ressuscitar o papel de mediador da França. Ontem, ele, Michael Sapin (o seu ministro das Finanças) e o comissário francês Pierre Moscovici voltaram a defender o regresso rápido às negociações, sem explicar em que condições. “Tivemos sempre a posição negocial mais aberta”, disse um diplomata francês ao site do Politico Europa. “Sempre dissemos que estávamos abertos à discussão sobre a reestruturação da dívida (…)” O mesmo site chamava-lhe “o último amigo de Tsipras”.

Jean-Claude Juncker ainda acredita que os gregos vão votar sim e apela a que o façam, oferecendo ao Syriza mais achas para a sua fogueira patriótica. O presidente da Comissão foi, quase até ao fim, o único aliado de Atenas. Sente-se traído pela forma como o governo de Tsipras abandonou a mesa das negociações.


A chanceler continua a não abrir o jogo, sem fechar completamente a porta. Ontem, voltou a lembrar que o fracasso do euro é o fracasso da Europa. Somando a cacofonia europeia, fica a ideia de que os líderes europeus ainda acreditam numa reviravolta, carregando as cores do que está em causa no referendo: se vencer o ‘não’ de Tsipras, a Grécia escolhe sair do euro. Já estamos, como avisou Draghi, em águas nunca dantes navegadas. O que está em causa é imenso. “A Grécia precisa de ser salva do colapso político, económico e social”, diz Tony Barber, editorialista do Financial Times. O fracasso grego e a incapacidade europeia para o evitar afectará, lembra também Barber, a capacidade europeia para resolver todos os seus outros enormes problemas, da Rússia ao Brexit, passando pela imigração ou o risco de estagnação económica. O jornalista defende que não falta apenas um plano B para evitar o contágio, falta um plano C para salvar a Grécia. Dentro ou fora da União Europeia. A Grécia não é a Argentina. É um país da União Europeia e da NATO. Deixada à sua sorte, pode enveredar facilmente por um caminho de extremos que fará do Syriza um partido “moderado”. A Aurora Dourada, ideologicamente fascista, é a terceira força no Parlamento de Atenas. Um default arrastaria os gregos para dificuldades económicas e sociais inimagináveis. Os europeus não poderiam, pura e simplesmente, olhar para o lado. Se é esse o preço que querem pagar para tirar o Syriza do jogo, é preciso anteciparem as consequências. A Rússia cantará de galo, perante uma brecha na muralha de segurança da NATO. “A crise da dívida grega coloca o euro e a União Europeia em perigo”, escreve Simon Tilford, do Centre for European Reform de Londres. Pode não estar a exagerar. Na Spiegel, Dirk Kurbjuweit explica longamente como é que “estamos a viver na Anti-Europa”. Merkel vai ter de navegar à vista. Ainda vai a tempo? Saberemos nos próximos dias.

O medo do contágio regressou à Europa, onde o primeiro sinal veio dos mercados
PEDRO CRISÓSTOMO 29/06/2015 - PÚBLICO

Com a Bolsa de Atenas fechada, a praça de Lisboa foi a que mais caiu na Europa. Receios estendem-se ao andamento da economia do euro.

A situação na Grécia atingiu um ponto crítico tal que não há analista que deixe de acrescentar uma ressalva a cada comentário que faz: a incerteza é tanta e as reviravoltas dos últimos dias tão surpreendentes que o conselho mais avisado é não dar nenhum cenário como adquirido. Pelo sim, pelo não.

O dia desta segunda-feira expôs as fragilidades que as economias da periferia do euro ainda enfrentam, com maior ou menor grau, face à volatilidade da crise grega. Não foi uma surpresa a sessão agitada que se viveu nas bolsas mundiais – de Tóquio a Londres, de Lisboa a Frankfurt, de Paris a Wall Street – nem o movimento ascendente que se verificou nos juros da divida de Portugal, Espanha e Itália. “Até ao referendo no domingo, e mesmo alguns dias depois, a incerteza é tanta que me parece um totoloto [falar dos mercados]”, compara Filipe Silva, director de gestão de activos do Banco Carregosa.

A questão que se coloca de novo, para além da pressão dos mercados, é saber que impactos o prolongamento da incerteza grega pode ter economicamente nos países mais fragilizados no espaço da moeda única: saber quão segura é a barreira de segurança que possa evitar o contágio a países como Portugal, Itália, Irlanda e Espanha, economias com elevados níveis de dívida pública e, por isso, mais pressionados num eventual cenário de abrandamento do PIB.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) espera que a economia do euro cresça cerca de 1% “no médio prazo”, um ritmo que considera baixo numa região ainda “vulnerável aos choques”. Esta era a análise feita há menos de duas semanas, antes de colapsarem as negociações entre a Grécia e os parceiros europeus. E de então para cá Washington não se cansa de repetir que é preciso encontrar uma solução a bem da economia mundial.

Para Portugal, o que é que mudou desde sexta-feira para que analistas voltassem a falar do país como um dos “próximos” da linha da frente da crise? “Com o programa de expansão monetária europeu, o país estava a conseguir trocar dívida e baixar os juros, a apresentar um crescimento forte e o desemprego em queda. Depois dos ajustes estruturais, estamos no ponto de transição a nível nacional e existe o perigo de um retrocesso económico evidente. Este pode ser o maior custo da situação grega para Portugal”, considera Eduardo Silva, gestor da empresa de corretagem XTB.

O andamento da economia europeia, onde estão os principais parceiros comerciais de Portugal (Espanha, Alemanha, França), será determinante. O Governo português apontava em Abril, no Programa de Estabilidade, para um crescimento de 1,6% do PIB este ano. E para isso conta com uma “forte aceleração” da procura externa.

Que almofada?
Como factor de pressão, Portugal continua a enfrentar os mercados e o elevado nível de dívida pública, que ascende a 130% do PIB (225.720 milhões de euros). Mais alto só na terceira economia do euro (a Itália, com uma dívida de 132% do PIB) e na Grécia (177%).

Ao intervir no mercado para comprar títulos de dívida pública, o Banco Central Europeu (BCE) deu uma ajuda para que as taxas de juro das obrigações portuguesas recuassem este ano. Mas se a rendibilidade implícita da dívida pública portuguesa a dez anos atingiu um mínimo histórico em Março, quando baixou para os 1,6%, o contexto de volatilidade foi crescendo e as taxas de juro já regressaram aos 3%. A trajectória dos juros da dívida no mercado secundário tem um impacto indirecto no custo do financiamento quando os Estados lançam leilões de dívida no mercado primário.

As taxas de juro da dívida grega com um prazo de dez anos dispararam nesta segunda-feira, passando para 15% quando na última sexta-feira os títulos estavam em 11,16%. E a pressão no mercado secundário intensificou-se de forma imediata sobre os outros países periféricos, embora com subidas menos acentuadas. “O que parecia um cenário de afastamento definitivo rapidamente evoluiu para indefinição em que nenhum cenário parece definitivo”, nota Eduardo Silva

As taxas de juro da dívida portuguesa escalaram para os 3,08% ao final do dia, contra os 2,718% de sexta-feira. O mesmo aconteceu com os títulos de Espanha (2,358%) e de Itália (2,395%), ao contrário do que se verificou com a dívida alemã (referência no mercado) e irlandesa, que negociaram em queda. “Os países do sul da Europa podem ser o ‘next in the row’,enquanto os países mais ricos reforçam o seu papel de refúgio e estão com os juros da dívida a descer”, nota Filipe Silva, director de gestão de activos do Banco Carregosa.

O Governo português tem repetido que os cofres estão cheios. O facto de as reservas de liquidez estarem nos 14.900 milhões de euros retira alguma pressão, mas pela frente Portugal vai enfrentar, ainda este ano e nos próximos, picos de amortização de dívida exigentes. Desde logo em Outubro, quando há para amortizar cerca de 5500 milhões de euros de uma linha de obrigações do tesouro. A expectativa é que neste segundo trimestre o Tesouro obtenha cerca de 7600 milhões de euros de financiamento e que a almofada de liquidez esteja em cerca de 9800 milhões de euros no final do ano.

Esta segunda-feira foi um dia de quedas acentuadas em todas as praças da Europa, com a Bolsa de Lisboa à cabeça a registar a maior descida, de 5,22%. Nenhuma das cotadas do PSI-20 escapou. O índice chegou mesmo a deslizar 6,16% e acabou por encerrar com a maior desvalorização desde a crise política de 2013, quando Vítor Gaspar e Paulo Portas se demitiram.


A bolsa de Atenas permanece encerrada. Milão caiu mais de 5% e pouco atrás ficou a bolsa madrilena, a recuar 4,56%. A pressão vendedora foi menor nas acções das praças de Paris e Frankfurt, mas nem por isso deixou de ser significativa, com recuos de 3,74% e 3,56%, respectivamente. O sentimento negativo estendeu-se à City londrina, onde o recuo foi de 1,97%, e chegou a Wall Street, onde o Dow Jones perdeu 1,95% e o Nasdaq desceu 2,4%.

Portugal prepara-se para o “contágio político” da Grécia


Portugal prepara-se para o “contágio político” da Grécia

Governos europeus preparam planos de contingência e apelam à negociação. Em Portugal, o Governo diz-se “tranquilo”, o Presidente não acredita em acordo

Paulo Pena / 30-6-2015 / PÚBLICO

O contraste não pode ser mais evidente. Numa segunda feira agitada por todas as chancelarias europeias, com reuniões de emergência de conselhos restritos (em Madrid, Londres, Paris), parlamentos (Reino Unido, Alemanha) e muitas chamadas telefónicas entre chefes de Estado, Lisboa foi um oásis de calma. “Tudo tranquilo”, resume um membro do Governo a quem o PÚBLICO pediu para resumir os acontecimentos do dia no executivo — reuniões, contactos, cenários.
No momento em que Portugal volta a aparecer nos radares dos analistas financeiros como a “peça seguinte no dominó” e a queda do índice bolsista português foi a maior em toda a Europa, o Governo tenta desdramatizar. “Com todo o respeito, não há qualquer comparação entre a situação de Portugal e da Grécia”, repetiu Paulo Portas, na manhã de segunda-feira, na sua intervenção na conferência Caixa 2020 — Serviços, Comércio e Restauração, no Estoril. A agenda do Governo não foi beliscada pela crise europeia. Pedro Passos Coelho foi, tal como o previsto — à cerimónia da “renovação da parceria entre a empresa Bosch e a Universidade do Minho”, em Braga. E foi aí que comentou, pela primeira vez no dia, a evolução da crise.
Salvaguardando que “ninguém pode dizer que está imune” a um problema destes, Passos garantiu que, “do ponto de vista financeiro, Portugal não é apanhado desprevenido”. Embora admitindo que a saída da Grécia do euro é hoje mais provável do que no passado, Passos afirmou que a prioridade europeia deve ser a de “reforçar a coesão dos países que compõem hoje a zona euro” e que, ao mesmo tempo, “a Grécia possa encontrar uma saída para o seu problema”. De seguida, o primeiro-ministro viajou para Viseu, onde jantou com empresários da região no Solar do Vinho do Dão.
O Presidente da República, Cavaco Silva, também manteve a sua agenda — que, neste caso, se aproximava um pouco mais da questão do momento. O seu “roteiro para uma economia dinâmica” passou por Paços de Ferreira, e foi aí que Cavaco falou sobre a crise que abala a Europa. O Presidente português destoou do tom optimista que os líderes europeus adoptaram para esta segunda-feira. Desde logo, por se mostrar razoavelmente descrente num desfecho positivo: “Gostaria que houvesse entendimento; acreditar é diferente.” Depois, por considerar que o Governo grego não negociou como devia, disse: “Há muito que pensava, pela forma como os gregos estavam a negociar, que as coisas iam acabar mal.” E, por fim, na mais surpreendente das suas declarações, o Presidente deixou a ideia de que uma eventual saída da Grécia não significa um desaire da moeda única ou do projecto europeu: “Penso que o euro não vai fracassar, é uma ilusão o que se diz. A zona do euro são 19 países, eu espero que a Grécia não saia, mas se sair ficam 18 países.”

A pouco mais de três meses das eleições legislativas portuguesas, os principais dirigentes parecem temer outro contágio da crise do euro: o efeito político. Esse não é um exclusivo nacional — o que, aliás, ajuda a explicar muito do ambiente no Eurogrupo. Os argumentos já estão preparados há muito tempo, mesmo antes de se terem interrompido as negociações entre Atenas e as instituições credoras internacionais. E são simples. Se as negociações satisfizerem algumas pretensões antiausteridade da Grécia, os partidos do Governo, PSD e CDS, ficam na difícil posição de explicar por que defendem o caminho dos cortes e do aumento de impostos. Se o caos se instalar em Atenas, e a Grécia acabar por sair do euro, sem qualquer tipo de “almofada” e com uma crise

domingo, 28 de junho de 2015

Greece crisis deepens as banks close for a week after weekend that shook euro


Greece crisis deepens as banks close for a week after weekend that shook euro

Greece’s government says banks will stay closed until after snap referendum, while stock exchange shut on Monday and cash machine withdrawals limited to €60

Ian Traynor in Brussels and John Hooper and Helena Smith in Athens

On Monday morning Greeks will find their savings blocked and their banks closed for a week following a fateful weekend that has shaken Europe’s single currency.

The Greek government decided on Sunday night it had no option but to close the nation’s banks the following day after the European Central Bank (ECB) raised the stakes by freezing the liquidity lifeline that has kept them afloat during a six-month run on deposits.

The Athens Stock Exchange will not reopen on Monday either. The dramatic move, after 48 hours of sensational developments in Greece’s long-running battles with creditors, was sparked by the country’s prime minister, Alexis Tsipras’s Friday night call for a referendum on its creditors’ demands. That prompted finance ministers of the eurozone to effectively put an end to his country’s five-year bailout by the International Monetary Fund, the ECB and the European commission.

In a brief, televised address to the nation, Tsipras threw the blame onto the leaders of the eurozone. But he did not say how long the banks would remain shut, nor did he give details of how much individuals and companies would be allowed to withdraw once they reopened.

In the early hours of Monday morning, Tsipras published a decree in the official government gazette setting out the capital controls to be imposed on the country.

The decree – entitled ‘Bank Holiday break’ – was signed by Tsipras and president Prokopis Pavlopoulos.

It said all banks would be kept shut until after the referendum on 5 July and withdrawals from cash machines would be limited to €60 – about £40. Cash machines are not expected to reopen until later on Monday.

Foreign transfers out of Greece are prohibited, although online transactions between Greek bank accounts are to continue as normal. Tsipras insisted pensions and wages would be unaffected by the controls.

Greece’s finance ministry later announced that the strict ATM withdrawal limits would not apply to holders of credit or debit cards issued in foreign countries. This was seen as a necessary move after worries that tourists were seen joining locals in front of ATMs on Sunday. Any similar restriction would hurt tourism, Greece’s one thriving industry, which accounts for at least a fifth of economic activity.

The prime minister said that Saturday’s move by the eurozone’s finance ministers to halt Greece’s bailout programme was unprecedented. He called it “a denial of the Greek public’s right to reach a democratic decision”.

Tsipras added that the finance ministers’ initiative had prompted the ECB to curb its assistance, forcing the government to take the steps that it had. He said he had once again appealed for an extension of the bailout until after the referendum, on 5 July, sending his proposal to the president of the European council, Donald Tusk, the leaders of the 18 member states of the single currency, the commission and the ECB.

As fears spread through Sunday that capital controls would need to be put in place, growing numbers of depositors lined up at ATMs, even in affluent city areas, to withdraw what cash they could.

Drivers also flocked to gas stations across Greece, prompting the country’s largest refiner to issue a statement reassuring there are enough reserves. Refiner Hellenic Petroleum said: “We maintain fuel reserves for several months. The supply of our refineries with crude oil is also assured.”

The country’s plight deteriorated sharply on Friday night when Tsipras put his country’s future in the balance by suddenly calling a referendum and arguing robustly for a rejection of the price set by his creditors for saving Greece, at least for a few more months. This Sunday’s vote will ask Greeks whether they approve or disapprove of the last offer tabled by the creditors before the negotiations broke down.

But during a marathon parliamentary debate that ended in the early hours of Sunday morning, opposition leaders argued that it was, in fact, a vote on whether Greeks wished any longer to be part of the eurozone. It will be Greece’s first referendum since the country voted to abolish its monarchy in 1974.

The European commission said on Sunday for the first time in the crisis that it wanted to offer Greece debt relief, Tsipras’s central demand during the five months of stalemated talks. Reports from Berlin said that Angela Merkel and François Hollande shared that view.

But the potential concession appeared to come too late to prevent growing chaos in Greece – and sparked concerns across the Atlantic. Barack Obama was said to have called Merkel to urge her to take action. Jack Lew, the US Treasury secretary, urged creditors to offer debt relief to Greece.

Financial analysts will be watching the impact on the markets, which have not yet had the chance to react to the events of the last 48 hours. Mario Draghi, the president of the ECB, tightened the screws somewhat on the country.

The governing council of the ECB decided to freeze emergency liquidity assistance to the Greek banks, the lifeline that is keeping the national financial system functioning. The ELA was capped at last Friday’s level of €89bn. It meant that the banks could continue to function, but the draining of money as people flocked to the ATMs to retrieve their savings also meant they would run out of money that could not be replenished by the central bank.

“We continue to work closely with the Bank of Greece,” Draghi said.

Greece’s financial stability committee, which includes the finance minister, Yanis Varoufakis, and the central bank governor, Yannis Stournaras, met on Sunday evening to discuss Greece’s rapidly shrinking options. The high-level political confrontations on Friday and Saturday produced the greatest uncertainty over Greece and in the eurozone in the five-year debt saga.

The fall-out from the collapse of negotiations and the calling of the referendum brought recrimination on all sides and predictions of gloom.

The German finance minister, Wolfgang Schäuble, said he was “perplexed and depressed” by developments. Jeroen Dijsselbloem, the Dutch finance minister who heads the committee of eurozone finance ministers, said that with his referendum call, Tsipras was thrusting the country into a mess from which it would struggle to recover.

“We are millimetres away from the total collapse of the Greek financial system,” warned Herman Van Rompuy, until last year the president of the European Council and heavily involved in years of Greek rescue negotiations. “It’s actually suicide that’s taking place in Greece right now.”

The restrictions being imposed are anathema to Tsipras’s radical left-led government – all the more so since it desperately needs to keep public opinion on its side ahead of the referendum.

Varoufakis told the BBC in a Sunday interview: “Capital controls within a monetary union are a contradiction in terms.” But he was party to Sunday night’s decision.

In the early hours of Sunday, parliament voted 178 to 120 in favour of holding the referendum. Embarrassingly for the government, the neo-Nazi Golden Dawn movement joined Tsipras’s Syriza party and its populist right-wing coalition partner, ANEL, in backing the proposal.

By Sunday evening, however, it had not received the necessary endorsement of Greece’s president, Prokopis Pavlopoulos.

According to two polls published on Sunday, Tsipras faces an uphill battle to secure the rejection he has indicated that he favours. One in the right-leaning tabloid Proto Thema found 57% of those interviewed favoured acceptance of the creditors’ latest offer. Another in the centre-left To Vima put support at 47%.

The Guardian view on Greece and the euro: no money left / EDITORIAL / GUARDIAN


The Guardian view on Greece and the euro: no money left

Editorial

Deadlines have come and gone before, but Tsipras’s referendum pledge has finally forced a denouement. Creditors must rethink a failed austerity policy, and the political risk of painting themselves as the enemies of the Greek people
Something was bound to snap in Greece, and now it has. Over six years, jobs have vanished, hope has been smothered and a generation of progress in living standards has been reversed. Suicides soared among stricken individuals, and the collective sense of sovereignty shrivelled. The nation has been crucified on the cross of a currency that it should never have been allowed to join. It awakes to discover the extent of restrictions on accessing its bank accounts.

Step back from the immediate row over proposals and counter-proposals, under which Alexis Tsipras drew a sharp line on Friday with his midnight pledge for a referendum, and this is the real backdrop to Athens’s abrupt decision to stop playing the European game. Fiery and inexperienced, the Greek prime minister has breached all the rules of diplomacy, failing to warn his counterparts about his plebiscite before going public, and perhaps depriving himself of a last bit of leverage in the haggling over bailout terms. His rhetoric contrasts his own mandate with the presumptions of callous technocrats, ignoring the mandates of creditor governments. That threatens the space in which a European club of 28 members is fated to find compromise. And the question he will put to the voters – whether they accept the creditors’ terms for extending a bailout that is now set to finish five days before Sunday’s vote – is arguably a nonsense.

No surprise, then, that the initial response of the eurozone finance ministers meeting in Brussels was to insist that the bailout would indeed end on Tuesday. Greece’s Yanis Varoufakis, the sole dissenter, had to pack his bags. A mood of “let Greece go” was taking hold. But by Sunday evening, there were signs of second thoughts. After briefing that it would not be able to provide the Greek authorities with the extra euros required to keep cashpoints working, the European Central Bank clarified that pre-existing assistance was not being cut off. The European commission published the creditors’ previously take-it-or-leave-it proposal, but now insisted that the plan had always been to marry this stringent short-term scheme with debt relief down the road. Soon Christine Lagarde of the IMF, too, put out a statement advocating debt relief and further talks.

The creditors’ rethink could be a ruse to destabilise Mr Tsipras ahead of his make-or-break vote. But let’s hope it is sincere. If the markets have seen one corner of the eurozone break away, there will be permanent and costly speculation about where the next crack will be. The creditors need to have the humility to recognise that their austerity programme has failed. None of the hardship has made Greek debt more sustainable, yet still they demand more. The loss of about 5% of UK national income in 2008 could be answered by pumping in a fiscal injection of 1% GDP. Greece, where 25% of the economy has disappeared, is instead asked to offer up a fiscal blood donation, whose direct effect is withdrawing 1% of demand.


Most fundamentally, an EU whose democratic credentials are under populist assault from Britain to Budapest needs to avoid reinforcing a damaging caricature. It helped kill the Greek government of George Papandreou after he had proposed a controversial referendum on bailout terms in 2011. Strong-arming a second administration out of consulting a suffering populace could look dangerously like haughty contempt. A club of democracies cannot afford to set itself up against even one demos.


Greece crisis could be a Sarajevo moment for the eurozone / GUARDIAN


Greece crisis could be a Sarajevo moment for the eurozone
Any government that runs into difficulties in the future will have the Greek option of devaluation as an alternative to endless austerity

Larry Elliott Economics editor

A hundred and one years ago on Sunday, gun shots rang out in a city in southern Europe. Few at the time paid much heed to the assassination of Archduke Franz Ferdinand and his wife as they drove through the streets of Sarajevo. Within six weeks, however, Europe was at war.

Make no mistake, the decision by Alexis Tsipras to hold a referendum on the bailout terms being demanded of his country has the potential to be a Sarajevo moment. The crisis is not just about whether there is soon to be a bank run in Greece, although there is certainly the threat of one. It is not just about whether the creditors overplayed their hand in the negotiations, although they did. It is about the future of the euro itself.

There will be much talk in the next few days about how Greece can be quarantined. The three people who have been leading the negotiations for the troika - Christine Lagarde of the International Monetary Fund, Jean-Claude Juncker of the European commission and Mario Draghi of the European Central Bank - can still cling to the hope that Tsipras will lose the referendum next Sunday.

In those circumstances, the Syriza-led coalition would have little choice but to hold an election. The return of a government headed by, for example, the centre-right New Democracy, would open up the possibility that Athens would sue for peace on the terms demanded by the troika.

There is, however, no guarantee of this. The troika was certain last week that Tsipras would fold when presented with a final take-it-or-leave-it offer. They were wrong. The Fund, the ECB and the European commission made a fatal misjudgement and have now lost control of events.

The immediate decision for the ECB was whether to cut off emergency funding before the country’s bailout programme formally ends on Tuesday. Wisely, it has chosen not to make matters worse.

In recent weeks, the Greek banks have only been able to stay open because Draghi has provided funds to compensate for capital flight. Sunday night’s announcement of an emergency bank holiday and capital controls demonstrates just how critical the situation has become.

Germany strongly supports the immediate end to emergency liquidity assistance (ELA), arguing that taxpayers in the rest of Europe should not be further exposed to the risk of a Greek exit from the single currency. The ECB, however, has always been reluctant to take what would clearly be a political decision to escalate the pressure on the Greek banks, and has announced that it will continue providing funding at last week’s level.


Even so, Greece now faces a week of turmoil. Tsipras bowed what seemed to be inevitable on Sunday by announcing controls to try to prevent Northern Rock-style queues outside the banks and - just as importantly - money leaving the country.


The Greek government will also be making contingency plans for exit from the single currency. Tsipras and Yannis Varoufakis, his finance minister, say that is not their wish or intention, but if the result of the referendum backs the government’s stance it is hard to see any alternative. Cyprus stayed in the euro after introducing capital controls, but it was done with the approval of other single currency members and involved knuckling down under an austerity programme.

In the meantime, the blame game has begun. The creditors say they offered Greece a deal that would have secured future financing in return for reforms and budget savings which would have hastened the country’s economic recovery. Lagarde has said there is now nothing on the table and that Greece should not expect the same terms to be available after the referendum.

Tsipras said the troika was proposing an “extortionate ultimatum” of “strict and humiliating austerity without end”. A spokesman for Varoufakis said the referendum meant the end to five years of “waterboarding”.

The stance taken by the troika has been wrong-headed but inevitable. Greece has seen its economy shrink by 25% in the past five years. A quarter of its population is unemployed. It has suffered a slump of Great Depression proportions, yet the troika has been demanding fresh tax increases that will suck demand from the economy, stifle growth and add to Greece’s debt burden.

If Greece were outside the euro, IMF advice would be different. The fund would be telling Greece to devalue its currency. It would be telling the country’s creditors that they would have to take a “haircut” in order to make Greece’s debts sustainable. It would then justify domestic austerity on the grounds that the benefits of the devaluation should not be frittered away in higher inflation.

This option, though, has not been made available to Greece. It is unable to devalue and European governments are resistant to the idea of a debt write-down. So the only way Greece can make itself more competitive is to cut costs, by reducing wages and pensions.

A fully fledged monetary union has the means to transfer resources from one region to another. This is what happens in the US or the UK, for example, with higher taxes in areas that are doing well being redistributed to areas with slower growth and higher unemployment.

The euro, however, was constructed along different lines. Countries were allowed to join even though it was clear they would struggle to compete with the better performing nations such as Germany. A stability and growth pact designed to ensure a common set of budget controls was a poor substitute for fiscal union. From the start, it was obvious that the only mechanism for a country that ran into severe difficulties would be harsh austerity. Greece is the result of what happens when politics is allowed to override economics.

If Greece leaves, the idea that the euro is irrevocable is broken. Any government that runs into difficulties in the future will have the Greek option of devaluation as an alternative to endless austerity. Just as importantly, the financial markets will know that, and will pile pressure on countries that look vulnerable. That’s why Greece represents an existential crisis for the eurozone.


It will be said in response that Greece is a small, insignificant country and that the single currency has much better defences than it had at the last moment of acute trouble in the summer of 2012. Diplomats in Europe’s capitals took very much the same view in late June 1914.

O regresso de Versalhes / MANUEL CARVALHO


O regresso de Versalhes
MANUEL CARVALHO 28/06/2015 - PÚBLICO

Para esta geração de tecnocratas que confundem países com empresas e eleitores com funcionários, não bastava, porém, uma vitória. Como em Versalhes, tinha de haver reparações pesadas sem direito a negociação.

O Governo arrogante e mitómano de Alexis Tsipras saiu do Eurogrupo de sexta-feira vergado não apenas pelos custos do delírio do seu programa político mas principalmente pela cegueira de uma geração de líderes europeus que não consegue ver além das sondagens e da sua sobrevivência política.

Custa determinar quem tem mais culpa no desfecho deste diálogo de surdos que dura desde Fevereiro. O Governo grego é um claro candidato ao prémio da irresponsabilidade, por julgar que o radicalismo e a ressurreição dos fantasmas de uma Europa de bons e maus (a invocação do passado nazi da Alemanha foi simplesmente abjecta) podiam satisfazer a sua vontade de matar a austeridade. Mas ainda mais culpa tem esta Europa que esqueceu mais de meio século de vida em comunidade e, em especial, esqueceu que o ressentimento é um vírus destrutivo, difícil de matar depois de ser gerado.

Entre o espírito punitivo do Tratado de Versalhes, que no final da Primeira Guerra Mundial castigou tão pesadamente a Alemanha que abriu as portas ao nazismo, e o Plano Mashall, que no final da destruição de 1939-1945 quis passar uma esponja pelo passado e inaugurar uma nova era de prosperidade na Europa, o comportamento das “instituições” seguiu claramente a primeira via nas negociações com a Grécia. Convém notar desde o início que a União jamais poderia aceitar as pressões do Governo grego que, com base em promessas irrealistas, se arrogava no direito de mudar unilateralmente a forma como se geriram quatro anos de crise do euro e exigia que a sua soberania se sobrepusesse a todas as outras. O problema é que a Europa reagiu ao discurso radical de Atenas com um inescapável desejo de vingança, no qual a ponderação e a racionalidade sucumbiram à vontade de vergar Tsipras e Varoufakis. Vale a pena notar que, desde o início, e apesar de toda a propaganda, a Grécia foi cedendo e na proposta do último fim-de-semana admitia já aplicar medidas de austeridade e parecia rendida ao músculo do Eurogrupo. Mas, em vez de aproveitar a abertura grega e entrar na negociação cedendo algo mais do que o limite do superavit primário (no qual já tinha cedido), a Europa decide manter a sua posição de vilão perante um pedinte fragilizado e desorientado.

A Europa, esta Europa, não percebeu que, no estado a que tinha chegado o processo, jamais poderia ser intransigente como o foi. Tinha de ceder nas vírgulas para que Tsipras mudasse o texto. Porque sabia perfeitamente que o primeiro-ministro grego estava a gastar com esse plano os últimos cêntimos do seu capital político – era até improvável que fosse aprovado no Parlamento grego. Perante o dilema de aproveitar a onda de optimismo que a Comissão e vários membros do Eurogrupo manifestaram no dia 21 e o desejo mesquinho de impor uma derrota incondicional às veleidades gregas, “as instituições” optaram pela segunda fórmula. Chegados aqui, já pouco interessa saber que Atenas se dispunha a aumentar impostos, a cortar pensões, a fazer reformas nas suas protecções ridículas a profissionais ou sectores económicos ou a mudar o seu sistema previdenciário nos timings e na substância que lhe era imposta. Pouco interessa também notar que essa receita era a repetição de uma política que levou a Grécia para um desastre.

A Europa e as “instituições” tiveram tudo na mão para sair bem do problema. Depois da capitulação de Tsipras à austeridade, a sua superioridade e o castigo à ovelha grega tresmalhada da ortodoxia oficial estavam garantidas. Para esta geração de tecnocratas que confundem países com empresas e eleitores com funcionários, não bastava, porém, uma vitória. Como em Versalhes, tinha de haver reparações pesadas sem direito a negociação. Em 1919, a Alemanha estava arrasada pela guerra e cedeu. Hoje, o Syriza sabe que a capitulação em Bruxelas significava a hecatombe em casa. Não apenas para os seus líderes, mas também para o país. Um acordo imposto pela lei dos mais fortes a um estado frágil derrubaria o governo, alastraria o ressentimento contra a Europa, faria explodir o ódio nacionalista e levaria ao florescimento de mil “syrizas” ou de mil “auroras douradas”. Mesmo que o referendo dite a vitória do “sim” ao acordo com as “instituições”, os gregos jamais deixarão de se sentir vítimas dos poderosos – se bem que as culpas maiores são dos líderes que elegeram nas últimas décadas.


Nesta estratégia de vistas curtas da Europa ninguém pareceu querer saber quanto custará o efeito de contágio de um colapso grego, que peso terá no desequilíbrio do euro e da própria União Europeia, que vírus nacionalista e antieuropeu ficará instalado entre os Balcãs e o Médio Oriente, que consequências geoestratégicas terá uma aproximação da Grécia à Rússia. Nesta Europa desmemoriada e perdida teria sido boa ideia ouvir os avisos de Washington, actuar com ponderação em vez de encostar às cordas um país arrasado. Nestes dias em que a tormenta radical islâmica ou o rosnar do gigante russo voltam a levantar os fantasmas da guerra, estamos a caminho do fio de navalha, de um mundo frágil que pode ruir ao mínimo solavanco. O eventual colapso da Grécia poderá ser visto dentro de alguns anos como um desses momentos que geram ondas de choque de consequências imprevisíveis. Evitá-lo por legítimo interesse teria sido a maior obrigação da elite que está no poder.

Um domingo em Atenas, ou o que nos podia ter acontecido


Um domingo em Atenas, ou o que nos podia ter acontecido
José Manuel Fernandes
28/6/2015 / OBSERVADOR

Ao vermos a aflição dos gregos é bom recordar que também Portugal podia ter caído naquele abismo. Bastava termos seguido os que pediram a mesma dureza, advogaram a resistência e insultaram os credores

Longas filas para levantar dinheiro nas caixas de multibanco. Supermercados a começarem a ficar com as prateleiras vazias. Automobilistas em demoradas esperas para encherem os depósitos das suas viaturas. A notícia de que os bancos estarão fechados até ao dia do referendo. Uma enorme expectativa sobre como será o dia de amanhã. E, claro, muito medo.

O referendo sobre a mais recente proposta de acordo do Eurogrupo será apenas no próximo domingo, até lá muita coisa pode acontecer. Mas a Grécia, que já estava mal, está agora muito pior. Pior na economia. Pior socialmente. Pior nas finanças públicas. Pior na confiança nas instituições (como o sistema bancário). Pior no clima politico e até pior no respeito pelas regras democráticas.

Claro que ainda há alguns lunáticos que acham que tudo está a correr maravilhosamente, mas não creio que sejam acompanhados por muitos portugueses. Acompanhado hoje, porque ainda há bem pouco tempo o discurso era outro, de encantamento com Tsipras e Varoufakis. Ou de elogia à sua abordagem “intransigente” das negociações.

A crise grega dura há tanto tempo que, por vezes, temos a sensação de repetir argumentos. O que até seria natural: logo no dia seguinte às eleições gregas escrevi que então é que começavam os dias difíceis do Syriza. Não conhecia ainda a arrogância de Varoufakis nem a atracção pela roleta russa de Tsipras, mas não era difícil prever que um país dependente de empréstimos para se manter à tona de água teria sempre dificuldade em conseguir novos empréstimos dizendo, ao mesmo tempo, que não pretendia pagar os antigos. É certo que tudo correu ainda pior do que se previa, 0 que é fruto de uma estratégia negocial suicida, da ausência da qualquer real margem de manobra para chegar a um acordo e ainda de algo que aqui lembrei a semana passada, a real natureza do Syriza. Mas o que arrepia é que, mesmo sem um Syriza português, podíamos ter ido pelo mesmo caminho.

Há dois anos e meio, pouco depois do “enorme aumento de impostos” e da crise da TSU, cheguei a temer, e escrevi-o, que provavelmente não escaparíamos a um destino semelhante ao dos gregos. Nessa altura quase toda a nossa elite andava pelas televisões e descia às ruas para proclamar a impossibilidade de atingir os objectivos e pedir negociações mais duras. Foi o tempo em que até o Presidente da República se juntou ao coro e anunciou a famosa “espiral recessiva” que nunca se materializou. Ninguém imaginava que fosse possível evitar um segundo resgate, muito menos que se conseguisse uma “saída limpa”.

Na verdade, conhecendo a nossa natureza e, sobretudo, a o egoísmo e a cobardia de boa parte das nossas elites, não era difícil imaginar um destino tão triste como o grego. Podíamos fazê-lo à moda de Sócrates, prometendo à Europa medidas e metas que depois nunca cumpriríamos, ou podíamos fazê-lo à moda grega, de Papandreou ou de Samaras, queixando-nos sempre de que as medidas “não iriam funcionar” e, depois, fazer tudo arrastando os pés. Sabemos onde nos conduziu o método Sócrates, com os seus três PEC (já nem falo do quarto), tal como sabemos no que deu o caminho grego.

Nestes dias em que regressamos a casa sem novos sobressaltos e, ao abrir a televisão, vemos o que se passa em Atenas ou Salónica, é bom recordar que nos podia ter acontecido o mesmo. Que até esteve quase a acontecer-nos o mesmo na crise do verão de 2013. Há por aí muita falta de memória, mas há coisas que não podem nem devem ser esquecidas.

Um dia se fará, com mais distância e mais dados, a história comparada dos resgates da crise das dívidas soberanas, mas há um ponto que podemos dar já por adquirido: o nosso ponto de partida era especialmente difícil. Éramos, em termos comparativos, mais pobres do que os gregos, vínhamos de dois anos com o défice público acima dos 10%, tínhamos uma dívida pública a crescer de forma descontrolada e – aspecto demasiadas vezes esquecido – uma dívida externa que era, em termos proporcionais, das maiores do mundo. Isto para além de tudo o que estava escondido debaixo do tapete, dos encargos futuros com as PPP às dívidas colossais de algumas empresas públicas.

A nossa tarefa não era mais fácil, a nossa troika não foi menos exigente – a nossa atitude é que foi diferente. No sector privado na economia e na direcção do governo. Nada demais, pois todos sabemos como muito ficou por fazer. Mas o suficiente para já estarmos a deixar para trás a parte mais difícil do caminho das pedras.

Dir-se-á, e eu também o disse e digo, e também o escrevi, que países como Portugal (e a Grécia por maioria de razão) acumularam dívidas que pesam excessivamente sobre as suas economias, pelo que deverão ser reestruturadas. E, na verdade, isso já aconteceu: na Grécia com um enorme haircut da dívida em mãos privadas, em Portugal através de iniciativas mais discretas de troca de dívida e mudança de maturidades. É um caminho que, no caso português, continuará a ser prosseguido, espero eu, mas que depende muita da relação de confiança entre credores e devedores. O que o nosso país conseguiu – e isso devemo-lo ao Governo, o seu a seu dono – é ter conseguido reganhar a confiança dos credores, o que lhe tem dado margem de manobra para alguma renegociação e permitido que gastemos, em proporção da dívida, menos com o pagamento de juros. É apenas um começo, mas é começo.

A abordagem do governo do Syriza a este tema foi diametralmente oposta. Começou por ser quase um “não pagamos”, desapareceu durante algum tempo e reapareceu nas exigências finais do governo grego, quase como pretexto para não aceitar um acordo no qual os credores já tinham feito a sua parte do caminho para irem ao encontro dos desejos de Atenas. Acontece porém que a abordagem agressiva do governo de Tsipras, que culminou com a convocação surpresa do referendo, tornou ainda mais claro para todos os parceiros que não existia gente confiável do outro lado da mesa. A resistência das instituições é assim não só compreensível, como natural e até exigível: porquê continuar a emprestar dinheiro a alguém que não dá garantias credíveis de equilibrar as suas contas? Porquê perdoar dívida quando se está a pedir a emissão de nova dívida e, ao mesmo tempo, a desfazer algumas das reformas levadas a cabo? Para quê ajudar a salvar a pele um político que nos despreza nos dias pares e nos sorri nos dias ímpares?

A aflição dos gregos que correram para as caixas multibanco é por isso da natureza das coisas. O dinheiro já é pouco e pode acabar de um dia para o outro. Os laços com a zona euro são cada vez mais ténues, com o Eurogrupo a reunir sem Varoufakis presente. E todos percebem que insultar os credores sempre que se sobre à tribuna do parlamento pode entusiasmar os radicais, mas só endurece ainda mais a posição de quem tem de mostra boa vontade e paciência. Muita boa vontade e muita paciência, apesar de tudo.

É por isso bem possível que cada dia seja ainda pior do que o anterior. Que mesmo aprovando em referendo o acordo, os gregos percebam que, entretanto, a proposta europeia foi retirada de vez. Que à radicalização do discurso se siga uma radicalização nas ruas, um processo que o país já conheceu. E que até o pouco que sobrava da economia – o turismo – entre em crise profunda, pois os turistas desabituaram-se de levar os bolsos cheios quando partem de férias e agora estão a ser avisados que devem fazê-lo, por precaução.

É também por isso que quando olhamos para trás e nos recordamos de como tantos, tantas vezes, nos recomendaram caminhos semelhantes, só podemos suspirar de alívio. De facto, não nos aconteceu, mas podia ter acontecido.


E, para sermos realmente honestos, ainda não estamos livres que nos aconteça.